Banco Nacional de Angola, um dos clientes do BCG sob suspeita Foto: David Stanley from Nanaimo, Canada, CC BY 2.0, via Wikimedia Commons |
A Frente Cívica escreveu estar terça-feira à Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, para denunciar o caso de corrupção da filial portuguesa da Boston Consulting Group (BCG) tornado público no final de Agosto pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Através do seu escritório em Lisboa, a consultora internacional subornou pessoas próximas do regime angolano, entre 2011 e 2017, para ganhar contratos naquele país, de acordo com a investigação das autoridades americanas. A Frente Cívica enviou uma denúncia a Lucília Gago, para que o Ministério Público dê conta das diligências que tomou neste caso, ou inicie um inquérito-crime por corrupção no comércio internacional.
Os factos tornados públicos pelas autoridades americanas «configuram com elevadíssima probabilidade crime de corrupção activa com prejuízo do comércio internacional», aponta a Frente Cívica. «Estas condutas devem por isso ser investigadas e punidas em Portugal, onde ocorreram, responsabilizando-se não só os agentes que praticaram os actos apurados pela investigação das autoridades dos EUA, mas a própria empresa, no âmbito da responsabilidade penal que lhe cabe».
Junta-se, para conhecimento, a carta enviada à Procuradora-Geral da República.
Exma. Sra.
Procuradora-Geral da República,
Dra. Lucília Gago
Rua da Escola
Politécnica, n.º 140,
1269-269 Lisboa
Assunto: Corrupção no comércio
internacional: Boston Consulting Group
Data: 3 de Setembro de 2024
Exma. Sra.
Procuradora-Geral,
Em carta de 27 de
Agosto do corrente, tornada pública nos últimos dias (e que anexamos), o
Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América revela um esquema de
corrupção levado a cabo em Portugal pela empresa de consultoria Boston
Consulting Group (BCG) e/ou por vários dos seus agentes e dirigentes, entre
2011 e 2017. Segundo as conclusões da investigação levada a cabo nos Estados
Unidos, o escritório da BCG em Portugal pagou subornos a uma figura com
ligações ao Estado angolano para obter contratos naquele país, nomeadamente com
o Ministério da Economia e o Banco Nacional de Angola. Foram apurados
pagamentos de 4,3 milhões de dólares em comissões, processados através de
offshores, beneficiando o agente da empresa em Angola, bem como responsáveis do
Governo angolano, como contrapartida de contratos no valor de 22,5 milhões de
dólares, a que corresponderam lucros de perto de 14,5 milhões.
Tais factos – que,
de acordo com a carta do Departamento de Justiça dos EUA agora tornada pública,
a Boston Consulting Group não contesta – configuram com elevadíssima
probabilidade crime de corrupção activa com prejuízo do comércio internacional,
previsto e punido pelo Art.º 7º da Lei n.º 20/2008, de 21 de Abril, que criou,
com as alterações subsequentes, o regime penal de corrupção no comércio
internacional e no sector privado. Estas condutas devem por isso ser
investigadas e punidas em Portugal, onde ocorreram, responsabilizando-se não só
os agentes que praticaram os actos apurados pela investigação das autoridades
dos EUA, mas a própria empresa, no âmbito da responsabilidade penal que lhe
cabe, ao abrigo da lei supracitada.
Por esta razão,
escrevemos a V. Exa. no sentido de inquirir que diligências de investigação pôs
em curso o Ministério Público português para apurar responsabilidades pelos
crimes cometidos em Portugal pela Boston Consulting Group e pelos seus agentes.
Caso não tenha sido aberto qualquer inquérito criminal, rogamos a V. Exa. que
considere esta missiva, e o anexo que a acompanha, uma denúncia formal para a
abertura do inquérito que se impõe.
Com os melhores
cumprimentos,
Pela Frente Cívica,
Paulo de Morais, Presidente |
João Paulo Batalha, Vice-Presidente |