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quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

CAVACO PRUDENTE OU TEMEROSO?


Durante várias décadas de vida, tenho assumido como regra comportamental que as autoridades, principalmente as que foram eleitas pelos cidadãos, devem ser por estes tratadas com o maior respeito e a máxima deferência.

Nesse conceito, enquadra-se o Supremo Magistrado da Nação que, por definição, deve considerar-se apenas limitado pelo texto da Constituição da República, interpretado com o bom senso e a prudência que deve estar sempre no espírito de uma pessoa que ousou candidatar-se ao cargo e obteve a eleição pelos votos da maioria dos cidadãos que votaram de forma útil.
Por isso, pode ficar-se chocado com o título da notícia «Cavaco é um vice-primeiro ministro e não um Presidente da República».

Mas como não há fumo sem fogo, devemos procurar os motivos que levaram a autora, eurodeputada também eleita por eleição legal, a fazer afirmação tão ousada. E deparamos com palavras do PR como as seguintes «Portugal tem ainda à sua frente grandes desafios muito exigentes. Portugal continua a enfrentar fortes restrições e ser-lhe-ão colocadas grandes exigências no futuro. É uma ilusão pensar que os problemas do país estão resolvidos. Tal como é uma ilusão pensar que os problemas podem ser resolvidos num contexto de facilidades»

Declara,assim, que o Governo não resolveu os problemas do país. Nisso, está em concordância com a opinião de Bruxelas: /«Outro problema para a troika é o programa de reformas estruturais. Para Bruxelas, o ímpeto do reformista está a abrandar consideravelmente e mal, porque a economia portuguesa precisa de continuar o seu ajustamento na visão de Bruxelas, e, em alguns casos, estarão mesmo a ser revertidos os resultados de algumas das reformas colocadas em curso.»

E que apesar de vários anos de dura austeridade, repetidamente agravada, afirma claramente que «Portugal continua a enfrentar fortes restrições e ser-lhe-ão colocadas grandes exigências no futuro». Um cidadão medianamente informado perguntará, qual o motivo de o PR não ter decidido eleições antecipadas. Pode ter havido um de dois tipos de raciocínio.

O primeiro, de extrema prudência e sensatez, porque pode ter pensado que as eleições representariam paragem na vida nacional e despesas, sem garantia de que delas resultasse um governo menos mau.
O segundo, de temeridade e falta de ousadia para arriscar essa paragem e despesa, com receio de que resultasse um governo pior, o que parece ser de grande improbabilidade.
Daqui que o artigo inicialmente referido tenha insinuado uma submissão ao Governo, como se fosse um seu vice-PM. Claro que isso não passa de uma forma hiperbólica e irónica como é frequente acontecer na nossa política de discutível qualidade.

Mas Cavaco manifesta-se contra o medo da mudança, a qual é meritória e indispensável para não continuarmos cristalizados numa austeridade por teimosia que já mostrou a sua ineficácia, por não ter efectuado a prometida Reforma Estrutural do Estado, entre outras coisas, com redução da burocracia ao mínimo indispensável, o que evitaria as falhas de um programa que estão na origem da operação Labirinto, que tornaria desnecessário o desbarato do património Nacional, das joias da coroa e a privatização de empresas símbolos de soberania, criado mais milionários e empobrecido maior número de cidadãos desprotegidos. E isso demonstra que o PR, em vez de se mostrar solidário com o Governo, devia tê-lo criticado e ter-lhe dado um puxão de orelhas e colocado de pé voltado para a parede.

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sábado, 13 de julho de 2013

CAVACO DESISTE DE MEDIADOR


A notícia de que Cavaco põe de lado figura do mediador é evidencia de que quando este foi referido na comunicação ainda não correspondia a algo já decidido e que a posterior referência a Ramalho Eanes foi abusiva.

Parece que a incompetência continua. Não é sensato tornar públicos projectos e promessas antes de acertar os pormenores que os tornem viáveis. Nada pior para a credibilidade do que tornar públicas ideias que depois não podem ser concretizáveis.

Passos já está a defender-se e a colocar em cheque o PR quando diz que “É preciso trocar declaração de Cavaco Silva por miúdos” E ninguém melhor do que o autor da declaração a pode explicar nos pormenores, para depois não ter de desaprovar qualquer interpretação vinda dos três partidos. Mas mesmo isso não seria correcto porque, no nosso regime democrático, cabe ao poder legislativo, que reside na Assembleia da República, a fiscalização dos actos do executivo.

Também o cronista do Jornal de Negócios, António Costa apresenta dúvidas sobre As saídas de Belém, em que tece considerações merecedoras de reflexão.

Está assim gerado um imbróglio para o qual José Miguel Júdice sugere a solução de “Um golpe de estado ou uma revolução” que instale o “presidencialismo”, mas sublinha que, para isso é preciso que o PR seja «“uma grande figura humanista” que, podendo ser do PSD ou do PS, seja “respeitada pelas elites”. Só um Presidente com esse perfil daria “algum sossego aos conservadores e algum sonho àqueles mais favoráveis à mudança”».

Em conclusão, nos últimos anos, tem ficada bem demonstrado que não bastam sonhos e fantasias prometidas aos portugueses para que a vida nacional passe a ser mais saudável em todos os aspectos. É preciso definir o objectivo pretendido, estudar seriamente os problemas, escolher as melhores soluções, planear, programar as acções concretas e controlar os resultados a fim de ir limando as pequenas arestas que forem detectadas, a fim de os objectivos pretendidos que serviram de alvo ao processo sejam obtidos. Tal metodologia consta aqui desde 4/12/2008, mas já consta de manuais muito mais antigos.

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sexta-feira, 12 de julho de 2013

CAVACO SILVA AGIU COM DISCERNIMENTO

O facto de Cavaco Silva ter apresentado de surpresa a sua proposta de Compromisso de Salvação Nacional deixou os responsáveis políticos e a Comunicação Social embrulhada em completa incredulidade. Isso ficou patente na avalanche de notícias destrutivas de que constam títulos como LoboXavier acusa Cavaco Silva de "instaurar o caos" e Pedro Silva Pereira "Cavaco deixou uma bomba atómica ao retardador".

A primeira análise optimista que me apareceu foi a de Henrique Monteiro em Cavaco: O surpreendente bom senso, mas não explicava os motivos de a comunicação ter aparecido de forma chocante e inesperada pelos próprios líderes partidários.

Procurando compreender o que se passou e sem se deixar arrastar pela generalidade das palavras nada abonatórias dirigidas ao PT. Uma pessoa mais realista poderia descortinar uma hipóteses de solução que fosse menos absorvedora de energias e de tempo para convencimentos dos partidos intervenientes. Assim, com a proposta do «Compromisso» esboçado, o problema passou a ser de imediato dos três partidos. Ou aceitavam colaborar para bem de Portugal ou, perante a população, ficariam considerados culpados dos males que adviriam do impasse criado, com os advenientes inconvenientes para a vida dos cidadãos e para a actividade económica e o emprego.

E essa ideia foi apanhada e esclarecida por Marcelo Rebelo de Sousa em Cavaco Silva “deu um estalo à classe política”.

Dele se transcreve:

"Foi, à sua maneira, um estalo grande na classe política toda, Governo e oposição. Um estalo no PC e no BE ao dizer que não há eleições, no Governo ao não dizer claramente que esta é a solução que dura até 2015 e no PS ao não dar eleições, mas que talvez dê em 2014, sabendo que isso divide o PS".

"O Presidente achou que tinha força para dar esses estalos construtivos, esperando que os partidos pegassem. Acho que os partidos devem devolver a bola. Vamos negociar, mas vamos esclarecer dois ou três pontos que estão por esclarecer".

"Não é de risco no sentido de que o Presidente tentava encontrar uma fórmula que fosse a linha intermédia entre tudo o que ouviu. Foi a procura do menor risco possível no imediato. Pode ser um risco a prazo".

Também António Capucho manifestou regozijo pela iniciativa presidencial em Temos Presidente.

Entretanto não demoraram as reacções dos partidos que parece terem feio a escolha mais racional segundo a visão de Helena Garrido traduzida na frase aproveitar a «oportunidade para renascerem e dar ao País a possibilidade de se manter no euro. A escolha que enfrentam PS, PSD e CDS é entre a morte a prazo ou a regeneração. É entre regressarem às raízes da sua existência, o combate com o povo e pelo povo, ou continuarem a atirar o País com eles para o precipício.»

E assim surgiram sinais de que Passos, Portas e Seguro estão abertos a negociar, Passos “totalmente empenhado” em conseguir acordo pedido por Cavaco, PS reitera disponibilidade para processo de diálogo e, por seu lado, o CDS diz que Abertura ao diálogo é uma "posição de princípio".

E na sequência da clarificação do processo, veio a saber-se que Cavaco Silva convidou António dos Santos Ramalho Eanes como seu trunfo para mediar o compromisso. Em conformidade com a Crónica de Fernando Dacosta é uma óptima solução por se tratar de um «Ser Decente», um homem sério, isento, patriota que ama Portugal, que se guia pelos mais altos valores morais e sociais, que respeita as pessoas sujeitas aos efeitos dos actos do Governo e da máquina do Estado. Ele saberá, com o seu saber, a sua sensibilidade e o seu portuguesismo, contribuir para a resolução de qualquer hesitação ou controvérsia acerca da missão que está entregue aos três principais partidos, para ser ultrapassada a crise que nos tem preocupado.

Oxalá nos regozijemos daquilo que começar a ser feito para bem de Portugal. É momento para fazer reviver a frase: Todos não seremos demais para fazer ressurgir a força de Portugal.

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sábado, 27 de abril de 2013

CONSENSO ODIADO OU APENAS ADIADO?


Transcrição de artigo, muito didáctico que merece atenta reflexão:

Dividir o consenso
Correio da Manhã. 27-04-2013. 01h00. Por: Medeiros Ferreira, Professor Universitário

Foi paradoxal o discurso do PR na Assembleia. Disse que era preciso o consenso e teve o efeito de dividir as bancadas entre os partidos do governo e os partidos da oposição.

E não foi a oposição que fabricou uma escuta facciosa, mas antes o tom estridente e pouco subtil das palmas dos deputados da maioria galvanizados por um apoio desmedido, que culminou com uma ovação de pé no fim da oração, a dividir ainda mais o hemiciclo. Em termos de consenso, o máximo que Cavaco Silva conseguiu foi adiá-lo para as calendas gregas.

Ora, num objectivo estratégico como o do consenso, o essencial joga--se na táctica e nos caminhos para o atingir. Não se chega ao consenso por declaração de emergência ou por decreto-lei, muito menos em "sociedades abertas" e "viradas para o exterior". Fora casos excepcionais, os consensos atingem-se pela via de propostas concretas, de diálogo, e de negociações que podem ser duras e albergar fases de antagonismo. Mesmo durante as guerras, foi assim em países democráticos. Não ter isso em conta quando se fala de consenso só serve para perder tempo e baralhar os espíritos. O consenso dá pois muito trabalho às partes envolvidas e a quem o quer promover.

Por outro lado, os consensos políticos podem ser gerais ou apenas focalizados em casos pontuais da agenda política. Pelo contexto do discurso do PR, pareceu-me que este se referia sobretudo aos decorrentes dos compromissos internacionais financeiros e monetários actuais, e à sempre desejada e adiada "disciplina orçamental". Ora, o garante desses compromissos é fundamentalmente o governo e a maioria que o apoia no parlamento. É mesmo saudável e realista deixar uma parte da representação do País com as mãos livres desses compromissos. Até porque há "desenhos", mesmo traçados por especialistas internacionais, que se revelam errados. O consenso no erro técnico é bem pior que o dissenso político.

A parte filosófica mais discutível do discurso de Cavaco Silva na AR foi a que pretendeu fixar o mandato dos futuros deputados, "independentemente do calendário eleitoral". Ora, "todo o mundo é feito de mudança", como diria Camões. Quem sabe se não haverá na próxima legislatura consensos diferentes, menos situacionistas e mais positivos?

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quinta-feira, 18 de abril de 2013

FRASES DE CAVACO SILVA NA COLÔMBIA


Transcrição a partir de artigo do Expresso:

«A Justiça enfrenta no nosso tempo desafios muito particulares. Não pode, contudo, alhear-se da realidade à sua volta, das necessidades concretas dos cidadãos, da celeridade exigida pelos agentes económicos».
"A Justiça não pode alhear-se da sua dimensão social, pois é ao serviço do povo que os Tribunais são colocados".
«A Justiça é um elemento essencial da paz em sociedade. Em última instância, a ela compete evitar que 'os tempos de crise' se convertam em 'tempos de cólera'. Os Tribunais são, pois, um pilar fundamental de qualquer processo de pacificação».
«o poder judicial constitui um pilar fundamental do Estado de direito contemporâneo».
«A separação de poderes e, muito em particular, a independência e imparcialidade dos Tribunais são essenciais à proteção dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, bem como à confiança dos agentes económicos».

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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Não lhe mexas que é pior

Em meados do século passado, no teatro Monumental estava em palco uma peça em que os actores Artur Semedo e Laura Alves, a dada altura, enquanto um casal mais idoso discutia, estavam sentados num sofá em atitude de namorados e, quando o Artur teve de se levantar para cumprir a parte seguinte do seu papel, ao dar os primeiros passos, teve necessidade de acomodar o volume que surgira no fundo do ventre por ter levado demasiado a sério o contacto com a namorada. Como o gesto fosse demorado e notado, um espectador gritou do meio da plateia: «Oh Artur não lhe mexas que é pior». Houve gargalhada e aplauso geral e o Artur distraiu-se do incómodo e este desapareceu.

O mesmo conselho é aplicável a Cavaco que, passados três dias da sua afirmação que mereceu a ajuda de Marcelo “Há dias em que uma pessoa não é feliz”, deu origem à notícia Cavaco Silva diz que não foi "suficientemente claro" na questão das reformas. Ora, para que os leitores compreendem o que se passara, três dias antes, o artigo repete o sucedido. E, quanto mais mexer, mais tempo as palavras «infelizes» e menos claras continuarão na boca dos portugueses.

Não lhe mexa que é pior. Aplique o tabu, ponha uma pedra sobre o assunto. Aqui será seguido este conselho para este caso.

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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Marcelo para defender o amigo enterrou-o

Marcelo tem razão quando diz «há dias em que uma pessoa não é feliz», pois a frase com que quis defender Cavaco sortiu um efeito contrário às suas prováveis intenções. Então, tem a coragem de dizer publicamente que Cavaco está em tal estado que «quis dizer uma coisa e saiu-lhe outra”. Depois diz que “há dias em que uma pessoa não é feliz”, o que pode levar a pensar se é essa a frase correcta ou se «há dias em que uma pessoa é feliz», como dizia um cauteleiro autorizado a entrar numa escola militar, que repetia o slogan «o quarto 24 já foi feliz!». Mas tratava-se da lotaria!

Marcelo deixou as pessoas a reflectir em sensatez, em capacidade e em auto-domínio para pensar bem e exprimir correctamente as ideias.

Com «defesas» como esta, não é fácil deixar de ter «dias em que uma pessoa não é feliz».

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sábado, 19 de novembro de 2011

CUIDADO com as «divindades» da TROIKA

Errar é humano, mas há erros previsíveis pelas tendências e interesses subjacentes às atitudes. Os «sábios» da Troika são representantes de interesses poderosos no mundo, o FMI, e como tal, por mais que quisessem não conseguiriam descer aos problemas das pessoas, compreendê-los e procurar para eles as melhores soluções em conformidade com todas as vicissitudes das circunstâncias.

Por isso, como foi há dias referido aqui, veio a público a notícia de que a Troika quer que empresas também cortem nos salários em 2012, contra o que surgiram de imediato várias reacções e a que o PR não ficou indiferente, como diz a notícia Cavaco critica sugestão de baixar salários no privado.

Por um lado, há que atender a que não é favorável ao desenvolvimento procurar a competitividade com salários mais baixos, mas sim, aumentando a capacidade de inovação e melhorando a qualificação dos recursos humanos, simultaneamente com investimento na eficiência dos equipamentos industriais e nos métodos de trabalho com uma boa ligação entre o ensino superior e as empresas, além de muitos outros factores como a qualidade da marca e o marketing.

Por outro lado, de acordo com o modelo económico português, “o poder político não tem competência para determinar directamente os salários praticados no sector privado”, devendo deixar funcionar a livre iniciativa, dentro de limites que salvaguardem o respeito pelas regras da leal concorrência.

Esta atitude da Troika, ao contrário dos milionários americanos, pretende que Portugal resolva o problema da crise, gerada por más decisões de governantes sob pressão de grandes empresários e outras espécies de milionários, não à custa de quem mais tem mas à custa de quem vive do salário do trabalha e que se vê frequentemente espoliado do pouco que recebe.

Agudizar o empobrecimento já bastante notório inviabiliza qualquer esforço de desenvolvimento e de recuperação da crise, como se vê pelas notícias Indicador de consumo privado com novo mínimo histórico e Actividade económica e procura mantiveram perfil negativo em Setembro.

Não é difícil compreender que, baixando o poder de compra das pessoas, o comércio começa a facturar menos, muitas lojas encerram, aumentando o desemprego, a indústria passa a produzir menos, com perigo de falências e desemprego, o total recebido dos impostos diminui e a crise agrava-se.

As «divindades» da troika não são infalíveis, não fazem milagres e nem sempre analisam os problemas nas suas complexas implicações. Cavaco, desta vez, colocou o dedo na ferida com justeza, oportunidade e sem ambiguidade.

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domingo, 23 de outubro de 2011

Caminho fácil é ilusão

Transcrição de e-mail recebido, há minutos, retransmitido por um Amigo, em que é desenhado o quadro das últimas décadas da vida nacional:

Carta Aberta ao venerando chefe do estado a que isto chegou

Senhor Presidente

Há muito muito tempo, nos dias depois que Abril floriu e a Europa se abriu de par em par, foi V.Exa por mandato popular encarregue de nos fazer fruir dessa Europa do Mercado Comum, clube dos ricos a que iludidos aderimos, fiados no dinheiro fácil do FEDER, do FEOGA, das ajudas de coesão e mais liberalidades que, pouco acostumados, aceitámos de olhar reluzente, estranhando como fácil e rápido era passar de rincão estagnado e órfão do Império para a mesa dos poderosos que, qual varinha mágica, nos multiplicariam as estradas, aumentariam os direitos, facilitariam o crédito e conduziriam ao Olimpo até aí inatingível do mundo desenvolvido. Havia pequenos senãos, arrancar vinhas, abater barcos, não empatar quem produzisse tomate em Itália ou conservas em Marrocos, coisa pouca e necessária por via da previdente PAC, mas, estando o cheque passado e com cobertura, de inauguração em inauguração, o país antes incrédulo, crescia, dava formação a jovens, animava a construção civil , os resorts de Punta Cana e os veículos topo de gama do momento. Do alto do púlpito que fora do velho Botas, V.Exa passaria à História como o Modernizador, campeão do empreendedorismo, símbolo da devoção à causa pública, estóico servidor do povo a partir da marquise esconsa da casa da Rua do Possôlo. Era o aplicado aluno de Bruxelas, o exemplo a seguir no Mediterrâneo, o desbravador do progresso, com o mapa de estradas do ACP permanentemente desactualizado. O tecido empresarial crescia, com pés de barro e frágeis sapatas, mas que interessava, havia pão e circo, CCB e Expo, pontes e viadutos, Fundo Social Europeu e tudo o que mais se quisesse imaginar, à sombra de bafejados oásis de leite e mel, Continentes e Amoreiras, e mais catedrais escancaradas com um simples cartão Visa.

Ao fim de dez anos, um pouco mais que o Criador ao fim de sete, vendo a Obra pronta, V.Exa descansou, e retirou-se. Tentou Belém, mas ingrato, o povo condenou-o a anos no deserto, enquanto aprendizes prosseguiam a sanha fontista e inebriante erguida atrás dos cantos de sereia, apelando ao esbanjamento e luxúria.

No início do novo século, preocupantes sinais do Purgatório indicaram fragilidades na Obra, mas jorrando fundos e verbas, coisa de temerários do Restelo se lhe chamou. À porta estava o novo bezerro de ouro, o euro, a moeda dos fortes, e fortes agora com ela seguiríamos, poderosos, iguais. Do retiro tranquilo, à sombra da modesta reforma de servidor do Estado, livros e loas emulando as virtudes do novo filão foram por V.Exa endossados, qual pitonisa dos futuros que cantam, sob o euro sem nódoa, moeda de fortes e milagreiro caminho para o glorioso domínio da Europa. Migalha a migalha, bitaite a bitaite, foi V.Exa pacientemente cozendo o seu novelo, até que, uma bela manhã de nevoeiro, do púlpito do CCB, filho da dilecta obra, anunciou aos atarantados povos estar de volta, pronto a servir. Não que as gentes o merecessem, mas o país reclamava seriedade, contenção, morgados do Algarve em vez de ostras socialistas. Seria o supremo trono agora, com os guisados da Maria e o apoio de esforçados amigos que, fruto de muito suor e trabalho, haviam vingado no exigente mundo dos negócios, em prol do progresso e do desenvolvimento do país.

Salivando o povo à passagem do Mestre, regressado dos mortos, sem escolhos o conduziram a Belém, onde petiscando umas pataniscas e bolo-rei sem fava, presidiria, qual reitor, às traquinices dos pupilos, por veladas e paternais palavras ameaçando reguadas ou castigos contra a parede. E não contentes, o repetiram segunda vez, e V. Exa, com pungente sacrifício lá continuou aquilíneo cônsul da república, perorando homilias nos dias da pátria e avisando ameaçador contra os perigos e tormentas que os irrequietos alunos não logravam conter. Que preciso era voltar à terra e ao arado, à faina e à vindima, vaticinou V.Exa, coveiro das hortas e traineiras; que chegava de obras faraónicas, alertou, qual faraó de Boliqueime e campeão do betão; que chegava de sacrifícios, estando uns ao leme, para logo aconselhar conformismo e paciência mal mudou o piloto.

Eremita das fragas, paroquial chefe de família, personagem de Camilo e Agustina, desprezando os políticos profissionais mas esquecendo que por junto é o profissional da política há mais anos no poder, preside hoje V.Exa ao país ingrato que, em vinte anos, qual bruxedo ou mau olhado, lhe destruiu a obra feita, como vil criatura que desperta do covil se virou contra o criador, hoje apenas pálida esfinge, arrastando-se entre a solidão de Belém e prosaicas cerimónias com bombeiros e ranchos.

Trinta anos, leva em cena a peça de V.Exa no palco da política, com grandes enchentes no início e grupos arregimentados e idosos na actualidade. Mas, chegando ao fim o terceiro acto, longe da epopeia em que o Bem vence o Mal e todos ficam felizes para sempre, tema V.Exa pelo juízo da História, que, caridosa, talvez em duas linhas de rodapé recorde um fugaz Aníbal, amante de bolo-rei e desconhecedor dos Lusíadas, que durante uns anos pairou como Midas multiplicador e hoje mais não é que um aflito Hamlet nas muralhas de Elsinore, transformado que foi o ouro do bezerro em serradura e sobrevivendo pusilânime como cinzento Chefe do estado a que isto chegou, não obstante a convicção, que acredito tenha, de ter feito o seu melhor.

Respeitoso e Suburbano, devidamente autorizado pela Sacrossanta Troika

António Maria dos Santos
Sobrevivente (ainda) do Cataclismo de 2011

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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Cavaco Silva e os tabus

Daquilo que os jornais ultimamente têm trazido a lume verifica-se que há muita gente com dúvidas acerca dos comportamentos de Cavaco Silva e muitos seus admiradores sentem-se frustrados e desiludidos.

Efectivamente, não parece fácil interpretar uma pessoa que foge aos padrões mais vulgarizados entre as personagens mais mediatizadas. A meu ver, trata-se de um homem sério, segundo os padrões mais optimistas, de entre os políticos actuais, tímido, receoso de dizer algo de que amanhã tenha que se arrepender. Por isso, quando fala, controla rigorosamente as palavras acabando, muitas vezes, por não explicar nem esclarecer mas ocultar mais do que aquilo que diz, do que aquilo que deixa atrás da cortina, algumas vezes o essencial, e apenas permitindo subentendidos que têm efeitos maléficos. Há quem diga que, neste aspecto, não devem ser desprezados os indícios da influência da esposa, demasiado dominadora e controladora que parece exercer muita pressão sobre as suas decisões.

Quando foi eleito presidente do PSD, na Figueira da Foz, deu uma «explicação» que não convenceu ninguém e que uns interpretaram de uma forma e outros de maneira diametralmente oposta. Não se candidatou, não quis ir ao congresso da Figueira e só ali apareceu porque calhou ir para aqueles lados, por acaso, fazer a rodagem do carro novo. Depois de lá estar, por acaso, uns companheiros de partido pressionarem-no para aceitar ser eleito e tanto insistiram que ele, boa pessoa, não quis magoá-los e aceitou!

Os mais amigos logo o apelidaram de generoso, dedicado, que aceitou o sacrifício de contribuir para um Portugal melhor. Enfim, o homem-providência. Depois, no Governo, onde chegou pela força do partido e não por vontade própria, pois declarou que nem lia os jornais nem respondia aos jornalistas, e criou tabus. Ficou célebre o desmesurado naco de bolo que meteu na boca para se defender do jornalista e da sua próprias eventual tentação de responder. Cavaco não falava, não esclarecia, apenas calava, ocultava.

No caso do veto de leis usa de meios argumentos, não esclarecendo completamente, como o caso de ter enviado o Estatuto dos Açores ao Tribunal Constitucional, por motivos que não tinham constado da anterior devolução do projecto à AR.

E o tempo foi assim passando e agora esteve vários meses, segundo os jornais, sem esclarecer o problema das eventuais escutas e, quando o caso saltou para o conhecimento público, continua com cautelas, calando, insinuando timidamente e prometendo esclarecimento numa data posterior. Entretanto exonera o jornalista assessor de imprensa.

Não gosta da fórmula «dizer a verdade, toda a verdade e só a verdade». Considera que «o segredo é a alma do negócio» e diz um pouco das coisas e deixa o resto à imaginação dos eleitores. Destes, uns interpretam com pessimismo e logo o condenam. Outros mais optimistas e aficionados interpretam segundo os seus próprios desejos e, mais tarde, sentem-se frustrados e desgostosos.

Há uma boa norma que deve ser seguida quando é necessário falar: «clarinho, clarinho, para o cidadão mais simples compreender». E quando o silêncio è preferível às palavras, então, deve ficar calado, mas totalmente calado, sem estimular esperanças nem receios, porque as insinuações são sempre nocivas e corrosivas.

A. João Soares