Talvez você já tenha se perguntado: e se o mundo fosse governado por crianças? Eu mesmo já me fiz essa pergunta quando era pequeno e a imagem de um mundo melhor veio à minha cabeça. Contudo, uma perspectiva bem diferente acerca de tal questão me foi apresentada no início da adolescência pelo filme “A colheita maldita” (1984, direção de Fritz Kiersch).
No filme, uma pequena cidade do interior dos Estados Unidos passa a ser controlada por crianças e adolescentes. Baseado em um conto do escritor norte-americano Stephen King, “A colheita maldita” elabora uma imagem bastante negativa de uma sociedade governada por crianças. Com elas no comando, a cidade se vê entregue à violência, ao terror e aos caprichos dos mais jovens que, aliás, chegam a matar os próprios pais. A obra até explica que aqueles meninos e meninas estão sob o domínio de uma força sobrenatural maligna, mas, ainda assim, a imagem que se tem das personagens infantis e adolescentes é de pessoas mimadas. Segundo o filme, não há um mundo melhor com as crianças no poder, mas justamente o contrário: um cenário de completo horror.
Guardadas as devidas proporções, o fato é que essa obra de ficção me faz pensar na educação de nossas crianças e de nossos jovens atualmente. O que se tem visto em muitas famílias brasileiras são pais e mães completamente dominados pelos filhos. Talvez como uma compensação pelo longo período passado fora de casa, no trabalho, muitos pais têm dado a seus filhos uma educação bastante permissiva, impondo poucos limites às vontades das crianças ou até mesmo nenhum. Não por acaso, psicólogos têm usado o termo “infantocracia” exatamente para descrever a situação na qual os filhos governam os pais e mandam em casa. As crianças estão assumindo o controle em muitos lares.
Não creio que essa seja uma boa forma de plantar um futuro melhor para a nossa sociedade. De fato, alguns frutos dessa verdadeira “colheita maldita” já podem ser vistos cotidianamente: crianças e adolescentes que não sabem ouvir um “não” e que ficam extremamente tristes ou irritados quando a vida coloca uma frustração em seu caminho, muitas vezes respondendo até com violência às decepções.
Lutar contra tal processo é uma tarefa da qual os pais não devem fugir. Afinal, uma boa educação não se faz apenas com colégios caros, conforto, amor, diálogo e muito carinho, mas também com limites. As crianças não devem crescer pensando que podem fazer tudo o que querem.
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 25 de abril de 2014.)