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quarta-feira, 14 de março de 2012

Todo um programa...



A tão propalada competitividade das empresas portuguesas (das que produzem alguma coisa, entenda-se) é sobretudo prejudicada por 3 factores modificáveis a nível local:


Por um lado, pela organização de trabalho e qualidade de gestão, já que somos daqueles que trabalham mais horas e dias na União Europeia, sendo a produtividade relativamente baixa.


Por outro, e excepto nalgumas áreas, pelos produtos oferecidos e sua rápida adaptação às expectativas dos consumidores. Afinal, se pomos a potencial mão-de-obra mais qualificada a vegetar precariamente em call centers, ou a mandamos emigrar, também não se fazem omoletes sem ovos...


Por fim, pelo custo elevado de diversos factores de produção, entre os quais não se inclui o trabalho - comparativamente barato, tal como aliás as contribuições patronais para a segurança social. Mas onde se inclui, de forma relevante para qualquer actividade económica e fulcral para muitas delas, a energia.


Energia que, claro está, também é essencial para cada um de nós e cuja necessidade e preço ainda se tornam mais importantes nestes tempos de alterações climáticas, marcados por frios mais frios e por calores mais quentes.


Se os exagerados preços energéticos pesam sobre as empresas portuguesas e a sua competitividade, pesam também (e muito, como bem sabemos ao olhar para a factura) nos nossos orçamentos domésticos, no nosso bem estar e, em última instância, na nossa saúde.


Justificar-se-ia, aliás, estudar urgentemente em que medida o incrível aumento de mortalidade neste inverno, em comparação com os anteriores, se deve não apenas ao impacto das políticas de austeridade sobre a quantidade e qualidade do consumo alimentar, mas também ao prosaico facto de que muito gente não tem condições para pagar o aquecimento de que necessitaria, num país em que as casas não estão preparadas para o frio.


A lógica e a experiência sugerem que a ligação entre esses factores e a mortalidade deverá ser muito directa. Perante ela, falar do aumento das gripes letais nestes meses que passaram equivale a dizer (e, em sentido estrito é verdade) que ninguém morre de SIDA; morre-se é de doenças a que o SIDA fornece as condições para se tornarem mortais.


Neste quadro, é relevante que o falatório se concentre nos subsídios às energias renováveis e não no facto de esses subsídios "estatais" serem pagos pelos consumidores, de eles serem estrategicamente importantes e mais ajustados do que outros concedidos a tecnologias poluidoras, ou de os preços da própria energia serem já exageradamente altos, e agora agravados por uma tributação de IVA inconcebível num produto económica e socialmente essencial.


Mas que, também neste quadro, um secretário-de-estado da energia se demita depois de considerar os preços da energia "exageradamente altos" e tentar intervir a esse nível, sendo de imediato substituído pelo senhor que (na presidência da instituição respectiva) dava o aval a esses preços, é todo um programa.


Todo um programa político, económico e social. Mas também de saúde pública.

domingo, 3 de abril de 2011

Japão no seu melhor

Esta auto-estrada, destruída no terramoto de dia 11, foi reparada em 6 dias.
(obrigado pela foto e informação, Último Nan Ban Jin)

sexta-feira, 11 de março de 2011

"Os mercados", essa coisa racional...

Por altura da abertura da Bolsa de Lisboa, viam-se nas televisões imagens de um depósito de gás de uma refinaria japonesa a arder, em consequência do enorme abalo sísmico ocorrido pouco antes.

As acções da Galp sofreram uma quebra.

Que "os mercados" não rimam com sensibilidade é, suponho, um facto assumido e consensual.
Mas espero que menos pessoas fiquem a acreditar que rimam com racionalidade.

Um abraço de solidariedade ao povo japonês


E os meus agradecimentos por, com a seriedade dos seus regulamentos de construção anti-sísmica e a preparação das pessoas para actuarem em situação de catástrofes, terem transformado uma tragédia que há 100 anos representava centenas de milhares de mortos em custos humanos incomparavelmente inferiores.

Estou certo de que um povo que, há séculos, conseguiu transformar algo de tão aterrador como uma onda gigante numa das suas obras de arte mais apreciadas sairá por cima desta desgraça.

Gostaria que alguma coisa fosse aprendida, com isto, na minha terra. Mas temo que tal não possa passar de um whishful thinking.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Produção primeiro, segurança depois

Agora que o Monde Diplomatique de Dezembro já está a sair, disponibilizo-vos aqui o artigo que lá escrevi no mês passado, acerca da subordinação da segurança à produção e ao lucro, em indústrias perigosas.

Passa por Sines, por Cahora Bassa, pelos arredores de Maputo, pela mina de San José e pelo Golfo do México, para defender que, embora isso seja pouco estudado pelas ciências sociais (em detrimento de outros fenómenos mais scientifically sexy), existe um padrão de subalternização da segurança aos objectivos produtivos, que urge combater.

Comentários e debates são bem-vindos, depois da leitura do artigo.

sábado, 6 de novembro de 2010

«Produção primeiro, segurança depois»


« Os dois acidentes laborais mais mediáticos dos últimos anos - o derrame do poço petrolífero da British Petroleum (BP) no golfo do México e os célebres 33 mineiros resgatados em San José, no Chile - vieram dar visibilidade, junto do grande público, a um problema que os estudos especializados tendem a ignorar: a frequente subalternização da segurança aos objectivos de produção e ao lucro, na gestão corrente de indústrias perigosas.

Em curioso contraste com o quase silêncio a nível internacional, o assunto tem sido abordado em estudos sobre Portugal e Moçambique, embora nada indique que tal se devesse a algum particularismo local ou cultural. Estas novos acidentes (cujo impacto mundial tornou inevitável a divulgação das suas causas e circunstâncias) vêm demonstrar que, a existir um particularismo, ele não se situa na prática das empresas, mas no olhar que sobre elas é lançado por quem as estuda.

Os acidentes vieram também colocar na ordem do dia interrogações inquietantes. Podemos continuar a considerar um caso pontual cada novo desastre em que a segurança tenha sido subordinada a critérios economicistas, ou estamos perante um padrão sistemático? Que podemos fazer para contrariar essa tendência empresarial, com isso protegendo a vida dos trabalhadores, o meio circundante e as demais pessoas que podem ser afectadas por cada desastre? »

...continue a ler, na página 2 do Monde Diplomatique deste mês

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Los 33 ( se puede reproducir libremente)

Chile es una país que crece en las tragedias. El poeta Fernando Alegría escribió:” cuando nos azota un temporal o nos sacude un terremoto, cuando Chile ya no puede estar seguro de sus mapas, digo enfurecido ¡viva Chile, mierda!”. En el mes de Agosto y todavía con la mitad del sur de país derribado por el terremoto del 27 de febrero, la voz de alarma llegó del norte, del desierto de Atacama, y supimos que 33 mineros habían quedado atrapados tras el derrumbe de una mina propiedad de una empresa que violaba todas las reglas de seguridad laboral.

33 hombres, uno de ellos boliviano, permanecieron atrapados a 700 metros de profundidad durante 69 días hasta que, y pese al show mediático montado por el gobierno, empezaron a salir uno a uno de las profundidades de la tierra.

Mientras escribo estas líneas ya han salido ocho, y lo han hecho de pie, recibiendo el saludo efusivo de sus compañeros que los buscaron, encontraron y cavaron la dura roca hasta que , con el lenguaje parco de los mineros, les dijeron que los sacarían de ahí.

Cuando salió el primero, el presidente Piñera daba gracias a dios y a la nomenclatura en orden de importancia de cargos, pero olvidó agradecer a los mineros de Pensylvania que, por haber experimentado una tragedia similar, se solidarizaron con sus lejanos compañeros de Atacama y aportaron los conocimientos técnicos –cultura minera- y parte de la maquinaria que hizo posible el rescate. Tampoco mencionó a dos héroes silenciosos, dos internacionalistas del trabajo; James Stefanic y Matt Stafeard, los dos operadores que llegaron hasta los mineros atrapados y son los grandes responsables del rescate.

Mientras sacaban al segundo minero, que salía del calor y la humedad del encierro a 700 metros bajo tierra para enfrentarse a la sequedad y 10 grados bajo cero del desierto, el presidente Piñera no resistió la tentación de otra conferencia de prensa “in situ” y en la que, lo único destacable, fue la vacilante declaración de intenciones para hacer algo por la seguridad laboral de los mineros. En su torpeza evidente, Piñera omite que ha sido justamente la derecha chilena la más feroz opositora a que se regule la seguridad laboral, indicando que los controles son sinónimo de burocracia y atentan contra la libertad de mercado.

En medio de su show cargado de gestos religiosos, Piñera omitió cualquier referencia a la triste situación de los otros doscientos y tantos mineros de la misma empresa, que trabajaban en la misma mina, que desde el mes de agosto no reciben sus salarios. Esta empresa se atrevió a declarar que incluso los 33 atrapados no cobrarían por todos los días bajo tierra, porque sencillamente no habían trabajado. Y la respuesta del gobierno brilló por su ausencia.

La tragedia, esos 33 hombres sepultados, ha sido utilizada para marcar de invisibilidad al otro Chile, al país que no sale en televisión, por ejemplo a los mapuche, cuya dramática huelga de hambre desapareció de la actualidad, ese sucedáneo del presente que se impone a la masa acrítica y dada al aplauso que los modernos comunicadores llaman “opinión pública”.

Desde luego que es emocionante verlos salir, uno a uno, y más emocionante es ver que esos 33 mineros, pese a los regalos prometidos, un viaje a España para ver un partido del Real Madrid, un viaje a Inglaterra para ver un partido del Manchester United, un Iphon de última generación, un viaje a Grecia, y hasta diez mil dólares a cada uno donados por un empresario chileno que aspira a ser presidente del país, pese a todo eso siguen siendo mineros y por eso mismo anunciaron la creación de una fundación que se preocupe de la situación de todos los trabajadores de la minería afectados por la irresponsabilidad de las empresas.

Sacarlos de ahí ha sido una proeza, pero una proeza de todos los que sudaron hasta conseguirlo y no de los encargados del Show del rescate.

Y la mayor proeza será lograr que en Chile se respeten las normas de seguridad laboral para que nunca más 33 mineros desaparezcan en las entrañas de la tierra.

Luis Sepúlveda

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Back from Sines

Soube muito bem (e bem precisado estava...) esta semanita de férias, família e praia em Sines.

Com o enorme prazer, pelo meio, de uma apresentação do Um Amor Colonial pelo Luís Patta e pelo Joaquim da A Das Artes - aquela livraria que é um centro cultural e que tanta falta me fez, por ainda não existir quando lá vivi.


Houve até gente suficientemente atenciosa para, uma bela manhã, se dar ao trabalho de me recordar a razão que me tinha feito por lá andar, aquele par de anos.

A cidade está mais viva e o Festival Músicas do Mundo faz-lhe bem.
Mas parece que some things never change...

quinta-feira, 17 de junho de 2010

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Um perigoso buraco

Uma notícia recente, acerca do destino a dar ao Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa parece confirmar aquilo que suspeitava quem passava pelo Vale de Stº António:

O enorme buraco que ali foi criado (com uma parede de betão a amparar o que resta de uma colina que, com ele, perdeu uma encosta) corresponde a um projecto abandonado.

Pedro Santana Lopes enterrou ali 3 milhões de euros e António Costa abandonou a ideia - dizem alguns que pelos seus custos faraónicos, sugerem outros que por existirem dúvidas acerca da segurança da contenção de terras.

A segunda hipótese é, claro, gravíssima no imediato.

Mas, mesmo que se dê o caso de tais dúvidas afinal não existirem, continua a estar ali um grave problema por resolver.

Apesar da impressionante quantidade de betão empregue para amparar a colina (cortada na vertical para escavar alicerces), uma coisa é a pressão das terras ser depois distribuída pela estrutura do prédio que se previa construir, outra é ter ali um paredão isolado, apenas sustentado em si próprio.

Mais a mais, o betão (como qualquer outro material) envelhece, degrada-se, cria zonas de fragilidade.
E mais depressa o faz quando foi empregue numa obra abandonada, que nunca merece a vigilância e manutenção de algo que está a ser utilizado.

Por outras palavras, os prédios que já estavam implantados na crista do que resta da colina estão, a prazo, ameaçados por aluimentos.

Que irá a Câmara de Lisboa fazer?
Repor as terras - o que também cria perigos e erosão e deslizamentos, imprevisíveis na forma que possam tomar?
Confiar que, com tanto betão ali metido, «não há de haver azar»?

Não sei.
Mas pelo menos que, desde já, se tenha consciência do problema e da necessidade de o solucionar.

sábado, 26 de dezembro de 2009

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

sábado, 19 de dezembro de 2009

Sympathy For The Devil

Será que ele andou por Copenhaga?

Ou foi antes ali para os lados das grandes petrolíferas e das fábricas dickensianas para as lojas dos 300?

Balanço de Copenhaga

Aspecto mais positivo da cimeira:

Pessoas normalíssimas da vida a conversarem sobre as alterações climáticas e o seu impacto, pelos cafés e restaurantes de Lisboa.

Por lá:

Um saco cheio de nada.

Mas também é verdade que, no seu início, especialistas bem sérios alertavam que mais valia um total falhanço do que o tipo de acordos que estavam em cima da mesa.

sábado, 28 de novembro de 2009

Quando um homem dorme na valeta...

Hoje foi, simultaneamente, o Dia Sem Compras e o início da habitual campanha do Banco Alimentar Contra a Fome, para recolha de produtos nos supermercados.

Mais de que uma coincidência, acaba por ser uma desconfortável metáfora de um modelo de sociedade que faz ombrear a fome com o estímulo ao consumo excessivo e desnecessário, ainda encarando isso com naturalidade.
E quando escrevo «excessivo e desnecessário», não penso apenas nos sempre discutíveis e mutáveis critérios éticos (que nem por o serem se tornam menos importantes), mas também no mais elementar bom-senso acerca da sua sustentabilidade energética, hídrica, sanitária e ecológica.

Cruzaram-se hoje nos títulos dos jornais - tal como todos os dias se cruzam à nossa volta, de forma subreptícia e inquestionada - a maior capacidade de produção e consumo (incluindo de muito lixo) da história humana, a aparência da promessa de riquezas sem limite, e a naturalidade e rapidez com que se condenam à exclusão e fome massas de serem humanos, no próprio centro dessa abastança.
Sem sequer precisarmos de olhar para o lado para não vermos. Porque essas pessoas (que facilmente poderíamos e poderemos ser nós próprios) se nos tornam invisíveis.

No percurso dos seres humanos pela terra, houve e há comunidades inteiras a morrerem de fome devido a catástrofes naturais e/ou asneiras humanas.
Houve e há desigualdades capazes de lançar na morte partes de sociedades, em alturas de particular escassez.
Mas até os senhores de escravos os alimentavam de acordo com o humanamente necessário, desde que houvesse comida.
E não conheço antecedentes históricos, fora do quadro do capitalismo, para a paulatina fome de parte da comunidade, em tempos de abastança.
Nem antecedentes, com crises ou sem elas, para tanta abastança.

Tenho para mim que impedir a fome, havendo comida, é uma responsabilidade do Estado. Mas não o faz. E a fome existe.
Tenho também para mim que, no quadro societal em que vivemos, a caridade cara-a-cara é degradante para quem a dá e para quem a recebe. Mas é de solidariedade e de decência humana que se trata. E a fome existe.
Um mundo diferente só pode ser possível. Mas temos muito que andar e que fazer. E a fome existe. Hoje.

A meia dúzia de coisas e de euros que nos permitem encher o saco que entregamos ao Banco Alimentar não mudam o mundo. Não mudam sequer a vida de quem tem fome. Mas permitem a alguns comer.

Penso que vale a pena.
Desde que não nos sintamos, com isso, aliviados.
Desde que isso também contribua um pouco para que essas pessoas deixem de ser invisíveis aos nossos olhos. Não como situações, mas como pessoas.

E, já agora, desde que isso nos lembre de quando era inaceitável e insultuoso, para cada um(a) de nós, que um outro ser humano dormisse na valeta.

Pois a naturalização da valeta, da caixa de cartão, da fome, não é apenas uma mutilação de quem somos.
É, também, uma condição para que tudo assim continue.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Uma questão de bom senso

Gro Harlem Brundtland, uma senhora de nome difícil que foi primeira-ministra da Noruega e é paladina do desenvolvimento sustentável, considerou errada uma eventual adopção de energia nuclear em Portugal, aconselhando o investimento em energias renováveis e eficiência energética.

Uma questão de mero bom senso, dirá a maioria de nós - não só em termos ecológicos, como de segurança tecnológica.
Ao que acrescento um outro argumento:

Se até em indústrias como a refinação petrolífera pude observar, no nosso país, uma submissão do cumprimento das regras de segurança aos objectivos económicos e produtivos, como é que poderíamos sequer equacionar a possibilidade, bem real, de que tal acontecesse numa central nuclear?

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Dia da Terra

Foi hoje Dia da Terra e foram-se vendo umas coisas engraçadas.

As que apareceram em sites de jornais deixaram já, quase todas, de estar acessíveis. A "actualidade", mesmo quando pouco relevante, (re)tomou-lhes o lugar - e ainda nem sequer o dia acabou.
Vê-se, afinal, a importância que é realmente dada às questões ambientais/energéticas a que tão importantes palavras foram sendo dirigidas ao início do dia. Valem, parece, pela "actualidade" e pela celebração, assim tipo uma oferta de flor no Dia da Mulher.

Está ainda acessível este dossier, com vários dados interessantes.
E a vossa vontade, ou não, de aproveitarem as coisas que foram ouvindo e vendo ao longo do dia para fazerem, quanto mais não seja, um pequeno bater de asas de borboleta.

Pela minha parte, decidi aproveitar o futuro reembolso de IRS cobrado em excesso para arranjar uma bicicleta com motor eléctrico.
Para além do mais, cheira-me que vou acabar por poupar umas boas massas.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Alarmistas e papões

O aspecto mais terrível do trágico sismo ocorrido em Itália é algo que poderá acontecer em qualquer outro país, desde que esse país disponha dos meios técnicos necessários e de pessoas que saibam interpretar os seus dados:

Havia fortes indicações de que um grande sismo iria acontecer, mas as autoridades mandaram calar o cientista que deu o alarme, por estar a ser (precisamente) alarmista e a causar o pânico entre a população.

O "filme" é de facto tão comum que até já deu origem a um género cinematográfico hollywoodesco, que mete desde tubarões de 10 metros até vulcões e centrais nucleares.
Ou seja, é popularmente credível e esperado (bem mais que um tubarão com o tamanho do velho Jaws) que existam coca-bichinhos com capacidade para detectar grandes perigos iminentes, sejam eles animais, naturais ou tecnológicos, e que as autoridades que deveriam zelar pelo bem de todos os mandem calar, transformando a ameaça em catástrofe devido à falta de informação e preparação.

É comum, nesses filmes, a reacção oficial vir a reboque de interesses económicos mesquinhos ou imediatistas.
Mas não é forçoso que assim seja, nem nos guiões cinematográficos nem na realidade.
A habitual preocupação que o possível pânico público costuma suscitar às instâncias de poder basta para motivar essa reacção de negação e silenciamento.
Porque quem diz 'pânico' diz 'caos', diz incontrolabilidade das massas humanas que se é suposto ter sob controlo.

Talvez esteja aí a chave para compreender um paradoxo dos tempos actuais:

Um pouco por todo o mundo, as autoridades e os interesses económicos escudam-se na incerteza que rodeia a (im)previsibilidade das ameaças naturais e técnicas para, a bem da serenidade pública, desacreditarem ou silenciarem chamadas de atenção para elas; ao mesmo tempo, instigam o pânico em relação a outras ameaças, também elas imprevisíveis, mas mais directamente humanas.

O problema não começou, sequer, com o despertar dos USA para o terrorismo como algo que lhes pode bater à porta.

Já bem antes disso, a leitura da realidade que estava na moda era a tal de "civilização do risco", assustando-nos com um mundo mais inseguro e perigoso do que nunca, mas alegrando-nos por haver quem tenha os instrumentos racionais e técnicos para domar tanta ameaça.

Curiosamente, pouca gente ouvi questionar porque deveríamos nós sentir que vivemos no mais arriscado dos mundos, tendo em conta que (apesar da polulação de novos riscos tecnológicos ou tecnologicamente induzidos) vivemos bastante mais tempo, com muito maior capacidade de responder a doenças e muito menos hipóteses de morrermos à fome, ou de sermos vítimas de violência indiscriminada ou acidentes letais, do que os nossos bisavós ou os nossos contemporâneos de outras paragens.

Talvez esse quase inexistente questionamento tenha a ver com a importância que para nós assume a crença de que podemos dominar o mundo.
Talvez seja por esse susto com os riscos ser politicamente valioso, já que reforça a nossa dependência dos especialistas e dos governantes, e os reforça a eles através da chancela de cientificidade que passa a estar colada às suas protectoras acções e decisões. Talvez...

Mas, num quadro como este, o especialista é bem-vindo se traz a ordem à (bem real) incerteza e ao caos - que, se não é bem real, se afirma como a realidade que existiria caso não existissem também, por um lado, o especialista com meios técnicos para dizer como controlá-lo e, por outro, o reconfortante governante que dá o braço ao especialista para nos proteger.

Se pelo contrário (e com base na sua expertise) o tal de especialista decide ser mensageiro da desgraça iminente, não traz ao poder nem controlo nem legitimidade.
Traz a desagradável evidência da falta de controlo técnico e político sobre a incerteza, a par da ameaça de falta de controlo sobre a população.
Tenha ou não razão (coisa que a incerteza do que está em causa só deixará saber a posteriori) é um alarmista. É alguém que joga com as mesmas regras, mas que só traz, no imediato, desvantagens para os principais jogadores, à luz do seu objectivo de jogo.
É claro que poderia contribuir para reforçar a posição deles (e, já agora, para salvar muitas vidas e bens), ao permitir-lhes demonstrarem uma grande capacidade de gestão da desgraça incerta. Mas ver isso, a partir de uma posição de poder, pode implicar para muitos uma racionalidade e capacidade de análise que seriam sobrehumanas.

Temos, por outro lado, os papões.

E esse mais recente enfatizar das ameaças humanas corporizadas no terrorista estranho (mas que pode estar no meio de nós) é, temo bem, um jogo com objectivos bem mais prosaicos e conciencializados.
É, afinal, espalhar o medo de uma ameaça invisível e de que só poderemos ser protegidos a partir de um controlo centralizado mas geral para, num muito clássico processo de hegemonia, aceitarmos ser controlados muito para além do que aceitaríamos, a bem da nossa segurança.
E pelos vistos resulta.

Talvez, então, o tal paradoxo não seja assim tão paradoxal.
Talvez a instigação do medo tenha, afinal, uma mesma razão última e um mesmo limite: o reforço e legitimação do poder; e o monopólio de estimular e controlar o medo - que não pode transformar-se, pelo contrário, num instrumento de perda de controlo sobre os outros.

*****

Entretanto, Silvio Berlusconi pede aos sobreviventes que encarem a situação como «um fim-de-semana no parque de campismo».

Qual Alberto João, qual quê... Este gajo não existe!

quinta-feira, 12 de março de 2009

Climate Change ao poder!


Às vezes, a gente passa pelos jornais on-line e dá com notícias boas.

O Prémio Universidade de Lisboa foi esta ano atribuído a Filipe Duarte Santos, um pioneiro na investigação das alterações climáticas, amplamente prestigiado nacional e internacionalmente.

A notícia dá conta do seu percurso e das boas razões que existem para a atribuição deste prémio.
Mas há uma coisa que talvez o júri e quem fez a nota de imprensa desconheçam:
O galardoado é um cientista "duro" com uma grande abertura de espírito às ciências sociais e "atrevido" nos desafios que aceita.

É assim que, por exemplo, aceitou a proposta que a Luísa Schmidt e eu lhe lançámos para, no âmbito de um projecto que conta com uma forte equipa do ICS, desenvolver cenários de impacto conjunto, sobre a erosão costeira, das alterações climáticas e das práticas locais de uso da costa - integrando nos modelos, portanto, variáveis sociais precisas e localizadas.
Assim à primeira vista, até pode não parecer nada de especial. Mas é um muito inovador salto na abordagem dos problemas de erosão, que lhe exigirá uma enorme dose de mestria e criatividade.
Muitos outros ter-se-iam resguardado de desafio exigente como este, de um risco que não precisa de correr; ele aceitou.

Fico muito satisfeito com este merecido prémio, Filipe.
Um grande abraço e até ao nosso desafio comum!