«Glenn Gould said, "Isolation is the indispensable component of human happiness."» [Contraponto] «How close to the self can we get without losing everything?»
Don DeLillo, “Counterpoint”, Brick, 2004.
segunda-feira, 29 de julho de 2013
Fim do Silêncio: Outono-Inverno 2013/2015
terça-feira, 15 de janeiro de 2013
Um paliativo para a ressaca
«(…) il y a un point où les infortunés et les infâmes se mêlent et se confondent dans un seul mot, mot fatal, les misérables (…)»*
Victor Hugo, Les Misérables, 1862 (Tome III, Livre huitième, Chapitre V).
«existe um ponto em que os infelizes e os infames se misturam e se confundem numa só palavra, palavra fatal, os miseráveis».
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
Fincheriana
domingo, 22 de janeiro de 2012
Obsessão (act.)
«Salander não consegue mexer-se. Espera que a dor abrande – o que eventualmente acontece – mas apenas para ser substituída por um sentimento de abandono. Então aquele abranda, substituído por um semblante de indiferença.»Em jeito de nota final, o fim: é impossível ficar indiferente ao pathos que emana daquele olhar, que tudo apaga, de Rooney Mara.
Steven Zaillian, The Girl with the Dragon Tattoo [screenplay], p. 165 (© 2011 Sony Pictures). Tradução livre: AMC.
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
Fincherianismo
«Daí a estranha beleza de Millennium 1: por um lado, há nele uma urgência face ao concreto do nosso mundo que lhe confere a dimensão de parábola sobre a persistência do Mal e o fim de todos os romantismos; por outro lado, vivemos uma aventura tocada pela abstra[c]ção formal. É tempo de acreditarmos que Howard Hawks tem, finalmente, um herdeiro moderno.»
quinta-feira, 5 de janeiro de 2012
Karen O, Reznor & Atticus Ross
quinta-feira, 16 de junho de 2011
Fincher e Nolan sobre Malick
quarta-feira, 1 de junho de 2011
Fincher 9
sábado, 8 de janeiro de 2011
Os prémios “highbrow” do cinema americano
Apesar de no ano passado os prémios da NSFC terem, de certo modo, coincidido com os filmes galardoados com os Óscares da Academia nas diversas categorias – e mais em concreto na categoria “Melhor Filme” para Estado de Guerra (The Hurt Locker), de Kathryn Bigelow, coincidência que, com esta, só ocorreu por cinco vezes* desde a sua fundação em 1966 –, estes galardões são normalmente conhecidos como os Anti-Óscares. Atente-se, por exemplo, nos realizadores que já viram filmes seus eleitos como os melhores do ano: Antonioni, Bergman (3 vezes), Costa-Gavras, Robert Altman (2 vezes), Rohmer, Buñuel, Truffaut, Louis Malle, Jarmusch, Kurosawa, David Lynch (2 vezes), Mike Leigh (2 vezes) ou P.T. Anderson. Apesar de haver filmes galardoados nesta categoria do calibre de Um Porquinho Chamado Babe (Babe, 1995, de Chris Noonan), Romance Perigoso (Out of Sight, 1998, de Steven Soderbergh), ou O Labirinto do Fauno (El laberinto del fauno, 2006, de Guillermo del Toro), para apenas nomear alguns, assaz medíocres (na minha íntima opinião) e de gosto bastante discutível.
Fincher soma e segue, com as três maiores votações do ano: 73, 66 e 61 votos, para o Argumento, Realizador e Filme, respectivamente.
Eis os vencedores, por categoria, dos NSFC Awards de 2010 (a 27 de Fevereiro verificaremos se foi ou não mais um ano – seria o 6.º – de coincidências com a Academia):
A Rede Social (The Social Network), de David Fincher:
Melhor Filme
Melhor Realizador – David Fincher
Melhor Actor – Jesse Eisenberg
Melhor Argumento – Aaron Sorkin
Carlos, de Olivier Assayas
Melhor Filme Estrangeiro
Melhor Actor Secundário – Geoffrey Rush
Melhor Actriz Secundária – Olivia Williams
Melhor Fotografia – Roger Deakins
Melhor Actriz – Giovanna Mezzogiorno
- 1977 – Annie Hall, de Woody Allen;
- 1992 – Imperdoável (Unforgiven), de Clint Eastwood;
- 1993 – A Lista de Schindler (Schindler’s List), de Steven Spielberg;
- 2004 – Million Dollar Baby – Sonhos Vencidos (Million Dollar Baby), de Clint Eastwood;
- 2009 – Estado de Guerra (The Hurt Locker), de Kathryn Bigelow.
***Fonte: indieWire.
sábado, 20 de novembro de 2010
O Armário e o Paquiderme*
Não gosto mesmo nada de me citar, nem de fazer das minhas opiniões sentenças, até por razão de manter algum contacto com a realidade: ninguém lê este blogue – ou melhor, pedindo desculpa aos que me lêem, cerca de meia dúzia, tenho a consciência de que qualquer opinião que aqui emita jamais será considerada em qualquer microtertúlia em que se discuta cinema, literatura, ou qualquer outro tema que aqui desenvolvi. Não é falsa modéstia, é apenas a constatação da realidade: não distribuo empregos, nem abraço políticos, não sou dono de uma editora, não escrevo em jornais ou revistas, vivo (e espero continuar a viver) no Porto, sou apartidário, embora a minha condição de blogger dispensável se agrave por uma certa dextralidade política (o que é isso?), sou agnóstico, sempre dubitativo (e não dúbio), estou-me perfeitamente nas tintas para líderes e pseudo-líderes, para os tipos que se dizem éticos (esta é das melhores lidas ultimamente), chefes, autoridades (sobre qualquer matéria); nisso sou um anarca (não estender muito o conceito, por favor), libertário, anticonservador, cultor do meu pensamento livre (jamais constrangido), sem o fim último de insultar a diferença, embora por vezes uma boa provocação à laia de insulto sirva para aliviar um pouco desta minha idiossincrática carga emocional fortemente compressora.
Não preciso de sair do armário (pronto, já arrumei com o título), nem sinto a necessidade de me revelar, muito menos de encetar qualquer manobra de diversão que permita deixar-me mais confortável perante alguém.
A 2 de Outubro passado disse aqui:
«A primeira e, pelos vistos, frutuosa união Fincher & Sorkin chega cá no próximo dia 4 de Novembro, e tenho uma forte suspeita de que, por terras do primeiro-ministro filósofo (…), onde predominam as mentes preclaras, levará no mínimo com uma bola preta… Há quem culpe o realizador de Denver por haver realizado alguns telediscos, uma mácula jamais expurgável na carreira de um cineasta.»
A concretização da profecia (mesmo antes de ter visto o filme, que, suponho, vi no dia a seguir à estreia – 5 de Novembro), levou-me, como já aqui disse, a suspender e arremessar para o arquivo de ficheiros “ponto doc” mortos a minha opinião mais elaborada sobre a última obra de Fincher**. Mas estarei sempre disponível para exteriorizar uma boa irritação, como se não bastasse, para não danificar ainda mais as paredes desta panela de pressão, já de si bastante combalida e com cicatrizes de repressões de antanho. O outing é a minha forma de vida. E já agora a de exibir algumas opiniões de quem muito respeito nesta matéria, apesar de discordâncias viscerais noutras ocasiões, o fio condutor no exercício da crítica jamais se cristalizou num conservadorismo bafiento:
«O filme de David Fincher possui não só a rara qualidade de ser tão inteligente como o seu brilhante herói, mas é-o da mesma forma. É arrogante, impaciente, frio, excitante e instintivamente arguto.Para terminar, e para um bom momento de descompressão, como seria A Rede Social se filmada por Wes Anderson, Michael Bay, Christopher Guest, Quentin Tarantino, Guillermo del Toro ou Frank Capra?
(…)
“A Rede Social” é um grande filme, não só devido ao seu estilo deslumbrante ou ao seu engenho visual, mas porque é admiravelmente bem-feito. Apesar das desconcertantes complicações da programação informática, da estratégia da Internet e da grande finança, o argumento de Aaron Sorkin torna tudo compreensível, e não seguimos com tanta força a história como somos puxados para detrás dela. Eu assisti ao filme rodeado por uma audiência que parecia absorta de uma forma invulgar: encontrava-se amplamente fascinada.»
Roger Ebert, “The Social Network”, Chicago Sun-Times, 29/09/2010.
**A minha indefectibilidade fincheriana será posta à prova no passo que o realizador do Colorado está prestes a dar. Trata-se de um remake de um filme sueco estreado no ano passado sobre o primeiro livro da trilogia-dos-títulos-em-comboio do escritor já desaparecido Stieg Larsson. Entretanto, continuo em aulas de mentalização para considerar uma obra-prima o terceiro filme da série Alien. Depois do 8.º Passageiro de Scott (o Ridley, o menos apimbalhado dos manos) e do Recontro Final de Cameron, e antes da Ressurreição do Jeunet, suponho que não necessitarei de uma sala fechada com grampos nas pálpebras para a Desforra de Fincher.
terça-feira, 16 de novembro de 2010
Biopic
«-noun
(informal) a film based on the life of a famous person, especially one giving a popular treatment
[from bio (graphical) + pic (ture)]»
Collins English Dictionary – Complete and Unabridged, 10th Edition.
«You’re not an asshole, Mark. You just want to be.»q.e.d.
[Do argumento de Aaron Sorkin, The Social network, pág. 160 – última fala do filme, proferida pela assistente do advogado ("Sy") de Zuckerberg, "Marylin".]
- Facebook e o mundo.
- A privacidade e o Facebook.
- Facebook e a dependência afectiva.
- O Facebook e a alienação da identidade.
- Manuel Alegre: "Cavaco Silva serve-se do Facebook enquanto PR" – A instrumentalização capitalista de Cavaco patrão / Cavaco costureiro.
- Beijei a fotografia do perfil do Facebook de Rui Santos (o tal do cabelo encaracolado), será que estou grávida?
- O Facebook e a modernidade: a impossibilidade de dissociar estes conceitos, ou o emparelhamento inextinguível – estudo de críticas cinematográficas.
- Fincher começa por F… acebook, o que faltou incluir no F… ilme para o transformar numa obra rivettiana, F… oda-se.
sábado, 13 de novembro de 2010
Desisto
«Depois de “Se7en”, David Fincher nunca mais atingiu as mesmas alturas, talvez porque se tenha deixado deslumbrar pelo seu virtuosismo, mais interessado em explorar jogos de imagem e surpresas de peripécias em reviravoltas constantes.»Desisto de postar aqui o texto que há uma semana vinha a congeminar nos intervalos da minha esgotante e, ultimamente, tumultuosa e angustiante actividade. Não sou crítico de nada, sou apenas, nestes domínios, um cinéfilo. Agarro nesta arte da projecção de ideias na grande tela com a paixão de um amante persistente não só da estética, mas também da técnica que a apurou. Preocupo-me menos com o corolário ético do «interrogar as manobras de poder e tocar nas contradições da modernidade», porque esse nunca foi o objectivo – faz-se a luz sobre um homem só, que aos dezanove anos começou do nada a erigir um império.
Breve crítica de Mário Jorge Torres, Público, CineCartaz e Ípsilon.
Não pretendo fazer a crítica da crítica ou dos críticos, embora esteja convicto de que todos nós, os que laboram nas mais diversas actividades cujo objectivo final é a exposição das nossas formas de pensar, sentir e/ou agir perante o mundo, jamais seremos possuidores do direito divino de proibir o seu escrutínio – negar esse exercício equivale a escrever entradas pueris num diário que se aferrolha ao fim de um dia de exaltações, tristezas, êxitos e frustrações, para mais tarde deitar fora a chave –, what lies beneath…
Desisto, mas deixo ficar uma sugestão: o excelente texto escrito pelo Sérgio Lavos a propósito do último trabalho de Fincher, A Rede Social (The Social Network, 2010). O tal que agora terminava, iniciava-se com uma rememoração (regressão), porventura fetal, e partia da técnica para estética: a fabulosa cena inicial num bar de Harvard e a viagem ao som do mestre Reznor, “Hand Covers Bruise”, até à consumação do pecado original na construção do personagem (que é real), e que acompanha os créditos iniciais até à sua entrada na Kirkland House: «Universidade de Harvard Outono 2003» (Fincher pretendia filmá-la num só take com a, segundo dizem, intrincada RED One®, que pediu de empréstimo ao seu amigo Steve [Soderbergh]).
Desisto, mas não resisto em deixar aqui, para memória futura, o começo do que estava escrito (excerto de um texto bastante mais longo – até poupei tempo ao leitor e meio que teimosamente me visita):
Um silêncio invadiu a sala durante os primeiros dez minutos após o último anúncio. A memória, por vezes traiçoeira, porém associativa num movimento perpétuo de sinapses, conduziu-me à infância. A estância – a última antes da reprise – concebida por uma trupe londrina de quatro (por justaposição à de Liverpool que sublima o final), quando ainda o calor líquido do ventre materno me afagava e abafava os sons psicadélicos que se lhe uniram numa perfeição eloquente, de vibração, tremor, oscilação – Respira:
Corre, coelho correRetomo ao silêncio embasbacado. Palavras proferidas em torno de uma mesa. Um diálogo frenético em tons pardacentos à mesa de um bar de Harvard. O fim, como revelação para a teia apocalíptica que se seguiria, envolvendo tudo e todos sem dó ou recuos perante a constatação do que se foi estilhaçando pelo caminho. Nove páginas do argumento de Sorkin equilibradas por um jogo de palavras que se entrecruzam sem se tangerem, que se esgotam com o murro no estômago:
Cava esse buraco e esquece-te do sol
E quando enfim o trabalho terminar
Não descanses é tempo de voltares a cavar
Por muito que vivas e por mais alto que voes
A menos que sigas com a maré
E te equilibres na maior das ondas
Lanças-te rumo a uma morte prematura.
Pink Floyd, “Breathe” (The Dark Side of the Moon, 1973; tradução livre: AMC, 2010)
«Ouve-me. Tu vais ser rico e ter imenso sucesso. Mas irás passar toda a tua vida a pensar que as raparigas não gostam de ti porque tu és um maníaco dos computadores. E eu só quero que saibas, do fundo do meu coração, que não irá ser esse o verdadeiro motivo. Será porque tu és uma besta.» [Do argumento de Aaron Sorkin, pág. 8; tradução livre: AMC][Textus interruptus]
- Alien 3 – A Desforra (Alien3, 1992)
- Se7en – Sete Pecados Mortais (Se7en, 1995)
- O Jogo (The Game, 1997)
- Clube de Combate (Fight Club, 1999)
- Sala de Pânico (Panic Room, 2002)
- Zodiac (2007)
- O Estranho Caso de Benjamin Button (The Curious Case of Benjamin Button, 2008)
- A Rede Social (The Social Network, 2010)
sábado, 2 de outubro de 2010
Mestre Fincher
terça-feira, 20 de julho de 2010
Let's Look at the Trailer
sábado, 10 de julho de 2010
domingo, 22 de fevereiro de 2009
...mas ficará para a História

«A iminência da tempestade é um mecanismo supérfluo e excessivamente portentoso, uma vez que o Katrina traz à memória precisamente as duras misérias da vida real que o filme, no alcance do seu poder, fez tudo para evitar.
Esse poder, contudo, é algo que deve ser tomado em conta, e consiste no talento de Fincher em usar a sua admirável aptidão para transformar um inconcebível e rebuscado conceito numa história de amor plausível. O romance entre Daisy e Benjamin começa quando ambos são cronologicamente pré-adolescentes e Benjamin é, fisicamente, um velho estranho, no entanto o elemento inicial de uma atmosfera perturbadora pedófila na relação dá lugar a outras formas de embaraço. O amor de ambos é incomparavelmente perfeito e paciente. Em simultâneo, como qualquer outro amor – como qualquer filme – é ensombrado pelo desapontamento e destinado ao fim. No caso de “Benjamin Button” tive pena quando acabou e feliz por o haver presenciado.»
A.O. Scott, “It’s the Age of a Child Who Grows From a Man”, in The New York Times (25/12/2008) [tradução: AMC]
«Algumas pessoas nascem para se sentarem à beira do rio.
Algumas são atingidas por raios.
Algumas têm ouvido para a música.
Algumas são artistas.
Algumas nadam.
Algumas percebem de botões.
Algumas conhecem Shakespeare.
Algumas... são mães.
E algumas pessoas... dançam.»
Eric Roth, The Curious Case of Benjamin Button [retirado do guião; tradução AMC]
Sem mais comentários.
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009
O Estranho Caso do Underdog
Fã de Milk, apreciador de Dúvida (Doubt), percebe-se um certo desencanto, de certa forma atenuado pela sua idiossincrasia: calmo, metódico e, sobretudo, um homem independente no seu sentido mais lato.
A partir de amanhã tentarei provar, segundo ouvi dizer, dessas histeria e agitação fílmicas boylianas.
quinta-feira, 22 de janeiro de 2009
Murmansk
A casa em silêncio, lembrei-me de Button, que perdura instalado em definitivo na minha memória, como um organismo vivo, mutável, como uma entidade estranha alojada na minha mente pronta a receber as emanações feéricas da sua arte.
Insónia. Assalta-me a mesma sensação de conforto por saber que as três mulheres que partilham a minha vida, a minha casa, dormem protegidas, apenas vulneráveis às investidas dos sonhos.)
Murmansk, 1941. Palácio de Inverno, hotel. Benjamin Button (Brad Pitt) conhece Elizabeth Abbott (Tilda Swinton), inglesa casada com um espião disfarçado de chefe da delegação de comércio britânica em Murmansk, União Soviética. Um dos momentos mais belos do filme de David Fincher (com a excelente direcção de fotografia a cargo de um tal de Claudio Miranda, será luso-descendente ou brasileiro?):
«[Na cozinha do hotel, a meio da noite]
Elizabeth: E de onde é?
Benjamin: Nova Orleães, Luisiana.
Elizabeth: Não sabia que existia outra.
E falou-me de todos os lugares onde tinha estado, o que tinha visto. E falávamos até ao amanhecer. Depois voltávamos para os nossos quartos, para as nossas vidas separadas. E todas as noites, encontrávamo-nos de novo naquele salão. Um hotel durante a noite pode ser um lugar mágico. Um rato a correr e a parar. Um radiador a sibilar. Uma cortina a esvoaçar. Há qualquer coisa de tranquilo, até de confortável, em saber que as pessoas que amamos estão a dormir nas suas camas, onde nada as pode magoar.
Ambos perdíamos o rasto da noite, até ao romper do dia.
Elizabeth: Creio que talvez lhe possa ter dado uma ideia errada.
Benjamin: O que disse?
Elizabeth: Bom, não é normal mulheres casadas ficarem sentadas durante a noite em hotéis a conversar com estranhos.
Benjamin: Eu não faço mínima ideia do que faz ou não faz uma mulher casada.
[Elizabeth levanta-se e abandona a cozinha]
Benjamin: Boa Noite!»Extraído do guião escrito por Eric Roth, baseado na versão original de 2002 de Robin Swicord e do conto O Estranho Caso de Benjamin Button (The Curious Case of Benjamin Button, 1922) do escritor norte-americano F. Scott Fitzgerald. [tradução: AMC]
segunda-feira, 19 de janeiro de 2009
Ainda (e sempre) sobre Benjamin Button
Se tiver oportunidade vê-lo-ei de novo ainda esta semana. Tal foi a marca de inquietação que, com uma persistência espantosa, não me larga o espírito.
Como desconstruir a hipótese existencial, em forma de prece divina, ambicionada por Mark Twain? O tal homem cujo destino ficou associado aos caprichos da circularidade de um cometa.
F. Scott Fitzgerald inspirou-se na biografia de Mark Twain, escrita e publicada em 1912 por Albert Bigelow Paine, onde leu uma curiosa citação:
«Seu eu houvesse ajudado o Todo-Poderoso quando Ele criou o homem, tê-Lo-ia persuadido a começar pelo outro extremo, pondo os seres humanos a nascer na velhice. Quão melhor seria nascer velho, com toda a amargura e a cegueira da idade dispostas no início! Ninguém se importaria se ansiássemos por uma juventude rejubilante. Pense na feliz perspectiva de rejuvenescer em vez de envelhecer! Pense na satisfação em esperar pelos dezoito anos em vez dos oitenta! Sim, o Todo-Poderoso nisso fez um mau trabalho. Quem me dera que Ele houvesse pedido o meu auxílio.» [tradução: AMC]Na colectânea de contos de Scott Fitzgerald, Tales of the Jazz Age de 1922, Scott, na apresentação dos contos compilados refere o que se segue para “The Curious Case of Benjamin Button”:
«Esta história inspirou-se numa observação de Mark Twain, que propalava que era uma pena que a melhor parte da vida surgisse no seu início e a pior no seu fim. Ao efectuar a experiência em apenas um homem num mundo perfeitamente normal, dificilmente proporcionei à sua reflexão um julgamento justo.» [tradução: AMC]Talvez tenham sido estas palavras introdutórias do criador que levaram Robin Swicord e Eric Roth (a primeira perseguia obsessivamente a concretização deste projecto em filme, e já dispunha de um guião escrito) à ampliação e trasladação histórica desta magistral alegoria sobre a morte como fim sombrio, angustiante, perceptível, inelutável e omnipresente em toda uma vida, quer haja ou não uma inversão do seu início. O sofrimento permanece, aproveitai os momentos.
Fincher alerta-nos para a beleza do preceito que, todavia, choca com princípios morais, na estrita medida em que se gera uma séria iniquidade, uma desarmonia existencial, jamais conjugável com, e potencialmente geradora de, uma felicidade perene e absoluta. Benjamin Button é uma parábola sobre essa dissonância insanável. Não é uma história de amor ou sobre o seu desencontro, é um hino ao não desperdício daquilo que a vida no traz no momento, saber vivê-lo, agarrá-lo com unhas e dentes, porque a única certeza, rejuvenescendo ou envelhecendo, é a transitoriedade para o vazio, que ultrapassa a dúvida paralisadora sobre a transcendência do fim.
Ainda sob a influência do espectro mágico do filme, que irei rever, revisitar e reexaminar, à procura dos famosos “ovos de Páscoa” – como gosta de chamar uma mente auto-iludida com a sua perspicácia – ou daquilo que aos meus olhos fugiu numa primeira exibição, não falarei, por enquanto, sobre os pormenores de realização, dos momentos memoráveis (o mais delicioso com Tilda Swinton no Hotel na cidade polar de Murmansk, no extremo noroeste da Rússia), a banda sonora, a fotografia e as interpretações (a soberba interpretação de Brad Pitt, que ao que tudo indica irá passar em branco).
Deixo apenas uma recomendação para a leitura deste excelente texto do Henrique e um excerto de um poema de Larkin (talvez a despropósito), que não me atrevo a traduzir:
I work all day, and get half drunk at night.
Waking at four to soundless dark, I stare.
In time the curtain edges will grow light.
Till then I see what's really always there:
Unresting death, a whole day nearer now,
Making all thought impossible but how
And where and when I shall myself die.
Arid interrogation: yet the dread
Of dying, and being dead,
Flashes afresh to hold and horrify.
Philip Larkin (1922-1985), 1.ª estrofe de “Aubade” (1977)
sábado, 17 de janeiro de 2009
Afecto
Um entre vários sentimentos que perpassam por um dos melhores filmes (americanos e não-americanos) dos últimos tempos.