quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Frente Cívica pede a primeiro-ministro que revogue lei dos solos

 


Frente Cívica pede a primeiro-ministro que revogue lei dos solos

Lei está “directamente associada a suspeitas de aproveitamento pessoal”

 

A Frente Cívica escreveu esta quarta-feira ao primeiro-ministro, Luís Montenegro, apelando à revogação do Decreto-Lei que alterou o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, a chamada Lei dos Solos. Na sequência da demissão do secretário de Estado do Ordenamento do Território, a associação nota que esta lei e as políticas em que Hernâni Dias se envolveu «estão manchadas pela mesma suspeição que tornou a sua continuidade no Governo impossível». «Este diploma, além do potencial de corrupção que comporta, está agora directamente associado a suspeitas concretas de aproveitamento pessoal de um dos seus principais autores, já visado noutras investigações judiciais, o ex-Secretário de Estado Hernâni Dias”, nota a Frente Cívica.

Além disso, a associação critica a entrada em vigor do Decreto-Lei, numa altura em que foi já iniciada a sua revisão, apontando a incerteza jurídica que este processo provoca. «Isto coloca o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial numa “terra de ninguém”, em que começa a produzir efeitos num contexto em que já se anuncia a sua revisão e a reversão de algumas das suas normas. O potencial para a confusão jurídica, a litigância e a invocação de “direitos adquiridos” em negócios urbanísticos – através de diferendos que se poderão arrastar por anos ou décadas – é praticamente inesgotável», alerta a associação.

A Frente Cívica reitera que o novo regime comporta enormes riscos de corrupção e desencadeará «uma autêntica corrida a terrenos rústicos pelos promotores imobiliários próximos do poder autárquico, com enormes impactos inflacionários e ambientais. Os “patos-bravos” do imobiliário conseguirão comprar solos rústicos a preço de saldo, transformá-los em terreno urbano e, com essa mera operação administrativa, embolsar mais-valias milionárias, de 600% ou mais. Margens desta dimensão só se obtêm no grande tráfico de droga e, agora, no urbanismo».

Junta-se, para conhecimento, a carta enviada ao primeiro-ministro.



Exmo. Senhor Primeiro-Ministro

Doutor Luís Montenegro

 

 

Data: 29 de Janeiro de 2025

ASSUNTO: Revogação do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de Dezembro, que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial

 

Excelência,

O Decreto-Lei n.º 117/2024, que hoje entrou em vigor, vem facilitar a reclassificação de solo rústico para solo urbano, mediante um novo mecanismo de alteração simplificada dos Planos Directores Municipais.

Esta legislação incentiva alterações abruptas e casuísticas aos Planos Directores Municipais, a pedido dos proprietários e em negociação directa com os municípios, gerando amplas oportunidades para conluios corruptivos que destroem a coerência, previsibilidade e segurança jurídica do ordenamento territorial. Este dano é amplificado pela circunstância – inusitada e cremos que inédita – de o Governo ter anunciado a revisão do Decreto-Lei ainda antes de o mesmo entrar em vigor! Isto coloca o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial numa “terra de ninguém”, em que começa a produzir efeitos num contexto em que já se anuncia a sua revisão e a reversão de algumas das suas normas. O potencial para a confusão jurídica, a litigância e a invocação de “direitos adquiridos” em negócios urbanísticos – através de diferendos que se poderão arrastar por anos ou décadas – é praticamente inesgotável.

Sejam quais forem as alterações que se venham a consagrar, o cerne do Decreto-Lei manter-se-á. A transformação expedita, a pedido, de solo rural em urbano irá gerar uma autêntica corrida a terrenos rústicos pelos promotores imobiliários próximos do poder autárquico, com enormes impactos inflacionários e ambientais. Os “patos-bravos” do imobiliário conseguirão comprar solos rústicos a preço de saldo, transformá-los em terreno urbano e, com essa mera operação administrativa, embolsar mais-valias milionárias, de 600% ou mais. Margens desta dimensão só se obtêm no grande tráfico de droga e, agora, no urbanismo.

O novo regime terá como primeiro efeito a subida vertiginosa do preço dos terrenos, encarecendo a habitação que neles se vier a construir. E terá como segundo efeito a corrupção, frequentemente associada ao financiamento político e de campanhas eleitorais. Isto, num país em que, segundo os dados da Direcção-Geral do Território, mais de 50% do solo já hoje classificado como urbano está desaproveitado, incluindo nas áreas de maior pressão, como a Área Metropolitana de Lisboa – o que deita por terra a tese de que a crise de habitação se deve à falta de terrenos urbanos. Por tudo isto, o Decreto-Lei 117/2024 é, em nosso entender, uma ignóbil trafulhice.

Acresce que, soubemo-lo agora, esta legislação foi concebida no seio do Ministério da Coesão Territorial, com a forte participação do ex-Secretário de Estado Hernâni Dias, agora afastado do Governo pela revelação de um evidente conflito de interesses associado a inegáveis riscos de corrupção.

Neste contexto, e em nosso entender, todas as políticas públicas que tiveram a participação deste governante estão manchadas pela mesma suspeição que tornou a sua continuidade no Governo impossível. Devem por isso ser alvo de um forte crivo de revisão. Em particular, o Decreto-Lei 117/2024 deve ser revogado. Este diploma, além do potencial de corrupção que comporta, está agora directamente associado a suspeitas concretas de aproveitamento pessoal de um dos seus principais autores, já visado noutras investigações judiciais, o ex-Secretário de Estado Hernâni Dias.

Excelência,

No seu discurso de tomada de posse como Primeiro-Ministro de Portugal, há menos de um ano, assumiu o compromisso: «Promoveremos uma governação séria, transparente e que combate a corrupção, com instituições credíveis e uma sociedade civil forte, tolerante e solidária». Esse compromisso, acompanhado do anúncio do combate à corrupção como prioridade política, tem agora o seu teste decisivo.

Assim, para segurança jurídica dos instrumentos de planeamento, para garantia e confiança dos cidadãos e até para salvaguarada da credibilidade do Governo, entendemos que só a revogação do Decreto-Lei 117/2024 reporá a legalidade democrática e a credibilidade do seu Executivo.

Assim, vimos pedir-lhe, Senhor Primeiro-Ministro, revogue esta ignóbil trafulhice.

Somos, com os nossos cumprimentos

Pela Frente Cívica,

 

Paulo de Morais, Presidente

 

 

João Paulo Batalha, Vice-Presidente

 


quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

Lei dos Solos: Frente Cívica apela à revogação da “ignóbil trafulhice”

 

Felix König, CC BY 3.0, via Wikimedia Commons

A associação Frente Cívica escreveu esta quarta-feira aos partidos representados na Assembleia da República, apelando à revogação do Decreto-Lei do Governo que pretende facilitar a transformação de solo rústico em solo urbanizável, alertando que a medida “leva a práticas corruptivas”. O Parlamento discute na próxima sexta-feira o Decreto-Lei, que tem sido universalmente contestado por peritos e organizações da sociedade civil.

Na carta enviada aos deputados, a Frente Cívica aponta que “Os amplos poderes de alteração do uso de solos previstos no Decreto-Lei […] constituem previsível – aliás, inevitável – lastro de corrupção”, ao estimularem a promiscuidade entre autarcas, partidos políticos e especuladores imobiliários. Este mecanismo terá como efeito imediato o brutal encarecimento dos solos, tornando ainda mais difícil a resolução do problema da habitação em Portugal.

“Estas operações urbanísticas valorizarão os solos em seis ou sete vezes. Margens desta dimensão (600% ou mais) só se obtêm no tráfico de droga de alto nível e, agora, no urbanismo”, alerta a Frente Cívica. “E assim, em ano de eleições autárquicas, os “patos-bravos” do imobiliário ganharão certamente milhões em manobras de valorização administrativa de terrenos, antes até de construírem uma única casa nos solos reclassificados. Inevitavelmente, uma pequena parte dos seus lucros irá financiar os seus cúmplices, os autarcas e os partidos que se candidatam nas eleições deste ano.”

Por tudo isto, a Frente Cívica sublinha que o Decreto-Lei é “inaceitável e irreformável”, pelo que “Deve ser pura e simplesmente revogado”.

“O Decreto-Lei 117/2024 é uma ignóbil trafulhice. Apelamos à Assembleia da República que nos livre dela, em vez de consagrar para a História este crime legislado”, lê-se na carta.

Inclui-se, para conhecimento, a carta enviada a todos os partidos da Assembleia da República.



Exmas. Sras. e Srs. Presidentes dos Grupos Parlamentares
e Deputada Única Representante de Partido,

 

 

 

Data: 22 de Janeiro de 2025

ASSUNTO: Apreciação Parlamentar n.º 6 /XVI/1.ª, do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de Dezembro, que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial

 

Exmas. Sras.,

Exmos. Srs.,

Através do Decreto-Lei n.º 117/2024, pretendeu o Governo autorizar a reclassificação de terrenos não edificáveis para solo urbano, mediante um novo mecanismo de alteração simplificada dos Planos Directores Municipais, a pretexto da crise de habitação que se vive em Portugal, sentida com especial gravidade nas principais zonas urbanas do País.

Se vier a entrar em vigor, esta legislação virá provocar alterações abruptas nos Planos Directores Municipais e violar a coerência, previsibilidade e segurança jurídica do ordenamento territorial, fazendo perigar um dos princípios basilares da democracia local. Os amplos poderes de alteração do uso de solos previstos no Decreto-Lei são ilegítimos, porque lesam gravemente o ordenamento do território. Para além disso, constituem previsível – aliás, inevitável – lastro de corrupção.

A permitir-se este mecanismo, e as enormes margens de discricionariedade de decisão que consagra, iremos nos próximos tempos assistir a uma corrida a terrenos rústicos por parte dos promotores imobiliários próximos do poder autárquico. Estes irão adquirir solos rústicos a preço de saldo. De seguida, irão transformá-los em solo urbano para construírem o que bem entenderem. Estas operações urbanísticas valorizarão os solos em seis ou sete vezes. Margens desta dimensão (600% ou mais) só se obtêm no tráfico de droga de alto nível e, agora, no urbanismo. E assim, em ano de eleições autárquicas, os “patos-bravos” do imobiliário ganharão certamente milhões em manobras de valorização administrativa de terrenos, antes até de construírem uma única casa nos solos reclassificados. Inevitavelmente, uma pequena parte dos seus lucros irá financiar os seus cúmplices, os autarcas e os partidos que se candidatam nas eleições deste ano.

Esta legislação, se efectivamente entrar em vigor, irá ainda permitir que algumas operações urbanísticas ilegais, eventualmente autorizadas nos últimos anos, sejam agora legalizadas, ao abrigo do princípio de aplicação da legislação mais favorável. Desta forma, o Decreto-Lei 117/2024 não só incentivará novos assaltos ao território, mas funcionará também como amnistia de crimes já perpetrados.

Os terrenos que irão beneficiar destas valorizações serão, em 30%, segundo o Decreto-Lei, comercializados livremente, ou seja, ao valor de mercado. Os restantes 70% terão de ser utilizados para habitação pública ou, alternativamente, em habitação de valor moderado. Mas esta habitação a valor moderado pode atingir valores até 125% da mediana de preço de venda para o concelho de localização, ou seja, pode ser superior ao próprio valor de mercado.

Legislação que designa como moderado um valor superior ao valor de mercado é, só por isso, enganadora. Legislação que permite ganhos milionários aos especuladores do urbanismo e aos autarcas que aceitam ser seus cúmplices leva a práticas corruptivas. O diploma que é agora levado à apreciação da Assembleia da República é por tudo isto inaceitável e irreformável. Não deve ser “melhorado” com alterações cosméticas que se limitariam a dar nova roupagem ao mesmo assalto aos bens públicos e ao território nacional. Deve ser pura e simplesmente revogado.

O Decreto-Lei 117/2024 é uma ignóbil trafulhice. Apelamos à Assembleia da República que nos livre dela, em vez de consagrar para a História este crime legislado.

Somos, com os nossos cumprimentos

Pela Frente Cívica,

 

Paulo de Morais, Presidente

 

 

João Paulo Batalha, Vice-Presidente

 


quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Procurador-Geral da República é orador principal do Dia Internacional Contra a Corrupção

 

Comemorações decorrem a 9 de Dezembro na Marinha Grande

O Procurador-Geral da República, Amadeu Guerra, será o orador principal das Comemorações do Dia Internacional Contra a Corrupção, que decorrerá este ano na Marinha Grande, a 9 de Dezembro. A data é celebrada em Portugal com uma conferência dinamizada pela sociedade civil, este ano com o apoio do Município da Marinha Grande.

Amadeu Guerra, que assumiu o cargo de Procurador-Geral da República a 12 de Outubro passado, será o orador principal do evento, que contará ainda com intervenções dos presidentes da associação Frente Cívica, Paulo de Morais; da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Nuno Matos; do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Paulo Lona; e da Associação Sindical dos Profissionais da Inspeção Tributária e Aduaneira, Nuno Barroso. O presidente da Câmara Municipal da Marinha Grande, Aurélio Ferreira, fará a intervenção de abertura.

“É para nós um prazer e um privilégio que o Procurador-Geral da República se junte às comemorações da sociedade civil e exponha a sua visão sobre o problema da corrupção e a urgência do seu combate. As comemorações nacionais desta data vão reunir representantes de topo do mundo da justiça, mas não deixaremos de lembrar que o combate à corrupção é uma exigência política que tem sido descurada por sucessivos Governos e Parlamentos, apesar da sucessão de agendas, comissões parlamentares e estratégias de papel”, aponta o presidente da Frente Cívica, Paulo de Morais.

O Dia Internacional Contra a Corrupção celebra a aprovação, em 2003, da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção. As comemorações portuguesas decorrem das 9h00 às 13h00 na Marinha Grande. A entrada é livre.

  


quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Frente Cívica homenageia Mário Frota

Professor Mário Frota

O Conselho de Direcção da Frente Cívica deliberou por unanimidade atribuir ao professor Mário Frota o título de Membro Honorário da associação. A distinção reconhece o notável papel cívico do professor, quer na liderança e dinamização de causas justas em defesa do interesse público, como no seu contributo como co-fundador e primeiro presidente da Mesa da Assembleia Geral da Frente Cívica.

«Mário Frota é uma referência para todos os portugueses, um exemplo também a nível internacional», lê-se na deliberação aprovada, que salienta o papel do académico e activista na defesa dos consumidores e em inúmeras causas cívicas. «[E]nvolveu-se em inúmeras lutas, justas lutas, engajou-se às causas mais difíceis. Nunca deixou de defender os mais desprotegidos, lutou sempre do lado certo da barricada», aponta a Frente Cívica. 

A distinção pública ocorrerá numa sessão solene, a realizar-se em breve.

Transcreve-se a deliberação, para conhecimento:


DELIBERAÇÃO

 

Mário Frota é uma referência para todos os portugueses, um exemplo também a nível internacional. Enquanto Professor e académico, tem liderado a discussão na área do Direito do Consumo em Portugal, na Europa e na América Latina, contribuindo para formar e inspirar gerações de académicos e activistas em vários países. A sua acção cívica na defesa dos direitos dos consumidores é ímpar, contribuindo de forma empenhada e decisiva não só para o desenvolvimento das leis de defesa do consumidor, mas para a sua aplicação concreta em benefício dos cidadãos. Muitos lhe devem o facto de terem visto reconhecidos os seus legítimos direitos.

 

Mário Frota, ao longo das últimas décadas, envolveu-se em inúmeras lutas, justas lutas, engajou-se às causas mais difíceis. Nunca deixou de defender os mais desprotegidos, lutou sempre do lado certo da barricada. Nunca aceitou as prebendas que o regime lhe poderia facultar. Pelo contrário, as causas em que se envolveu em prol do interesse público trouxeram-lhe dissabores, custos económicos e pessoais. Mas Mário Frota sentiu sempre o apoio do povo e o respaldo da sua consciência.

 

Na Frente Cívica, Mário Frota foi, desde a fundação, personalidade fundamental. É um dos primeiros fundadores, integrou a Comissão Instaladora e presidiu à primeira Mesa da Assembleia Geral. Desde o primeiro dia tem sido entusiasta de todas as causas, tem também liderado algumas das intervenções mais marcantes da Frente Cívica, sempre guiado por uma enorme generosidade pessoal e profundo sentido de justiça.

 

Atendendo ao percurso cívico de Mário Frota ao longo de toda a sua vida, considerando ainda o seu papel fundamental na fundação e consolidação da Associação Frente Cívica, o Conselho de Direcção da Frente Cívica, em reunião extraordinária de 7 de outubro, deliberou, por unanimidade, atribuir o título de associado honorário a Mário Frota. Mais deliberou organizar, em breve, uma sessão solene e pública para a entrega do respectivo diploma e a expressão da gratidão, da associação e do país, pela sua vida e obra exemplares.

 

Coimbra, 7 de outubro de 2024

 

O Conselho de Direcção


terça-feira, 3 de setembro de 2024

Frente Cívica denuncia Boston Consulting Group ao Ministério Público

 

Banco Nacional de Angola, um dos clientes do BCG sob suspeita
Foto: David Stanley from Nanaimo, Canada, CC BY 2.0, via Wikimedia Commons

A Frente Cívica escreveu estar terça-feira à Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, para denunciar o caso de corrupção da filial portuguesa da Boston Consulting Group (BCG) tornado público no final de Agosto pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Através do seu escritório em Lisboa, a consultora internacional subornou pessoas próximas do regime angolano, entre 2011 e 2017, para ganhar contratos naquele país, de acordo com a investigação das autoridades americanas. A Frente Cívica enviou uma denúncia a Lucília Gago, para que o Ministério Público dê conta das diligências que tomou neste caso, ou inicie um inquérito-crime por corrupção no comércio internacional.

Os factos tornados públicos pelas autoridades americanas «configuram com elevadíssima probabilidade crime de corrupção activa com prejuízo do comércio internacional», aponta a Frente Cívica. «Estas condutas devem por isso ser investigadas e punidas em Portugal, onde ocorreram, responsabilizando-se não só os agentes que praticaram os actos apurados pela investigação das autoridades dos EUA, mas a própria empresa, no âmbito da responsabilidade penal que lhe cabe». 

Junta-se, para conhecimento, a carta enviada à Procuradora-Geral da República.


Exma. Sra. Procuradora-Geral da República,

Dra. Lucília Gago

Rua da Escola Politécnica, n.º 140,

1269-269 Lisboa

correiopgr@pgr.pt

 

 

 

 

 

Assunto: Corrupção no comércio internacional: Boston Consulting Group

Data: 3 de Setembro de 2024

 

 

 

Exma. Sra. Procuradora-Geral,

 

Em carta de 27 de Agosto do corrente, tornada pública nos últimos dias (e que anexamos), o Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América revela um esquema de corrupção levado a cabo em Portugal pela empresa de consultoria Boston Consulting Group (BCG) e/ou por vários dos seus agentes e dirigentes, entre 2011 e 2017. Segundo as conclusões da investigação levada a cabo nos Estados Unidos, o escritório da BCG em Portugal pagou subornos a uma figura com ligações ao Estado angolano para obter contratos naquele país, nomeadamente com o Ministério da Economia e o Banco Nacional de Angola. Foram apurados pagamentos de 4,3 milhões de dólares em comissões, processados através de offshores, beneficiando o agente da empresa em Angola, bem como responsáveis do Governo angolano, como contrapartida de contratos no valor de 22,5 milhões de dólares, a que corresponderam lucros de perto de 14,5 milhões.

 

Tais factos – que, de acordo com a carta do Departamento de Justiça dos EUA agora tornada pública, a Boston Consulting Group não contesta – configuram com elevadíssima probabilidade crime de corrupção activa com prejuízo do comércio internacional, previsto e punido pelo Art.º 7º da Lei n.º 20/2008, de 21 de Abril, que criou, com as alterações subsequentes, o regime penal de corrupção no comércio internacional e no sector privado. Estas condutas devem por isso ser investigadas e punidas em Portugal, onde ocorreram, responsabilizando-se não só os agentes que praticaram os actos apurados pela investigação das autoridades dos EUA, mas a própria empresa, no âmbito da responsabilidade penal que lhe cabe, ao abrigo da lei supracitada.

 

Por esta razão, escrevemos a V. Exa. no sentido de inquirir que diligências de investigação pôs em curso o Ministério Público português para apurar responsabilidades pelos crimes cometidos em Portugal pela Boston Consulting Group e pelos seus agentes. Caso não tenha sido aberto qualquer inquérito criminal, rogamos a V. Exa. que considere esta missiva, e o anexo que a acompanha, uma denúncia formal para a abertura do inquérito que se impõe.

 

Com os melhores cumprimentos,

Pela Frente Cívica,

 

Paulo de Morais, Presidente

 

João Paulo Batalha, Vice-Presidente

 

 


quinta-feira, 27 de junho de 2024

Frente Cívica denuncia ilegalidade no Conselho Superior da Magistratura

 

"Supremo Tribunal de Justiça" por schoeband sob licença CC BY-NC-ND 2.0.

A Frente Cívica escreveu esta quinta-feira ao presidente do Conselho Superior da Magistratura  (CSM) denunciando o envolvimento ilegal do vogal José Manuel Mesquita em actividade político-partidária. Mesquita, reeleito na semana passada pelo Parlamento para novo mandato no órgão de avaliação e disciplina dos juízes, foi mandatário financeiro das campanhas eleitorais do PS para as Europeias e as Legislativas deste ano, em violação do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a que estava vinculado enquanto membro do CSM.

«Ao aceitar ser mandatário financeiro de campanhas partidárias, o vogal José Manuel Mesquita violou a lei e reduziu o Conselho Superior da Magistratura a um comissariado de capatazes políticos com poderes de superintendência sobre os juízes. Tal promiscuidade provoca prejuízos inultrapassáveis à independência do Conselho e dos tribunais portugueses», escreve a Frente Cívica. «O facto de, há poucos dias, o mesmo vogal ter sido reeleito para o CSM por maioria qualificada dos deputados à Assembleia da República mostra a displicência com que o Parlamento encara a separação de poderes e convoca o Conselho Superior da Magistratura a actuar, de forma imediata e determinada, em sua defesa», lê-se na carta enviada a João Cura Mariano que, enquanto presidente do Supremo Tribunal de Justiça, é por inerência presidente do Conselho Superior da Magistratura.

Anexa-se a carta enviada, para conhecimento público.


Exmo. Sr. Presidente do Conselho Superior da Magistratura,
Juiz Conselheiro João Cura Mariano,


C/c

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República,
Dr. José Pedro Aguiar-Branco

Exmo. Sr. Presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses,
Dr. Nuno Miguel de Jesus Lopes Matos

 

Assunto: Incompatibilidade do vogal do CSM José Manuel Mesquita

Data: 27 de Junho de 2024

 

Exmo. Sr. Presidente,

O Estatuto dos Magistrados Judiciais, a que estão vinculados os vogais do Conselho Superior da Magistratura (CSM)[1], explicitamente veda “a prática de atividades político-partidárias de caráter público”[2]. Não obstante esta explícita proibição, é público – e poderá ser facilmente constatado junto da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos – que o vogal do CSM José Manuel Mesquita assumiu o papel de mandatário financeiro das campanhas eleitorais do Partido Socialista às recentes eleições para a Assembleia da República, de 10 de Março de 2024, e para o Parlamento Europeu, de 9 de Junho de 2024.

O desempenho de funções partidárias e de campanha eleitoral levanta evidentes e intransponíveis conflitos de interesses com o exercício da magistratura e mais ainda, por maioria de razão, com o exercício de cargos no órgão de cúpula da magistratura judicial. Por essa razão, em boa hora o legislador determinou uma rigorosa incompatibilidade entre a política partidária e a magistratura, ciente de que o princípio da separação de poderes, fundacional para um Estado de Direito democrático, não pode conviver com a existência de comissários eleitorais nos órgãos de cúpula do sistema judiciário.

Ao aceitar ser mandatário financeiro de campanhas partidárias, o vogal José Manuel Mesquita violou a lei e reduziu o Conselho Superior da Magistratura a um comissariado de capatazes políticos com poderes de superintendência sobre os juízes. Tal promiscuidade provoca prejuízos inultrapassáveis à independência do Conselho e dos tribunais portugueses. O facto de, há poucos dias, o mesmo vogal ter sido reeleito para o CSM por maioria qualificada dos deputados à Assembleia da República mostra a displicência com que o Parlamento encara a separação de poderes e convoca o Conselho Superior da Magistratura a actuar, de forma imediata e determinada, em sua defesa.

Pelo exposto, rogamos a V. Exa. que desencadeie os procedimentos necessários e exigíveis para punir a violação da lei pelo vogal José Manuel Mesquita e proteger a imprescindível independência política e partidária do Conselho Superior da Magistratura e do sistema judicial português.

Com os melhores cumprimentos,

Pela Frente Cívica,

 

Paulo de Morais, Presidente

 


João Paulo Batalha, Vice-Presidente

 


[1] Por força do Art.º 148º, n.º 1 da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, Estatuto dos Magistrados Judiciais, na sua redacção actual.

[2] Art.º 6.º-A, n.º 1 do supracitado Estatuto dos Magistrados Judiciais.


quarta-feira, 22 de maio de 2024

Frente Cívica pede afastamento de Lobo Xavier do Conselho de Estado

 

"40 Anos Democracia, 40 Anos PSD no Porto", por PSD - Partido Social Democrata 
sob licença 
CC BY-NC-SA 2.0.

A associação Frente Cívica escreveu esta quarta-feira, 22 de Maio, ao Presidente da República, apelando a que substitua no Conselho de Estado o novo presidente do Conselho Geral e de Supervisão da EDP, Lobo Xavier, apontando o conflito de interesses inerente à acumulação, pelo advogado, das funções de Conselheiro de Estado com as de representante dos interesses económicos e geoestratégicos do Estado chinês, accionista de referência da eléctrica portuguesa.

«Entendemos que esta circunstância o impede de continuar a integrar o Conselho de Estado, por duas ordens de razões. Em primeiro lugar, porque se criam riscos objectivos de que Lobo Xavier possa utilizar a sua condição de Conselheiro de Estado para defender os interesses da EDP e da própria República Popular da China junto da Presidência da República e, por força do seu estatuto, junto dos restantes órgãos de soberania. Por outro lado, é expectável que a informação a que Lobo Xavier aceda enquanto Conselheiro de Estado possa ser, directa ou indirectamente, canalizada para a EDP, ou seja, para a esfera de interesses do Governo chinês, ou usada em seu proveito», lê-se na missiva enviada a Marcelo Rebelo de Sousa.

A Frente Cívica recorda que, na sequência da sua nomeação para o cargo na EDP, Lobo Xavier abandonou outras funções privadas que exercia, para evitar conflitos de interesses - nomeadamente o seu lugar como vice-presidente do BPI. «Ora, é no mínimo estranho que Lobo Xavier tenha de abandonar a administração de um banco, mas se possa manter como membro do Conselho de Estado, onde não parece haver qualquer política (ou prática) de avaliação, prevenção ou resolução de conflitos de interesses e acesso a informação sensível», alerta a associação.

«Assim, para salvaguarda da dignidade institucional do Conselho de Estado, para defesa da integridade nacional e em obediência ao mais elementar bom senso, vimos solicitar a Vossa Excelência que substitua de imediato no Conselho de Estado António Lobo Xavier por outro membro que não coloque Portugal numa tal situação de risco e numa posição tão confrangedora», conclui a carta.

António Lobo Xavier exerce as funções de Conselheiro de Estado a convite do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa.

Junta-se, para conhecimento, a carta enviada nesta data ao Presidente da República:



Sua Excelência Presidente da República

Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa

 

 

ASSUNTO: Conflitos de interesses no Conselho de Estado

 

DATA: 22 de Maio de 2024

 

 

 

Exmo. Sr. Presidente da República,

O Dr. António Lobo Xavier, designado por V. Exa. como membro do Conselho de Estado, foi recentemente nomeado Presidente do Conselho Geral e de Supervisão da EDP, companhia cujo maior accionista é a empresa China Three Gorges Corporation, sociedade cujo capital social é detido a 100% pela República Popular da China. Ao assumir este lugar na EDP, António Lobo Xavier assume também a posição de representante de interesses e homem de confiança da República Popular da China e do Governo de Xi Jinping em Portugal.

Entendemos que esta circunstância o impede de continuar a integrar o Conselho de Estado, por duas ordens de razões. Em primeiro lugar, porque se criam riscos objectivos de que Lobo Xavier possa utilizar a sua condição de Conselheiro de Estado para defender os interesses da EDP e da própria República Popular da China junto da Presidência da República e, por força do seu estatuto, junto dos restantes órgãos de soberania. Por outro lado, é expectável que a informação a que Lobo Xavier aceda enquanto Conselheiro de Estado possa ser, directa ou indirectamente, canalizada para a EDP, ou seja, para a esfera de interesses do Governo chinês, ou usada em seu proveito.

A sensibilidade desta situação é tal e os conflitos de interesses, reais, potenciais ou aparentes são tão evidentes que, noutros contextos, a posição profissional e institucional do Dr. António Lobo Xavier foi profundamente alterada. Com efeito, o Conselheiro abandonou diversas funções em múltiplas entidades privadas, por incompatibilidade com o cargo que agora assumiu na EDP. A título de exemplo, teve de abandonar o cargo de Vice-Presidente do BPI. Ora, é no mínimo estranho que Lobo Xavier tenha de abandonar a administração de um banco, mas se possa manter como membro do Conselho de Estado, onde não parece haver qualquer política (ou prática) de avaliação, prevenção ou resolução de conflitos de interesses e acesso a informação sensível.

Assim, para salvaguarda da dignidade institucional do Conselho de Estado, para defesa da integridade nacional e em obediência ao mais elementar bom senso, vimos solicitar a Vossa Excelência que substitua de imediato no Conselho de Estado António Lobo Xavier por outro membro que não coloque Portugal numa tal situação de risco e numa posição tão confrangedora.

Com os nossos melhores cumprimentos,


Pela Frente Cívica,


Paulo de Morais, Presidente

João Paulo Batalha, Vice-presidente