Foto do Expresso, António Costa e Mário Centeno |
Começo pelos factos, retirados
do excelente trabalho de jornalismo de Maria João Gago e Marta Moitinho
Oliveira no Negócios:
O
BCE chumbou 8 dos 19 administradores da CGD. Todos não executivos.
Entre eles estão Leonor Beleza
(presidente da Fundação Champalimaud), Carlos
Tavares (presidente do grupo PSA Peugeot Citroën) , Bernardo Trindade (director de projecto do grupo hoteleiro Porto
Bay), Ângelo Paupério (co-presidente
executivo da Sonae), Rui Ferreira
(presidente da Unicer), Paulo Pereira da
Silva (presidente da Renova), António
da Costa Silva ( presidente da Partex) e Fernando Guedes (presidente da Sogrape).
Em termos simples, não passaram num dos critérios exigidos
para o cargo: a disponibilidade.
Três
administradores executivos têm de fazer um curso de gestão bancária estratégica
no INSEAD. São eles João Tudela
Martins, que actualmente desempenha funções de gestão e controlo de risco
no BPI; Paulo Rodrigues da Silva
ex-administrador da Vodafone de onde saiu em 2009, tinha estado antes disso no
BPI; Pedro Leitão, actualmente na
Angola Telecom.
No
prazo de seis meses é preciso arranjar um ‘chairman’ para a CGD. António
Domingues não pode acumular essa função com a de presidente executivo.
O
secretário de Estado do Tesouro Ricardo Félix quer alterar a lei bancária para
que alguns dos administradores chumbados possam assumir essas funções.
A minha análise e opinião:
Lições não aprendidas
- As más práticas de governo das sociedades foi uma das muitas razões para s
problemas que tivemos com o BPN, BPP, BES e Banif. E para os problemas que
enfrentam hoje a CGD e o BCP por exemplo, com a nomeação de algumas pessoas que
me dispenso de identificar. A leveza com que o secretário de Estado diz que
muda a lei para a ajustar aos perfis que quer é um sinal de que não aprendemos
nada com o que nos aconteceu nos bancos. Além disso, mostra que a escolha do
Governo foi feita sem levar em consideração da lei que existe no país – não é o
BCE.
Experiência e
Disponibilidade - A equipa da Caixa
que o Governo validou está longe de respeitar as melhores práticas. Pessoas sem
experiência necessária na banca como se vê no caso de três executivos que terão
de frequentar cursos de gestão bancária. Pessoas sem disponibilidade para acompanharem
e supervisionarem a gestão executiva, como se viu no fundamento para o chumbo
de oito administradores.
Fiscalização - A
disponibilidade dos administradores não executivos é ainda mais relevante
porque o Governo mudou o modelo de governação da Caixa a meio do processo de
nomeação da nova administração. No modelo original existia uma comissão
fiscalizadora autónoma. No novo modelo essa comissão de fiscalização emana da
equipa de administradores não executivos.
Já tinha escrito sobre este tema em Julho no Observador: “O
caso da CGD é um guia para aprender o que não fazer”
Concorrência - Aos
problemas formalmente identificados pelo BCE para chumbar 8 administradores não
executivos junto mais um. Como se sabe, os
administradores vão ter acesso a toda a informação dos clientes da CGD. Na
lista de administradores encontramos líderes de grupos económicos que têm concorrentes.
Vão ter ou teriam acesso a informação privilegiada dos concorrentes, dos
fornecedores e dos clientes. O que coloca graves problemas de distorsão da
concorrência (parece que a DG Concorrência, sempre tão preocupada com a sua
cartilha e os negócios da banca não deu conta disso ou não tem competência para
se pronunciar.
O silêncio –
Perante tudo isto, o silêncio de todos os partidos e dos líderes de algumas empresas
é ensurdecedor. Apenas uma pessoa, Eugénio Rosa do PCP tem escrito e falado
sobre o tema. Veja-se no Observador: "Parece que se perdeu a vergonha"
Estamos a caminho de cometer
exactamente os mesmos erros do passado com a CGD e com os outros bancos.
Responsabilizar depois aos colaboradores da Caixa pela destruição de valor que
por lá tem existido não é só injusto, é pouco sério.
Já nem falo da humilhação do país, de ver chumbada a proposta
do Governo ara a administração da CGD pelo BCE, com parte desse “não”
justificada pela lei de Portugal, a crer no que diz o secretário de Estado
quando defende a mudança da legislação que pretende fazer.
Já gastamos muito
dinheiro com os bancos. Contas por alto e apenas para aqueles que foram
intervencionados já vamos em 13 a 14 mil milhões de euros . Claro que ainda há
activos para vender. Mas, para já, esse dinheiro está empatado, tem o custo do
juro e de não se conseguir fazer outra coisa com ele.
Deixem-me finalizar com o sublinhado para o bom jornalismo que foi feito no Negócios
e noutros jornais. Que não se ficam pelos primeiros parágrafos de um comunicado
que dizia que O BCE tinha decidido “favoravelmente a proposta de nomeação dos
corpos sociais da CGD”. Para só mais à frente explicar, parcialmente, o que se
tinha passado.
Para quem quer ter informação de qualidade feita por
jornalistas de qualidade é bom que vá pensando que não há almoços grátis.
Para que se possa ver a diferença entre aquilo que se queria
comunicar e todo o trabalho de investigação feito pelo Negócios, em muito pouco tempo, e em tempo de férias, deixo aqui na
íntegra o comunicado do Ministério das Finanças:
"Modelo de governação e
de administração da CGD aprovado pelo BCE
O Banco Central
Europeu (BCE) decidiu hoje, favoravelmente, a proposta de nomeação dos corpos
sociais da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Esta decisão do BCE aprova a
estrutura de governação da instituição proposta pelo Governo. Nomeadamente, o
BCE considera adequada a estrutura de controlo composta por:
a. Um Conselho de
Administração alargado, em que os administradores não executivos terão funções
de controlo da Comissão Executiva através de Comissões Especializadas;
b. Um Conselho Fiscal,
que será o órgão de fiscalização da CGD e que terá assento, por inerência, na
Comissão de Auditoria e Controlo Interno.
O BCE atestou a
adequação e a idoneidade de sete administradores-executivos propostos, de
quatro administradores não-executivos e dos quatro membros do Conselho
Fiscal.
Aprovou também a
acumulação pelo Dr. António Domingues das funções de Presidente do Conselho de
Administração e da Comissão Executiva.
A separação das
funções de Presidente do Conselho de Administração e de Presidente da Comissão
Executiva foi considerada necessária no prazo de seis meses. Período esse que o
Governo utilizará para analisar com o Banco de Portugal e com o BCE esta
questão.
O Regime Geral das
Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras (RGICSF) impõe um limite
ao número de funções desempenhadas em órgãos sociais de outras sociedades. Um
regime que é mais estrito que o imposto pela diretiva comunitária. De entre os
administradores não-executivos propostos oito excediam este limite. O processo
de conformidade levaria a uma maior morosidade do processo de nomeação.
A nomeação dos
restantes administradores não-executivos será feita num curto espaço de tempo
já que não houve sobre estes qualquer objeção relativamente à adequação ou
idoneidade, nem foram identificados quaisquer conflitos de interesses
impeditivos.
A nomeação destes
administradores não-executivos completará o Conselho de Administração,
assegurando assim o funcionamento de todas as comissões especializadas que
integram a estrutura de governação aprovada pelo BCE." (Fim de citação do comunicado do Ministério das Finanças de 17 de Agosto de 2016 às 21:30).