Título: O Nome da
Rosa
Autor: Umberto Eco
Editora: Gradiva
Sinopse:
Um estudioso descobre casualmente a tradução francesa de um manuscrito
do século XIV: o autor é um monge beneditino alemão, Adso de Melk, que narra,
já em idade avançada, uma perturbante aventura da sua adolescência, vivida ao
lado de um franciscano inglês, Guilherme de Baskerville.
Estamos em 1327. Numa abadia beneditina reúnem-se os teólogos de João
XXII e os do Imperador. O objecto da discussão é a pregação dos Franciscanos,
que chamam a igreja à pobreza evangélica e, implicitamente, à renúncia ao poder
temporal.
Guilherme de Baskerville, tendo chegado com o jovem Adso pouco antes das
duas delegações, encontra-se subitamente envolvido numa verdadeira história
policial. Um monge morreu misteriosamente, mas este é apenas o primeiro dos
sete cadáveres que irão transtornar a comunidade durante sete dias. Guilherme
recebe o encargo de investigar estes possíveis crimes. O encontro entre os teólogos
fracassa, mas não a investigação.
Opinião:
Nunca um livro abrangeu de uma forma tão perfeita os componentes mais
diversos: uma excelente caracterização histórica, as constantes e exigentes
reflexões filosóficas, uma crítica social pujante e, acima de tudo, um
verdadeiro enredo policial intenso e profundamente intrigante.
Umberto Eco desenvolve um retrato histórico sublime da Europa no século
XIV, do quotidiano numa abadia beneditina, ao mesmo tempo que, com um engenho inigualável,
cria uma investigação criminal complexa, capaz de capturar a atenção do leitor
até à última página. Todo o ambiente de intriga e suspeita que rodeia a Abadia
à medida que as mortes se sucedem é retratado com mestria. Os pormenores são vitais
nesta estória, pequenas pistas são fornecidas de uma forma subtil e, quando
todos os detalhes se unem no final, compõem a imagem de uma cadeia de
acontecimentos macabros e potenciados por uma mente profundamente perturbada.
Paralelamente, são abordadas questões sempre atuais da condição humana:
a desigualdade social, o preconceito perante a homossexualidade, a ambição
desmedida, a riqueza e poder desmesurados da Igreja, e a manipulação
generalizada do povo.
A premissa mais explorada nesta obra é, na verdade, a seguinte: será que
Jesus Cristo riu? Algo nunca demonstrado pelos Evangelhos e um comportamento aparentemente
incompatível com a dimensão da sua missão como Filho de Deus. Uma questão
aparentemente irrelevante, quase jocosa, que o autor critica impiedosamente, mas
que dá azo a um debate aceso e constituirá a chave para deslindar o enigma das
sete mortes. É no âmbito destas discussões filosóficas entre os teólogos da
época que o leitor certamente se sentirá mais perdido. Confesso que não domino
grande parte das questões culturais abordadas e, por isso, foi necessária uma
grande ginástica mental e alguma paciência para seguir a linha de pensamento
descrita. De igual modo, a falta de tradução para as frases em latim constituiu
outro entrave à leitura, na medida em que sinto que perdi grande parte da
subtileza do discurso e da natureza das críticas que o autor pretendia transmitir.
Mesmo assim, foi muito interessante acompanhar estes debates que fomentaram a
minha reflexão crítica. Acredito que esta leitura será um verdadeiro deleite
para quem aprecie – e seja versado em – disciplinas como a história, filosofia
e religião.
As personagens são, também, o grande trunfo do autor, principalmente Guilherme
de Baskerville. Recorrendo somente à sua mente perspicaz, o irmão Guilherme
ensina ao jovem Adso a importância da reflexão e do pensamento lógico. É
verdadeiramente impressionante a maneira como o seu intelecto produz saltos
lógicos tão obscuros que deixarão qualquer leitor embasbacado. De igual modo, é
um protagonista com o qual se desenvolve uma empatia instantânea,
principalmente pelo papel de mentor que estabelece com Adso e os laivos de
humor que caracterizam os seus momentos de orgulho perante as suas descobertas.
No entanto, para mim, a protagonista é sem dúvida a biblioteca da
abadia, com todos os segredos que encerra. A alma de toda a obra, um verdadeiro
labirinto do saber e a essência de todo o mal do qual a abadia padece. É
através da biblioteca que Umberto Eco tece uma grande crítica à sociedade da
época: será que o conhecimento deve ser acessível a todos ou deverá permanecer
enclausurado num labirinto, disponível apenas para uma elite exclusiva?
É fantástico como um livro tão denso, repleto de conteúdos complexos, consegue,
ao mesmo tempo, perpetuar um ritmo fluído e incentivar o leitor a virar as
páginas na ânsia de desvendar os seus segredos. Uma leitura que aconselho
vivamente aos amantes da história e filosofia, mas também a todos aqueles que
se queiram deslumbrar com um enredo intrinsecamente delineado, onde o mais ínfimo
detalhe constitui uma peça fulcral no mosaico de intrigas e enigmas que Umberto
Eco magistralmente arquitetou.
22:56
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Unknown