Ilust.
Porém, a exaltação da língua portuguesa sobressai como evidente manifestação de resistência à castelhanização forçada num tempo de domínio filipino em Portugal, como resposta a um sentimento de inconformismo perante a perda oficial do idioma pátrio:
"E verdadeiramente que não tenho a nossa língua por grosseira nem por bons os argumentos com que alguns querem provar que é essa; antes é branda para deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar, breve para resolver e acomodada às matérias mais importantes da prática e escritura.
Para falar, é engraçada, com um modo senhoril; para cantar, é suave, com um certo sentimento que favorece a música; para pregar , é substanciosa, com uma gravidade que autoriza as razões e as sentenças; para escrever cartas, nem tem infinita cópia que dane, nem brevidade estéril que a limite; para histórias, nem é tão florida que se derrame, nem tão seca que busque o favor das alheias.
A pronunciação não obriga a ferir o céu da boca com aspereza, nem a arrancar as palavras com veemência do gargalo.
Escreve-se da maneira que se lê, e assim se fala.
Tem de todas as línguas o melhor: a pronunciação da latina, a origem da grega, a familiaridade da castelhana, a brandura da francesa, a elegância da italiana. Tem mais adágios e sentenças que todas as vulgares, em fé de sua antiguidade. E, se à língua hebreia, pela honestidade das palavras, chamaram santa, certo que não sei eu outra que tanto fuja de palavras claras em matéria descomposta, quanto a nossa. E, para que diga tudo, um só mal tem, e é que, pelo pouco que lhe querem seus naturais, a trazem mais remendada que capa de pedinte!"
(In Corte na Aldeia)
Soneto
Mil anos há que busco a minha estrela
E os Fados dizem que ma têm guardada;
Levantei-me de noite e madrugada,
Por mais que madruguei, não pude vê-la.
Já não espero haver alcance dela
Senão depois da vida rematada,
Que deve estar nos céus tão remontada
Que só lá poderei gozá-la e tê-la.
Pensamentos, desejos, esperança,
Não vos canseis em vão, não movais guerra,
Façamos entre os mais uma mudança:
Para me procurar vida segura
Deixemos tudo aquilo que há na terra,
Vamos para onde temos a ventura.
Soneto
Mil anos há que busco a minha estrela
E os Fados dizem que ma têm guardada;
Levantei-me de noite e madrugada,
Por mais que madruguei, não pude vê-la.
Já não espero haver alcance dela
Senão depois da vida rematada,
Que deve estar nos céus tão remontada
Que só lá poderei gozá-la e tê-la.
Pensamentos, desejos, esperança,
Não vos canseis em vão, não movais guerra,
Façamos entre os mais uma mudança:
Para me procurar vida segura
Deixemos tudo aquilo que há na terra,
Vamos para onde temos a ventura.
Rodrigues Lobo por José Hermano Saraiva