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segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Se7en – Sete no Mercado de Capitais

[Imagem: ©Jornal de Negócios (15/12/2008); da esquerda para a direita: Jorge Jardim Gonçalves, Paulo Teixeira Pinto, Filipe Pinhal, Alípio Dias, Christopher de Beck, António Castro Henriques, António Rodrigues.]
O regulador reactivo reagiu. Com lentidão e parcimónia, sete, mágico. Espera-se por sangue, momentos difíceis, trágicos.
Não, não se trata dos tercetos dramáticos de Conrad, a que Roth se referia no seu penúltimo romance; Zuckerman rememorando a Linha de Sombra (The Shadow Line, 1917). E, então, que se cite a obra do excelso viajante polaco-britânico Józef Teodor:

«Só os jovens passam por momentos assim. Não quero dizer os novos demais; esses não conhecem, para falar verdade, momentos propriamente difíceis. É dado à adolescência o privilégio de viver antecipadamente os dias da sua vida na plena continuidade admirável de uma esperança» (p. 13)

E prossegue:
«O tempo também continua para diante – até que avistamos, mergulhando mais fundo, uma linha de sombra que nos previne de que o país da adolescência terá igualmente que ser deixado para trás.» (p. 14)
[ed. port. Relógio D’Água, 1984; tradução de Maria Teresa Sá e Miguel Serras Pereira.]
Mas aqui a Linha de Sombra é mais difusa, longe da costa, offshore… longe do coração e da supervisão.
(Já nem se fala sequer dos empréstimos concedidos a familiares e amigos ou a comparsas noutras empresas sem garantias…)

Por outro lado, será difícil invocar, a não ser por recurso a um trocadilho de baixo nível literário (ver título), a obra cinematográfica de Fincher, ou o épico divino de Dante, guiado por Virgílio, e a visão dos apocalípticos círculos do Inferno, porque a amálgama pecadora não permite uma discriminação e posterior classificação dos vícios: não se trata, apenas e só, de avareza. É muito mais que isso, é toda uma cultura que se foi enraizando pelas condições meteorológicas favoráveis: impunidade perene a soprar de todos os quadrantes, até mesmo inabalável por um furacão qualquer… sistema inafrontável, eterno, massacrante, iníquo.

(Os Estados Unidos, esse conglomerado gigante e proselítico do capitalismo, o império de todos os males, o paraíso da ganância e dos miseráveis à laia de Hugo, vai dando exemplos ao mundo – embora, tenha de convir, ainda bem longe da perfeição – das reais consequências dos homólogos perpetradores de crimes económicos e financeiros: Enron, WorldCom & C.ª)

Por cá, paradoxalmente, continua a ser muita parra para um país produtor de vinhos de qualidade e de um ímpar licoroso, suave e generoso, do Porto, bem na linha da costa.

quinta-feira, 19 de julho de 2007

Direito de resposta

Exercido por Abílio Neto, santomense, autor do blogue Uma Abordagem, como resultado do texto por mim publicado no passado dia 13 de Junho de 2007, sob o título “Hermenêutica do Racismo”:

«
Caros,
Sobre os V/ escritos.
É preciso não conhecer a obra do Chinua Achebe, CA, (ninguém é obrigado a conhecer tudo), só assim se explicando a estreiteza dos V/ comentários. Reduzir a complexidade da escrita de CA ao mais simples PC parece dar razão ao principal argumento do seu artigo sobre a obra de Conrad: não é (continua a não ser) possível existir complexidade no homem africano, real, criador e / ou representado.
Sobre a justificação da minha intervenção.
Conheço bem as obras de Achebe, Conrad, DeLillo, Roth - nutro uma autêntica paixão por qualquer uma delas - e também pela obra de Edward Said, cuja leitura aconselho, caso queiram ter uma ideia de outras aproximações, considerando as limitações dos comentários que acabei de ler.
Sobre os meus argumentos.
Tanto CA como Said reconhecem o talento dos autores das obras analisadas, reconhecem a qualidade literária das obras, reconhecem o contexto da narração e da acção e reconhecem a «injustiça literária» das suas abordagens, mas avançam para análise, antecipando as suas perspectivas, são culturalistas. Por isso, obrigam-se, no seu tempo, podendo fazê-lo (na altura em que Conrad publicou não podiam fazer...) a dar as suas visões críticas, claro e óbvio, sem fugir ao enquadramento político, que os motiva, pelas suas condições. Para tal, preocupam-se em desconstruir textos de manifesta visibilidade, porque são aqueles que fazem consciências. O privilégio de não ter que o fazer desta forma, a forma de CA e Said, é dos Ocidentais... que podem e puderam sempre ler, tranquila e incondicionalmente.
Sobre mim.
Sim, sou africano, já consigo e posso ler, e, hoje, nem sequer sou particularmente «exótico». Não, não considero Conrad um racista, considero que ele não podia ser outra coisa, e isso agrada-me, porque, hoje, eu posso ser o que quiser. Graças ao Conrad, ao Chinua, ao Roth, ao DeLillo, ao Said e a muitos outros.
Gosto deste blog. Continue. Que merecerá a minha visita.
Desculpa pela maçada ou massada! Feito à correr.
Abraços,

Abílio Neto
».

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Hermenêutica do Racismo [corrigido]

1.º Passo: Impotência e Ingovernabilidade (assunção)
(seguindo os passos até ao São João)


Enquanto Lisboa dorme, o mundo trabalha, e uma vez mais o júri do Man Booker International Prize trabalhou (mal, na minha opinião de metediço em assuntos literários… atem-te às Finanças Empresariais, porra! – diz-me a voz interior) e resolveu ignorar os americanos – esses imperialistas… – Philip Roth e Don DeLillo, nascidos na década de 1930, tal como o vencedor, o romancista, contista, poeta, ensaísta e crítico literário nigeriano Chinua Achebe (n. 1930) – apenas com dois livros publicados em Portugal – celebrizado pelo seu primeiro romance Things Fall Apart (1958) e pela crítica feroz ao racismo demonstrado por Joseph Conrad na sua obra-prima O Coração das Trevas, numa prelecção dada na Universidade de Massachusetts em Fevereiro de 1975, sob o título An Image of Africa: Racism in Conrad's Heart of Darkness – mais tarde publicada na Massachusetts Review vol. 18 (1977).
Achebe é ademais conhecido pela defesa intransigente dos valores culturais africanos perante a constatação das suas flexibilidade e demissão ante o mundo ocidental, como resquícios de um colonialismo político-administrativo que imperou durante séculos, e que mais tarde se transmutou em dependência económica, tecnológica e cultural.

Títulos de Chinua Achebe publicados em Portugal:

  • A Flecha de Deus, Edições 70, 1979 (obra original: Arrow of God, 1964);
  • Um Homem Popular, Editorial Caminho, 1987 (obra original: A Man of the People, 1966).

Nota: consultar a press release página oficial do Man Booker International Prize para mais informações (inclui os comentários de Colm Tóibín e de Nadine Gordimer, dois dos três elementos do júri deste ano).

Correcção: voz avisada alertou-me para um erro (gerúndio) no título do 1.º romance de Achebe, prontamente corrigido.

terça-feira, 13 de março de 2007

O Mestre é…

Henry James.
A primeira década do século XXI foi fértil em obras de ficção que, de forma directa ou indirecta, se debruçaram sobre um dos maiores estetas literários de todos os tempos.
O maior destaque vai não só para a obra de Allan Hollinghurst, A Linha da Beleza (The Line of Beauty, 2004) – vencedor do Booker Prize em 2004 e que se centra na existência atribulada do jovem plebeu e homossexual Nick Guest pelos meandros da frívola aristocracia e da corrompida classe política britânicas, enquanto trabalha na sua tese de doutoramento sobre Henry James –, como também, e de forma mais directa, pelas obras Autor, Autor (Author, Author; 2004) do truculento David Lodge e de O Mestre (The Master, 2004) do escritor irlandês Colm Tóibín, que lhe permitiu vencer o cobiçado IMPAC Dublin Literary Award em 2006 – em termos monetários, é o maior prémio do mundo a distinguir uma obra literária de ficção que, desde a sua criação em 1996, já galardoou romances de escritores como Michel Houellebecq, Orhan Pamuk, David Malouf ou Javier Marías.
Decorridos quase três anos (1060 dias) após a sua primeira publicação em língua inglesa, O Mestre de Colm Tóibín foi finalmente editado em português de Portugal, sob a chancela da Dom Quixote.

Na Ípsilon do
Público de sexta-feira passada há um excelente e extenso artigo, escrito por Luís Miguel Queirós sob o título “Diabruras do fantasma de Henry James”, que relata a recente febre Jamesiana na literatura contemporânea e em particular um curioso conflito entre Tóibín e Lodge a propósito da publicação das suas obras com Henry James como protagonista.

Para finalizar, nada como as palavras de um Mestre sobre outro Mestre, sobre alguma incompreensão do público e da crítica reinante perante a subtileza dos personagens e dos finais abertos que abundam na obra do escritor anglo-americano e na recusa daqueles pelo mundo das sombras em detrimento da realidade substancial. Joseph Conrad discorre sobre a permanente busca do público pelo desenlace, pelo fim da história, pelo descanso após o encerramento do livro e a constatada impossibilidade dessa demanda na genialidade da obra de James e dos seus personagens que imitam a vida, deixando os seus leitores em permanente sobressalto.
Conrad chega a afirmar: «Por que motivo o público leitor, que, como um todo, nunca conferiu ao contador de histórias o poder de ser um artista, lhe deve exigir a presunção da Divina Omnipotência, é algo absolutamente incompreensível.» [tradução livre: AMC]

A ler: Joseph Conrad, “Henry James – An Appreciation – 1905”, Notes on Life and Letters, 1921 (Part I – Letters; textos editados por J. H. Stape)

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

Um pouco de Conrad

«Só os jovens passam por momentos assim. Não quero dizer os novos demais; esses não conhecem, para falar verdade, momentos propriamente difíceis. É dado à adolescência o privilégio de viver antecipadamente os dias da sua vida na plena continuidade admirável de uma esperança ininterrupta e sem introspecções.»
Joseph Conrad, Linha de Sombra
. Lisboa: Relógio D’Água, 1984, pág. 13 (tradução de Maria Teresa Sá e Miguel Serras Pereira; obra original: The Shadow Line, 1917)



Lembro-me bem dessa linha de sombra. A aflitiva transição entre a responsabilidade partilhada e a plena assunção dos danos que as nossas falhas infligem. Não se trata porém de um momento definido, como uma marca a vermelho no calendário de uma vida, infinita na sua compleição: a morte não nos pertence, não se pressente. A sede de viver, a rebeldia sem causas – um pouco Deaniano, é certo –, é sobretudo a pressa não sentida, mas que se reflecte no aproveitamento exemplar do oxigénio que nos alimenta as células.
Oh, quantas vezes não dou por mim, agora, a arrazoar sobre as tontices e a frugalidade que essa pressa me impingia. Loucuras vividas, o leve sentimento do limite alcançado como um funâmbulo sem vara de equilíbrio caminhando nas nuvens da imortalidade sentida. Fui feliz. Vivi. Aproveitei essa saudável alucinação com todas as forças que a juventude despretensiosamente me forneceu. Ouvia o Ian, psicótico e cavernoso, que atravessava a linha mas não lograva alcançar aquela centelha que nos indica a outra margem; porventura pretendia regressar, mas a porta fechara-se, e uma corda pendia do tecto de um suposto firmamento, não há centelha, há apenas a visão nocturna de um pensamento amadurecido na negridão percebida da inutilidade da vida. Ouvia-te e paradoxalmente só reforçaste a minha vontade de respirar livremente, formavam-se os ideais que mais tarde poria em prática… Esperança vã. A soberba advinda da convicção que pela palavra mudaremos a rota do nosso microcosmos. O muro ergue-se. Somos Nashe vagueando sem destino, somos Pozzi na convicção de que o mundo se ajoelha perante o desembaraço demonstrado. O muro construímo-lo, passo a passo, pedra sobre pedra, e só quando a vertigem da intransponibilidade se manifesta é que o dilema sobrevém: contornar, abdicando dos valores que se foram solidificando na alma; persistir na luta, mesmo que sintamos que só algo de intangível – ó alma – o poderá atravessar.
Essa dúvida foi a minha linha de sombra. Essa obstinação por percorrer o caminho que parece… que é o correcto. Foi… ainda é. Esse ideal alimenta-me e deixa-me paralisado. Enche-me de esperança e vai apartando-me do mundo. Envaidece-me e convence-me de que sou um pacóvio presunçoso, sem vida, sem futuro.
Na ausência do meu ser, dar-vos-ei tudo, ó mulheres da minha vida, mesmo que alma se arrede por uns momentos para se alimentar da utopia que brotou das sombras da minha mutação ontológica.