Mostrar mensagens com a etiqueta Nunes da Rocha. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Nunes da Rocha. Mostrar todas as mensagens

Nunes da Rocha


Não esqueci nenhum artifício
Paráfrase ou sussurro
Que dariam títulos de jornais
(fui poeta de corpo inteiro entre datas sofríveis).

Hoje espremo pequenas gorduras duma pele infeliz
E aparo grisalha barba à criança distraída;
Mesmo assim
Não esqueço o perfil de romântico alemão,
À medida dum assombro teu,
Com o qual esperei uma felicidade universal
Daquelas que julgamos sem moldura.


em Poemas Obsoletos de um Bicho Imóvel, Lisboa: Averno, 2017, p. 25.

Um poema de Nunes da Rocha


De um taifa no Alfeite


Olho pró lado da barra — está de chuva.
Calhava agora um ponto negro no Infinito;
Uma angústia, gabardine e par de luvas
O "barreirense", proa à popa manuscrito.

(Não há que duvidar, ele há poeta!
De boquilha, sem anão inglês.
Apesar da metafísica erecta
Do Comércio, Palladium e Marquês)

Eis o ponto negro, agora alto e quente
De entre as calças à boca-de-sino.
A manhã está mais clara, emoliente,
Já requer heterónimo e desatino.

Ah, todo o cais é uma tusa!
Ergo o colarinho de alcache
E vejo a Ideia, matinal, difusa,
Como se tivesse fumado um haxe.

(Lá vai um, outro, todos de chupeta!
É este um país de marinheiros,
Poetas que viajam de cacilheiro
Para a ilha de Creta).

São todos os cais iguais a este?
Devem ser: fedores-caneiro deste,
Mulheres-putas, dealers-homens,
Coisas-Reais que nos consomem.

..........

Cá está o ponto negro, agora nítido
Debaixo da mini-saia.
Tive sorte, com o pré antecipado
Dou uma, clássica, na praia.


em Cancioneiro da Trafaria, Lisboa: & etc, 2009, pp. 26-27.