Eu faço parte de uma raça extinta que comprava LPs de vinil até o início dos anos 80 e que, devido a um cataclismo fonográfico, foi obrigada a migrar para os cds e mais recentemente para os pen-drives e i-pods.
Quem não viveu a fase dos vinis nunca vai entender perfeitamente a magia de curtir um bolachão na vitrola. Tirar o LP da capa e daquele saquinho plástico que ressecava com o tempo, sentir aquele cheiro sutil do acetato, passar uma flanela no disco, colocar no toca disco, ligar o receiver e o amplificador e escutar os primeiros acordes fisgados pela agulha do aparelho. Daí era pegar a capa do disco e ficar um tempão maturando as fotos, acompanhando as letras, lendo a ficha técnica, imaginando a cada música como foi todo o processo de criação e gravação do disco.
Quando vieram os cds e suas promessas de qualidade musical, sepultaram a grandiosidade dos encartes e posters que acompanhavem os vinis. Diria que 50% do encanto de ouvir música perdeu-se ali. Mas ainda assim cabia-nos um prazer de manter uma coleção bem arrumada em ordem alfabética já que os cds ocupavam menos espaço. Depois aquilo que conhecíamos como música transformou-se em arquivos de computador armazenados em pastas que migraram para pen-drives e i-pods, causando a segunda extinção em massa em poucas décadas. Agora ouvir música se tornou um desconforto porque você não consegue descobrir, sem perder tempo, em qual pen-drive esta a música que você quer ouvir e os portáteis transformam você em pessoas solitárias com aqueles irritantes fones de ouvido.
Colecionar cds e vinis era uma coisa imponente que impressionava seus amigos quando eles entravam na sua sala e viam aquela estante abarratoda, com uns 100 ou 200 discos dos seus estilos preferidos. Era só aguardar o UAU!!!! Hoje quando alguém me diz que tem 40, 80 gigas de música no PC não me causa o mesmo impacto e eu não consigo visualizar o que aquela pessoa ouve, sentir seu feeling.
A recente ressurreição do vinil tem mais efeitos capitalistas que sentimentalistas. Para conviver lado a lado com as outras mídias, transformaram-no em objeto de cultos para DJs e alguns abonados. Pra mim isso soa semelhante como se fosse possível ressuscitar os Neandertais e trazê-los de volta ao convívio com os Homo sapiens. Evento que somente atrairia a atenção de poucos como antropólogos e paleontólogos.
Mas nada devolve a essência das coisas. Principalmente quando elas são intangíveis.