Uma cadeira de ferro composta por quatro peças fundamentais: dois tubos, um encosto e um assento. O primeiro tubo define as duas pernas traseiras, o apoio para os braços e o contorno superior do encosto, o outro compõe as duas pernas dianteiras e o contorno do assento. O encosto é curvo e ligeiramente inclinado, e o assento, também levemente inclinado, tem a frente curvada.
A peça terá nascido entre os anos 30 e 40, no número 16 a 18 da Rua Alegre, em Algés, a primeira casa da Arcalo. Produzida pelas mãos do mestre serralheiro Gonçalo Rodrigues dos Santos, na década de 40, a cadeira já podia ser encontrada na esplanada do Café Lisboa, na Avenida da Liberdade ou nas esplanadas da alameda de Algés. Ainda assim, o modelo original apenas viria a ser registado nos anos 50, com o nome de cadeira modelo 7, pelo seu criador. Terá sido nos anos 30 que se viram os primeiros exemplares sobre a calçada lisboeta. Primeiro em espaços de tertúlias como o Café Nicola e A Brasileira, a cadeira acabou por ir de férias e começou a surgir também em locais de veraneio.
A antiga fábrica na Rua Alegre em Algés |
Manuel Caldas, de 67 anos, é o actual dono da fábrica que se encontra hoje em dia no Cartaxo, local onde a Arcalo dá, diariamente, continuidade a este ícone do design português.Nasceu na mesma rua da cadeira. “Todos os dias passava à porta da Arcalo”, relembra. O encarregado, Serafim, e outros trabalhadores eram seus conhecidos desde miúdos e com 17 anos começou a trabalhar na empresa. “Eu trabalhava no comércio, mas de vez em quando gostava de trocar e lá saltava para o ferro”, conta.
Depois de um período emigrado na Alemanha, regressou a Portugal e apercebeu-se que a Arcalo estava para fechar. O tempo fez com que o negócio esmorecesse mas o antigo empregado da fábrica quis recuperá-lo. “Achei que a fábrica merecia mais respeito e continuidade”, explica. Na altura, Gonçalo Rodrigues dos Santos já tinha falecido e nem os filhos nem o encarregado estavam nessa disposição. “Eu arrisquei”, lembra Manuel Caldas. O filho do mestre Gonçalo aceitou a proposta, corria o ano de 1994. “Achei que era uma parvoíce acabar com a empresa e apostei na cadeira.”
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Manuel Caldas, dono da fábrica, nasceu na mesma rua da cadeira. Foto Cristiana Borges |
Em 1995, Manuel Caldas apresentou ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), um pedido de registo da Arcalo como marca, mas só em 1997 ele foi concedido. Desde aí, a fábrica é reconhecida como marca nacional de móveis metálicos. Ainda em 1995, o proprietário viu o design da sua cadeira ser também registado como modelo industrial nacional. “Cadeira destinada a esplanadas e outros recintos abertos ou fechados”, lê-se na epígrafe do processo disponível na base de dados do INPI. O resumo é simples: “cadeira conjunto de linhas geométricas, ângulos no encosto, pernas e assento”.
Em homenagem ao homem que lhe deu vida, Caldas batizou-a Gonçalo. “Entendi que esta tinha de ter um nome para ser uma senhora cadeira, senão seria só mais uma”, diz. Em 1995, o industrial fez um último pedido que consistia em registar a Gonçalo enquanto marca nacional. Dois anos mais tarde, o requerido viria a ser aprovado pelo INPI e, por isso, Manuel Caldas afirma: “A cadeira Gonçalo é só nossa, embora toda a gente chame Gonçalo a todas as outras e elas não o sejam.”
Com quatro anos a comandar os destinos da marca, surgiu o maior desafio da história da Arcalo: equipar todo o recinto da EXPO 98. “Em Algés não havia capacidade”, recorda Manuel Caldas. Para fazer as 9.000 cadeiras que tinham sido encomendadas, a fábrica foi obrigada a mudar-se para Torres Vedras. “Demorou três meses a fazer”, conta o industrial. A visibilidade da EXPO trouxe mais procura pelo artigo. “Na altura todos beneficiaram, até a concorrência.”
A História De Um Mestre
A história da cadeira Gonçalo remonta ao início do século 20. Em apenas 22 anos, Gonçalo Rodrigues dos Santos era um orgulhoso Mestre Artesão. Muito jovem, ele decidiu estabelecer-se em Lisboa, Portugal, e abrir sua própria oficina. Naqueles primeiros dias, Mestre Gonçalo e as suas dezenas de trabalhadores trabalhavam e faziam à mão um pouco de tudo, de acordo com as ordens do cliente. Estes incluíram grampos para correias de máquinas, saltos para calçados femininos ou mesmo juicers frutas.
A cadeira de metal famosa veio depois. Por causa de seu irmão, Mestre Gonçalo visitou a França várias vezes e foi lá onde se inspirou.
Após os primeiros desenhos da cadeira, o Mestre encontrou seu primeiro problema artesanato: A Dobra de um tubo de ferro. Estudar, veio em seguida, mais desenhos, experiências. Dias, fins de semana, semana após semana, até que finalmente conseguiu: o seu próprio design e invenção – o seu próprio ferro máquina de dobra.
O Café ‘Chave de Ouro’, fundada em 1916, foi a primeira a encomendar as novas cadeiras concebidas e criadas por Mestre Gonçalo. O projecto foi mais tarde aperfeiçoado para equilibrar o conforto e a estética até a década de 50, onde ela tem a sua forma final.
Por esse tempo, a sua prova de ferrugem, características robustas e empilháveis concebidas pelo mestre Gonçalo encontrado o seu lugar diretamente sobre esplanadas e em parques públicos em todo o país.
Seu design foi puramente resultado da análise empírica. Naquela época, uma das inovações surpreendentes foi a invenção da máquina de dobrar tubo, que Mestre Gonçalo foi aperfeiçoando para moldar as curvas elegantes necessáriasminimizando o número de pontos de soldadura.
Naqueles dias, a ergonomia era eram os trabalhadores que analisavam nos protótipos e, em seguida, avaliava características básicas, como o conforto e a capacidade de empilhar várias cadeiras. Dentro de décadas de tentativa e erro, o resultado é uma das cadeiras mais confiáveis já feitas.
Hoje, este processo ainda é feito à mão por artesãos especializados.
A cadeira Gonçalo tornou-se um ícone da estética industrial portuguesa. A sua popularidade dentro de terraços em Lisboa concedeu-lhe um lugar na Colecção do Museu de Lisboa de Design e da Moda (MUDE) como um símbolo da cultura Portuguesa.
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1961 Esplanada da avenida da Liberdade, fotografia de Artur João Goulart |
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1961 Esplanada da avenida da Liberdade, fotografia de Artur João Goulart |
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1956 Parque Eduardo VII, esplanada, fotografia de Armando Maia Serôdio |
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1956 Esplanada da Cruz das Oliveiras, fotografia de Armando Maia Serôdio |
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1961 Esplanada do café Caravela d'Ouro, fotografia de Arnaldo Madureira |
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1956 Parque Eduardo VII, esplanada, fotografia de Armando Maia Serôdio |
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