Fica por ali imóvel
admirando as congeminações do tempo que corre
dá-lhe corda.
O tempo é como a corrente do rio
é esse lugar comum de ficar em cima da ponte em transe
a vê-lo passar ou se morde o isco.
Nesse entretanto
cresce a sua dor e avista o avião comercial que se aproxima
será dentro de pouco tempo o barulho dos seus motores ensurdecedor.
Aguarda agora paciente a sua vez
naqueles propósitos e no seu comportamento exemplar
nem parece um rapaz deste tempo.
Espreita para a esquerda da estação
a melancolia dos carris estende-se sem se encontrar até ao infinito
o tempo do comboio não é o seu.
Vai devagar
aparentemente, terá muito tempo
ninguém lhe poderá dizer qual o tempo que lhe pertence.
Pode ter vindo da guerra
pela forma furtiva de se deslocar
no compasso de espera deflagra o solitário ricochete de um olhar.
Não se precipita
deixa que as coisas aconteçam pois o que tem demais é tempo
e o desespero, no dilema de o perder ou de saber esperar.
Até ao crepúsculo na sua timidez vive escondido
agora vai ser a hora dos lobos
e a sua que envergonhadamente lhe veste a pele.
Haveria de chegar à sua altura
do sol brilhar e da colheita dos frutos
não contou porém de que apenas a morte, o tempo nos dá como certa.
Sai de casa e corre mas perde o autocarro
na sua cabeça mil e uma tarefas e assuntos se acotovelam
perde contra o cronómetro, a multidão e os lugares, ele é o seu contratempo.
Esperava sentado no banco do jardim
apagaram-se os risos das crianças, a solidão dos velhos decorados de flores
ficou ali à sua espera com a noite e a lua, ela odiava que se atrasasse aos encontros.
Foi apenas um instante de lucidez, sem pestanejar
e saltou para o precipício e acendeu um sorriso
saltou para dentro do tempo que ali ninguém o iria procurar para o prender.
O passageiro do tempo
não tem nem rugas, cabelos brancos, nem silêncios amadurecidos
em êxtase olha a paisagem, quem está de viagem na vida nunca morre, será que existe?
Pesa na sua memória a pedra de calcário
relógio de sol e altar no horizonte que lhe oferecia o amanhecer
depois da clepsidra esvaziar as longas noites da infância.
Olhava-te como se nada mais existisse
as palavras, o movimento dos seus gestos definiam as estações, a noite e o dia
e se abraçasse o seu corpo o tempo possuía.
Lisboa, 24 de Março de 2013
Carlos Vieira
Imagem de autor desconhecido