«No dia 20 de maio de 1941, Ian Fleming, o futuro autor dos romances da série James Bond, registou-se no Hotel Palácio, no Estoril, e descreveu a sua ocupação como um simples funcionário governamental. Na verdade, Fleming estava em Lisboa como parte do seu trabalho na Operação Golden Eye [...] para os serviços secretos da marinha britânica. O plano seria implementado na eventualidade de uma invasão da Espanha pelos alemães [...] A estada de Fleming em Lisboa foi passada a lidar com o lado português da operação e a tratar dos preparativos com os diretores dos postos de Lisboa com vista à potencial implementação dessa operação. Também passou algum tempo com o seu velho amigo David Eccles, do Ministério da Guerra Económica. Fleming estava em trânsito e viera de Inglaterra para Lisboa com destino aos Estados Unidos.
«O serviço de hidroaviões da Pan Am a partir de Lisboa era um serviço popular para os agentes britânicos, que também usavam os voos da BOAC [...]. Fleming chegou à doca de hidroaviões de La Guardia, em Nova Iorque, na tarde de 25 de maio de 1941. Fleming e o seu dirigente, o almirante John Godfrey - que viria a ser, em parte, a inspiração para a personagem ficcional M nos romances da série Bond [...].
«Durante uma visita a Tânger, Fleming exibira alguns dos traços de teatralidade de James Bond ao alugar uma avioneta privada para poder regressar a Lisboa o mais depressa possível. Os seus relatórios de serviço revelam que apresentou cento e dez libras de despesa relativa ao uso dessa avioneta. [...]
«Na sua segunda noite no Estoril, Fleming e Godfrey passaram o seu tempo no casino, que estava invulgarmente sossegado e onde Fleming jogou à mesa apostando montantes relativamente modestos e perdeu. Quando estava prestes a sair do casino, virou-se alegadamente para Godfrey e disse algo como: e se aqueles homens sentados à mesa do jogo fossem agentes alemães e lhes tivéssemos ganho o dinheiro? Crê-se que esse incidente serviu de inspiração a uma cena do primeiro romance da série James Bond, Casino Royale, na qual Bond faz justamente isso ao malvado espião comunista Le Chiffre.»
Neill Lochery - Lisboa: a Guerra nas sombras da cidade da luz, 1939-1945. Barcarena: Presença, 2012, p. 145-146