Mostrar mensagens com a etiqueta formação de professores. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta formação de professores. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, outubro 06, 2011

"Mudaste a minha vida"

Há poucas semanas encontrei-me com duas amigas, mãe e filha, encontro onde conheci o recente marido da última. Nessas coisas que se dizem em apresentações, a mãe mencionou-me como tendo sido "professora" de Matemática da I.
Entre aspas, pois não fui professora da I. Apenas a acompanhei quando, com 11 anitos, começou a vir a minha casa porque a mãe estava preocupada não só com o muito pouco gosto da I. pela Matemática, como também com a professora, com formação para a lecionação de Ciências e pouco dada ao ensino da referida disciplina.
E a I. (agora já na casa dos 30) aqui continuou a vir até meados do seu 10º ano, em que já ia longe o tempo da nota positiva "pequenina". E ainda bem que esse tempo ia longe, pois precisou de alta média em Matemática para o curso que seguiu.

Até aqui, nada de especial nesta estória. Mas, o que foi especial, o que foi não digo revelação, mas alguma surpresa, foi a I. ter-me dito: "Sem dúvida que mudaste a minha vida, e sei isso bem; eu detestava a Matemática e hoje é com ela que lido todos os dias".

Não, não fui eu, foi ela, pois o mérito do trabalho e da responsabilidade foi dela desde pequenita. Contudo, ainda agora estou a vê-la ali na mesa comigo, e a ouvi-la logo num dos primeiros dias em que cá veio, 11-12 anitos: "Ah! Que engraçado! Nunca me tinham explicado isso assim!" Como também ainda me lembro que foi essa expressão "que engraçado" que me fez logo pensar que não ia ser difícil mudar a sua aversão à matemática em gosto.

Por favor, não deixem avançar a ideia dos professores generalistas para o 2º Ciclo! Sendo muito importante um bom 1º Ciclo, não deixa de ser verdade que é no 2º que verdadeiramente se inicia a Matemática, e que este ciclo pode ser decisivo para o bem ou para o mal do futuro de muitos alunos.

segunda-feira, junho 20, 2011

Comentário ao discurso do novo Ministro da Educação

O discurso já é bem conhecido e pode ser ouvido AQUI.
Comentei-o na rede Interactic 2.0, pelo que me limito a copiar para aqui esse meu comentário, com alguns pequenos prolongamentos.

-Começando por apontar um ponto positivo: Valorizar os professores. Mas, onde fez Nuno Crato ouvir a sua voz quando, após a LBSE, a formação dos professores de Matemática do Ensino Básico, especialmente do crucial 2º Ciclo(falo desta disciplina porque a lecionei durante 37 anos, primeiro no 2º Ciclo - e ainda no "Ciclo Preparatório" da Reforma Veiga Simão -, depois no 3º Ciclo), baixou muitíssimo de qualidade, juntando a formação científica à formação pedagógica, praticamente eliminando verdadeiros estágios pedagógicos, tudo com a mesma duração que antes tinha a formação científica? E com que força procurou opor-se ao ainda pior Novo Regime de formação de professores, quando do processo de Bolonha? (Não tenho voz pública, mas, no meu humilde blogue, muito denunciei tudo isso)

-"Ensino em espiral":  NC critica, e valoriza conteúdos, mas esquece que, no E. Básico, além de uma boa preparação nos conhecimentos, essencial para os alunos que virão a prosseguir para áreas com Matemática ( e boa preparação a nível de conhecimentos não é simplesmente  decorá-los de modo a não serem esquecidos até realizarem exames), é fundamental criar os hábitos (e o gosto) de raciocinar, de rigor, de pensar criticamente, e proceder desde relativamente cedo à iniciação em CONCEITOS, os quais só ficam elaborados por sucessivas retomas. A matemática do (decorar) "como se faz" em nadinha contribui para a Formação Matemática e desenvolvimento do pensamente rigoroso sem a aquisição de conceitos, e estes só ficam elaborados após o tal "ensino em espiral" (que Nuno Crato de algum modo caricaturiza - talvez se encontre aí a explicação para a falta de rigor de alguns dos seus escritos, nada própria de um matemático)

- Nunca adopto a expressão "Ciências da Educação" (e gosto de ter no meu registo biográfico "mestrado em Educação", pelo Departamento de Educação da FCUL - departamento que é avesso à expressão acima). Mas muito importantes são as Ciências tais como Psicologia Cognitiva, Psicologia da Aprendizagem", etc., do âmbito da investigação científica (essas sim, Ciências), pelas suas aplicações em educação-ensino-aprendizagem. NC tem na sua cabeça um "eduquês" que ridicularizou com bastante ignorância e recurso a método nada próprio de quem deveria ter rigor intelectual, como já disse acima - um "eduquês" completamente irreal nas escolas.
O que não é compatível, é juntar a formação científica sólida (o professor tem que saber bem mais do que o que tem que ensinar a determinadas idades) com essas ciências num curso de formação inicial com a mesma duração que tinha no meu tempo só a licenciatura científica especializada. E os verdadeiros estágios pedagógicos foram tornados caricaturas de estágios por motivos economicistas (pelo menos para lecionar 2º Ciclo, onde tive o que guardo como triste memória quando, uma única vez, aceitei ser professora cooperante - não confundir com professor orientador). NC denuncia o actual regime de formação inicial de professores, relacionado com o Processo de Bolonha, mas não diz que vai ter coragem para o alterar.

- Por último: NC tem-se mostrado assustadoramente retrógado, pois tem insistido na sobreposição dos conteúdos e na memorização, desvalorizando os processos. Além de que mais exames pressionarão os professores para o treino para estes, quando a aprendizagem da Matemática, precisando, claro, também de treino, não chega a ser aprendizagem que dure sem os processos que levam os alunos ao pensar, à compreensão, e ao ganho de autonomia numa relação com gosto e com esforço no prosseguimento do estudo dessa disciplina.

Perdoem-me o pecado de pouca humildade, mas tenho que dizer que tenho autoridade para opinar pois os meus alunos sempre provaram prosseguir bem preparados, e, no respeitante ao 9º ano, quer aqueles a quem atribuí o nível mais elevado (5) mantiveram, na escala de notas do Secundário, a excelência (própria das elites sobre as quais parece predominar o pensamento de NC), quer alunos a quem atribuí aquele nível 3 "baixinho" e prosseguiram para a escolaridade não obrigatória, aguentaram-se muitas vezes até para além das minhas expectativas. (Eu tinha notícias de quase todos porque a Escola Secundária era ao lado da minha E2,3).
Eu seria decerto apelidada por NC de "eduquesa", mas, por minha vez, eu considero-o não "moderno", mas sim com um pensamento extraordinariamente antiquado e voltado para as elites de alunos. Revela-o pouco no vídeo, mas não é pelo vídeo que eu o conheço (que nós o conhecemos).

segunda-feira, setembro 06, 2010

TIC... mais TIC... e mais TIC no ensino

Nota prévia
O que se segue é escrito com absoluta isenção, pois fui pioneira, na minha ex-escola, na 'introdução do computador na sala de aula', no tempo em que os alunos não tinham "magalhães" e só tinha uma sala com os primeiros computadores que a escola conseguiu - sala para onde apenas eu levava as minhas turmas, sem problema de não estar vaga.
_____________________
Perdi-me com tantos "reajustamentos" no modelo da ADD, pelo que não sei bem se o uso das TIC ainda conta para a pontuação na avaliação dos professores, mas suponho que ainda conta.
Ora, um método de ensino não vale por si só, vale pelo que o professor fizer com ele. Não há padrões, muito menos um padrão único. O que me parece essencial é que o ensino-aprendizagem assente num método verdadeiramente activo, de modo a conduzir os alunos, sempre que possível, à (re)descoberta, e à construção da sua relação com o(s) saber(es). E seria um erro, a meu ver, que o professor, ao interiorizar isto, se forçasse a pôr em prática modelos/métodos que não sejam já significativos para si. Das teorias e dos artigos fundamentados que não faltam, o professor recolhe novas perspectivas, e o que delas fica nele é o que pessoalmente (re)constrói no alargamento e aprofundamento da sua prática, não na demolição de tudo o que já construiu no seu modo de ensinar.

Isto leva-me à questão da formação (sem dúvida urgente) dos professores no uso das novas tecnologias. É verdade que, actualmente, não estou a par do modo como essa formação decorre e de quem a dá. Mas lembro-me que, quando essa formação começou nos centros de formação, no âmbito da formação contínua obrigatória para obtenção dos créditos então indispensáveis para mudança de escalão, quem escolhia uma acção relacionada com as ditas TIC recebia uma formação meramente técnica, sem ligação à Pedagogia (apesar de o formador ser professor).
Claro que os professores têm que aprender os aspectos técnicos do uso de recursos informáticos - se não os souberem, caso que até já pouco sucederá com as novas gerações de docentes. Mas a formação tem que ser dada por pedagogos, por professores abertos à inovação e conscientes de que o uso de recursos informáticos nas aulas em nada melhora as aprendizagens dos alunos se esses recursos forem usados na manutenção de um ensino tradicional, expositivo, em que os alunos não são chamados a construir, a criar, a serem agentes activos.
E é para isto que o formador tem que estar apto a sensibilizar os formandos e a dar-lhes perspectivas de recursos diversos a fim de que cada um possa sentir apelo e motivação de acordo com a sua apetência, de acordo com o que seja mais significativo para si próprio, de modo a sentir-se atraído pela inovação ou pelo desejo/necessidade de mudança face a eventuais (ainda há muitos - demasiados) métodos retrógados anquilosados.

A finalizar, deixo o pedido a quem eventualmente me leia e esteja informado, de me esclarecer: Estão a ser assim, generalizadamente, as formações dos professores no uso das TIC? (Digo generalizadamente porque não duvido de que há formadores nessa área - e até conheço dois ou três - que é nessa perspectiva de real mudança que se esforçam por sensibilizar os seus formandos).

quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Recordando o grande Piaget em duas questões primordiais e tão pouco debatidas

___________
(Com uma pequena mudança na data, reponho o post de há quatro dias atrás. É que, afinal, apeteceu-me não mudar de assunto, talvez para me encorajar a, mais dia, menos dia, retomar temas do ensino e da aprendizagem. Sei que a minha disposição para isso é incerta, pois estou desmotivada, mas a verdade é que fiquei com desejo de não mudar de assunto quando andei a ler por aí umas discussões sobre o "eduquês", que não sei se alguém ainda sabe o que é, mas que de vez em quando é evocado por certos "anti-eduquês" como causa de todos os males na educação, numa tal misturada de alhos com bugalhos que uma pessoa acaba por dizer a si própria: se aqueles exemplos que dão é que são o "eduquês", então um dos males na educação é serem tão raramente levados à prática! Mas já chega de preâmbulo à reposição do post que se segue)
___________
Jean Piaget não foi pedagogo e sempre fez questão de o salientar. No entanto, entre a sua vastíssima obra, não deixamos de encontrar um ou outro escrito dirigido directamente aos educadores. É o caso de dois ensaios pedagógicos reunidos num pequeno livro traduzido entre nós com o título Para Onde Vai a Educação?.
Vou buscar um texto tão antigo porque, ao contrário do que dizem certas vozes - a meu ver ignorantes e ridículas -, o grande Jean Piaget não está ultrapassado, e continua a ser uma enorme referência. Quanto às questões específicas que evoco, uma é a dos métodos de ensino-aprendizagem, e a outra é a da formação dos professores, que, naturalmente, não se pode alhear da primeira.
Daqui a poucos meses, na altura dos exames nacionais, ou quando da publicação dos resultados do PISA, muito se falará mais uma vez da taxa de insucesso escolar dos nossos alunos, especialmente na disciplina de Matemática. Mas, mais uma vez também, decerto ficará à margem, como causa pouco falada como se não fosse decisiva, a influência dos métodos no sucesso-insucesso escolar.
Eu pertenço a uma geração de professores, especialmente os de Matemática, que muito pugnou pela difusão e aceitação de métodos activos no processo de ensino-aprendizagem. Mas a expressão "métodos activos" tem muitas ambiguidades, quando não chega mesmo a ser caricaturada. E essa geração a que pertenci foi insuficientemente ouvida, e o que tantos desses professores defenderam e praticaram está hoje diluído no tempo, pouco disso parece ter perdurado na memória e na prática de considerável número de docentes.
Quantas e quantas aulas continuam meramente expositivas, mesmo quando sob uma aparência de actividade participativa dos alunos? Quantos e quantos métodos se mantêm anquilosados como quase reproduções dos mesmos que os professores "sofreram" no tempo dos próprios bancos da escola? E até as "novas tecnologias" não são, bastantes vezes, mais do que "enfeites" desses métodos estagnados, com umas vistosas apresentações a substituirem o giz no quadro a fim de prenderem mais a atenção de alunos talvez assim um pouco menos entediados, mas na mesma receptores pouco construtores das aprendizagens.

Volto então a Piaget e dele deixo os pequenos excertos que se seguem, extraídos de um texto especialmente dirigido aos educadores, como acima referi.

Sobre os métodos:
"A primeira dessas condições (o autor refere-se a condições imperativas na iniciação às ciências) é naturalmente o recurso aos métodos activos, conferindo-se especial relevo à pesquisa espontânea da criança ou do adolescente e exigindo-se que toda a verdade a ser adquirida seja reinventada pelo aluno, ou pelo menos reconstruída e não simplesmente transmitida. (...) O que se deseja é que o professor deixe de ser apenas um conferencista e que estimule a pesquisa e o esforço, em vez de se contentar com a transmissão de soluções já prontas. (...) Em resumo, o princípio fundamental dos métodos activos só se pode beneficiar com a História das Ciências e assim pode ser expresso: compreender é inventar, ou reconstruir através da reinvenção, e será preciso curvar-se ante tais necessidades se o que se pretende, para o futuro, é moldar indivíduos capazes de produzir ou de criar, e não apenas de repetir."

Sobre a formação dos professores:
"Restam-nos dois problemas de ordem geral a mencionar. O primeiro relaciona-se com a preparação dos professores, o que constitui realmente a questão primordial de todas as reformas pedagógicas em perspectiva, pois, enquanto a mesma não for resolvida de forma satisfatória, será totalmente inútil organizar belos programas ou construir bela teorias a respeito do que deveria ser realizado. (...)
É preciso ainda insistir num ponto central mas que restringe essencialmente aos níveis secundários e universitários: o aspecto cada vez mais interdisciplinar que assume necessariamente a pesquisa em todos os domínios. Ora, mesmo actualmente os futuros pesquisadores continuam sendo muito mal preparados nesse particular, devido a ensinamentos que visam à especialização e resultam, com efeito, na fragmentação, por não se compreender que todo o aprofundamento especializado leva, pelo contrário, ao encontro de múltiplas interconexões. (...) Do ponto de vista pedagógico estamos pois diante de uma situação muito complexa que comporta um belo programa para o futuro mas actualmente ainda deixa muito a desejar. Com efeito, se toda a gente se põe a falar das exigências interdisciplinares, a inércia das situações adquiridas - isto é, passadas mas ainda não ultrapassadas - tende à realização de uma simples multidisciplinaridade; trata-se, pelo contrário, de multiplicar os ensinamentos, de tal forma que cada especialidade venha a ser, ela própria, abordada dentro de um espírito permanentemente interdisciplinar, ou seja, sabendo cada qual generalizar as estruturas que emprega e redistribuí-las nos sistemas de conjunto que englobam as outras disciplinas. Trata-se, por outras palavras, de os próprios mestres estarem imbuídos de um espírito epistemológico bastante amplo a fim de que, sem para tanto negligenciarem o campo da sua especialidade, o estudante possa perceber, de forma continuada, as conexões com o conjunto do sistema das ciências. Ora, tais homens são actualmente raros. "

Em suma, 'métodos de ensino-aprendizagem' e 'formação de professores' são dois tópicos que sempre me ocorrem quando reparo no título deste meu blogue e me pergunto por que o trago tão abandonado (ao título). Confesso que estou cansada de uma blogosfera docente onde quase todos vêm batendo nas mesmas teclas, raramente tocando nas que escrevem sobre a sala de aula. E como era sobre a sala de aula que eu mais pensava vir a escrever quando iniciei este blogue e lhe dei o título, mas a atenção foi tão desviada que, ao aposentar-me, me restou abandonar as memórias dessa sala, agora dá-me de vez em quando para (re)aflorar umas questões, desistindo, logo a seguir, de continuar. Há demasiado ruído para que se consiga ouvir o âmago das escolas? Há demasiada poeira a ser deitada aos olhos de todos para que se consiga ver onde estão certas questões essenciais?
_______________
Fonte das citações: Jean Piaget (1990). Para Onde Vai a Educação? Livros Horizonte: 2ª ed., pp 28-29, 31, 35, 37, 41 (original em fr.: 1972).

quinta-feira, março 15, 2007

O professor generalista e a matemática

Não destaco a matemática nem por ser a "minha" disciplina, nem por pensar que esta ou aquela disciplina é mais importante - todas são (podem e devem ser) importantes para a formação global dos alunos a nível do ensino básico. Destaco-a pela própria natureza da matemática e pela importância da atitude face a ela desde os primeiros anos de escolaridade.

Ora, enquanto os professores do 3º ciclo e secundário optam pelo ensino de uma disciplina ou área para que se sentem especialmente vocacionados, o que, no caso da matemática, significa decerto, em geral, um gosto, uma sensibilidade e uma formação marcada pela compreensão quer da sua natureza, quer do modo de a ensinar no sentido de uma educação matemática, o mesmo não se passará necessariamente com o "professor generalista". Por isso, foi sentida a necessidade de reforçar a formação matemática dos professores do 1º ciclo e, até aí, tudo bem (pelo menos 'teoricamente' - se, na prática, existirá de facto um reforço adequado, isso se verá). Mas, para o 2º ciclo, baixa-se de uma especialização (já de si muitas vezes apontada por vozes autorizadas como deficiente ou insuficiente nalgumas instituições formadoras) para o prolongamento a este ciclo do professor generalista.
Enquanto ninguém nega que o professor precisa de saber muito mais do que aquilo que ensina em determinado nível, também não se negará que as exigências na formação dos professores não sejam as mesmas para os diferentes níveis de ensino. A questão não está aqui, mas sim na possibilidade de cursos com determinada duração poderem propiciar, com todas as vertentes que têm que abranger - científica, didáctica, pedagógica e outras -, uma formação que altere tendências quer para a predominância do ensino de procedimentos matemáticos sem uma preparação suficiente dos professores para importantes perspectivas tais como a iniciação dos alunos na elaboração de conceitos, quer para uma marcada incidência da formação do professor na didáctica da matemática (Como diz Suzana Nápoles na publicação que abaixo vou referir, "a Matemática não pode surgir a propósito da didáctica da Matemática, a didáctica da Matemática é que deve surgir a propósito da Matemática.").

Tenho procurado no site da APM (Associação de Professores de Matemática) alguma tomada de posição relativa ao novo regime jurídico da formação de professores, mas o parecer que ali se encontra reporta-se ainda à fase de discussão do projecto (fase em que, como tem vindo a ser habitual, a actual equipa do ME se mostrou surda a pareceres que contrariassem o seu projecto de decreto ou alguma questão de fundo do mesmo). No entanto, a questão da formação inicial dos professores tem sido abordada nos últimos anos pela APM em vários documentos. No último número da revista Educação e Matemática, desta associação, é publicada uma mesa redonda, sob o título A Matemática na formação inicial de professores*. Deixo alguns excertos pois apontam para o que penso.

«(...) a principal e primeira linha de força que deve estar presente na formação matemática dos futuros professores consiste na convicção, por parte dos encarregados de organizar essa formação e dos próprios formadores, de que essa formação tem características próprias (...)»(Eduardo Veloso)

«(...) Os cursos de formação estão a preparar professores generalistas ou por áreas disciplinares, pelo que o tempo dedicado à Matemática é largamente prejudicado. Além disso, a constatação de que os conteúdos dos currículos dos 1º e 2º ciclos se resumem praticamente a abordagens elementares dos conceitos de número e forma pode induzir nos formandos a ideia de que a Matemática nos cursos de formação inicial não deve ter grande peso. Ora, é nestes níveis de ensino que se lançam as primeiras pedras para a construção do pensamento matemático, o que acarreta uma enorme responsabilidade dos professores na atitude futura dos alunos em relação à Matemática. (...) Os futuros professores devem ser levados a entender as várias facetas da Matemática: a Matemática como arte, em que se conjugam proposições, se estabelecem conexões e se encadeiam raciocínios para a construção de resultados; a Matemática como instrumento, tanto para aplicações no dia-a-dia, como na resolução de problemas tecnológicos, ou na formulação de teorias científicas; a Matemática como linguagem precisa e geral; a Matemática como desafio, que tanto pode revestir aspectos essencialmente recreativos (...) como decorrerem da constante necessidade de ir mais além na procura de respostas para o mundo que nos rodeia.
(...)
Especificamente no que diz respeito à formação de professores de Matemática para o 2º ciclo (variante Matemática /Ciências da Natureza), existe uma enorme disparidade entre a formação oferecida, tanto a nível de conteúdos curriculares como do peso da Matemática face às restantes disciplinas. Tanto constatamos a existência de um naipe de conteúdos muito vasto e desadequado aos objectivos dos cursos, como a conteúdos muito limitados subordinados à didáctica. (...)» (Suzana Nápoles)
________

Resta-me deixar a pergunta: Como será que "se encadeiam raciocínios" na mente de Maria de Lurdes Rodrigues quando se mostra tão preocupada com o ensino-aprendizagem da matemática e, ao mesmo tempo, ignorando tantos alertas de que os transcritos acima são apenas um ínfimo exemplo, empurra o futuro professor do 2º ciclo para professor generalista?
______
* Pareceu-me que está acessível a não sócios da APM

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Habilitações para a docência - para mim, basta desse assunto!

Perdi a paciência, afinal já estou fora, e para que hei-de preocupar-me e até ficar efervescente com as notícias, aliás ainda muito escassas, que há sobre o assunto? Hoje despeço-me dele, pois de nada serve a preocupação de um simples professor, nem de vários, nem de muitos que o conhecem bem por terem acompanhado no terreno as evoluções do sistema de formação de professores após a Lei de Bases do Sistema Educativo, especialmente no que respeita às formações para a leccionação no 2º Ciclo. Mas também não pensem os colegas do 3º Ciclo e do Secundário que o assunto não lhes diz respeito, ou então não se venham a queixar quando os futuros alunos lhes chegarem às mãos.

Bati na tecla de algumas formações vigentes para o 2º ciclo e, recentemente, alertei para a visão da actual equipa do Ministério da Educação, relativamente à qual, no respeitante ao 2º ciclo, até um grupo de trabalho constituído por responsáveis de várias ESEs esteve contra, apesar de as ESEs serem as instituições que maioritariamente têm a cargo essa formação. (Esse meu alerta, incluindo informação de pareceres, está aqui).

O novo regime de formação para a docência na Educação Pré-Escolar e nos ensinos Básico e Secundário foi aprovado em conselho de ministros em 28 de Dezembro sem que dele fosse dado conhecimento público ou aos sindicatos de professores. Foram ontem divulgados alguns aspectos desse Decreto-Lei, e as posições da FENPROF (que acabo de ler) sobre o que já é conhecido não me indiciam que tenha sido corrigida a visão que mais me preocupava, embora ainda não tenha acesso ao diploma para ler com os meus próprios olhos. Entretanto, não preciso de ler para conhecer, desde a aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo, quer o facto de nunca terem sido postas em prática algumas disposições dela, quer o modo como foram sendo contornados e mesmo desvirtuados princípios nela inscritos depois de processo árduo para se conseguir uma lei que, pela sua importância, requeria a obtenção de consenso.

A pôr ponto final num assunto com que me preocupei longamente (e disso, já tive quanto baste), deixo apenas e sucintamente uma memória que até devo ter escrito com mais pormenores algures neste cantinho. É a memória de quatro estagiárias que tive numa turma minha de 6º ano, a partir só de finais de Fevereiro desse ano, e tive apenas na qualidade de cooperante, não de orientadora. (Para não cometer injustiças, esclareço que não frequentavam uma ESE, mas um desses institutos privados, igualmente credenciados para a referida formação).
Eram jovens trabalhadoras, empenhadas, entusiastas e que queriam mesmo ser professoras (e boas professoras). Apesar de assoberbadas por outros trabalhos além daquele (pseudo) estágio, arranjavam disponibilidade para todas as horas (muitas) que elas próprias eram as primeiras a pedir, dado que eram críticas quanto à insuficiência da duração da formação em tantas vertentes como as científica, didáctica, pedagógica e não só. Dei-lhes muitas horas para além do que se inseria nas minhas obrigações como cooperante apenas, e dei com gosto porque elas iam tendo consciência das lacunas a nível científico e de dificuldades até elementares que queriam ultrapassar.
Desejo que estejam colocadas e não duvido de que sejam professoras competentes, mas também não tenho dúvidas que terão tido que fazer, para isso, um considerável esforço pessoal adicional à formação recebida. Porque só cabeças tais como as da actual equipa ministerial podem não perceber que não chega uma formação (agora, pelos vistos, ainda mais "generalista") que não dê a preparação científica especializada indispensável para que o professor saiba mais do que ensina, mesmo a nível ainda elementar/inicial, sob pena de não ficar capacitado para, por exemplo, iniciar os alunos no processo progressivo de aquisição/elaboração de conceitos, devido a não ter ele alguns bem elaborados ou sequer minimamente, mas correctamente, adquiridos.

E pronto. Prossigam os ministros da educação com uma política de formação de professores que fique o mais barata possível, com a justificação de que os meninos ficam traumatizados com a passagem do professor único do 1º ciclo para vários professores - justificação de que até se ririam os próprios alunos, pelo menos após a primeira ou segunda semana dessa transição -, prossigam, que eu fico-me com a minha opinião mas não vou insistir mais no assunto.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Um Anteprojecto de Decreto-Lei que parece estar a passar despercebido

(Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência) (1)

Nota prévia:
Talvez o anteprojecto ande a passar despercebido por se pensar que se trata apenas da necessária adaptação dos cursos de formação para a docência, no contexto do Processo de Bolonha, aos dois ciclos agora designados, respectivamente, por licenciatura e mestrado. Essa adaptação não está em causa, mas já o está preocupantemente (não só a meu ver, mas também na visão de personalidades autorizadas do ensino superior, quer universitário, quer politécnico) pela fuga da actual equipa do ME à oportunidade de uma correcção (que há muito se impõe) a perspectivas de formação generalista de professores do ensino básico destinados à leccionação do 2º Ciclo, e agravadas pelo alargamento dessa perspectiva à formação dos professores do 3º Ciclo.
"O anteprojecto de decreto-lei do Ministério da Educação sobre o regime jurídico da habilitação profissional para a docência (...) parte de um princípio muito discutível na definição do perfil do professor desses dois grandes ciclos de formação (básico e secundário): o professor generalista. " (Carlos Ceia, 8 - 11-2006)(2)
Note-se ainda a perspectiva expressa na Lei 115/97, que alterou, entre outros, o artigo 31º Da Lei de Bases do Sistema Educativo em vigor desde 1986: "A formação dos educadores de infância e dos professores dos 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico realiza-se em escolas superiores de educação e em estabelecimentos de ensino universitário." (Artº 31º, ponto 3) - alterando o disposto na alínea c do ponto 1 do correspondente artigo de 86, que estipulava: "A formação de professores do 3.º ciclo do ensino básico e de professores do ensino secundário realiza-se em universidades.(destaques meus)
(Fim de nota prévia)

_______________
Deixo de lado pareceres de professores do ensino universitário, tais como o de João Pedro Ponte em 2004 (3), emitido a pedido da então Ministra da Ciência e do Ensino Superior(4), no qual (considerando que "nos primeiros níveis do sistema educativo evidencia-se o papel do professor generalista, que tem a responsabilidade por uma turma, enquanto que nos níveis mais avançados, o papel do professor está claramente vinculado a uma disciplina ou área disciplinar" e que "a transição entre os dois tipos de perfil profissional faz-se sobretudo no 2ºciclo do EB") é salientado que se justifica "uma atenção especial à formação dos professores do 2º ciclo do EB".

Destaco em especial, sim, o parecer(5) do grupo de trabalho nomeado pelo CCISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos) para dar resposta à solicitação de elaborar “o perfil de competências e de conhecimentos referentes à profissão de educador/professor”. Destaco-o por ser um parecer de uma comissão constituída por professores das próprias ESEs (seis ESEs), quase todos coordenadores das mesmas, ficando eu perplexa perante o ignorar (ou despresar) também desse parecer por quem elaborou o Anteprojecto referido no título deste post.

Reportando-me apenas à questão que relevo neste escrito - a formação dos professores do 2º Ciclo -, deixo para comparação pelos meus eventuais leitores as respectivas propostas que se seguem.

Do Grupo de trabalho nomeado pelo CCISP:
Ramos propostos para educadores de infância e professores dos dois primeiros ciclos -
· Educador de infância
· Professor do 1º ciclo do ensino básico
· Professor do 2º ciclo do ensino básico em ______ (áreas definidas no quadro das habilitações para a docência)

Do Anteprojecto da actual equipa do ME:
Domínios de habilitação para a docência propostos para educadores de infância e professores dos dois primeiros ciclos (totalidade das alternativas propostas) -
. Educador de Infância
. Professor do Ensino Básico: 1º Ciclo
. Educador de Infância e Professor do Ensino Básico: 1.º ciclo
. Professor do 1.º e do 2.º Ciclo do Ensino Básico
(Destaques meus)
________
Links para as referências:
(1)
Ante projecto de Decreto-Lei - Regime Jurídico da Habilitação Profissional para a Docência (Ver anexo, p. 21)
(2)
Parecer - p. 1 - 1.
(3)
Parecer - p. 14
(4)
Diário da República, pp. 10 579-80
(5)
Parecer do Grupo de Trabalho nomeado pelo CCISP (Ver quadro, p. 4)
_____________________________
ADENDA
Para além de o anteprojecto não deixar alternativa aos formandos que queiram optar exclusivamente pela leccionação no 2º Ciclo (até por não se sentirem vocacionados para o 1º), o que sobressai essencialmente é a persistência do ME em não reconhecer as insuficiências e deficiências (para as quais tem havido vários alertas) inevitáveis quando, numa formação de duração curta para todas as vertentes que pretende contemplar, se integram simultaneamente uma formação teórica generalista (justificável num tronco inicial comum), uma profissionalização em termos de prática (a substituir os antigos estágios pós formação científica) e uma formação científica e didáctica já necessariamente especializada em disciplinas ou áreas de duas disciplinas, tudo isto juntando a habilitação para a monodocência no 1º Ciclo com a habilitação para a docência no 2º Ciclo.
Não é preciso lembrar que o professor tem que saber bastante mais do que o que ensina a nível básico, sob pena de ter dificuldade em iniciar os alunos em conhecimentos e no processo de elaboração de conceitos em bases correctas e seguras. E, ainda que muitos professores colmatem autonomamente insuficiências de formações iniciais que lhes são proporcionadas, tal não pode ser tomado como princípio, sendo seu direito (e dos alunos) receberem uma formação não prejudicada seja por interesses obscuros, seja por motivos economicistas.
Mas a pergunta que deixo é a seguinte:
Se, como vimos, são também os responsáveis por várias ESEs que apontam para cursos distintos de formação para leccionação respectivamente do 1º e do 2º ciclos (ainda que, como já disse, possam ter um tronco inicial comum), quem são então os mentores do anteprojecto do ME? Mais: Há "lobbies" pressionando? Há interesses a não tocar? (Sem entrar em suspeições de que não tenho provas, não deixa de ser impossível que não ocorra às nossas mentes o envolvimento e comprometimento, de há muito tempo, com as ESEs e as formações por elas prestadas, de um certo senhor que é actualmente Secretário de Estado da Educação).

__________
P.S. Ler, a propósito, notícia do Público aqui, e também notícia aqui de que o ME enviou o anteprojecto aos sindicatos "apenas para dar conhecimento"

sexta-feira, setembro 01, 2006

Poupem-me, por favor!

Não foi, como julgo óbvio, directamente este post do Miguel Pinto que me levou a escrever o título acima, foi apenas essa moda recente, que ele me lembrou, de algumas rotulações fáceis de "eduquês" sobre variadas ideias pedagógicas, e algumas autoproclamações mais fáceis ainda de "anti-eduquês". (Não me refiro, claro, a colegas que, sensatamente até, rotulem de eduquê este ou aquele escrito que leiam - esses colegas, aliás, não costumam andar a apregoar-se dogmaticamente disto ou daquilo).

Todos sabemos que esta moda se popularizou a partir do livrinho de Nuno Crato que o Miguel também refere como tendo colocado o dito termo "no top dos lugares comuns" e ao qual, já que teve a categoria de livro, eu só chamo mesmo "livrinho". Logo quando o li me faltou a paciência para terminar as últimas páginas, pois duas coisas me irritaram, uma respeitante ao recurso a curtas frases proferidas em situações pontuais, e retiradas do contexto do que esta ou aquela pessoa disse, e a outra parecendo já ignorância sobre o significado original, genuino, de um ou outro conceito. Mas, não venho falar do dito livro nem dos métodos nele seguidos pelo seu autor, embora isso de deduzir, de um pequeno escrito ou comentário, algum enorme eduquê ande a ter seguidores.

Entretanto, nesta 'história' de eduquês e anti-eduquês, o que me preocupa não são os que se andam a ocupar dela com defesas ou acusações (a menos que sejam mesmo professores e uns tantos miúdos lhes andem a passar pelas mãos). O que me preocupa é que também haja, entre os professores que os lêem, alguns que se limitem a fazer a sua auto-formação contínua por leituras "pop" (como lhes chamava um professor que tive não há muitos anos), umas "baratas", outras superficiais.

Já que Rousseau anda na mira dos anti-eduquês, ocorre-me que o caso da pedagogia não é, a meu ver, diferente do da filosofia propriamente dita no que concerne à formação do nosso pensamento. No 2º caso, o conhecimento de grandes filósofos contribui para a formação, criticamente, do nosso próprio pensamento sobre a vida e a humanidade, e, de preferência, conhecimento de pensadores com diferentes e até contrárias perspectivas, pois é no conflito entre ideias contrárias que o pensamento avança. Quanto ao 1º caso, se me perguntassem em que perspectiva ou corrente pedagógica me insiro, desde há muito tempo que responderia: Em quase todas as que li e em nenhuma. Claro que não estou a referir-me a alguma amálgama de ideias contraditórias. O facto é que construí (como todos os professores que procuram um pensamento autónomo) as minhas perspectivas pedagógicas (e também busquei fundamentos sólidos para as que privilegiei) através da selecção, em cada uma, dos aspectos sensatos a conservar - embora, naturalmente, tenha as minhas 'linhas de fundo'. Ou seja, a adopção exclusiva, exagerada ou dogmática de qualquer uma depressa, numa determinada fase lá para o início da vida profissional, me pareceu inadeaqada, seja às realidades, seja à eficácia, ou simplemente a mim mesma.
Considero, aliás, que foram bastante nefastas as passagens, depois do 25 de Abril, de extremos para outros extremos - foram os casos de eliminações de memorização da tabuada e de defesas de que tudo tem que ser bem compreendido antes de memorizado, ou até de traumas com algo que possa ter alguma pequena semelhança com o ensino do antigamente, como seja haver momentos de aula expositivos e exigindo dos alunos que ouçam com atenção e calados informações ou explicações do professor, para não falar de ideias extremadas sobre educação adoptadas muito para além do interior da escola.
Tudo isto pareceria caricatura se não tivesse mesmo acontecido. E, professor que inova na sala de aula e vai adequando as suas inovações a novas realidades (ou pedagogo teórico), só dá um contributo válido com isso se tiver, antes de tudo o mais, as noções de bom senso e de equilíbrio.

Mas eu ia jantar, passei pelo blogue do Miguel e vim, para quê (?) escrevinhar - já acentuei no início que o Miguel não teve culpa nenhuma, ainda menos de eu, em vez de ir jantar, me pôr a escrever também lugares comuns. Afinal, o que queria era apenas fazer o desabafo - que até fiz logo em título - sobre telenovelas de eduquês e anti-eduquês: Poupem-me, por favor!

;)

segunda-feira, julho 25, 2005

Agenda pós-férias

Iniciado este cantinho em Maio último, logo duas memórias (entre outras) estiveram nas minhas intenções de posts. Relacionam-se com duas questões que, se até se afiguram particularmente oportunas neste momento, também lembrei em muitos outros, uma no círculo vasto de colegas de várias disciplinas que igualmente as colocam, outra no círculo mais restricto daqueles colegas de disciplina que, ao longo de anos, pugnaram (sempre isolados) pela sua aceitação como questão determinante da relação dos jovens alunos com a Matemática.

A "blogosfera docente" está a partir para férias, também eu me limito a deixar agendadas essas duas memórias para o começo do novo ano lectivo. Porque este cantinho ao menos uma utilidade tem: a de me fazer (a mim) pensar como que em voz alta, ao escrever.

1ª questão - Da necessidade de formação rápida de grande número de professores de 2º Ciclo, devido à massificação do ensino, até à instalação e continuação de uma situação quando os formados até passaram a ser em excesso. Situação derivada do alargamento da formação inicial (científica e profissional) para fora das ESES, ao sabor da proliferação de institutos superiores privados, creditados decerto por planos apresentados, mas não pela prática de muitos (demasiados), a qual, como é bem visível nas escolas a quem pedem cooperação e nos vários alertas, nomeadamente da APM, tem contribuído significativamente para insuficiente/deficiente formação inicial, científica e profissional, dos docentes que formam (do que estes não são responsáveis, note-se). E alguém nega a importância dos começos escolares dos alunos? E alguém nega que a dispersão dos formandos entre uma predominante vertente pedagógica teórica (aliás ligada à prática por uma prática efectiva e acompanhada que se limita à leccionação de meia dúzia de aulas disponibilizadas por um professor cooperante meramente voluntário) e uma vertente científica dividida entre, por exemplo, Matemática e Ciências, alguém nega, dizia, que se torna assim difícil, num modelo já de si interrogável e que se aplica ao sabor do que disse acima, que os professores formados tenham eles a educação matemática que tanto urge dar aos jovens alunos portugueses?

2ª questão - Da defesa e até luta de bastantes professores de Matemática pela adopção generalizada de novas metodologias especificamente adequadas ao ensino-aprendizagem dessa disciplina nos anos da escolaridade básica (novas na prática, que nada novas nas teorias e investigações na área da educação matemática), até à resistência que não se situa apenas nos próprios - os professores de Matemática -, mas na cultura e/ou clima ainda prevalecente na escola portuguesa. Questão de particular importância no 2º Ciclo (não tenho dados suficientes nem competência para referir a situação no 1º Ciclo) - ciclo em que são menos importantes os conteúdos (que se retomam no 7º ano), sendo qualquer um propício a ser trabalhado em pesrspectivas importantes: iniciação no processo de aquisição de conceitos (que sabemos ser longo, requerendo posteriores etapas); iniciação na resolução de problemas, ou seja, na aquisição de competências de interpretação, relacionação e procura activa de estratégias de resolução - e os alunos até são hoje exímios em jogos de estratégia, porque não hão-de interessar-se e ter sucesso nesse desafio ao raciocínio que a Matemática deve saber colocar?; iniciação em hábitos de rigor e precisão, tão necessários nos futuros adultos e que até vão influenciar o próprio domínio progressivo de um português correcto. Alguém duvida de que era preciso cautela (era, mas o passado corrige-se) ao colocar-se a Matemática do 2º Ciclo num plano susceptível de diminuir demasiado a respectiva formação especializada a requerer?

domingo, julho 10, 2005

Fim de estágios

O blog está de fim de semana prolongado, mas eu vim acrescentar uma "coisita" - não que o assunto seja coisita pouca, mas porque um comentário deixado ontem por um colega numa entrada relativa à formação dos professores mo reavivou. É que me tenho referido à formação inicial dos professores do 2º Ciclo, da qual já foram há anos abolidos os estágios - ao que actualmente se chama estágio nesse ciclo (ver IC said), tenho designado por "estágio", isto é, entre aspas . Entretanto, não era preciso mencionar especificamente o 2º Ciclo!
Por isso, relembro mas nem comento a questão "fim dos estágios". Indigno-me apenas, ou melhor, vou-me indignando sempre mais.

De acordo com a proposta ministerial, os candidatos à docência deixariam de dar aulas para passarem a assistir às aulas dadas pelos orientadores de estágio, deixando por isso de receber a remuneração que até agora lhes era concedida pelas aulas que ministravam. Com esta medida, a tutela irá poupar cerca de 50 milhões de euros.O Ministério decidiu também que o ano de estágio deixará de contar como tempo de serviço para efeitos de carreira.Em comunicado, os estudantes afectados por estas medidas afirmam que as alterações ao modelo de estágio "representam uma verdadeira regressão na formação inicial da carreira docente e são inaceitáveis, para além de terem consequências imprevisíveis na qualidade do ensino e na qualidade da formação dos alunos".

quarta-feira, julho 06, 2005

Formação de professores (um preâmbulo só)

Estou precisando de algum tempo para trazer aqui a memória (devidamente comprovada, que memória só por si, tenho-a bem presente) da evolução (ou involução) do sistema de formação de professores para leccionação do 2º Ciclo do Ensino Básico desde que, em 1986, tivemos a 1ª Lei de Bases do Sistema Educativo. 2º ciclo, porque o conheço bem; 2º ciclo, também porque ninguém negará decerto a importância determinante da aquisição de "bases" no futuro escolar dos alunos e nas possibilidades (que há o possível, mas também há o impossível) que terão os professores dos ciclos seguintes (e até também conheço bem o imediato, o 3º Ciclo).
Entretanto, encontrei quase por acaso um documento do Conselho Nacional da FENPROF, de 25 de Novembro de 2004, de que deixo abaixo dois breves extractos (do 1º parágrafo e do ponto 6, relativo à formação de professores, inicial e contínua). Inicial - já neste blog toquei nela, se a Srª Ministra vai tocar é que não sei; Contínua - a tal que se tem dito, com razão, que dá créditos que tornam as mudanças de escalão equivalentes a automáticas, sem se acrescentar que do modelo disponível conhecido por FOCO e da degradação subsequente do mesmo não são responsáveis os docentes, que sempre defenderam o direito a uma formação contínua de qualidade e pertinente.
"A chamada Lei de Bases da Educação, que a maioria de direita aprovou sozinha na Assembleia da República, foi posteriormente sujeita a veto presidencial..."
"Uma nova Lei de Bases para a educação deve inscrever também a profissão docente como eixo central da qualidade de todo o sistema educativo, valorizando o papel que cabe aos professores nos processos de ensino e aprendizagem e na actividade global das escolas, exigindo que na sua formação, para além dos métodos e das técnicas científicas e pedagógicas ajustadas, se contemple também uma formação pessoal, cultural, social e ética, adequada ao exercício da profissão. A formação de professores, numa perspectiva de educação permanente, deve associar a formação inicial à formação contínua (...) A consagração de uma formação que favoreça e estimule a inovação e a investigação, para todos os níveis de ensino, com incidência particular no ensino superior, projectada a partir da própria actividade educativa, visando práticas reflexivas e atitudes críticas e actuantes no domínio social, deve ser posta em consonância com a relevância social da profissão docente e com a dignificação do seu estatuto de carreira."
(...www.fenprof.pt/?xpto=27&cat=53&doc=566&mid=115 - Princípios de uma nova Lei de Bases do Sistema Educativo)

sábado, junho 25, 2005

Carroça à frente dos bois???

Neste momento, na Educação/Ensino (inclusive na blogosfera) fala-se e fala-se em avaliação. Dos alunos, seria natural, pois termina o ano lectivo, durante o qual decorreu o processo de ensino-aprendizagem. Dos professores, é que não me parece natural: Congela-se a progressão na carreira e faz-se passar o slogan “eles progridem automaticamente”; viram-se pais contra professores e esquece-se que os professores são pais; decreta-se que os alunos do 9º ano tenham exames e nem se esconde que estes não pesarão na sua avaliação, o que se pretende é avaliar os professores. Mas do processo de ensino-aprendizagem dos assim avaliados nem se fala (nem se lembra sequer que não são os professores que escolhem o sistema de formação), porque pôr os bois à frente da carroça como manda o mais elementar discernimento, isso já iria contra muitas conveniências!

Os professores da minha geração e de outras seguintes profissionalizaram-se mediante estágios – estágios mesmo, a dar aulas -, a assistirem a aulas uns dos outros e a serem assistidos pelos orientadores a cujas aulas por sua vez assistiam. Sim, porque estes não eram os colegas cuja profissão é a de leccionarem no ensino superior – universidade ou instituto -, mas sim outros que não tinham apenas que expor modelos pedagógicos teóricos, tinham que os praticar e mostrar que eram praticáveis, tinham, em suma, que estar nas escolas com os estagiários.
Mas isso não era barato, e mudou-se não porque embaratecer fosse na altura urgência devida a buraco do deficit, mas porque eram sempre “urgentes” outras prioridades orçamentais (que a da educação ia-se referindo por palavras para não parecer tão mal). E assim se passou aos chamados estágios integrados nos cursos para a via de ensino, que de integrados têm de facto muito, só que sobrando um escasso tempo para vir para o “terreno”. Ao menos que se tenha um pouco de recato na culpabilização dos professores assim formados, pois não são eles que escolhem o sistema de formação, escolhem, sim, a via de ensino onde duvido que se “enfiassem” se não desejassem mesmo ser professores.

Decerto que muitos e muitos professores do tempo dos "estágios a estagiar mesmo” mudaram criticamente, a seguir, métodos neles preconizados, ou analisaram, avaliaram e substituíram este ou aquele modelo. Mas esses estágios não deixaram de ser, mesmo assim, fundamentais (se não imprescindíveis) para os (nos) munirem daquelas competências que subjazem nessa mesma autonomia, na iniciativa, na criatividade e na inovação (e até na segurança científica, pois havia o tempo de fazer cada coisa a seu tempo), competências que a profissão de professor constantemente requer.