sexta-feira, 26 de março de 2010

POESIA

Quem de nós, poetas,
pode cometer o desatino
de desatar os próprios nós?
O que seria da poesia
se, soltos como meninos,
vagássemos inocentes
apenas pelo paraíso?

É preciso purgação
atar e desatar laços
verter lágrimas
para cumprir o destino.

É preciso morrer muitas vezes
para se fazer poesia;
inventar mágoas
disfarçar sorrisos

porque é a tristeza que faz versos,
não a alegria!

quarta-feira, 24 de março de 2010

BEIJO



Ele pronuncia meu nome
como quem come uvas vermelhas
e deixa escorrer o sumo pela boca;
assim, como quem toma vinho
de olhos fechados.

Na polpa macia dos seus lábios
o vinho escorre,
mancha o linho da sua roupa.
Eu, com a respiração arquejante,
as pernas trôpegas,
fraquejo, me aproximo
e bebo sua saliva num longo beijo.

ESTILHAÇOS


A palavra caiu verde
da tua boca;
estilhaçou-se em meus ouvidos
como pólvora

num esgar,
um 'não' tão fácil,
tão simples e destemido
estilhaçou-me:

salitre
carvão
enxôfre

inútil agora
tentar reescrever nossa história.

EXÍLIO



Aquele que foi meu chão
é hoje abismo



Sua boca
que tantas vezes sussurrou
meu nome,
agora grita;
aponta-me o dedo sua mão
que era só carícia



Aquele
que foi minha pátria
é hoje exílio.

CICLO INEVITÁVEL

  “Faz tempo, sim, que não te escrevo, ficaram velhas todas as notícias”, disse o poeta num soneto à mãe nos anos 40. A velocidade do temp...