Os velhos
Um dos grupos sociais que tem pago e sofrido mais com a
crise é sem dúvida o dos reformados; e o governo usa e abusa dele como não usa
e abusa da população activa. Isto já vem desde 2005-2006 e continua
imperturbavelmente na balbúrdia de hoje. Esmagar os fracos nunca foi um plano
de batalha muito difícil de perceber, nem infelizmente muito impopular.
Os jovens merecem uma vida, mas parece que os velhos não merecem nada.
O Dr.João Salgueiro sugeriu outro dia que os reformados fizessem um sindicato
deles. Não percebeu, com é óbvio, a manifesta impossibilidade do exercício. A
primeira praga dos velhos é o isolamento. Sem amigos, nem camaradas, porque uns
morreram, ou estão doentes no hospital ou em casa, ou vivem numa miséria tão
profunda que ficaram sem força para resistir. De resto, os poucos
privilegiados, a quem sobra um vestígio de energia e de indignação, perderam o
lugar por excelência para se encontrarem ou organizarem: o lugar do trabalho.
Aos vários governos, que nos trouxeram à presente desgraça, não escapou esta
impotência essencial. E a troika, que teme distúrbios, concorda alegremente com
a receita. Se um belo ano morrermos todos simultaneamente, haverá uma grande
festa nas Finanças.
Entretanto, se a pensão não chegar ou diminuir para além do tolerável, os
velhos, tirando uma pequeníssima minoria, não conseguem, como os jovens,
encontrar trabalho. Mesmo fortes, mesmo lúcidos, mesmo competentes
e, às vezes, competentíssimos, ninguém os quer. Pior do que isso: no bom
tempo, os velhos mereciam o respeito da generalidade da populaça. Agora, não. A
deferência e a delicadeza com que eram tratados desapareceram e, no lugar
delas, apareceu uma arrogância e um desprezo, uma espécie de ironia perversa
que os põe firmemente à margem como se eles não tivessem também o direito de
viver. E, segundo Passos Coelho, um perene jovem, e os seus sócios na “Europa”,
de facto não têm. Esse minúsculo bando que nos pastoreia prepara em público e
com boa consciência da loucura um plano para o extermínio democrático dos velhos.
E nós, claro, marcharemos sem um pio para o nosso destino.
Vasco Pulido Valente, Público, domingo, 30 Junho 2013*
*Recebido por mail