Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

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sábado, julho 09, 2011

DUAS VERSÕES D'A CRISTALEIRA










Para Manuel, Victorine e Claude Debussy,
que sobreviveram entre porcelanas...
(in memorian)












A Cristaleira
(1ª versão)

Na aresta
da sala
de estar
estava a cristaleira
A um tempo quieta e aflita
Equilibrando em prateleiras vítreas
finíssimos cristais...

Por trás
De olhos cristalinos
Trago o t(r)emor astigmático,
A tentação dos estilhaços
E a sensação de (ha)ver um gato

( O que traz um gato a este tema?)

Um sobressalto:
O espanto, o grito!
Um gato.

Cacos de vidro.

Súbito, um gato!
Pênsil, pingente, pendular
Feito o lustre no teto
Da sala, a aresta
estala
pela lente dos meus óculos,
Um salto ( ou a ilusão de um salto )

O sobressalto:
A cristaleira sob o gato.

O impacto,
Trinca-se-me o fotocromático, ante os meus olhos fitos, mil pedaços
Ou a ilusão dos estilhaços...



Eurico, 13.12.2000.


A Cristaleira
(2ª versão)

Na aresta
da sala
de estar
estava a cristaleira
A um tempo, quieta e aflita,
Equilibrando, em prateleiras vítreas,
finíssimos cristais...


Por trás
Dos olhos cristalinos
Trato,
retrato,
um remoto
t(r)emor astigmático,
a tentação dos estilhaços
e a sensação de (ha)ver um gato
(O que traz um gato a este tema?)


Um sobressalto:
O espanto, o grito.
Um gato.


Biscouits de vidro.
Bijuterias.
Súbito, um gato!
De porcelana,
pênsil no teto,
lustre pingente.
Na aresta
da sala de estar,
a cristaleira
estala inteira
à lente dos meus óculos.
No impacto:
trinca-se-me o fotocromático,
ante os meus olhos fitos, mil pedaços.


Um salto ( ou a ilusão de um salto )


O sobressalto:
A cristaleira sob o gato.


Ou a ilusão nos estilhaços...

Eurico, 13.12.2000

Ouçam o cristalino piano do Arabesque nº 1, do eterno menino Achile-Claude Debussy:


Nota:
Às vezes, no processo criativo, dá-se a angústia da escolha.
Deixo, pois, as duas versões, para apreciação do Mestre Diógenes,
conhecedor da Língua e da fragilidade dos cristais...
após conversa sobre nosso estranho ofício, essa brincadeira linguística:
aliterativa, sinestésica, metonímica,

e sei lá mais o quê.


Obs.: para o Prof. Diógenes,
e para meus dois ou três leitores fiéis. rsrsrs


Abs fraternos.
Eurico - 17/09/06

ALFENINS (doçaria sinestésica)

Imagem: Luísa Carneiro






















Enfileirem-se uns flácidos fonemas,
formando feixes deles,
em fornada fluente
:
Frases em flocos,
fluídas, de rar(o)efeito.

Lufadas de ar/tifícios,
forjados em foles.

Hiatos,
feito fluxos pífaros,
de oxítonos flautins;

Fabriquem-se, assim,
sobre melífluos morfemas,
fonoestéticos enfeites,
[esses]
movediços semantemas
:
Suspiros,
sussurross,
rebuçadosss,
filhoses, algodoados
e ôcas formas afins,
* * * * * * * * * *
que se esfarelem na fala,
ao feitio de alfenins.



Fonte da imagem:
http://i.olhares.com/data/big/137/1370591.jpg

Releia Alfenins,  ao fluxo da Sonata para Flauta, Viola e Harpa (Debussy)

segunda-feira, julho 04, 2011

PEQUENOS NADAS

Rendados - Carla Schwab





















"A Poesia é feita de pequeninos nadas e
(...) cada palavra tem uma função precisa,
de caráter intelectivo ou puramente musical, e não
serve senão a palavra cujos fonemas fazem vibrar
cada parcela da frase por suas ressonâncias anteriores
e posteriores".    (MANUEL BANDEIRA).


.
.
.
Eu traço versos
como quem trança
                os nós du'a rede.
.
.
.
In/vento-os,
Pequenos nodos,
            pequenos nadas,
feitos de vozes
         com que desfio,
                    fio após fio,
em des(a)linho, esses retroses
de quase nada.
Não têm motivo,
           não têm sentido,
                 esses liames
esses barbantes de fino linho,
que só têm ritmo,
tecido e rima,
mas não têm nome que os defina.

Enlaço os versos como quem ata
cordéis ao vento. . . como um encanto. . .
(Fecha essa página, se até agora
Não tens motivo nenhum de espanto.)

A cada linha aqui tecida,
de mim se escorre,
e em mim se míngua
a tessitura dos véus da língua...

Pois nesses laços que agora vedes,
há uma parte de mim
que morre
e outra parte que (se) me amarra à (minha) vida.

(Eu faço versos como quem tece u'a estranha rede...)



Fonte da imagem:
http://carlaschwab.blogspot.com/2010/04/rendados-carla-schwab_11.html

Retome a teia, curtindo CLAUDE DEBUSSY - La Fille aux Cheveux de Lin

terça-feira, abril 05, 2011

CLARAS EM NEVE
































"Devemos ser suaves, suaves, suaves uns com os outros, porque somos muito frágeis..."


............................................................................Petra Maré, in Abrigo de Ventos



Dissolve-se um fonema,
em excipiente átono,
quase inaudível fluxo, in abstrato,
claras em neve,
i-lógico hiato...
de ilusória elisão.

Leva-se a lenir, vogal aberta,
u'a  flatus vocis,
em leve vozear, ao rés do vento,
dulcíssima alusão...

Servir, translúcida,
em céu algodoado.




Eurico
em reengenharia de nuvens...rs



Fonte da imagem (e da epígrafe):

Algodão em flor.

sábado, abril 02, 2011

ODE ETIMOLÓGICA (arcaísmos redivivos)


Biblioteca de Coimbra


Dos muitos livros que herdei de meu avô, um marcou-me a infância e a vida toda. Dele é o interessante diálogo que transcrevo, razão de um de meus mais arraigados vícios, a pesquisa etimológica:

"– E a senhora, que é? Perguntou-lhe.

– Sou a palavra Ogano.

– Ogano? O que quer dizer isso?

– Nem queira saber, menina! Sou uma palavra que já perdeu até a memória da vida passada. Apenas me lembro que vim do latim Hoc Anno, que significa Este Ano. Entrei nesta cidade quando só havia uns começos de rua; os homens desse tempo usavam-me para dizer Este Ano. Depois fui sendo esquecida, e hoje ninguém se lembra de mim. A senhora Bofé é mais feliz; os escrevedores de romances históricos ainda a chamam de longe em longe. Mas a mim ninguém, absolutamente ninguém, me chama. Já sou mais que Arcaísmo; sou simplesmente uma palavra morta... "

..........................................................................................................................................in
Emília no País da Gramática, Monteiro Lobato



ODE ETIMOLÓGICA


O arrebol unge de lume o albor de agora,
em um dilúculo crescente,
com ledos rádios iluminescentes.
Eterna antemanhã,
em que a Palavra, alvinitente,
é sempre a Aurora.

Por isso o Sol, renato, faz o dia
e, mesmo astro longevo,
anuncia
a novidade, emb'hora...

Não há palavra antiga,
em verve viva.
A flama é nova,
a cada vez que o fogo faz faúlha.

A fácies desses étimos rebrilha...
num prisma iridescente, evém da hulha;
E exsurge a voz d'outr'hora
em voz de hac hora.


****************

Eurico,
com a cabeça enfiada em um dicionário etimológico...rsrsrs



Fonte da imagem:
Biblioteca de Coimbra

terça-feira, março 29, 2011

URZIR ADREDE (puzzle-dadá pra Mirze)























urzir wrzir oorzir uurziir
urrzir urzeer urzyr urzzir
urzyier urzzr urrzyir hurzir
ürzir uwrzir urisir urzieer
ulrzir wrzir uzeir urzir ad/rede


Eurico,
brincando de armar...a rede.

segunda-feira, março 28, 2011

ANDAIMES (ou Babel de Vidro)


equívoco vitruviano



"O mundo poderá ser salvo
se o homem desfizer a distância
que o separa da sua infância."

Cassiano Ricardo



Essa urbe vítrea funda-se em um equívoco deliqüescente
um desvio nos desvãos das mentes
ruas sintáticas,
lineares, sem graça e sem crianças;
carentes dos trapézios líricos
e da possibilidade do vôo..


Permanece  vitrúvio no vítreo,
esse dessonho retilíneo,
em inútil plano desonírico?


Toda construção em cânones é um equívoco,
um anti-Sphairos,
mesmo que côncava,
e ainda que convexa,
Isso que eles chamam nexo
é uma dislexia do oco sem eco.
Quando entenderão os arquitetos
que o unívoco e eterno é um Ser Esférico?






Fachada de vidro

sábado, março 26, 2011

ALVENARIA (exercício de seleção e combinação)

Protopoesia?





 
Poética pragmática beleza rara de ara de objeto engastado em pedra dura sem lavra sem cantaria ou argamassa xisto pedra sabão quartzito  calcário pedra de rio e granito coisa litúrgica rito de pedra em pedra uma coisa túpida e não úmida mas unida em solidária alvenaria de junção em pétrea combinação


[Protopoesia?]




     




Eurico,

combinando e selecionando pa/lavras,
sob o comando do mestre de obras
Paul Valèry...rsrs




Fonte da imagem:
http://www.mardevinho.com.br/colunas/suica-2



       

sexta-feira, março 25, 2011

FROL (em pérgola)

Imagem Flickr - Google


























se é poesia
pode se dar elegantemente despida
sem pétalas
apenas ramagens esguias e perfume;
vestes,
quase sempre,
impedem a necessária estesia;
basta-lhe um átrio com risos silvestres,
pequenos ar-bustos
de amena buganvília


quando há sorriso
todo o menos belo desaparece em pelúcia
em plúcia
dilícia plúmida
que de poesia ex-pele
e despe-se
toda elegância
de falda em frol
toda fragrância de eflorescência e sol


se é poesia, a-flora,
...adere.





Eurico,
experimentos de arquitetura e paisagismo... volátil...rsrsrs

terça-feira, março 22, 2011

CARCARÁ (linossignos onomatopaicos)






















O Carcará
(volataria rés-do-chão, ou um close-up cabralino)



O carcará é o eco do eco,
Do eco seco,
Onomatopaico eco.

Falcão modesto
E sem estirpe
Que, não se apresta, de resto,
Aos exercícios fidalgos
Da caça em volataria.
Voa rés-do-chão, rasante,
Vôo sem nada elegante
Aqui mesmo, nas barrancas
À jusante ou à montante,
do leito seco do rio.


Tem um pouco de caprino (cabra alada?)
Quando escava o chão infértil
No vão das palmas de espinhos,
caçando o rato-preá
que se esconde entre as raízes.


Um pouco de cabra ou de ema,
Outra ave de pouco senso,
Pois não escolhe alimento.
Come tudo. Rato, lagarto e cobra.
E por que haveria de escolher
entre as pedras da escassez?

Vai reto e certeiro, ao ponto.
Bicho do mato, agreste e rude,
Não faz o arrodeio e o rito
Funéreo, assim como o abutre
Que espera a morte matar.

A fome, que dá sentido
Ao seu jeito de caçar,
Não lhe permite a espera.
E nem se diz que ele caça,
Pois caça é arte mui nobre,
Pra um bicho pobre e sem raça
Pra um bicho sem sobrenome.

O carcará vai bem reto
Guiado por sua fome
Não metaforiza a lida,
Não tem pena, não vacila,
Que nenhum dó lhe consome.
Pega e arrasta a lagartixa
Abre-lhe o ventre
E, ali, come.

Lições de vida
Pros homens,
Crias da caatinga braba,
Ventres e bocas aflitas,
São os carcarás e as cabras,
Emas, ratos, lagartixas;


Lições de vida
E de morte.
De fado, de sina e sorte,
Homem e bicho
Bicho e homem.
Fauna em flora estiolada.
Juntos na mesma desdita.

***********************************


Eurico,
reeditando signos cíclicos...rsrs


***********************************

Ao poeta, músico e cuidador de almas viventes,
Éverton Vidal.

EU-caOlhO (um divertimento em linossignos)


Seu Malaquias - carnaval - Recife-PE

"Porque hoje o mundo automático
É bem mais para as crianças
do que pra nós que conhecemos
o seu mecanismo, o que há, nele,
de lunatismo e abismo."
(Cassiano Ricardo)

N. do A.
Portanto,
permitam-me
mais um brincante rsrsrs







I


POr
que razãO
nãO me enfiei,
vestes a dentrO,
nUm daqUeles calUngas-mãos-molengas,
em solitária e ridícula euforia
pelAS
ruelAS
estreitAS
da Cidade AnTiga,
se caRnaval sem Ridículo é coR-vadia?




Caboclo de lança Nazaré da Mata PE
foto Rafael Alex Flickr.com
                                         II

Devia ter trincado
um cravo entre dentes,
e balançado
os badalos de cauda,
como badalam
os caboclos de lança;
Devia ter vivido
esse ridículo sem medo,
um ridículo tão risível
quanto os outros,
mas, um ridículo regado a música,
um ridículo gostoso,
em que se dança,
como fazem, nas laursas, as crianças...
De que me adianta
essa séria carranca
demasiado humana
discreta e anônima,
que conduzo entre
pudores e vergonhas

Devia ter usado a carantonha
dos bufões,
dos bobos,
dos palhaços,
e atravessar a cidade sem recalques,
como vi fazer aquele bêbado,
amparado pela embriaguez,
 que cantava: "ó, não me levem
à minha lucidez;
é que só posso ser eu mesmo, dessa vez"



LAMBE-LAMBE

III


Que fiz de mim no entrudo?

Saí nO blOcO
dO
eu-sÓzinhO,
COm uma câmara fOtOgráfica
cOlada aO OlhO,
e assim, caOlhO,
esse mesmO eu-liridículO
e tOlO,
em que me escOndO O anO tOdO,

A espreitAr A festA AlheiA,
A AlegriA AlheiA,
e A estAr nA vidA, À-toA,
sem meter-me nelA...
Sem ViVê-lA...



Eurico,
ainda, um divertimento, rsrsrs


Fonte do LAMBE LAMBE
http://cloacanews.blogspot.com/2009_03_22_archive.html


Fonte do CABOCLO DE LANÇA:
Rafael Alex Sobrinho
http://www.flickr.com/photos/rafaelalex/5516448962/in/photostream/

sábado, março 19, 2011

UAUÁ (linossignos oscilantes)

Pirilampos (in Firefly Flashing)



























Chegaríamos na noite,

noite profunda,
noite ignara e hermética,
depois duma escuridão de léguas...


O sereno, no entanto,
molhava as c'roas e as palmas
e nos breus, de instante a instante
flutuavam
dois fonemas oscilantes


Uauá


lume aceso que se apaga,
que outra vez lucila e apaga,
lume que vaga, e não vaga
pelas barrancas do arroio


Uauá
(borbulhar luminescente...)


E eu que tinha algo a dizer,
Calei-me.
Na noite densa,
gelada, feito a orla do deserto,
deu-me um calafrio de tragédia.
Naquela chã, ainda ecoa o genocídio
:

As estrelas eram os olhinhos
das menininhas tapuias que as gentes viam na noite.
Apagaram-se as estrelas.
As indiazinhas, também.
Restaram os vagalumes, soluços de luz,
Uauás (so)lucilantes.


Rio-abaixo,
mais adiante
era Canudos, Bello Monte,
à jusante
do velho Vaza-barris...
Era Canudos, num é mais.
Nosso Senhor assim quis...


Lá, meus irmãos, no entanto,
já não brilham pirilampos, como brilham por aqui
:
Furaram os olhos dos santos
e inundaram a Matriz...






Eurico
"em viagem, metonímica e sinestésica, pelos sertões"

Fonte da imagem:
Pirilampos

NATUREZA-MORTA COM CAJU (linossignos sobre papel sulfite)


Busco-
me, frágil e
p
ê
n
s
i
l
infrutescência,
a casca mascarada,
o broto ácido,
p
i
n
g
e
n
t
e
e FLÁCIDO;
IN/tensa realidade macerada,
ranço e nódoa,
que se me
e
s
c
o
r
r
e
peloscantosdalma.
Onde estou frondoso?
Em que sítio de mim sou Eu e eterno...?
Maturi-pêndula
in/ventos sazonais,
Oscilo ao Tempo,
invento cajuais.
Des/fruto
aquém,
a
Q
U
E
D
A
além,
o NADA...
ou a sempiterna seiva nacarada?



Eurico
poema datado de 05/02/97


A imagem é a capa do Eu-lírico nº 11/1997
desenho do artista-plástico
Eugenio Paxelly

quarta-feira, março 16, 2011

M'BOIÚNA (sete serpes-linossígnicas)

Medusa
( imagem Google)



Desdobra-se em dobras, redobras,
por vértices e vórtices,
um ser de mil bocas
mil línguas
[in/tensa-cobra-mítica]

Quando,acuada, estertora prosódias,
                                            [sucuri-fônica]

Debate-se em rimas, plurirrimas assimétricas
    [áspide-rítmica]  .................................................

Tenta escapar do cerco
             [serpe-sintática]

                               Enrosca-se sobre si
[jibóia-morfológica]

Estruge, ruge,
                                 [anaconda-simbólica]

                                 Engole a própria cauda
[m'boiúna verbofágica]


E reverbera em verbos
...semióticos guizos...

 [linossignos ]

        guizos...
                                             [linossignos]
                                                                                    guizos...
                                                                          [..................]
                                                       
                                                                 guizos...           
                                                                                                  
                                                                                              [...p o e s i a...]                     






Fonte da imagem:
http://www.tonomundo.org.br/

sexta-feira, janeiro 28, 2011

SAÔ (uma advinha)




Nas veneráveis folhas da Torah
oculta-se
esse gigante de África
:
Em seus cabelos uma águia se aninha;
no dorso de seus pés planta-se uma vinha
e um sensitivo hassid ad/vinha,
nessas mãos de auspiciosas

entrelinhas.

Se és iniciado em Burroughs,
saberás que aqui se fala
por senhas recortadas da cabala;
Se reconheces Pessoa,
e os rosa-cruzes,
saberás que aqui se evoca um Urvater, em luzes

Essa é u'a voz-águrio, voz de um vate;
na língua original de Adam, fold-in/cut-up,


Toda protopoesia há nessa Ursprache.





Fonte da imagem:Estudo para Crucificação

quinta-feira, setembro 30, 2010

Balões de Nada




Atentai hoje
na ars poetica da bolha breve
que escapa leve de um tubo fino
com que um menino sopra a ilusão
Balão brilhante soprado a esmo que nada afirma
além do brilho pois que em si mesmo a nada alude
diversamente das que de gude lidam em lúdica competição
Só brilham estes casulos ocos vazios nulos e entrementes desvãos desvios
vácuos inócuos comas hiatos bulbos de ar fruta gorada e vã lenição
mero à esquerda hora perdida tiques e lapsos sons tautológicos
versos autistas frases recurvas sem dicção
balões de nada coisa fadada à
d i s s o l u ç ã o.





Fonte da imagem:Abrigo de Ventos

terça-feira, setembro 28, 2010

Florada






















Não olvideis, no entanto,
desses nichos vocálicos, minúsculos,
que, a um canto, oclusos,
roem o instante...

Eis que eles brotam dos sais,
monossilábicos ais
e alçam, em inesperados tons,
suas asas, brevíssimas, bilabiais.
Pululam, palpáveis sons,
mantras zen, interjeições...

Olhai os insetos do céu...

E não olvideis desse mel,
mimético mel, volátil,
tão metonímico mel.

Volvei as vistas ao léu:

borboleteiam abelhas,
com favos novos, verbais,
zumbidos consonantais,
arbitrárias uruçus,
em aglutinantes colméias
melífluas onomatopéias,
in/significantes zunzuns.






Fonte da imagem:
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiNlrlrpro9JGvn3USMdia_JZ7Eyv0h4gk1saWmJ0anFgGfpwa1Fff8xJuT5eMPGKMPuDq2U1jm4UqHK_D1B3gXPwR91WMrtZDUFTj0GfKAZkMUt9g4MaH9lIYOLUvX9df9eXIR4Q/s1600/abelhas-e-favos-f6b46.jpg

terça-feira, setembro 21, 2010

Jarra de Luz



























Dum jarro jorram jáculos
de lázuli sem mácula.
Vernáculos.
Cristais azuis em jactos,
aquáticos.
de luz coagulada.

Finíssimos filetes,
tentáculos,
de caules florescentes,
quais báculos,
em que rebentam brotos,
re/natos e trans/lúcidos,
da bela e inculta flor
do Lácio.


Fonte da imagem:
http://br.olhares.com/flor_azul_foto1973596.html

sábado, setembro 18, 2010

O ARTISTA E SEU CHAPÉU


























Esta edição do Eu-lírico
é dedicada aos inventores silenciosos, aos
que trabalham sem ruído, amassando
o verbo com a ponta dos dígitos,
(mesmo os que usam apenas o índex);

Aos que, verbofágicos, assentam-se
à ceia dos comedores de palavras para degustar
o peixe mitológico
e arquetípico.

Aos incendiários, aos que atritam
palavras coruscantes.
Aos que ousam parir
e dão à luz os seus filhotes, nas cavernas neo-modernas.
Aos roubadores do fogo,
os que expõem suas vísceras aos abutres:

Esta edição do Eu-lírico
é pra vocês

Poetas tribais e ideoplásticos
que vivem sob a unção da Palavra!

(transcrição do pósfácio do Eu-lírico nº 7 jul/ago 1995)


***********************************************

O ARTISTA E SEU CHAPÉU (um salmo apócrifo)


Ó chamas esfaimadas, velozes, inexatas
como uma língua de lava. Ou rio,
um imenso rio, fumegante enxurrada.
Seu rastro incandescente: o léxico brasil,
palavras fumarentas, falidas e tisnadas,
na língua de estupor de mães desesperadas:
Herodes, ó Herodes!
Romãs ensangüentadas.

(E pode traduzir-se o orbe
em árias, aquarelas, valsas, odes?)


Agulhas de tricô/espasmos nucleares
Aidéticos de trem, luar/Louis Pasteur
Tropel, trovões, tzar/ Tristan Tzara
e a degenerescência que tão clara

Vincos do nada
Ecos vazios
Alvo e absurdo
Demolidor. Cinzel. Nuncas e tudos.

VENDE-SE UM NEXO ÍNDIGO BLUE EM ÓTIMO ESTADO

Chamas na sala, bicos vorazes, mães, lavaredas.
Tenor, gibi, maçã cansada e em relativa ordem

(E ouso perguntar se o mundo pode
traduzir-se...pode?!
em árias, aquarelas, valsas, odes?)

Eurico
(poema transcrito do zine-colagem Eu-lírico, edição nº 7)

***********************************************

Comentário do Salmo Apócrifo nº XXIV
(por Carlinhos do Amparo)


As palavras são objetos plasmáveis, ideoplásticos, musicais.
Apalpadas, moldam figuras;
Sopradas, produzem voz;
Atritadas, soltam centelhas, chamas incendiárias.

O artista, em seu ofício, debruça-se sobre elas : desmonta-as,
reinventa-as, dá-lhes novo ser. Busca, como o pintor materista,
esmagá-las sobre o suporte. Joga-as umas contra as outras.
Seu intento?
Que elas centelhem. Que tragam de dentro sua luz.
E que essa luz alargue os limites da realidade.
Que nos faça adentrar a instância da Arte.
No mundo absoluto.
Na Poesia.

Neste Salmo XXIV - O Artista e seu Chapéu, o poeta atinge
as palavras em seu âmago. Elas emergem, vulcânicas, ab/surdas,
para reconstruir o mundo, voz flamígena.
O poema busca angustiadamente seu nexo.
Mas o nexo da poesia é o indizível.

Pode a palavra poética traduzir o mundo?
O poema é atravessado por essa antiga questão, como se essa
fosse a sua própria razão de ser: a única coisa que faz sentido
no mundo estranho e hostil em que se dão os poemas.

Mas ouso perguntar se o mundo pode
traduzir-se (pode?!)
em árias, aquarelas, valsas, odes?


******************************************************

Quero dedicar essa postagem,
apesar de ser uma transcrição de 1995,
ao Mestre Luís de la Mancha
vate da voz incendiária!


A capa daquela edição do fanzine,
inspirada no célebre chapéu com velas de Van Gogh,
deve-se ao pintor Eugenio Paxelly,
poetartista-plástico neo-barroco!

Improviso à Clarineta (Jazz-band lírica Op. 1)





sié
çarua
sié
çarua
fossimin-
nha

eumã
dava
eumã
davamo-
dularrr
co'notinhas
co'notinhasdissonantes
parumeuparumeuamormalhar

sié
çalua
sié
çalua
fossiminha
eumãdava
eumãdava
eh
lah
brilharrr
comluzinhasmiluzinhasdissonantes
pareleh
pareleh
fantespassar

serpentinasciciantes
silhuetasdecetim
rodopiammilinfantes
piruetasdeguri

obrincanterodopia
quatrocantosdeolinda
braçossoltosmãomolenga
passotortopernafina
cabriolaabailarina
melodiafescenina
clarinetasbombardinas
vaievémnamultidão


rammramm
rammramm
ramram

rammram!
taaa-taritari-tatá!




Eurico,
em dias de brincantes...rsrsrs

Fonte da imagem:
http://coretojs.blogspot.com/2009_11_01_archive.html