In Público (26/4/2013)
Por Inês Boaventura
«Num estudo encomendado pela câmara, Mega Ferreira inspira-se em Bolonha para propor um projecto para o futuro dos museus da capital
Os museus geridos pela Câmara de Lisboa apresentam, segundo António Mega Ferreira, problemas como a “imprecisão da defi nição da missão” de cada um deles, a “escassa orientação para o utilizador”, a “reduzida sensibilidade à componente comercial” e a “inexistência de edições próprias”. Isto além de padecerem de “problemas estruturais”, ao nível da sua orgânica e recursos humanos, da manutenção dos edifícios e equipamentos e da conservação e segurança.
Este diagnóstico é traçado no estudo sobre os museus municipais de Lisboa elaborado por Mega Ferreira, por deliberação do executivo
municipal, e ao qual o PÚBLICO teve acesso. No documento, intitulado O Museu É a Cidade, o escritor e antigo presidente da Fundação do Centro Cultural de Belém começa por fazer uma avaliação da situação actual, para depois apresentar uma proposta para o futuro, inspirada na cidade italiana de Bolonha. “A missão de cada um dos museus não se encontra clara e formalmente definida”, afirma Mega Ferreira, referindo-se aos equipamentos de tutela directa da Câmara de Lisboa: Museu da Cidade, Museu Antoniano, Museu do Teatro Romano e Museu Bordalo Pinheiro. Fora desta avaliação fi cam os equipamentos geridos pela Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural, que é municipal.
Quanto à relação com o público, o escritor diz que de uma forma geral há “uma rigidez expositiva”, uma “fragilidade dos discursos temáticos” e uma “obsolência das técnicas expositivas”, sublinhando ainda o facto de o número de visitantes ser “relativamente baixo” e apresentar “uma preocupante variabilidade”. O que, alerta, “parece denotar a incapacidade para fixar públicos, muito menos para os aumentar de forma sustentada”. Mega Ferreira critica ainda a “reduzida sensibilidade à componente
comercial”, incluindo bilheteiras, lojas e merchandising. Sobre o facto de os museus Antoniano e do Teatro romano serem de acesso gratuito, o escritor diz que “tendo em conta os constrangimentos fi nanceiros vigentes, só se pode justifi car ou pela fraca
qualidade da oferta ou pela inexistência de condições infra-estruturais mínimas”.
No seu diagnóstico, o ex-presidente do CCB denuncia a existência de “deficiências graves no plano de manutenção dos edifícios e equipamentos”, acrescentando que são
“em grande parte fruto de ausência de intervenções regulares, cuja origem é pelos responsáveis assacada à crónica falta de capacidade orçamental para lhes fazer face”. Os problemas mais graves, diz, verificam-se no Museu da Cidade, instalado no Palácio Pimenta, no Campo Grande, onde um orçamento feito em 2004 pela autarquia previa a necessidade de um investimento de mais de 600 mil euros.
Essas deficiências nos museus, alerta Mega Ferreira, “têm implicação directa nas condições de conservação do acervo das unidades museológicas”, existindo “problemas crónicos quanto à segurança dos
edifícios e peças expostas”. No caso do Museu Antoniano, por exemplo, há problemas de humidade, não há espaço de reservas, o sistema de intrusão está desactivado e trabalha no local uma única funcionária, “o que acarreta que, por vezes, a porta de entrada esteja fechada”.
Face a tudo isto, o escritor conclui que “os museus sujeitos a tutela directa da Câmara Municipal de Lisboa estão longe dos parâmetros ideais” que levaram o Conselho Internacional de Museus a consagrar nos seus estatutos a seguinte defi nição de museu: “Uma instituição permanente sem objectivo de lucro, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, estuda, expõe e transmite o património material e imaterial da humanidade e do seu meio ambiente, tendo por fim o estudo, a educação e a fruição.”
No âmbito do estudo que desenvolveu para o município, Mega fez “uma visita de estudo a Bolonha”, para conhecer o projecto Genus Bononiae, lançado em 2003. Trata-se, explica o escritor, de “um percurso cultural, artístico e museográfico articulado em diversos palácios do centro histórico de Bolonha, devidamente restaurados para albergar exposições ou instituições culturais”.
Da análise dessa experiência, o escritor ressalta o conceito de “museu difuso”, cuja adopção em Lisboa propõe, “para reorganizar os museus municipais na perspectiva de uma narrativa multipolar sobre a cidade”. Mega sugere ainda que para os equipamentos envolvidos nesse projecto seja criada uma marca — a que chama LisboaMuseu — “com uniformização dos sinais identifi cadores e linguagens gráficas e estabelecimento de políticas de funcionamento e comerciais comuns”.
Roteiros para uma leitura histórica da cidade
Na reunião camarária de anteontem, onde falou sobre as “novas perspectivas” do Museu da Cidade (que vai chamar-se Museu de Lisboa), a vereadora da Cultura não disse que futuro terão algumas das propostas de Mega. Mas pelas palavras de Catarina Vaz Pinto conclui-se que pelo menos duas serão concretizadas: a atribuição de nova vocação ao Palácio Pimenta, que o escritor propôs que se transformasse “em casa musealizada do século XVIII, reconstituindo a sua vivência como residência”, e a utilização do Torreão Poente do Terreiro do Paço para exposições. Esse espaço, disse a autarca, passará a ser o “núcleo-sede” do até aqui chamado Museu da Cidade. Defendeu ainda que “os outros museus e monumentos nacionais que se relacionam com a história de Lisboa devem ser programados em estreita articulação com o Museu de Lisboa” e sugeriu a criação de “itinerários/roteiros entre o Museu de Lisboa e outras entidades patrimoniais que
contribuem para uma leitura histórica da cidade”.»
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Geee, Bolonha é uma cidade bem bonita...