Sempre pensei que as questões de fé, as questões de consciência, não se discutem. Por isso evito entrar neste tipo de
querelas que opõem crentes e descrentes. Muitas vezes, deixamo-nos levar pelas emoções e descuramos a racionalidade e acabamos por nos enganar…
Conheci e admirei um homem que se chamava Mário Castrim. Foi um jornalista bastante conhecido no seu tempo, nomeadamente através das crónicas que assinava no há muito extinto Diário de Lisboa. Eram crónicas de sociedade, da sociedade vista através da televisão da época e acredito que não havia um único jornalista de televisão que passasse um dia sem pegar no DL só para ler o Castrim. Acontecia que o Mário Castrim era comunista confesso, militante do PC assumido. Não havia enganos, todos sabíamos que a visão dele era formatada pelas suas convicções políticas. Alguns até lhe puseram a alcunha maldosa de “coxinho das estepes”, porque o Castrim coxeava, de facto. A referência às “estepes” era uma alusão à Sibéria, província da URSS.
Um dia, fui almoçar à residência dos Missionários Combonianos, em Lisboa. Com alguma frequência, esses meus amigos convidavam-me para ir até lá para uns dedos de conversa que eles retribuíam com um almoço despretensioso.
Nesse dia, havia outros convidados e um deles era o Mário Castrim. Fiquei a saber que o Mário Castrim era um colaborador antigo da revista missionária Audácia, onde escrevia crónicas para crianças. Foi uma boa surpresa.
E surpreendente é, também, a convicção que mantém Saramago inabalável no seu diletantismo anti-religioso. Tanto mais surpreendente quanto ele se aproxima da morte. Já vi alguns soçobrarem à angústia e, na dúvida, aceitarem a fé dos pais e avós. Saramago não.