12.12.2012

A raposa e as uvas



Não existe sentimento menor que o meu. Só o seu. Não existem pensamentos mais tacanhos que os imaginados agora. Fel. Toda força da natureza desviada, enxurrada de maldizeres, dilúvio de execrações. Num altar o alvo e com dardos envenenados o consagro. Arranco os ex-votos das paredes. Retiro todas as bênçãos, coloco opróbrios, maldições. Para que nada nos una, que nada nos separe. Hoje, sou a antítese de Neruda.

12.04.2012

Revisar

Vago pelo mundo como um Hamlet sem Horatio. Pisando em sonhos, gritando loucuras, caçando fantasmas, vivendo traições, procurando culpados e seguindo sem entender-me. Por onde andará Horatio, o arauto da verdade? Onde está aquele que nunca foi escravo da paixão? Grandes perguntas e nenhuma resposta. Sem ser entendido sigo.


12.02.2012

... e o buraco

Algo nele crescia e todo o resto em sua volta o incomodava. Os cheiros, as cores, os gostos, as palavras e todas outras coisas que existiam. Nada era o mesmo. O mundo ou ele tinham mudado. Quiçá ambos, não o sabia e nem lhe importava saber. Sabia porém que algo tinha virado outro, virado coisa nada familiar. Ao mesmo tempo, tudo que conhecia continuava lá, no mesmo lugar. As coisas não estavam fora de ordem, mas existia um descompasso inexplicável. Algo que podia ser apenas sentido. Este algo continuava a crescer. Primeiro tomou os vazios. Depois, ganhou força e ocupou outros recantos. Separou carnes, rompeu vasos, abriu miolos e caminhos. Ocupou o espaço das coisas perdidas. Em seguida, o das coisas esquecidas, das coisas amadas e das coisas guardadas. Cresceu novamente e cresceu tanto que ocupou o presente. Não existia nele mais a memória recente e nem o agora. Só lhe restou o futuro. Projetou tudo nele, uma outra infância, um novo crescer, uma outra pessoa, uma vida inteira futura. Segurou-se no futuro enquanto pode. Aquilo que cresceu era forte e continuava crescendo. Cresceu, cresceu, fortaleceu-se, ficou mais forte que a esperança. Por fim, engoliu o amanhã.

12.01.2012

The love song

Hoje completei 41 anos, minha barba cresceu, meu cabelo caiu, muitos sonhos morreram, outros tantos nasceram e sigo. A minha cara mudou, meu coração também. Onde havia uma imensidão de esperanças deu espaço ao abstrato. Morro um pouco todo dia. Nasce algo também. Nunca sou o mesmo, sou outro, para o melhor ou para o pior.


 

"... I grow old … I grow old …
I shall wear the bottoms of my trousers rolled.

Shall I part my hair behind? Do I dare to eat a peach?
I shall wear white flannel trousers, and walk upon the beach.
I have heard the mermaids singing, each to each.

I do not think that they will sing to me...


...Till human voices wake us, and we drown."

T.S. Eliot, The Love Song of J.Alfred Prufrock

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