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sábado, 9 de setembro de 2023

quando o poema ganha outra dimensão


O vento forte da vida nos mantém nessa praia lírica da amizade, do afeto, da delicadeza, querida Mona Gadelha, desde tanto mar dentro de nós. Meu coração abraça o seu. Amores que estendem os braços.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

todas as metades

Meu primeiro poema musicado foi Ventania, do livro Roteiro dos pássaros, Editora Lourenço Filho, 1981, por Ricardo Augusto.

Não sou um letrista para canções. Sou apenas um poeta aprendiz e escrevo poemas para “dar coerência aos sonhos”, como disse Pirandello. A poesia tem sua musicalidade. Mas quando um poema, já com seu corpo definido, ganha uma melodia, ele se engrandece, ganha uma alma, uma outra dimensão. O poema se duplica. E se triplica na audição do outro.
A melodia está lá, na extensão de cada verso, no fôlego de cada palavra, na rima de uma emoção. O poeta não se dá conta. A escrita é uma canção embutida. Vem o músico e encontra as notas, porque só a ele cabe o sol que ilumina dó-ré-mi-fá-lá-si.

Depois de Ricardo Augusto, outros compositores cearenses desenharam música em alguns poemas, Bernardo Neto,
Calé Alencar
,
Parahyba de Medeiros
,
Alan Morais
,
Zé Rodrigues
,
Charles Wellington
,
Gildomar Marinho
,
Evaristo Filho Freitas
,
Eugênio Leandro
, o carioca Berto Mendes e o goiano-brasiliense
Rubi
. É sempre uma saudável perplexidade o encontro com a outra margem do rio.
Recentemente Alan Morais e Zé Rodrigues postaram no Spotify os EPs com as parcerias, respectivamente, Lunar e Metade, publicados no meu livro Poesia provisória,
Editora Radiadora
, 2019. No mesmo serviço de streaming está Ventania, gravada por
Mona Gadelha
no disco Cidade blues rock nas ruas, Brazilbizz, 2013, e também no DVD do show apresentado na Caixa Cultural de Fortaleza, 2014.
Abaixo, os links de cada uma. Grato a todos os parceiros pelas metades que somamos.

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

consolo na praia - encontro e desencontro em agostos

O primeiro poema que li, ainda criança se alfabetizando, foi Mãos dadas, de Carlos Drummond de Andrade, publicado em O sentimento do mundo, de 1940. Desde então nunca mais larguei as mãos do poeta.

Quando publiquei meu primeiro livro, Roteiro dos pássaros, em 1981, coloquei versos de vários de seus poemas como epígrafes nos capítulos. Um ano depois, consegui o endereço de Drummond com o poeta amigo Marcio Catunda e enviei-lhe um exemplar.
Meses depois, em agosto de 1982, recebo um cartão-cartinha-cartografia afetiva, agradecendo-me o livro, elogiando meus poemas aprendizes, transcrevendo um verso que gostou, deixando-me em estado de pleno êxtase sereno. Outras trocas de correspondências, sempre sobre literatura, continuaram por um tempo. Da rua Conselheiro Lafaiete, em Copacabana, no Rio, para rua Barão de Aracati, na Praia de Iracema, em Fortaleza. E vice-versos em meu coração. Aquele que me inspirou e me guiou na poesia tornou-se meu missivista, e eu devotava-lhe todo o sentimento do mundo.
No começo de agosto de 1987 eu estava no Rio de Janeiro quando soube da morte de Maria Julieta, filha do poeta. Apegadíssimo a ela, a quem chamava de “meu melhor poema”, ao receber a notícia Drummond disse ao médico que o atendia: “Doutor, receite-me um infarto fulminante.”
Meu propósito de conhecê-lo pessoalmente, como estava se encaminhando naquela viagem, foi deixado de lado. O poeta em luto se recolhera, eu mais distante me guardei.
Na noite de 17 de agosto, colocando na mala uns exemplares de seus livros que levei para dedicatórias, ouço Cid Moreira anunciando a morte do poeta, vítima do que pediu ao médico na receita. Drummond foi ao encontro do "melhor poema" doze dias depois, aos 84 anos.
Restou-me, muito tempo passado, à falta de rima e solução, um encontro no banco do calçadão da praia, numa tarde também de agosto. Ficamos de mãos dadas. “O tempo é a minha matéria, o tempo presente", pareceu-me dizer, de costas para o mar, de frente para o mundo, vasto mundo.
Como ele escrevesse para mim num agosto em que nos encontramos em cartas, como eu pedisse a ele num agosto que não nos vimos em sua casa, ousei naquele dia uma colagem de versos de dois poemas, Consolo na praia e Poema da necessidade, que cabe neste agosto sombrio de 2020 em que sobrevivemos isolados em nossas casas.
Vamos, não chores.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

É preciso viver com os homens,
é preciso não assassiná-los.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.

Mas a vida não se perdeu.
Mas o coração continua.
É preciso salvar o país,
é preciso crer em Deus.

sexta-feira, 31 de julho de 2020

galope

O corpo do homem
é um cavalo
onde
a alma põe a sela
e dispara no mundo
- o galope da existência
é um fato mágico
um mistério profundo
uma revolução eterna.

As esporas dos dias
atiçam o meu corpo
pelo sertão do mundo
e com as rédeas dos braços
cavalgo
pela trajetória contínua do sol
com a vida ferrada
nos olhos
e os segredos nos alforjes do peito.

Jogado no mundo
não há como se escapar:
todo passo
é decisivo
todo caminho
dá para o norte
todo corpo
é um gibão sobre a alma
toda a vida
é o lado externo da morte
todo peito
é um roçado
para toda safra
ser das rosas.

.............................................................................
Poema de meu primeiro livro ©Roteiro dos pássaros, 1981, Prêmio Filgueiras Lima de Poesia, Editora e Gráfica Lourenço Filho, Fortaleza, Ceará.
O escritor amigo Carlos Emílio Corrêa Lima, parceiro da geração do Grupo Siriará de Literatura, sempre “me cobra” uma nova edição do livro. À época a tiragem foi de 1000 exemplares, e hoje me surpreendo quando encontro um exemplar no site Estante Virtual a preço de raridade.
Outro dia, o poeta amigo de Brasília, Domingos Pereira Netto, lembrou que em 2021 o livro fará 40 anos de publicação, e merece uma edição comemorativa.
Juntando a “cobrança” de um com a lembrança de outro, no próximo ano será lançada, pela Editora Radiadora, uma edição com tiragem limitada, revisada e com mais um prefácio.
Na edição de 1981:
Projeto gráfico, capa: Rosemberg Cariry
Prefácio: F. S. Nascimento
Textos da contracapa: F. S. Nascimento e Artur Eduardo Benevides
Foto: Celso Oliveira Fotógrafo

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

intimidade

O teu silêncio é íntimo.
O teu quarto,
a tua roupa pendurada no cabide,
o quadro na parede é íntimo.
Íntimo é o teu olhar,
as tuas lembranças,
a tua saudade,
as tuas cartas rasgadas
nunca mandadas são íntimas.

Uma canção gemida
nos teus lábios
é íntima como o beijo leve,
como o abraço profundo,
como o golpe da lâmina,
como o sangue jorrado.

Íntimo é o teu modo
de pentear os cabelos diante do espelho,
o cortar das unhas,
o escovar dos dentes.
O teu banheiro é íntimo,
mais íntimo é o teu sexo.

As tuas artimanhas
no ventre são íntimas.
O teu medo é íntimo,
o teu suor nas axilas,
o pulsar do teu coração,
o teu sono sobre o travesseiro.

Íntimo é a escuridão
da tampa do ataúde
quando na tua carne morta.

Íntimo é o teu depois.

....................................................................

Poema de meu primeiro livro Roteiro dos pássaros, 1981, Prêmio Filgueiras Lima de Poesia, Editora e Gráfica Lourenço Filho, Fortaleza, Ceará.

O escritor amigo Carlos Emílio Correia Lima, parceiro da geração do Grupo Siriará de Literatura, sempre “me cobra” uma nova edição do livro. À época a tiragem foi de 1000 exemplares, e hoje me surpreendo quando encontro um exemplar no site Estante Virtual a preço de raridade.

Outro dia, o poeta amigo de Brasília, Domingos Pereira Netto, lembrou que em 2021 o livro fará 40 anos de publicação, e merece uma edição comemorativa.

Juntando a “cobrança” de um com a lembrança de outro, no próximo ano será lançada, pela Editora Radiadora, uma edição com tiragem limitada, revisada e com mais um prefácio.

Na edição de 1981:

Projeto gráfico, capa: Rosemberg Cariry
Prefácio: F. S. Nascimento
Epígrafe: Carlos Drummond de Andrade
Textos da contracapa: F. S. Nascimento e Arthur Eduardo Benevides
Foto: Celso Oliveira






sexta-feira, 13 de setembro de 2019

arqueologia dos afetos

Numa tarde de um dia qualquer, mas especial, do comecinho dos anos 80, em Fortaleza, o meu amigo compositor Ricardo Augusto entra na sala de audiovisual da Centro de Referência Cultural, da Secretaria de Cultura, onde eu trabalhava, com um violão e o cantor Lucio Ricardo. O órgão estadual ficava nos andares da Biblioteca Pública Menezes Pimentel, hoje integrada arquitetonicamente ao Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.

De um janelão, eu via os históricos galpões da antiga área portuária, o centenário prédio da Alfândega (hoje Caixa Cultural)... Meus olhos de planador sobrevoavam os telhados, chegavam à praia de Iracema e se perdiam no mar... Assim, os primeiros versos do meu poema Ventania foram paridos nessa brisa vespertina.

Passei meses com os rascunhos no bolso, sempre mexendo quando alguma palavra precisava ser tirada, alguma pontuação precisava melhorar o ritmo da leitura. Convivendo com o poema antes de escrevê-lo, como ensinava Drummond. Finalizado, foi publicado no meu primeiro livro, Roteiro dos pássaros. E nele Ricardo Augusto leu, e musicou, num dos mais belos e gratificantes encontros de verso e melodia. Cantou para mim com sua voz de Beto Guedes em Albey Road e me desmanchei em alegria. Não sou letrista, e o poema se fez canção.

Pois naquela tarde Ricardo adentra a sala com Lucio Ricardo para gravar a composição. Ele, o bandleader de voz única da lendária banda de blues e rock Perfume Azul, que eu “perseguia” na adolescência nos shows na década de 70. E de forma empolgante e artesanal, gravamos num dinossáurico AKAI, em fita de rolo BASF, ¼ de polegada, um canal, Lucio cantando Ventania e Ricardo ao violão.

Em 2013, a cantora Mona Gadelha grava a música em seu disco Cidade blues rock nas ruas, num arranjo coletivo belíssimo de estúdio, com a produção de Alexandre Fontanetti. Ela, a minha musa do blues e da cor dos meus sonhos, que eu “perseguia” nos shows do IBEU e da arena da CREDIMUS.

Como se não bastasse a versão blues-standard-banquinho-e-violão de Lúcio Ricardo, Mona me presenteia com sua interpretação visceralmente mergulhada na letra e melodia, sua voz desenhando meu canto feminino sobre o mar.

O poema é uma tentativa de reflexão existencial, tão comum, e necessária, na inquietação e perplexidade que inspiram os poetas em seus primeiros rabiscos. Ricardo Augusto vestiu com melodia uma letra sem rima, que se destinava ali mesmo na limitação de um poema num livro. Lucio Ricardo e Mona Gadelha despiram a alma do poema com suas interpretações únicas.

E assim se marcam os encontros que o universo trama, cristalizam os afetos que “estendem os braços / como se fossem mágicos”, como digo em um verso.

No ano de lançamento do disco de Mona Gadelha, o cineasta Valdo Siqueira concebeu e dirigiu o clipe de Ventania (já postado aqui, https://youtu.be/dl0AzBBaxIk). E mais uma vez, como se não bastassem Ricardo, Lúcio e Mona, o cinema, que é igualmente minha praia lírica, dá mais um corpo a um poema-que-se-tornou-música-imagem. Valdo, como um Dziga Vertov na praia de Sabiaguaba, expressa com sua câmera a sinestesia dos versos que “atravessam o mar / como se fossem pássaros”.

O músico Kildare Rios posta nesta manhã de sexta-feira, em seu canal no Youtube, o clipe da gravação do neolítico áudio de Lúcio Ricardo, criando e mixando afetuosamente em estúdio os arranjos, colando digitalmente imagens que ele vê na letra. E assim, mais uma vez, como se não bastassem Ricardo, Lúcio, Mona e Valdo, Kildare dá um corpo carinhosamente singelo de um poema que nunca pensou em ser canção.

A ventania ficou calmaria nos corações entrelaçados.

Gratidão a vocês.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Ventania

O vento forte da vida
assanha os meus cabelos,
molda o rosto,
apaga os passos.

Mas a minha existência
não se limita ao tamanho do corpo:
tenho todo um rosário de dias
e amores que estendem os braços
como se fossem mágicos
e olhos que atravessam o mar
como se fossem pássaros.

Poema do meu primeiro livro, Roteiro dos Pássaros, musicado por Ricardo Augusto, belamente interpretado e gravado por Mona Gadelha em seu disco Cidade blues rock nas ruas, 2013. Lucio Ricardo também encanta com sua interpretação visceralmente blues.
Os dois grandes da música cearense estarão amanhã, sexta-feira, no lançamento-sarau do meu novo livro Poesia Provisória.
No dia do meu aniversário, o presente presença de tanta gente querida em meu coração.
Livraria Lamarca, 19h
Av. da Universidade, 2475, Fortaleza, CE

domingo, 21 de outubro de 2018

intimidade


O teu silêncio é íntimo.
O teu quarto,
a tua roupa pendurada no cabide,
o quadro na parede é íntimo.
Íntimo é o teu olhar,
as tuas lembranças,
a tua saudade,
as tuas cartas rasgadas
nunca mandadas são íntimas.

Uma canção gemida
nos teus lábios
é íntima como o beijo leve,
como o abraço profundo,
como o golpe na lâmina,
como o sangue jorrado.

Íntimo é o teu modo
de pentear os cabelos diante do espelho,
o cortar das unhas,
o escovar dos dentes.
O teu banheiro é íntimo,
mais íntimo é o teu sexo.

As tuas artimanhas
no ventre são íntimas.
O teu medo é íntimo,
o teu suor nas axilas,
o pulsar do teu coração,
o teu sono sobre o travesseiro.

Íntimo é a escuridão
da tampa do ataúde
quando na tua carne morta.

Íntimo é o teu depois.




segunda-feira, 13 de março de 2017

colheita



"todo peito
é um roçado
para toda safra
ser das rosas."

Do meu poema Galope, livro Roteiro dos pássaros, 1981 

sexta-feira, 10 de março de 2017

a quem interessar possa

À época, a tiragem foi de 1000 exemplares. Não sei quantos vendidos na noite de lançamento, não me lembro quantos ficaram comigo e doei todos para amigos, não tenho ideia de quantos deixei nas livrarias em consignação, uma quantidade ficou com a Fundação Lourenço Filho, em Fortaleza, que patrocinou a publicação como prêmio do concurso... e um exemplar guardo como troféu na minha estante real.
Agora o site Estante Virtual tem um único exemplar disponível a preço de raridade.
A poesia é gratificante por isso, e expressa exatamente aquilo que não permito que me empreendam: o recolhimento do meu voo, a desfaçatez de dizerem que o Ícaro em que acredito não pode seguir viagem.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

de mãos dadas com Drummond

No meio do meu caminho tinha O poeta: Carlos Drummond de Andrade.

O primeiro poema que li ainda me alfabetizando foi "Mãos dadas". Aqueles versos serviram-me como guia, "o presente é tão grande, não nos afastemos...", como uma cartilha pa
ra aquele menino despertado pela poesia, "o tempo é a minha matéria, do tempo presente, os homens presentes, a vida presente." Desde então, vim de mãos dadas com Drummond. Nenhum outro poeta me influenciou tanto nas minhas inquietações quanto ao sentimento do mundo: Pessoa, Bandeira, Cecília, Régio, Quintana, Gullar,
Manoel de Barros, Cabral, Faustino Whitman, Eliot, Rimbaud, todos eles entenderam minhas idas a Itabira.


Quando publiquei o meu primeiro livro, "Roteiro dos pássaros", em 1981, todos os capítulos foram abertos com epígrafes de versos de Drummond. Não tinha outro jeito, foi muito natural, e definia bem a minha poesia aprendiz. Meu amigo poeta Márcio Catunda tinha o contato de Drummond no Rio de Janeiro, aliás, tinha até foto com ele, o que me deixava cheio do quinto pecado... E eu lá me importava com isso! Mandei o livro para o meu mestre. Dias depois tive uma das maiores alegrias da minha vida: uma carta de Drummond! Um envelope com meu nome, meu endereço subscrito, um cartão personalizado com sua letra miúda agradecendo-me o exemplar, a honra dos epígrafes, e o elogio reescrevendo um verso meu. A gesto de Drummond foi o melhor poema que não escrevi.

Amanhã ele faria 110 anos. Algumas comemorações se espalham por aí. No Rio haverá um recital em frente a estátua no calçadão em Copacabana. Aqui em Brasília, na livraria Sebinho, 406 Norte, poetas referenciarão o poeta maior. Estarei lá, Drummond, sempre grato por suas mãos dadas, "nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas."

sábado, 15 de setembro de 2012

galope

O corpo do homem
é um cavalo
onde
a alma põe a sela
e dispara no mundo
- o galope da existência
é um fato mágico
um mistério profundo
uma revolução eterna.
 
As esporas dos dias
atiçam o meu corpo
pelo sertão do mundo
e com as rédeas dos braços
cavalgo
pela trajetória contínua do sol
com a vida ferrada
nos olhos 
e os segredos nos alforjes do peito.
 
Jogado no mundo
não há como se escapar:
todo passo 
é decisivo
todo caminho
dá para o norte
todo corpo
é um gibão sobre a alma
toda a vida
é o lado externo da morte
todo peito
é um roçado
para toda safra
ser das rosas.
 
(do livro "Roteiro dos pássaros, 1981)
 

sábado, 25 de agosto de 2012

ventania

Ricardo Augusto musicou belamente meu poema "Ventania", Lúcio Ricardo gravou belamente com sua voz.  A felicidade é isso, também. É ver, ouvir um texto que se escreveu sem necessariamente com o propósito de musicá-lo, e depois, ouvir esse texto em melodia, devidamente colocado em suas pontuações e sentimentos expressos. Eu não sou um letrista para canções. Sou apenas um poeta e escrevo poema como quem parte. A poesia tem sua musicalidade. E quando um poema já com seu corpo definido ganha uma melodia ele se engrandece como quem ganha uma alma, uma outra essência, ele ganha outra beleza de leitura, ele se duplica. E se triplica na audição de terceiros, para quem no fundo um trabalho é direcionado: para todos. Depois que Ricardo Augusto musicou esse poema, publicado no meu primeiro livro, "Roteiro dos pássaros", de 1981,  leio como se ele tivesse renascido sem nunca ter findo. O artista é finito, a arte atravessa o mar, amplia-se no tempo. A arte é maior. A voz de Lúcio Ricardo sobre meu poema dá a ele uma autoria, porque no momento que ele interpreta reescreve o poema que Ricardo Augusto musicou, que pari num momento da minha vida tentando entender o que os meus olhos miravam. "Ventania" agora não é mais meu, é também dos dois Ricardos.
 

terça-feira, 15 de maio de 2012

dor

o
     odor
  da dor
    a dor
       dor
              dormido
                     ido
                                 o amor:
                                       morte.

(do livro "Roteiro dos pássaros ")