Showing posts with label nazismo. Show all posts
Showing posts with label nazismo. Show all posts

Tuesday, June 18, 2024

EURÓFAGOS

Eurófago não é termo dicionarizado, salvo melhor conclusão que não encontrei em breve procura nas fontes do costume.
Por analogia semântica, eurófago é aquele que, à semelhança do xilófago, se alimenta, e, deste modo, destrói, as estruturas em que se instala e desenvolve a sua actividade.

Xilófagos, vulgo carunchos, são insectos que se alimentam de madeira, perfurando galerias até a estrutura em que se instalam desabar, se, entretanto, não forem detectados pelo pó que rejeitam para o exterior, e eliminados. Não metem o dente em estruturas menos complacentes que a madeira.
 
Ocorreu-me esta actividade xilófaga a propósito das intenções de eurófagos, diferentes dos euro cépticos porque, instalados na Europa da livre expressão do pensamento, uma estrutura complacente,  a querem minar e desmantelar para ser governada por autocratas, arrasando, deste modo os seus valores democráticos.

Quem são os inimigos explícitos da Europa livre, aqueles que não escondem os seus propósitos?
Sem dúvida, Putin e seus amigos ou aliados, e Trump, se, como é muito provável, voltar à presidência dos EUA. São eles  que, visivelmente, movem-se por objectivos declarada e objectivamente arrasadores e animam as actividades de parasitas (os eurófagos) que, por dentro, minam as estruturas em que se vivem e se alimentam, até as desmantelarem.
 
Os resultados das eleições europeias ocorridas este mês de Junho implodiram, pela primeira vez, os principais vectores de estabilidade da União Europeia, reflectidos nesta imagem de reconciliação em 1984, protagonizada por Helmut Khol e François Mitterrand. 
 
 
Cinco anos depois, 1989,  assistir-se-ia à queda do Muro de Berlim.
 
 
No ano seguinte, 1990, reunifica-se a Alemanha e o Marco alemão passa a ser a moeda em toda a República Federal da Alemanha até 2002, ano em que o Marco deu lugar ao Euro, como moeda corrente na generalidade dos países da União Europeia. 
Foi Helmut Khol quem, enfrentando forte oposição do lado ocidental, impulsionou a construção da Alemanha reunificada. 

Em 1991, desintegrava-se, sem causa física exterior, a União Soviética. 
Nazismo, fascismo, comunismo, tinham sido abalados mas não erradicados.
 
Trinta e três anos depois, Macron, defensor intransigente dos valores da União Europeia, sente-se obrigado a convocar eleições legislativas após a evidente emergência de forças políticas extremistas que entalam as posições politicamente moderadas do Presidente francês.  
Na Alemanha, o Chanceler Olaf Scholz, também ele um europeísta convicto, nomeado há dois anos, observa um desaire semelhante a Macron, mas os resultados das europeias não o colocam em situação tão fragilizada quanto a do presidente francês. 
 
Para uma observação da situação em que se encontram os progressos dos eurófagos nestes dois países, determinantes para a sustentação da União Europeia hoje, recorro a um artigo publicado anteontem no Público, de Teresa de Sousa, que considero a jornalista portuguesa melhor informada sobre a situação política na Europa e das influências que podem determinar o futuro: Eleições europeias: de suspiro de alívio em suspiro de alívio.
 
A União Nacional (Rassemblement National) estará com saliente implantação em quase toda a França: exceptua-se uma relativamente pequena área em Paris. 
Se vier a governar retomará todas as vias do nacionalismo, será condescendente com os autocratas e voltará a exibir o seu fascínio pela Grande Rússia.

A Frente Popular de 1935, é a motivação invocada por Jean-Luc Mélanchon, um putinista declarado, que recusa condenar o Hamas, para  reunir as esquerdas extremas com socialistas, ecologistas, (de ideologia europeísta e apoio total à Ucrânia) e comunistas. 

Na Alemanha, o SPD de Olaf Scholz, ficou nas eleições europeias em terceiro lugar, abaixo da AfD, de extrema direita, que domina todas as regiões da antiga RDA. 
Votos da AfD mais os do Die Linke (herdeiro do partido Comunista da RDA e da Aliança Shara Wagenkecht (uma excrescência do SPD com uma ideologia que mistura políticas de extrema esquerda e extrema direita) representam cerca de 25% do total, no país que se cria imune ao regresso do que se assemelhasse ao nazismo.
 
A Europa está hoje rodeada de ameaças e desafios globais, de Putin à China.
Mas a maior preocupação é, obviamente, o apoio à Ucrânia, onde se joga verdadeiramente o futuro da Europa.
 
Talvez os eurófagos se cruzem e se auto eliminem nas galerias que vão minando em sentidos diversos.
 
E em Portugal, num país que, segundo as sondagens publicadas, é na UE dos mais europeístas, quantos, dos que sabem quem ele é, detestam Macron?
 
Pergunto-me e vejo muitas caras conhecidas sorrirem perante o desaire espelhado nos resultados obtidos pelo Presidente francês.

Monday, December 18, 2023

TEMPESTADE AINDA

 

TEMPESTADE AINDA

TEATRO ABERTO 

"Tudo se passa na paisagem montanhosa de Caríntia, na Áustria meridional, na região dominada pela língua alemã onde o escritor nasceu, em dezembro de 1942, e no tempo em que nasceu, em pleno conflito mundial, sob domínio das forças de Hitler. Handke toma por referência a família, vinda da minoria eslovena – os avós maternos, a mãe e os irmãos desta -, convoca-os, entre realidade e ficção, entre figuras reais e imaginadas, para que falem da opressão nazi e dessa verdade.
A proibição de falarem a língua materna, o esloveno, a obrigação de os homens partirem para a guerra em defesa da Alemanha de Hitler, e a resistência à anexação nazi ocorrida em 1938, feita a partir das montanhas pelas brigadas de ‘partisans’, estabelecem a ação de cada um dos cinco atos da tragédia.
“Tempestade ainda” é “uma tempestade contra a história, contra a história como ideia de progresso”, disse Peter Handke ao jornal Die Zeit, em novembro de 2010, quando concluiu a obra.
Ao misturar factos com recordações e ficção, o escritor, que foi Prémio Nobel da Literatura em 2019, homenageia os seus ascendentes, carregando para o palco acontecimentos que foram esquecidos ou ofuscados pelos livros de História, como afirmou à Lusa o encenador João Lourenço, no final de um ensaio de imprensa de “Tempestade ainda”.
Publicada em setembro de 2010 e estreada em agosto do ano seguinte, no Festival de Salzburgo, a peça põe em palco duas famílias: uma eslovena que colabora com os alemães e outra que se opõe a eles.
Em “Tempestade ainda”, dois irmãos da mãe de Handke, o cronista da peça, partem para a guerra com uniforme nazi e morrem na frente, enquanto ela engravida de um alemão, com quem depois vem a casar e que adota o autor. Na ficção, outros dois irmãos juntam-se à resistência.
Para João Lourenço, Peter Handke mostra todo o seu amor pela controvérsia vivida na região da Caríntia pelos seus habitantes, que foram “os únicos austríacos a revoltarem-se contra o Terceiro Reich”.
A atitude britânica, assente no modelo do imperialismo inglês, também não passa incólume. Quando as tropas aliadas chegaram à região, na última fase do conflito, os britânicos “portaram-se pior do que nas suas ex-colónias”, escreve o autor.
O título “Tempestade ainda” (“Immer noch Sturm”, no original) tem origem na didascália (indicação) “Storm still” usada por Shakespeare na abertura da segunda cena do terceiro ato de “Rei Lear”, uma peça de que Handke traduziu sequências para a produção do encenador e realizador suíço Luc Bondy, estreada em Viena em 2007.
João Lourenço e Vera San Payo de Lemos, responsável pela dramaturgia de “Tempestade ainda”, queriam fazer uma peça do escritor austríaco, assumir o desafio que mostrasse “a beleza e poesia da linguagem de Handke, a história dele e por que motivo vai às origens”.
“Éramos para fazer isto há dois ou três anos e acabámos por não fazer. E hoje, infelizmente, com todas as guerras, a Segunda Guerra Mundial torna-se muito atual”, fundamentou o encenador.
Para João Lourenço trata-se de um “reencontro feliz” com um autor cuja escrita e produção para cinema foi acompanhando sempre, mas no qual não voltou a tocar desde que, em 1972, encenado por Fernando Gusmão, interpretara “Insulto ao público”, com Rui Mendes, Irene Cruz, José Morais e Castro e José Messias. Foi no antigo Grupo 4, companhia que viria a estar na base do Novo Grupo – Teatro Aberto, em 1982.
Ao ler esta tragédia – que Peter Handke configura em tragédia, onde não faltam sequer os clássicos cinco atos deste género dramático –, João Lourenço resolveu voltar ao autor que, ao longo de toda a obra, tem abordado a figura da mãe.
“A mãe de Handke, uma atriz amadora da Caríntia, está em toda a obra do escritor, assim como vai estar no palco, pois ele convoca-a ao longo da peça, dialogando sempre com ela, incluindo quando ela ainda o traz na barriga”, sublinhou o encenador.
A cadeia de acontecimentos associados ao passado de Handke surge em obras iniciais, como “Wunschloses Unglück” (“Infortúnio indesejável”, em tradução livre), de 1972, em que aborda o suicídio da mãe, ocorrido no ano anterior.
Em 1986, retomou a história da família em “A Repetição” (título da edição brasileira), ligando-a pela primeira vez ao movimento de resistência eslovena, no sul da Áustria, “drama real” que retoma em 1997, em “Zurüstungen für die Unsterblichkeit” (“Ligações à imortalidade”, em tradução livre) e em “A noite do Morava”, de 2008, romance publicado há dois anos em Portugal pela Relógio d’Água, passado num cenário posterior a uma imaginada nova guerra mundial.
“A minha mãe sempre me falou muito sobre os mortos, sobre os irmãos que ela amava e que morreram na guerra”, disse Handke ao jornal Die Zeit, na entrevista de novembro de 2010. “A vida dos mortos sempre me absorveu. O meu primeiro romance, ‘Die Hornissen’ [“As vespas”, em tradução livre], é baseado numa história que ela me contou.”
A crítica internacional vê na abordagem das origens eslovenas de Handke, e na experiência de guerra da família, uma ligação às suas posições controversas e contestadas sobre os Balcãs e a desintegração da antiga Jugoslávia.
“Talvez possam ser vagamente explicadas, se não perdoadas, como parte da necessidade de Handke de ser inconveniente e errado, aquele impulso de descobrir o ninho de vespas e de ser picado”, escreveu o autor irlandês Hugo Hamilton, no jornal britânico The Guardian, quando da atribuição do Nobel da Literatura ao escritor austríaco, em 2019.
“Tempestade ainda” tem versão dramatúrgica de João Lourenço e Vera San Payo de Lemos, que também são responsáveis pela encenação e dramaturgia, respetivamente."

***

Sunday, April 17, 2022

ESTA TERRA É MINHA

 

This Land is Mine (1943).

Recomendável a quem hesita entre liberdade e segurança submissa.

Saturday, September 26, 2020

O JOGO DA CABRA CEGA

Anteontem, pelo Público soube-se - Professor de Direito compara o feminismo ao nazismo -  que esse professor de direito, Francisco Aguilar, está ser julgado por violência doméstica, e que a Faculdade de Direito retirou da Net programas de cadeiras do mestrado em que o Aguilar fala de mulheres com o pessoas desonestas, compara o feminismo ao nazismo, "nazismo" de género do totalitarismo dos Estados Feministas do Ocidente", terminando com "Morte a todos os comissário políticos do Conselho Superior da Magistratura!" "Morte à escolha de de professoras feministas para entrevistas ao CEJ." "Morte a todos os feministas." Repudia a "transmutação total dos valores do Ocidente resultante da adopção da besta do pó-modernismo iluminista ... dos psicólogos que dizem que as empresas devem contratar mais mulheres, designadamente para cargos dirigentes, porquanto as mulheres são, na linguagem pós-moderna, mais emocionalmente inteligentes que os homens, ... i.e., precisamente aquilo que, na Antiguidade, na Idade Média e ainda no Antigo Regime, mas já na Idade Moderna, se chamava [sic] pessoas desonestas. de "espertas", em suma, de canalhas", lê-se no ponto 49 do programa de Direito Processual Penal III", do prof. Aguilar.

O discurso do prof. Aguilar é um escarro na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Como é que um indivíduo é professor na FDUL há 30 anos e só agora deram por ele? Lê-se este artigo e só gente muito desmemoriada não se recordará do juiz Neto Moura que citava a Bíblia para atribuir pena suspensa a dois homens que agrediram vítima com uma moca de pregos, uma agressão  "não de gravidade bastante" segundo o juíz e, acrescente-se, uma juíza que subscreveu a sentença, invocando mais tarde não ter lido até ao fim o acórdão que assinou. Cf. aqui e aqui

Ontem, o Público noticiava - Juíza absolve professor (Aguilar) de violência doméstica. Mulher "também provocava", disse.  Professor de Direito estava acusado por uma ex-aluna, dez anos mais nova. A juíza Joana Ferrer referiu que expressões que ele usou foram motivadas “pela pressão, pelo gozo e pela violência psicológica a que a assistente igualmente o sujeitava”. Faculdade de Direito abriu processo de inquérito por Francisco Aguilar ter dois programas onde compara feminismo a nazismo. 

Só por isso?

Wednesday, July 11, 2018

O AVÔ DE LUKAKU

A ler o artigo de Paulo Curado no Público de ontem -  Romelu Lukaku: “Na Bélgica já não me pedem a identificação” - A surpreendente história e o exemplo de vida do melhor marcador da história da selecção belga. Nesta terça-feira, um país de muitas cores e línguas aguarda pela sua inspiração frente à França. ", emocionei-me, numa hora amarga.

A Bélgica perdeu contra a França, Lukaku teve uma actuação discreta, quase apagada, não será campeão do mundo este ano, mas não é por essa razão nem pelo desenrolar do encontro, nem pelo resultado final que a minha emoção, quando agora releio o testemunho de Lukaku, se esvaiu. 

Eu não sabia nada acerca de Lukaku, mas fiquei a perceber que, para além de um atleta de alto gabarito, é um homem íntegro, ancorado nas raízes familiares, imbuído dos valores morais que a sociedade europeia, individualista, egoísta, a caminhar a passos largos para o cenário, racista, xenófobo, nacionalista, que em meados do século passado ateou fogo ao mundo inteiro, despreza. 

"Aos 25 anos, Romelu Lukaku é uma lenda no futebol belga. É o melhor marcador da história da selecção. É a estrela do ataque do Manchester United. ... É também um jovem humilde que a fama não mudou. Tem uma maturidade anormal moldada por sacrifícios e uma fé inabalável.

Para além do pai e da mãe, o avô, no Congo [antiga colónia belga], era a pessoa mais importante da sua vida, com quem falava sempre que podia ao telefone.
“Ele era a minha ligação ao Congo, de onde são os meus pais. Um dia liguei-lhe e disse-lhe que o meu futebol estava a correr muito bem, que tinha marcado 76 golos, que vencemos o campeonato e que as grandes equipas começavam a reparar em mim. Normalmente ele queria saber, mas dessa vez estava estranho.

- ‘Sim Rom, isso é bestial. Mas podes fazer-me um favor?’- ‘Claro, o que é?
- ‘Podes olhar pela minha filha, por favor?’
Fiquei muito confuso.
- ‘A mamã? Sim, tudo bem.’
- ‘Não, promete-me. Podes prometer-me? Trata da minha filha. Cuida dela por mim, está bem?’
- ‘Sim avozinho. Entendi. Eu prometo.’
Cinco dias depois ele morreu  e eu percebi tudo. Fico tão triste ao pensar nisto, porque gostava que ele tivesse vivido mais quatro anos para me ver a jogar no Anderlecht. Para saber que tinha cumprido a minha promessa e que tudo ia ficar bem.”

“Quando as coisas corriam mal na selecção os jornais chamavam-me Romelu Lukaku, o atacante belga de origem congolesa; quando corriam bem, era Romelu Lukaku, o atacante belga. Alguns riam-se de mim quando não estava a jogar no Chelsea e fui emprestado. Mas não estavam comigo quando tinha de pôr água nos cereais e não podem realmente entender-me. Se não gostam da minha forma de jogar, tudo bem. Mas eu nasci aqui. Cresci em Antuérpia, Liége e Bruxelas.”

Romelu nunca esconde o orgulho pelo país e por vestir a camisola da selecção, com a qual fez história individual e colectiva. Já não pode contar ao avô que agora todos conhecem o apelido da família.
“Falo francês, holandês, alemão, espanhol ou português, dependendo do bairro onde estiver em Bruxelas. Somos ‘todos’ belgas. É isso que torna este país fixe, não é?”
Devia ser, Lukaku, devia ser. 

Antes do jogo e da leitura do Público, tinha enviado a seguinte mensagem aos nossos emigrantes: 
"Aposto que ganha a Bélgica, e será, segundo meu palpite a vencedora do mundial.
Interessante é que tanto do lado da França como da Bélgica a grande maioria dos jogadores ou são emigrantes ou descendentes de emigrantes, facto que deve colocar os nacionalistas, os neo-nazis, os racistas, e outros da mesma espécie, a espumar de raiva."

Para quem não perceba porquê recomendo a leitura de
 https://www.theguardian.com/education/2002/jan/04/highereducation.books
Hitler 1936-45: Nemesis by Ian Kershaw


Monday, April 24, 2017

QUADRILHA NACIONALISTA

- Em quem votarias na segunda volta se votasses em França: em Macron ou em Marine Le Pen?
- Nem num nem noutro! Abstinha-me!
- Abstinhas-te?
- Abstinha-me. 

A pergunta foi feita a um dos participantes do "Eixo do Mal", aquele que foi membro da Juventude Comunista nos anos 80, saiu do PCP para participar na fundação da Plataforma de Esquerda, migrando três anos depois para participar na fundação do Bloco de Esquerda, abandonando a militância partidária oito anos mais tarde.

Quantos militantes ou ex-militantes da esquerda comunista ou da extrema-esquerda assumirão em 7 de Maio a mesma posição de Daniel de Oliveira? Quantos, dos que votaram em Fillon, Hamon, apesar das indicações de voto em Macron se absterão ou votarão em Marine Le Pen? Quantos dos que votaram em Mélenchon, que ainda não deu até agora qualquer indicação de voto, votarão em Le Pen ou se absterão? As sondagens dão a Macron uns folgados 68% contra Le Pen na segunda volta mas serão as sondagens tão certeiras quanto o foram na primeira? 

O assunto não é despiciendo mas não foi por essa razão que me ocorreu comentar a resposta de um ex-comunista-plataformista-bloquista-independente-até-mais-ver. O que parece inédito, mas não é, nas actuais tendências do eleitorado em regimes democráticos é a vaga da sedução pelos extremos, sejam eles de direita ou de esquerda, sobretudo do eleitorado mais jovem, que leva à formação de frentes nacionalistas que juntam comunistas, ex-comunistas-saudosistas, fascistas, racistas, xenófobos, chauvinistas, neo-nazis, e outros extremistas contra a democracia e a Europa. É a sedução nacionalista, num lado e noutro dos extremos, que, novamente, setenta anos depois do último grande
conflito bélico mundial, encaminha para a desagregação a frágil unidade europeia ainda que a provável vitória de Macron a 7 de Maio possa conter o avanço nacionalista na Europa durante os próximos anos.

Dos nove candidatos que concorreram na primeira volta às eleições para a presidência francesa, apenas Emmanuel Macron, que não é suportado por nenhum partido, se afirmou europeísta convicto. Recolheu apenas 23% dos votos, um número suficiente para o colocar na segunda volta e, muito provavelmente, ser presidente de França dentro de duas semanas, mas que confirma que a União Europeia continua sem partidos nem cidadãos que inequivocamente se assumam como europeus.
E sem europeus, Europa continuará a ser apenas nome de um continente de estados-nações condenados a agredirem-se uns aos outros ad seculum seculorum.


Monday, March 06, 2017

Wednesday, January 18, 2017

FRANCISCO VS TRUMP

O canal National Geographic está a transmitir um docudrama (a próxima transmissão será na segunda-feira, 23, às 6,00h) sobre o papel desempenhado pelo Papa Pio XII durante a Segunda Grande Guerra. Foi Pio XII o "papa de Hitler" ou o anátema lançado é injusto?

"Nos dias mais negros da Segunda Grande Guerra, São Pedro estava encoberto pela sombra da suástica. Mas enquanto o Führer o rodeava, o Papa planeava uma contra ofensiva secreta. O Pontífice de Guerra Pio XII foi ridicularizado pelo seu silêncio sobre o Holocausto. Mas provas mostram que o seu silêncio poderá ter sido subterfúgio. E o homem marcado como "papa do Hitler" poderá ter querido eliminá-lo. Pio serviu de intermédio com os rebeldes alemães para montar uma revolta. Entretanto, uma rede de espiões da Igreja coloca os planos em marcha. Mensageiros católicos transportam mensagens entre Roma e Berlim, enquanto conspiradores se juntam na cripta de São Pedro. É um capítulo esquecido de uma guerra. Um confronto secreto entre o vigário de Cristo e o anti-Cristo. Papa Vs. Hitler é um docudrama entusiasmante de duas horas que explora uma das histórias menos conhecidas da Segunda Grande Guerra - o papel do Vaticano na conspiração para assassinar Adolf Hitler." - cf. aqui

Um docudrama, um neologismo que pretende significar uma versão entre a ficção e a realidade, e a ficção, neste caso, enrola-se sobretudo nas eventuais conexões entre o Pio XII e aqueles que na Alemanha arriscavam e pagavam com a vida a ousadia de parar as desmedidas atrocidades dos nazis. A realidade é um facto comprovado: Pio XII nunca fez ouvir publicamente a sua voz em protesto e condenação do holocausto em curso, que ele não ignorava porque viu, com os seus próprios olhos, uma amostra real do horror desencadeado pela fúria da besta. 

E hoje? 
O que diz o Papa Francisco perante a vaga de populismo carregado de ódios racistas, xenófobos, chauvinistas, que ameaçam desagregar a Europa e intensificar o incêndio ateado às suas portas? O que pensa, e se pensa deve dizer porque a força do Papa está na sua palavra, das declarações de Trump quando classificou de catastrófica a política de Merkel perante os refugiados?
Francisco esteve em Lesbos e até levou com ele 12 refugiados sírios para o Vaticano. É pouco, a bem dizer, é nada.
Fala Francisco!, "Estar atento não chega"* para que a história não venha a interpretar o teu silêncio como conivência.  
"Per ché non par li?".

foto c/p aqui
---
* Correl . - Papa Francisco: " O que pensa de Donald Trump?"

"A resposta de Francisco que rejeita julgar políticos e diz que está atento às consequências que os seus comportamentos causam aos pobres e aos excluídos"

Sunday, November 20, 2016

DE LESTE E OESTE SOPRAM NUVENS NEGRAS SOBRE A EUROPA

Não compreendo, mas reconheço, que a tese do politicamente correcto, como justificação da vitória de Trump, esteja a prevalecer na identificação das causas de um sucesso que, não muitos dias antes de 8 de Novembro, era considerado pela generalidade das sondagens como altamente improvável. 

Coloquem-se de parte as causas dos erros das sondagens e foquemos-nos nos resultados. Quem venceu?
Claramente, aqueles que aderiram ao discurso de Trump.
Foi o discurso de Trump um discurso "politicamente incorrecto" e, por esse motivo, sobrepôs-se ao discurso "politicamente correcto" dos seus opositores nas primárias e de Hillary Clinton na corrida final?

Houve, obviamente, uma inversão do sentido das palavras que parece estar a ser geralmente despercebido. Uma mensagem "politicamente correcta" é (ou era) aquela com a qual o emissor procura ir de encontro aquilo que os receptores, na sua maioria, querem ouvir. 
Ou não?
Se assim é, foi Trump e não Clinton quem discursou de forma mais politicamente eficaz, i.e., da forma mais politicamente correcta.

Pelos vistos os norte-americanos que votaram em Trump (menos do que aqueles que votaram em Clinton, mas com melhores resultados pelas razões conhecidas) não votaram por melhor assistência na doença, por melhor segurança social, por mais e melhor emprego (a economia dos EUA está a crescer bem e em quase em situação de pleno emprego) nem por mais igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. As mulheres brancas, aliás, votaram maioritariamente (53%) em Trump. São masoquistas, estúpidas ou adoram ser pegadas pela vagina como disse Trump?

Para mim, a resposta é clara: Trump venceu porque apelou aos instintos nacionalistas, xenófobos, racistas de muitos norte-americanos. Se não porque outra razão? Neste sentido, fez um discurso "politicamente correcto". Ou não?
Não quero acreditar que, os que votaram em Trump, o tenham feito por birra a quem apetece mas não se pode dar uma palmada. Ou por estouvamento juvenil geralmente mal desculpado. 
Agora, não resta senão esperar que a dignidade democrática amadureça os "imaturos" sem palmadas. 

E que a Europa, onde as vagas de nacionalismo atingem alturas assustadoras, não caia nas mãos de trumpitos**.

---
*  Comentário colocado aqui a propósito desta e desta reflexões de J C Alexandre.
**Em França estão a decorrer as primárias para a nomeação do candidato da direita moderada que deverá enfrentar Marine Le Pen, já que a esquerda se encontra desbaratada à partida. Um dos candidatos, Sarkozy, ex-presidente da República, e também o mais mediático, segundo li algures, "mimetiza nos seus discursos os discursos de Marine Le Pen". 
Um trumpito.

Tuesday, November 15, 2016

O CERCO DO HOMEM SOVIÉTICO*


Há oito dias ganhou Trump, amigo de Putin.
Dias depois, foram eleitos presidentes na Bulgária e na Moldávia os candidatos que se afirmaram pró- Rússia.
Na Hungria, o chefe é indisfarçável admirador de Putin desde que - cf. aqui - se fez eleger.
Marine Le Pen, cada vez mais próxima do Palácio do Eliseu, e Putin admiram-se mutuamente.
E as outras extremas-direitas para onde se voltarão se voltam costas à UE? Holanda, Áustria, ...
O Brêxit unirá mais os interesses do Reino Unido aos dos Estados Unidos, Teresa May estará do lado de Trump, e, pasme-se!, amigos dos meus amigos ... 
Há dois anos na imprensa britânica o actual presidente da Comissão Europeia era considerado - vd. aqui - "bêbado e perigoso". Depois Cameron, sem outra saída, arriscou o Brêxit e perdeu.
---
Sugestão de leituras durante o cerco : O Fim do Homem Soviético, de Svetlana Alexijevich (Nobel da Literatura 2015); Hitler de Ian Kershaw


Sunday, November 13, 2016

OUTRO OVO DE SERPENTE


Sinceramente, Estimada Suzana Toscano, não compreendo os seus argumentos e muito menos as suas conclusões.

Hillary Clinton reconheceu a derrota e telefonou a Trump. Este disse depois que ela tinha tido palavras amáveis para com ele.
Até aqui, ao comportamento dos Democratas não são atribuíveis reparos.
Concorda?

Depois refere o comportamento não democrático de milhares de cidadãos que se manifestaram nas ruas e uma petição que já terá três milhões de assinaturas.

Ora os "Democratas", eleitores ou não, contam-se em números muitíssimo mais elevados. Pode retirar-se, mesmo validando os seus argumentos, que os "Democratas" estão a ter um comportamento anti democrático porque alguns deles, na realidade uma pequena parte, se manifesta e protesta? Confundir uma parte com o todo não me parece uma aceitável indução estatística. Não concorda?

Por outro lado, uma manifestação de desagrado não é, não pode ser, em democracia considerado um comportamento antidemocrático porque a essência da democracia sustenta-se na liberdade de expressão. 

A mim, porque tenho família nos EUA, o comportamento de Trump preocupa-me não apenas pela soberba e falta de civismo que demonstrou ao longo da campanha mas pelos comportamentos que os seus dislates já estão a promover. 

Na imprensa norte-americana de referência li ontem que em várias escolas começaram a aparecer slogans racistas e inscrições de suásticas nas paredes. E que alguns jovens alarves terão acossado colegas pegando nelas pela vagina porque se Trump o fez por que razão não podem eles fazer o mesmo? São apenas casos isolados, facilmente controláveis pelas instituições?
Hitler, publicamente, não ordenava matar nem perseguir. Regozijava-se com as iniciativas dos que o idolatravam e actuavam de forma que eles acreditavam agradar ao führer.

Estimada Suzana Toscano,

A sociedade norte-americana está agora mais dividida que antes. 
Os sintomas são claros: o racismo, a xenofobia, a misoginia, a intolerância e o fanatismo religioso vão galopar com Trump. É preciso muita ingenuidade para supor que Trump não vai prosseguir pelo caminho que prometeu prosseguir. As primeiras indicações já chegaram. Os resultados prometem um desastre social, não só a nível norte-americano como mundial. 

Pela Europa são vários os trumpitos a esfregar as mãos de contentamento. Foi mais ou menos assim que foi chocado há cerca de oito décadas atrás o ovo da serpente.
---
Correl.


Cartaz convocando manifestação Klu Klux Klan para o dia 3 de Dezembro na Carolina do Norte
c/p aqui

Sunday, September 04, 2016

É A HORA DO SUL

De um e do outro lado do Atlântico Norte, onde a democracia ganhou raízes e frutificou durante quase três séculos, rejuvenescendo das cinzas mesmo quando parecia aniquilada pela fogueira ateada pela hidra nazi, chegam notícias que dão conta do crescimento de rebentos da besta multicéfala.

Na Alemanha, observa-se a queda da popularidade de Merkel e o crescimento do partido da extrema-direita AfD (Alternativa para a Alemanha) sustentado na xenofobia a degenerar em racismo dos seus mentores. Hoje, os eleitores do estado mais a nordeste da Alemanha -Mecklenburg-West Pomerania-, aquele em que se insere o distrito eleitoral em que Merkel vota e, por má coincidência, o território onde o AfD passa a ter maior representação na Assembleia de um estado da federação alemã, atribuiram o segundo lugar ao partido de extrema-direita, relegando a CDU de Merkel para a terceira posição. Os sociais-democratas mantiveram o primeiro lugar, mas, também eles, perderam lugares para o AfD.

A Alternative für Deutschland, AfD não se distingue apenas pela sua repulsa xenófoba - com 1,6 milhões de habitantes, a presença de imigrantes em  Mecklenburg-West Pomerania ronda apenas 3,7% da população total do estado - porque, além do mais, defende a dissolução da zona euro. 
A coligação SPD/CDU, com 40 lugares entre os 71 da Assembleia de Mecklenburg-West Pomerania vai continuar a governar o Estado, mas Merkel sai enfraquecida e será tentada a inflectir à direita o governo  federal em Berlim.

Se o futuro não parece prometedor a Merkel, também o enfraquecimento político interno da actual chanceler não favorece, antes pelo contrário, o caminho para uma maior integração da União Europeia nem um maior peso político da Europa na geoestratégia mundial. 

No Reino Unido, a pusilanimidade dos trabalhistas favorceu o voto no Brexit
Não é garantido, bem pelo contrário, que os sociais-democratas na Alemanha, e na Europa do Norte em geral, não venham a titubear tanto ao mais que os seus confrades britânicos.

Adensam-se as nuvens  sobre os céus do ocidente.

---
Correl . - 


Saturday, April 18, 2015

PHOENIX


Phoenix tem sido muito aplaudido e bem acolhido pela crítica. É uma obra-prima? Alguns consideram-no o melhor do filme do ano. Aponto dois aspectos que retiram força à verosimilhança da história: 1 - A desfiguração física não determina a distorção da voz, e a voz é um sinal identificador praticamente inalterável ao longo da vida.  É inverosímil que o homem, denunciante da mulher, judia, só na cena final reconheça a voz da mulher, cantora, com quem fora casado, e que ele acompanhara como pianista. Percebe-se que ele, por um lado, carregando o remorso de a ter denunciado, e, desse modo, remetido para um campo de concentração, e, por outro, obcecado pela procura de alguém que possa ser seu comparsa na reivindicação de uma herança fabulosa, estivesse possuído por uma situação de negação total. Mas é uma interpretação forçada considerando as suas faculdades auditivas de um pianista. 2 - O suicídio da amiga (lésbica?) e a entrega extemporânea do certificado de divórcio parecem-me também menos bem enquadrados no desenrolar do drama.
.
Mas Phoenix vale a pena ser visto.

***
----
Correl. -  Terrivelmente real é o relato publicado hoje no El País - Quando as mães atiravam ao rio os seus filhos

"El documento es estremecedor. 28 páginas repletas de nombres acompañados de la fecha y el motivo de su muerte. Elegida una al azar, aparecen varias familias —los Gaut, los Schubert (madre e hija), los Rienaz (también madre e hija)…—. Todos fallecieron el 8 de mayo de 1945. Y todos por una misma causa: suicidio. Estamos en el Museo Regional de Demmin, una pequeña ciudad del noreste de Alemania que estos días revive sus días más dramáticos. En los últimos meses de la II Guerra Mundial, cuando la victoria final tantas veces anunciada por Adolf Hitler parecía cada vez más irreal y el Ejército Rojo acechaba, entre 700 y 1.000 ciudadanos de Demmin —que entonces tenía unos 15.0000 habitantes— prefirieron morir antes que vivir en un mundo en el que los nazis no gobernaran. Fue el mayor suicidio masivo en la historia de Alemania.
 ...
 Desde hace una década, cada 8 de mayo, día de la capitulación, un pequeño grupo de manifestantes cercano al partido de ultraderecha NPD recuerdan a las víctimas alemanas. “Durante los años del comunismo, este era un tema tabú. Nadie quería recordar las violaciones o crímenes cometidas por los soldados que nos liberaron del fascismo. Y ahora los neonazis también utilizan el dolor pasado para sus fines”, explica Petra Clemens, la directora del museo, rodeada de vestigios de la historia de la zona. En esta castigada ciudad del este alemán, el paro afecta al 17% de la población (un porcentaje altísimo para un país en el que la media está en el 6,9%) y el alcoholismo hace mella."

Sunday, April 05, 2015

SUITE FRANCESA

As histórias contadas no cinema à volta do comportamento da resistência francesa durante a ocupação nazi acabam, geralmente, por transmitir imagens pouco dignas do povo que cento e cinquenta anos tinha degolado o Antigo Regime. Se a história contada é uma adaptação de uma obra de uma escritora nascida na Polónia de origem judaica, que viria a ser morta em Auschwitz em 1942 (apenas dois anos depois do início da ocupação da França), a colaboração cobarde das denúncias e acusações mesquinhas remetidas por habitantes de uma pequena cidade francesa aos militares ocupantes, o filme é uma acusação implacável daqueles que, com raras excepções, se comportaram da firma mais indigna. 

Para lá da fotografia a negro da sociedade retratada, há uma incontavelmente repetida história de amor, desta vez bem contada, entre militares ocupantes e mulheres dos territórios ocupados. 
O facto de os intérpretes dos personagens franceses se expressarem, entre si e com os alemães, em inglês, imprime no espectador menos atento a ilusão de uma deslocalização do cenário da história. Tanto quanto num qualquer western, dobrado, John Wayne a hablar espanõl.

 Suite francesa vale, mesmo assim, a pena ser vista.

---
Correl . - Exorcizar o passado em Paris

Sunday, February 08, 2015

FLATULÊNCIAS DE UM CABOTINO

A surpreendente entrada do Syriza na ribalta política europeia, e até mundial, está a provocar as mais desencontradas, e frequentemente extremadas, reacções. Se para uns Alexis &Yanis são uma diabólica parelha vermelha que não se aguentará na corda bamba mais que dois meses ou três, para outros o Syriza é a lufada de ar fresco que, para salvação da UE penetrou na claustrofóbica câmara em que, até agora, se moviam os eurozónicos. Se para uns a democracia em Atenas não vale menos que a democracia em Berlim, a inversa é logo argumentada pelos outros. Contudo, nenhum dos políticos no activo ou na reserva, ou comentadores remunerados, ou pro bono, vulgo bloggers, tinha atingido o cúmulo de aversão ao Syriza a que o sr. Vasco Valente Correia Guedes desceu num artigo que o Público colocou ontem aqui.

Transcrevo:

"Os fanáticos vêem o mundo por uma fresta e ganham pela demagogia e pela intimidação. Na história política contemporânea, há centenas de casos parecidos. Dos maiores, como Hitler, aos mais pequenos, como o PRD de Eanes. Hitler declarou guerra ao Império Britânico, à URSS e à América: toda a gente percebeu que o desastre era inevitável, mas só ao fim de 55 milhões de mortos, com os russos a 100 metros da porta, ele percebeu. Eanes imaginou que se criava um partido com meia dúzia de militares e dúzia e meia de tresmalhados ou desiludidos, sem uma tradição e uma função social evidente e durável, mas bastou Mário Soares dissolver a Assembleia para se ver o vácuo daquela traquitana. O Syriza esperneia e faz barulho, mas passará depressa."

Que o sr. Vasco Valente Correia Guedes junte no mesmo saco Hitler e o Syriza é uma pesporrência a que nenhum grego dará a mínima atenção; mas o envolvimento do General Ramalho Eanes é uma infâmia que só pode merecer a indiferença de qualquer português minimamente informado se considerar que tamanha bacorada deve ter germinado na cabeça daquele senhor em algum momento de delirium tremens.

Monday, June 02, 2014

OLHA QUE DOIS

Não é novidade para ninguém, salvo para os comparados, que são mais perturbadoras as semelhanças que as diferenças entre as ideologias fascistas/nazis e comunistas, ainda que esta comparação possa fazer espumar de raiva e dar saltos de corça aos extremos que se tocam. Afirma, por um lado,  Marine Le Pen: "Quero destruir a União Europeia ... A Europa é a guerra. A guerra económica, um aumento das hostilidades entre os países. Os alemães são insultados e acusados  de crueldades, os gregos são acusados de gastadores e os franceses de vagos". E, do outro lado extremo, ouve-se que "foi o PCP  ainda o primeiro, e até hoje o único, partido a colocar como objectivo político, a luta pelo fim da União Económica e Monetária".

Não estão sós. Com mais ou menos as mesmas intenções de destruição da União Europeia, invocadamente, para salvar a Europa, estarão representados no futuro PE um leque de partidos que, sendo, por enquanto bastante minoritários, e impossivelmente miscíveis num mesmo quadrante parlamentar, irão continuar a cantar a canção do nacionalismo que encanta cada vez mais gente de norte a sul da Europa. Num continente milenarmente fracturado, a ideia fundadora da contrução da União Europeia e, mais tarde, a criação do euro, confrontam-se com um nacionalismo atávico, e aqueles que se dizem defensores da integração europeia coibem-se, por adaptação manhosa às circunstâncias ou vacilação nas convicções, de opor à prevalência do discurso nacionalista o da integração política que só pode ser tendencialmente federativa. 

Há quem defenda, e eu concordo, que a extensão da abstenção nas eleições e a progressão dos nacionalistas, digam-se eles de direita ou de esquerda, irá obrigar aqueles que se lhes opõem a um posicionamento claro que até agora não assumiram, e a procederem em conformidade. O avanço nacionalista, com todo o seu cortejo de racismo, xenofobia e chauvinismo,  é agora de tal modo evidente, que só uma defesa forte e determinada dos valores postos em causa, ainda que de modo camuflado, pode conter e evitar a repetição da endémica tradição de confronto bélico entre europeus.

Os próximos anos serão cruciais para garantir a paz na Europa. Quando, em 1960, De Gaulle lançou a ideia de uma Europa das nações (também repescada por Le Pen) estava longe de supor a evolução do resto do mundo, agora transformado numa aldeia global, um termo cunhado poucos anos depois da designação gaullista. Muitas das palavras do chefe de Estado francês* subsistem ainda hoje como principal argumentário, eficazmente convincente, dos nacionalistas contra a integração federativa da Europa.

Mas o mundo mudou, e mudou muito. E se a Europa não mudar continuará a ver  passar por si o mundo.

---
cit. adapt. a partir daqui

Europa das nações em 1960

Para De Gaulle importava actuar, não de acordo com os sonhos, mas sim em conformidade com as realidades, para construir a Europa, isto é, unificá-la. Ora quais são as realidades da Europa? Quais são os alicerces sobre os quais queremos construi-la? Na verdade, são os Estados que, de certo são muito diferentes uns dos outros, que têm cada um a sua alma para si, a sua história para si, a sua língua para si, os seus infortúnios, as suas glórias, as suas ambições para si, mas Estados que são as únicas entidades que  têm o direito de ordenar e a autoridade para agir. Fingir-se que pode construir-se qualquer coisa  que seja eficaz para a acção e que seja aprovado pelos povos por fora e por cima dos Estados, é uma quimera. Seguramente, esperando qu'on a pris corps à corps e no seu conjunto o  problema da Europa, é verdade que se pôde  instituir certos organismos mais ou menos  extranacionais. Estes organismos têm o seu valor técnico mas não têm nem podem ter autoridade e  por conseguinte eficácia política.


Defesa da cooperação política

Assim, propõe que se ultrapasse o problema da instituição daquilo que qualifica como cooperação política: assegurar a cooperação regular da Europa ocidental, é o que a França considera como sendo desejável, como sendo possível e como sendo prático no domínio político, no domínio cultural e no da defesa. Isso implica um concerto organizado e regular dos governos  responsáveis e em seguida o trabalho de organismos especializados em cada um dos domínios comuns  e subordinados aos governos; isso implica a deliberação periódica de uma Assembleia que seja formada  pelos delegados dos Parlamentos nacionais e, em meu entender, isso deve implicar a mais cedo possível, um solene referendo europeu de maneira a dar a tal  ponto de partida da Europa o carácter de adesão e de intervenção popular que lhe é indispensável. Conclui, assim, que se enveredarmos por esse caminho ... forjar-se-ão elos, adquirir-se-ão hábitos e, com o tempo, é possível que venham a dar-se outros passos para a unidade europeia.

A Europa como confederação de nações 
  
O mesmo De Gaulle, numa conferência de imprensa de  31 de Dezembro de 1960,  proclama: nós faremos, em 1961, o que temos de fazer: ajudar a construir  a Europa que, confederando as suas Nações, pode e deve ser para o bem dos homens a maior  potência política, económica, militar e cultural que jamais existiu. Este mesmo De Gaulle, considerava  num artigo de 1948 que  A Europa deverá ser uma federação de povos livres.  Em Abril de 1962  considerará: Se a União Política não for instituída, que ficará do Mercado Comum? Não deixava,  no entanto, de salientar em privado:  A Europa é um meio para a França tornar a ser o que era antes  de Waterloo: a primeira no Mundo (Agosto de 1962). Também, em privado, salientava em  Setembro de 1962: o interesse egoísta da França é que a Alemanha continue dividida o mais  tempo possível. Mas nisto não será eterno. Adenauer pensa-o, engana-se. O futuro vai desmenti-lo.  A natureza das coisas será a mais forte. A Alemanha há-de reunificar-se.  Na mesma altura  salientava que  as únicas realidades internacionais são as nações.

 A Rússia secará o comunismo como o mata borrão seca a tinta.

---
Correl. - A União Europeia vai destruir a Europa - José Gil
 

Wednesday, March 26, 2014

A LESTE LEVANTAM-SE OS FANTASMAS DE NOVO

Obama garante aos europeu todo o gás que necessitam de modo a poderem dispensar os fornecimentos russos Na Ucrânia o preço do gás vai subir 50% para os consumidores privados por imposição do FMI como contrapartida de um plano de assistência de 15 a 20 mil milhões de dólares. A Alemanha pondera expulsar imigrantes europeus sem trabalho há seis meses. Em França, a extrema direita, afirma-se nas eleições municipais depois de ter ascendido a posição cimeira a nível nacional. Na Ucrânia confrontam-se as bandeiras do nazismo, desfraldadas pelos seguidores de uma parte significativa dos membros do governo de Kiev, e as do comunismo, apoiantes de Putin. Entre uns e outros tropeça a democracia europeia. No meio de uma desorientação geral, que se manifesta em múltiplos sintomas de fractura, assomam uma vez mais os EUA a colocar alguma ordem na velha casa. 

Valha-nos, desta vez, pelo menos a nossa perificidade a oeste. Se os EUA vão passar a abastecer de gás a Europa, talvez venham a reparar que a ponta mais ocidental do Velho Continente é o Cabo da Roca.
---
Correl. - Leading Briton´s business links with Russians under spotlight
Merkel recusa mais sanções sobre a Rússia
Uma nova República de Veneza independente de Itália
---
5/04 -Milhares de pessoas arriscaram a vida para poderem levar com uma perda de território, uma súbida brutal do preço do gás e a redução dos rendimentos disponíveis. Irónico.
Jan Wolf em Empréstimos à Ucrânia dependem de austeridade "impopular e dura"
aqui