Add in Facebook

Vale da Veiga

Foto: Foz Côa Friends

Estação e Foz do Côa

30 de Junho de 2012

Foto: Foz Côa Friends

Paisagem avistada junto ao Castelo Velho - Freixo de Numão

26 de Maio de 2012

Foto: Foz Côa Friends

II Passeio pedonal pela Linha do Douro

Quinta abandonada - Almendra

Foto: Foz Côa Friends

II Passeio pedonal pela Linha do Douro

Rebanho nas proximidades da Srª do Campo - Almendra

Foto: Foz Côa Friends

Terrincas

Amêndoas verdes

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Rio Douro próximo da estação de Freixo de Numão / Mós do Douro

Foto: Foz Côa Friends

Linha do Douro

Viaduto da Linha do Douro no Vale Canivães entre o Pocinho e a foz do Côa.

Foto: Foz Côa Friends

Pocinho

Vista geral sobre o Pocinho a partir do santuário da Srª da Veiga.

Foto: Foz Côa Friends

Pocinho

Um dos muitos pombais existentes na região.

Foto: Foz Côa Friends

Foz do Côa

Onde o Côa e o Douro se abraçam.

Foto: Pedro Pego

Foz do Côa

Onde o Côa e o Douro se abraçam.

Foto: Foz Côa Friends

Foz Côa

Lagoa

Foto: Foto Felizes

Flor de Amendoeira

Foto: Foz Côa Friends

Igreja matriz de Almendra.

Templo do séc. XVI em estilo manuelino e maneirista.

Foto: Fernando Peneiras

Pelourinho de Almendra

De acordo com a sua feição quinhentista, o pelourinho datará dos anos seguintes à atribuição do foral manuelino em 1510.

Foto: Fernando Peneiras

Foz Côa

Câmara Municipal e Pelourinho

Foto: Foz Côa Friends

Pocinho e Cortes da Veiga

Vista geral

Foto: Adriano Ferreira

Quinta da Ervamoira

Foto: Adriano Ferreira

Foz Côa

Amendoeiras floridas

Foto: Adriano Ferreira

Foz Côa

Floração da amendoeira.

Foto: Adriano Ferreira

Túnel das Pariças

Linha do Douro - Castelo Melhor

Foto: Foz Côa Friends

Foz do Côa

Nevoeiro sobre a foz do Côa.

Foto: Foz Côa Friends

Quinta da Granja

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Quinta da Granja

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Próximo da Quinta das Tulhas

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Próximo da Quinta das Tulhas

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Próximo da Quinta das Tulhas

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Saião (Pocinho)

Foto: Foz Côa Friends

Douro

Próximo da Quinta das Tulhas

Foto: Foz Côa Friends

Linha do Douro - Caseta

Próximo do Côa

Foto: Foz Côa Friends

Foz Ribeira Aguiar

Próximo da estação de Castelo Melhor

Azulejos

Estação de CF do Pocinho

Manifestação pela reabertura da Linha

Porto

Foto: Foz Côa Friends

Castelo de Numão

Foto: Foz Côa Friends

Capela do Anjo S. Gabriel

Castelo Melhor

Foto: Foz Côa Friends

Castelo Melhor

Foto: Foz Côa Friends

Castelo Melhor

Foto: Foz Côa Friends

Quinta da Granja

Foto: Foz Côa Friends

Quinta da Granja

Foto: Foz Côa Friends

Concerto no Museu do Côa

Foto: Foz Côa Friends

Figos e Amêndoas

Foto: Foz Côa Friends

Foz do Côa

Foto: Filipe Inteiro

Orgal

Foto: Foz Côa Friends

Mostrar mensagens com a etiqueta Lendas e Fenómenos. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Lendas e Fenómenos. Mostrar todas as mensagens

09 fevereiro 2013

Calçada de Alpajares - Lenda e História

Calçada de Alpejares ou calçada do diabo.

Foto: Aníbal Gonçalves

Na calçada de Alpajares pode-se fazer um passeio pedestre, com 8km, que nos leva a um dos locais mais fantásticos do Douro Internacional. Um caminho construído do nada, onde as pedras e estruturas rochosas aparecem como se a mão humana as tivesse feito. No caminho sinuoso encontram-se alguns pombais e sepulturas antropomórficas cavadas no xisto preto.


Lenda da Calçada de Alpajares ou Calçada do Diabo

Diz a lenda que "em tempos antigos era tudo por estes sítios barrancos e precipícios medonhos, um cavaleiro vindo dos lados de Barca d'Alva em noite de tempestade, chegou à margem da Ribeira do Mosteiro que ia de mar a monte. Dada a necessidade impiedosa de atravessar o bravo curso de água, pois tinha a sua amada à espera, suspirou aflito: Valha-me Deus ou o Diabo. Foi Satanás que apareceu ao chamamento e disse: Se me deres a tua alma, antes que o galo preto cante, te darei uma ponte e uma estrada para que possas seguir a tua cavalgada sem perigo. O Cavaleiro aceitou e o infernal pedreiro e seus acólitos atarefaram-se na arrojada construção de uma calçada entre os fraguedos, distribuindo 18 elegantes lancetes em gogos da ribeira, ao som de estridentes cantares de Bruxas que no terreiro se reuniram para festejar a conquista de mais uma alma. Eis que canta o galo três vezes quando apenas faltava colocar as duas últimas pedras da ponte. O cavaleiro liberto do seu compromisso prosseguiu a sua viagem e o Diabo enraivecido, desapareceu com os seus acólitos através de uma bocarra que se abriu entre os penhascos".

Lendas à parte, a realidade histórica da referida calçada é bem diferente, afinal não passa de uma calçada romana, mais uma entre muitas, esta com a particularidade de ao longo dos tempos, e ainda hoje, ter despertado o imaginário colectivo das populações locais. Afinal, coisas do diabo sempre houveram, até calçadas....

Segundo o IPPAR «foi classificada em 1977 como "Imóvel de Interesse Público", a "Calçada de Alpajares", ou "Calçada dos Mouros", como será mais conhecida localmente, integrava a via romana de carácter secundário que atravessava o rio Douro (nas imediações da localidade de Barca de Alva) e a ribeira do Mosteiro, até chegar ao planalto mirandês. Actualmente, remanescem apenas alguns dos seus troços originais, visíveis perto da convergência das ribeiras da Brita e do Mosteiro, a partir da qual se prolonga pela encosta de Alpajares de forma ziguezagueante, até chegar ao muralhado do povoado de São Paulo, edificado na Idade do Ferro no cimo de um espigão sobranceiro àquelas mesmas ribeiras, com testemunhos ocupacionais dos períodos romano e medieval. E terá sido, na verdade, a excelente implantação estratégica deste Castro que subjazeu à sua eleição por parte do poder romano, que assim fez confluir para a sua fortificação a calçada, tão necessária a uma célere movimentação dos seus diversos elementos constituintes.
Estruturada ao longo de cerca de oitocentos metros em lajes afeiçoadas em xisto e seixos de pequena dimensão, a calçada possui degraus intercalados com certa regularidade, entre três a quatro metros, apresentando-se, ainda, reforçada com uma parede lateral na zona em que o declive da encosta se revela mais acentuado, designadamente nas curvas do traçado da via, que, tal como sucedeu com o Castro (vide supra), acabaria por ser reutilizado ao longo dos tempos, a atestar, no fundo, a pertinência da sua localização e a relativa abundância de recursos naturais imprescindíveis à normal subsistência das comunidades humanas de modo, mais ou menos, ininterrupto.»

In: Calçada Portuguesa
Publicada em amigos de Urros por Misé Fernandes


A lenda em filme:

Parte I


Parte II


29 novembro 2012

A LENDA DA CAPELA DO ANJO - Parte II

(Continuação da parte I)

Ao final do dia – o segundo – lá desceram novamente à povoação para cearem e descansarem; alguns dormiram mal, tiveram pesadelos, que um Anjo lhes estava a deitar abaixo o que tinham feito e levado as pedras para junto das outras do dia anterior. E quando de madrugada começaram a subir o monte, iam contando os sonhos aqueles que os tinham tido e os outros, não tendo sonhado ou dos sonhos se não lembrando, mas todos iam com algum receio de que algo pudesse ter sucedido; e se chegarmos lá e tudo tiver sido deitado abaixo o que vamos fazer? Não pensem nisso, dizia um mas a confiança era nenhuma.

De facto ao chegarem viram que todo do dia anterior estava destruído e amontoado lá junto do outro do primeiro dia! Ora aí está o trabalho de dois dias desfeito em duas noites; o material diminuía no local – no estaleiro diríamos hoje – e ia aumentando na mesma proporção lá junto à ponta do rochedo, no tal local onde o ancião garantia ser ali que o Anjo queria a sua capela.

Capela do Anjo
Foto: Dinis Ângelo

Resolveram não mexer em mais nada e irem falar com o pároco e lá foram, trazendo de Almendra a sugestão debitada pelo representante de Deus e dos Anjos na Terra, mais crente na maldade humana do que na palavra divina e que era a de retomarem o trabalho e no final do dia um dos pedreiros ficar de guarda, escondido, para de uma vez por todas o ou os responsáveis serem apanhados e em vez de desfazerem fossem eles a fazer tudo o que tinham estragado.

E assim fizeram. Desceram todos no final do dia, menos o destacado para montar a guarda, por sinal o único que era solteiro, não ficando assim mulher e filhos em sobressalto toda a noite ficaria a Mãe pois que Mãe tinha, mas esse não era pormenor que fosse tido em conta.

Comeu a ceia, bebeu o que era hábito e de varapau na mão e casacão abotoado que a noite ameaçava ser bem fria, sentou-se junto do que antes tinham acabado de alinhar e aprumar da parede da capela futura. Só que o pedreiro não é segurança e por isso não tem hábitos de estar acordado enquanto outros dormem e nem sequer tinha ido à tropa e não sabia o que era estar de sentinela, ainda não era meia-noite quando a moleza lhe atacou com força e pregou-se mesmo a dormir encostado à rocha escolhida para se apoiar.

Local da Capela do Anjo
Foto: Adriano Ferreira

Sonhou que estava na cama e que a rapariga de quem gostava tinha ido ter com ele, lhe fez sinal para não espantar e ali fizeram a primeira vez o que, pelo menos ele andava a magicar há muito. Foi uma noite inesquecível, não só pelo sonho, mas pela realização de outro que há muito lhe tirava o sono. Mas a noite ficaria inesquecível também por outro motivo, este bem menos sonho e bem pouco agradável.

Antes de a manhã começar a clarear pareceu-lhe ouvir um estranho ruído e, sobressaltado, acordou; não com a namorada a seu lado como sonhara mas sem toda a obra do dia anterior a que ele se comprometera guardar, estando todas as pedras juntas às dos primeiros dois dias lá mais adiante junto à ponta do penhasco.

Capela do Anjo
Foto: António José Ribeiro

O sonho transformou-se em real pesadelo pois não sabia o que iria dizer aos camaradas quando chegassem e como cabeça de pedreiro não foi treinada para grandes eloquências explicativas, isso é mais para outras profissões e muito menos para descaradas mentiras, essas também de outras profissões são apanágio, mas que estava preocupado lá isso estava.

Como é que não acordei com o barulho?! Tirar calhaus, alguns bem grandes, de mais de um metro de parede na altura com meio metro de espessura e com seis metros de um dos lados e cinco do outro e levá-los para cinquenta metros de distância, sempre deviam fazer tal ruído que daria para acordar, mesmo que o sono fosse profundo e o sonho ainda mais e não ter sido interrompido. Antes estivesse ainda a sonhá-lo do que estar aqui agora, com a cabeça a latejar e sem saber o que hei-de dar como desculpa.

Que me deixei dormir podia ser aceite por eles, mas todos sabem que eu tenho um sono leve e por isso ou também por isso fui escolhido, logo vai dar confusão eu não ter ouvido nada.

Também não posso dizer que o tinto me subiu à cabeça, sabendo eles que só fiquei com a quantidade habitual para a refeição e que nunca me fez mal!

Fonte: http://cienciadiaria.com.br

Assaltado também não servia, pois se o fosse não deixaria de me defender, não sou nenhum cobarde e sempre ficaria com marcas daqueles que fizeram a desobra, mas marcas não tenho; só as boas, do sonho!

Atirar-me pelo rochedo abaixo para ficar com marcas visíveis também me não parecia boa ideia, pois um trambolhão, mesmo que bem calculado, sempre podia dar para o torto e ir desta para melhor! Não, isso nem pensar!

Vou arriscar e dizer-lhes que me apareceu aqui o Anjo, exactamente como o da imagem que está na igreja à espera que acabemos a capela para se mudar para cá – de armas e bagagens não será uma vez que os anjos não usam armas nem costumam andar com bagagens - acompanhado por outros mais novos, todos com asas e me disseram que foram eles que retiraram as pedras do local onde nós as tínhamos colocado e as levaram para o rochedo e que não valia a pena insistirmos na construção neste sitio e muito menos montar guarda, pois só quando lá fizerem a capela e não aqui como teimam em fazer é que nós deixaremos de vos incomodar. Eles que acreditem se quiserem e se não quiserem que arranjem outro para ficar de guarda! Mesmo que tivesse a certeza de voltar a ter o sonho que tive eu não voltaria a ficar nem mais uma noite.

E assim foi quando eles chegaram.

Foto: António José Ribeiro

Uns gozaram com ele, outros diziam que ele tinha ido para casa dormir e bastou levantar-se um pouco mais cedo para chegar antes deles e pelo caminho inventar aquela fraca desculpa para o caso de se ter repetido a cena das duas primeiras noites. Danados estavam todos!

O mais calado, depois de ouvir tudo o que foi dito, sugeriu que o melhor a fazer seria irem novamente falar com o senhor prior, contar-lhe o sucedido e perguntar-lhe se ele não sabia do que se tinha passado ou assim constava muitos anos antes, talvez séculos, quando os que tinham deixado o Castelo Calabre e queriam construir o seu próprio castelo, ali na ponta do rochedo e o Anjo não deixou!

«Alguma coisa teremos de fazer; vamos ter com o senhor prior.»

A verdade é que ele não queria voltar com a palavra atrás quanto ao local da construção da capela, tanto mais que sabia que a construção na ponta do penedo iria ficar muito mais cara, mas como quem pagava eram os paroquianos disse que conhecia a lenda, que até acreditava nela, pois aparições são o que não falta por aí, só que umas são mais aparições que outras, pensou só para si, decidindo que ia à Guarda falar com o senhor bispo e depois daria a resposta. Até lá é melhor não mexer em mais nada, ou seja, suspende-se a construção.

Dias mais tarde deu o dito por não dito e mandou alterar o projecto inicial e que a capela ficaria no sítio onde as pedras do dia foram depositadas durante a noite. Que não acreditava que o Anjo fizesse aquilo mas que também não custava experimentar, mesmo que no fim a obra ficasse mais cara.

Foto: António José Ribeiro

E em boa hora o fez. A capela está construída há tantos anos, outros padres vieram, muitas romarias foram feitas, o Anjo lá fica na sua casa e só desce ao povoado para tomar parte na procissão da Senhora do Rosário que era realizada no dia vinte e dois de Setembro de cada ano ou então para ser levado serra acima para a sua romaria, lá no alto, em cada segunda-feira de Pascoela.

No local do litígio existe ainda um pedaço da falhada construção primitiva e cuja pedra era grande demais para a força de tão frágeis Anjos.

A este ponto, agora encimado por uma pequena cruz, os contemporâneos passaram a designá-lo por Miradouro do Anjo.

Texto: Reis Caçote

Agradecimentos ao autor do texto e aos autores das fotos.

23 setembro 2012

A LENDA DA CAPELA DO ANJO - Parte I

Castelo Melhor

Passaram séculos sobre a chegada dos dissidentes do Castelo Calabre, construtores do Castelo Melhor e de facto os fundadores do povoado que veio a adoptar o singular nome do castelo.


E digo fundadores por que não consta que outros, nomeadamente os gravadores das rochas das margens do Côa há trinta mil anos ou mais, tenham deixado outra obra ou rasto para além dos rabiscos como prova da sua presença na região e que só por acidente chegaram até nós – as gravuras.

Gravura do sítio da Penascosa

Com o crescimento do povoado e a chegada de novas gentes as novas gerações e os migrantes que em todos os tempos os houve, por um ou outro motivo, chegaram também, naturalmente, outras formas de pensar a vida e as crenças ou, se quisermos as religiões; e de tal modo se foram impondo aos que lá estavam que estes acabaram, não sei se pacificamente, por abandonar as suas, se é que alguma religião professavam e adoptaram a dominante.

Além do natural crescimento o burgo foi ganhando importância social e religiosa; no primeiro caso foram-lhe atribuídos forais por diferentes monarcas e um deles ordenou mesmo a restauração do castelo, tudo levando a crer que ou houve escaramuças que o danificaram ou então, como ainda hoje sucede, deixa de ser assistida a obra e o tempo se encarrega de a deteriorar; no que se refere à importância religiosa foi decidido que era altura de ser construída uma igreja paroquial que não será a que ainda hoje existe, mas outra mais modesta, tudo levando a crer que já ocupara o espaço da que hoje serve de lugar de culto pois todas as ruas parecem ter a igreja como centro de convergência.



Pormenor da Igreja Paroquial de Castelo Melhor

Mais tarde e tendo em conta o que desde há séculos vinha passando de geração em geração, ou seja, a promessa ao anjo São Gabriel, feita pelos fundadores, de um dia lhe construírem uma morada lá no alto do monte que veio a tomar o seu nome – monte do Anjo; foi decidido que a capela iria ser construída cumprindo-se, finalmente, a promessa antiga.

Parece que por esquecimento ou por desconsideração dos termos exactos em que a promessa fora feita, na época da negociação, entre os vindos do Calabre e a embaixada do Céu, os encarregados da construção da orada, examinando o local, concluíram que a ponta do rochedo era o local menos indicado para que a construção se fizesse; terão invocado razões de ordem económica e de segurança, para o Anjo e para os futuros veneradores em festa; logo, decidiram que seria construída no cerro da encosta, mas aí uns cinquenta metros antes da ponta do rochedo.

O responsável religioso estava de acordo, assim como a maioria das pessoas da aldeia; porém um idoso havia que o não estava: que a exigência do Anjo era diferente no que se referia ao local; todos se riram nas barbas do ancião e alguns mais atrevidos e divertidos ainda lhe foram perguntando como é que estava tão seguro disso e que, mesmo sendo o mais velho, não constava que o fosse tanto a ponto de estar na reunião que decidiu, há séculos, do local exacto onde a capela devia ser feita! Façam como quiserem, respondeu o ancião, mas... qual mas retorquiram os empreiteiros.

Capela do Anjo

O representante da igreja, presente desde o início em carne e osso na reunião também achou que não devia haver qualquer razão para que não fosse adoptada a forma mais razoável e o local mais indicado para que a capela fosse construída era o sugerido pelos empreiteiros e com o apoio da população.
O ancião encolheu os ombros e foi “pregar”, bem calado, “para outra freguesia”, como costuma dizer-se.

Ninguém se apercebeu que o espírito do Anjo esteve sempre presente na discussão, mas como não tinha sido convocado preferiu manter-se de espírito aberto e a provar-lhes, a seu tempo, que tinha sido desastrada a decisão tomada.

A obra foi iniciada e tudo correu normalmente durante o tempo em que foi terraplanado o espaço para a construção; toda a gente estava já esquecida do que o ancião dissera e a ponta do rochedo lá estava intocada.

Quando a primeira parede começou a ser levantada tudo continuava a decorrer normalmente e no final da jornada de trabalho todos voltaram à aldeia para descansar; bem precisavam, pois no dia seguinte tinham que se levantar bem cedo para chegarem a horas lá ao alto da serra e continuarem o trabalho; e não era só o dia de trabalho que cansava, mas logo antes de começarem o dia terem de subir toda a encosta que o que apetecia mais, quando chegavam, era deitar-se e descansarem novamente; durante o período de alisamento do espaço e quando acabavam a jornada e desciam ao povoado não custava muito porque a descer todos os santos e anjos ajudam; subir e trabalhar é que era mais complicado.

Altar da Igreja Paroquial de Castelo Melhor

Vitral da Igreja Paroquial de Castelo Melhor

E logo pela manhã do segundo dia da construção propriamente dita lá subiram como puderam, mais lestos uns que outros, ou porque eram mais novos ou porque tinham descansado mais; notava-se que o cansaço era diferente, mas todos chegaram. E todos viram espantados, que toda a parte da parede no dia anterior construída tinha desaparecido e os materiais utilizados estavam amontoados lá adiante na ponta do rochedo!

E de imediato se instalou a confusão; quem poderia ter feito tal serviço quem não poderia ter feito, cada um levantando a sua suspeita e quase todas se inclinavam para o ancião que dias antes, durante a reunião, lembrara a promessa feita ao Anjo.

Mas um deles, mais prudente, levantou a voz para questionar tal hipótese, alegando que o velho seria incapaz de, sozinho, desfazer e transferir para cinquenta metros mais além todos os materiais que seis homens levaram o dia inteiro a edificar! Mas ninguém se atrevia a acusar o Anjo, embora um deles tenha pensado nisso, mas ficou calado.

Capela do Anjo

Não havia carro de mão e as pedras eram muitas, como é que isto poderia ter sido feito?! Levar as pedras de braçado também estava fora de questão, pois nem três ou quatro pessoas o conseguiam fazer numa só noite!
De qualquer modo é melhor irmos falar com o velho e se ele confessar damos-lhe nas ventas e obrigamo-lo a vir connosco e voltar a pôr tudo no seu lugar; e se teve companhia será melhor trazê-la também e assim ficamos a saber quem o ajudou a dar cabo do nosso trabalho.

O ancião negou, pensando até que eles estavam a brincar ou queriam era gastar mais tempo na obra e, assim, subirem o preço contratado. Ainda foi insultado, mas manteve-se na negativa, que nada teve a ver com tal assunto.

E lá voltaram ao alto da serra recomeçando o trabalho com outras pedras e assim fizeram mais uma jornada; mas danados com o que tinha sucedido e mais ainda por não terem conseguido saber quem tinha sido o autor ou autores da proeza e bem gostavam de o saber, talvez nunca mais se metesse noutra! Eles queriam era acabar a obra para receberem o contratado e não podiam ali ficar a vida toda!

(Continua...)

Texto: Reis Caçote

13 junho 2012

A LENDA DOS CASTELOS - Parte II

(...Continuação da parte I

Capela do Anjo S. Gabriel

O Anjo Gabriel convocado para a ultimação do acordo, abençoou o grupo e prometeu-lhe que, lá do alto, com ou sem morada própria, zelaria, para que tudo corresse bem e que não mais teriam de se incomodar. Um dia mais tarde, isto é forma de dizer, mais hoje que naquela altura, pois hoje se não perdoa um segundo de atraso ou avanço, mais de atraso que de avanço, e naquele tempo, o dizer um dia mais tarde, podia muito bem ser um século, ou vários, um dia mais tarde, dizia o Anjo, ainda os vossos descendentes irão construir a minha casa, aqui neste sítio. Ficou prometido, sem data marcada, mas que o Anjo não perdoa. 


Capela do Anjo S. Gabriel


E não se comprometeram logo, o que o Anjo compreendeu, já que a prioridade era o Castelo, não só porque queriam a promessa feita aos calabrenses, também sem data, mas porque precisavam de descansar e planear a construção. O Anjo ajudaria. 

E, no dia seguinte, não consta que, com a ajuda do Anjo, embora os anjos façam as coisas sem dar nas vistas, começaram a empilhar calhaus à volta da colina, calhaus estes surripiados, não sem dificuldade, do maciço de xisto que era toda colina; e assim andaram durante longos anos, partindo o rochedo e alinhando os calhaus no paredão, juntando-lhe terra amassada misturada com palha, que era o cimento da época.




Capela do Anjo S. Gabriel vista do Castelo de Castelo Melhor


Se os calabrenses ou outros os foram ali importunar, não consta; o castelo, ou melhor dizendo, a muralha à volta do cume da colina, lá está, com vários metros de altura, desde o lado nascente, mais alto na parte norte e poente, e com dois ou três metros do lado sul; digo lados, para facilitar a compreensão, pois não é uma construção em círculo perfeito, tendo sido mais usada a economia de meios, conceito já nessa época praticado, do que a preocupação geométrica.


Muralha do Castelo de Castelo Melhor


Dado o espaço existente entre a face interior da muralha e a base do centro rochoso ser tão pequena, tudo leva a crer que seriam poucas e de reduzidas dimensões as habitações intramuralha; e a fortificação só serviria mesmo para refúgio, por tempo indeterminado. Mesmo a existência de um poço, este sim, quase circular, que devia servir para represar as águas das chuvas, já que nascente, naquele ponto, seria difícil existir; deve ter sido construído por descendentes dos originais construtores. 


Poço existente no interior do Castelo


As habitações mais próximas e provavelmente as mais antigas, ficam a cerca de cem metros da muralha, na encosta norte e nordeste, designada por abixeiro, designação que sempre interpretei, como sendo o avesso de soalheira; ou então, Abixeiro, devido à forma como as construções se foram agrupando, formando bicha, em direcção ao castelo ou dele divergindo.




Embora a rua existente tenha esse nome, com placa toponímica – modernices – a verdade é que não há referências nos documentos consultados. E como tudo o que está embalado em celofane de lenda, assim deve continuar, a História tem muito tempo e pode esperar, não fiz qualquer esforço documental em relação a datas e vocábulos, porque não tenho formação ou vocação, e nem tempo, para calar o que de histórico existe, até porque a História, não raras vezes, com suas obsessões de rigor e finitude, apaga a parte encantatória que espaços, tempos e seres mantiveram anteriormente, mesmo antes da invenção da História, condenando sumariamente, algumas vezes, os crimes que as lendas e seus protagonistas não cometeram e raramente aceitam ter havido erro histórico. E, assim, a rudeza da ciência histórica não repõe nem repara a beleza e a ternura das lendas que vai desfazendo.




Não foi este o caso e disso me encarreguei de salvaguardar.

O castelo foi crescendo devagar mas seguramente, a família foi aumentando naturalmente, quando o grupo era formado por homens e mulheres, e ainda pelos que, pela calada da noite e sem se despedirem, foram deixando o Calabre e se foram juntando aos de Castelo Melhor, que ainda o não seria tanto por estar em construção. 


O chefe tribal do Calabre, furioso com as fugas quase diárias, ordenou a três dos guerreiros da sua confiança, que fossem ver o que se passava lá para os lados dos dissidentes e tentassem convencer a voltar os que, de noite se tinham escapulido. Os emissários lá foram aos tropeções por ladeiras agrestes, onde só pedras e mato cresciam até que agora estes, lá do alto que veio a chamar-se de Santa Bárbara, viram as paredes já bem altas, do castelo em construção e logo comentaram, “este castelo é bem melhor do que o nosso”, razão tinham eles!

Com alguma precaução, pois eram o pessoal de confiança do chefe do calabre, foram descendo a encosta, até que foram interceptados, por uma moira que andava à caça com mais três adolescentes e lhes perguntaram quem eram, de onde vinham e ao que vinham. Lá se explicaram, beberam água fresquinha numa fonte que ali perto havia, e que veio, muitos anos depois, a chamar-se de Santa Maria; e todos os sete, falando a mesma língua – pois a emigração para França, só muitos séculos depois é que se daria – desceram até à parte mais ou menos plana do requeijão e depois foram subindo pelo abixeiro até há construção em curso (sem licença, como agora, sem responsável pela obra, como agora) onde encontraram uma grande azáfama e depois uma grande festa; foi então, que o mais velho dos três guerreiros viu o seu irmão, desavindo com o chefe do calabre, de braços abertos para o receber. 


“Como nós envelhecemos”, disseram em coro, ao mesmo tempo que eram abraçados por todos; “mas temos de acabar isto”, dizia o do castelo em construção. “E nós vamos ajudar-vos, se nos aceitarem e não voltaremos mais para o calabre”, dizia o mais velho dos três guerreiros. “Não senhor, não vão fazer nada disso; os que vieram durante a noite, de livre vontade, cá ficaram, estão bem, trabalham no castelo, e estão a fazer a sua casa; vós, como viestes em nome do meu avô, vão voltar e dizer-lhe que estamos bem e quando um dia quiserem vir, podem mudar-se para cá, até porque já não serão muitos lá no calabre.”. “Sim, somos já poucos e quase só velhos, mal conseguimos tirar da terra o bastante para nos mantermos; o que nos vai valendo é o rebanho das cabras”. “Então vão lá e venham todos”, disse-lhes o chefe do novo castelo. 


Castelo de Castelo Melhor


“Nós vamos e voltaremos se o casmurro do teu avô nos não convencer a ficar; está velho e sobretudo mais intransigente e injusto, mas vamos tentar que ele venha”.

Lá partiram, sem esperança de voltar e menos ainda de que o velho patriarca os acompanhasse.

Ainda a grande distância do Calabre começaram a ver uma grande mancha de fumo, cada vez mais denso e que lhes parecia ser lá para os lados do seu castelo. Aceleraram o passo ladeira acima até ao ponto mais elevado de onde se avistava o Calabre. Era já noite.

As chamas envolviam todo o castelo e temeram que os seus familiares mais próximos não tivessem escapado e a correr como podiam foram-se encontrando pelo caminho com pequenos grupos aterrorizados, só com as roupas que usavam vestidas, cansados e se água ou alimento.


Monte Calábria (à direita na foto)
«O que se passou, perguntaram os três ao mesmo tempo? O chefe acordou bem cedo e subiu ao ponto mais alto do castelo; como lhe disseram que vós não tivesseis regressado ainda, ficou de tal modo furioso que começou a amaldiçoar tudo e todos sobretudo a vós os três, chamando-vos traidores, bastardos e a ameaçar deitar o fogo a tudo. Reuniu o que restava da tribo, os mais novos já tinham começado a abandonar o castelo e sem atender às vozes que lhe aconselhavam calma dissolveu o conselho dos anciãos e chamou seis guerreiros para que formassem um conselho de guerra para vos julgar aos três como traidores e que fossem severamente punidos. À revelia? Sim, à revelia.»

O conselho assim nomeado concluiu que não cederia a pressões e que não julgaria à revelia fosse quem fosse antes de saber se traíram ou se ainda não tinham voltado por não terem conseguido; decidiram também que a partir desse momento nenhuma decisão seria tomada sem que o concelho dos anciãos do qual faziam parte fosse ouvido, devendo por isso ser convocado novo conselho.

Foi o fim. O velho chefe tribal, incapaz de perceber o que se passava para perceber sensatamente, preferiu chamar a si todos os poderes e, praguejando, dirigiu-se para o subterrâneo do castelo, sempre acompanhado do seu corpulento bode preto e ali se trancou.

Uma violenta trovoada estoirou por cima do castelo e era tal o brilho dos relâmpagos e o ruido dos trovões qua todos pensaram que era o fim do mundo a chegar e que o velho guerreiro e chefe tribal e as suas pragas estavam na origem de tamanha borrasca quando ainda há pouco o céu estava quase limpo.


Vista geral sobre Castelo Melhor


Ainda não sabiam que havia no céu uma santa que tinha a seu cargo acudir aos crentes qua a convocassem quando havia trovoada. Como não crentes da religião a que a santa pertencia o mais natural seria, mesmo que soubessem por ouvirem falar, não a invocassem por preconceito religioso, por sinal bem frequente nos tempos mais actuais. E tal desconhecimento ou recusa em pedir ajuda terá sido a sua salvação. Afastaram-se cada vez mais do castelo e já distanciados, umas centenas de metros, viram que um relâmpago como nunca tinham visto antes iluminou o céu por milésimos de segundo (não dava para confirmar pelo relógio mesmo que relógio houvesse, já que tal preciosidade só muitos séculos mais tarde veio a ser útil a uns tantos, a enriquecer alguns e nalguns casos a enfeitar os bolsos e os pulsos de muitos), mas aquela tribo nem dos de sol tinha, embora por ele e outras estrelas se guiassem e orientassem.

Dizia que o tal relâmpago nunca visto igual atingiu em cheio a parte do castelo onde se situavam os currais e a lenha, criando um fogaréu que depressa se elevou no ar e alastrou a toda a área castelar.

De longe viram que só as paredes, ou seja, a muralha ia resistindo e na noite ficava um “esqueleto” de castelo recortado no vermelhão do rescaldo.

Mas ainda conseguiram distinguir, bem no alto da torre mais alta, a imponente figura do bode que o reflexo do brasido nos seus olhos caprinos pareciam dois faróis a iluminar o caminho do que restava da tribo em fuga.

Ainda hoje, muitos séculos volvidos, se algum incauto ou mais afoito entra nas ruinas do que resta do Calabre, lá vai encontrar o velho bode de luzidio pêlo preto e olhos em chama. Os mais atrevidos que ousaram montar o velho bode tiveram encontro com Satanás e transformaram-se em fantasmas do velho chefe tribal que continua fechado nos subterrâneos do castelo para a eternidade da lenda!


Fim


Texto: Reis Caçote

02 junho 2012

A LENDA DOS CASTELOS - Parte I

Castelo Melhor


Quando de lá saí, em finais de Setembro de 1952, não havia água canalizada, nem electricidade, nem telefone, nem estradas, nem um único doutor ou engenheiro, nem sequer as gravuras que, segundo me garantem e eu acredito, já para ali estavam há mais de trinta mil anos! É muito ano! E sempre tão disfarçadas que nunca se denunciaram; até que um dia... Lá voltaremos.

Mas havia o castelo, a igreja, duas escolas primárias - hoje do primeiro ciclo - uma para os rapazes e outra para as raparigas, nada de misturas; havia também umas largas centenas de pessoas, perto de mil, ufanas da sua terra, a maior parte delas; todas não, como é costume, mas as que o eram tinham por lema dizerem-se de “Castelo Melhor, dos pimpões”, expressão que vinha de um velha quadra popular na zona, que rezava assim:

«Muxagata das tomatas
Vila Nova dos ladrões
Almendra dos urtigões
Castelo Melhor dos pimpões»


Poderíamos tentar encontrar uma explicação para aquela vaidade toda, mas tal como está é que me parece bem. Assim, há que não mexer.

Havia muitas fragas e terra, pouca, mas ia dando, desigualmente como é hábito, para todos viverem, mal quase sempre, sem assistência médica ou outra, a não ser o doutor Caldeira, que morava em Almendra, a tal dos urtigões, e que uma vez por semana ia a Castelo Melhor, onde nasci e vivi até aquele Setembro distante.

Como disse lá atrás tinha um castelo e tem-no ainda e como já vimos não se trata de um castelo qualquer, mas o Castelo Melhor!


Castelo de Castelo Melhor
Desengane-se quem acidentalmente, possa ler este apontamento e não conhecer o castelo; é uma muralha, construída em torno da crista de uma colina e todo o seu miolo é um aglomerado de xisto, que sobressai bastante acima da muralha ou do que dela resta.

O qualificativo de “Melhor” tem a ver, como quase sempre sucede, com uma lenda que lhe está subjacente e que, em traços largos, é mais ou menos assim:

Na tribo de origem dos meus longínquos antepassados, habitantes de um outro castelo – o Calabre – que nunca soube exactamente onde ficaria e que também tem a sua lenda, e se lendas são não se lhes deve tocar para que se mantenham como tal e mantenham a natural beleza da lenda.

Deve ter sucedido algo de anormal, lá para o Calabre, se calhar desentendimentos sobre chefia ou governação má ou então, o que não seria de todo impossível um conflito de gerações, como hoje se vai chamando quando uns querem só os direitos e outros não querem só os deveres; o que é certo, é que o grupo se cindiu, e uns quantos, à falta de outros argumentos melhores, decidiu separar-se e no acto de despedida, em jeito de ameaça e também desafio, prometeu, aos que ficavam que ainda iriam ter um castelo melhor.

Eu estou convencido, mesmo que não conste da lenda e muito menos da estória, que o grupo dissidente já devia ter andado por aquelas paragens, nos seus passeios a pé ou montados nalgum animal que já tivessem por sua conta e domesticado ou durante as caçadas, que por certo fariam; e deviam ter já reparado que havia para aqueles lados, bons locais para fazerem um castelo ou outra estrutura defensiva; lá está, defensiva, é por que algo temiam. Vamos em busca do que temeriam. 

E agora, sem querer interferir nas voltas que a vida daquela gente terá dado, acho que outra lenda, se lhes atravessou no caminho, antes de definitivamente se decidirem por aquele local da fortificação.

Estou a imaginá-los a olharem em volta, vindos dos lados do Rio Douro, que não sei se já se chamaria assim, mas tudo leva a crer que já por ali corria, há milhares ou milhões de anos, com algumas alterações que a natureza foi por certo introduzindo, mas quando digo milhares ou milhões de anos é porque já há muito chovia, muito nalguns períodos e nada noutros, como hoje sucede.

Dizia que, vindos do lado do Douro e quando chegaram ao Alto de Santa Bárbara, que não podia ter esse nome, nem outro, e muito menos teria a capela, devem ter visto, logo no primeiro plano, à direita, a serra, sem nome como hoje, só serra, que ia crescendo em declive irregular vinda dos lados do Rio Côa e do lugar onde se junta ao Douro, acabando num penhasco de xisto de onde se via tudo em redor.

O citado rio Côa, tal como o Douro, não sei se teria já esse nome, mas que por ali já corria há milhares de anos não pode haver dúvida, ou então as tais gravuras não podem ter trinta mil anos, já que é nos penedos que estão junto à margem que os riscos foram feitos, não sei por quem, e se soubesse não dizia, pois não só não tenho feitio de denunciante e muito menos tratando-se de conterrâneos meus.




Terão visto também, lá mais ao fundo, a colina, bem mais pequena na altitude, mas mais equilibrada para fazerem um castelo; parecia um requeijão quando vista de mais perto.

Embora aquela ponta da serra fosse o que mais lhes agradara e melhor servia para organizar a defesa ou dos escassos meios tirar proveito, pois bastaria largar uns calhaus em direcção às hordas assaltantes e que, com a velocidade vertiginosa que, de certo, adquiririam, levariam tudo à frente, como bem me lembro das “galgas” a descer a Cabreira, ou os Cascalhais, a saltarem como loucas, por cima de árvores e outras rochas, partindo pelo caminho tudo o que à frente se lhes atravessasse, só parando quando se desfaziam em pedaços pelo caminho ou então quando atingiam os leitos dos rios, Douro ou Côa, conforme se tratasse da Cabreira ou dos Cascalhais.

Aquela ponta da serra era a mais indicada à primeira vista, como já disse, por ser sobranceira a todas as outras a vários quilómetros em redor, mas teve de ser rejeitada por dois motivos, ambos de inegável valia a ter em conta: o primeiro era de natureza estratégica, por não ser fácil defender com vantagem o lado virado à foz do Côa, do lado do Orgal, só citado para melhor orientação, pois o lugar não existia na época em que nos reportamos, assim como os que atacassem do oeste por a serra quase não ter declive durante muitas centenas de metros; podiam colocar sentinelas, mas gente com essas características não devia fazer parte dos planos, até porque o grupo dos dissidentes não era muito numeroso e funcionava melhor quando em ataque agrupado.




O outro motivo, de natureza divina, bem mais complicado que o estratégico, como se veio mais tarde a comprovar, é que foi na ponta do rochedo que, em tempos não datados, mas que teria a ver com a distribuição dos espaços entre as forças celestiais, o Anjo Gabriel, embaixador do Céu, desceu e dali contemplou a beleza e também a pobreza de toda a imensidão envolvente; e tão necessária achou a sua definitiva guarda, que decidiu que ali devia ser erguida uma sua morada. E embora estivesse distante o tempo que mediava entre a construção do castelo e a morada para o Anjo, a verdade, salvo seja, é que os mediadores acharam que deviam ceder à vontade divina, não só por ter direitos adquiridos e que naquele tempo eram bem mais respeitados do que o são agora, mas também porque não iam desencadear uma guerra entre o Céu e a Terra, tanto mais que foi para evitar uma guerra entre família que deixaram o Calabre há já uns dias; a dormirem ao relento, mal alimentados e cansados. Em suma, nada de guerras e mãos ao trabalho, ficando assim assente, que o castelo iria ser construído lá em baixo, na colina que parecia um requeijão, não sei se haveria tal iguaria naquele tempo, mas se não havia, não souberam nem saberão o que perderam. 


Texto: Reis Caçote

25 novembro 2011

Lembranças do "Homem Macaco" (Albano de Jesus Beirão)


Albano de Jesus Beirão, o nosso Albaninho, para uns é um fenómeno inexplicável, para outros é um mito, para alguns outros é um mistério com um homem dentro. Colocados perante o Albaninho como simples observadores, tomamos necessariamente uma destas posições, e, tal como vemos de forma diferente um copo com água dentro, uns vêem menos a água se se fixam na beleza do recipiente, outros deleitam-se na total transparência do cristal, enquanto há quem se abstraia de tudo e se concentre na pureza do líquido.
Como quer que seja, Albano de Jesus Beirão, que se tornou mundialmente conhecido como o "Homem-Macaco", nasceu e viveu nesta região, aqui arrastou o seu drama ingente, a estranha doença que, como dizia sua pobre mãe, "era uma doença que ninguém mais tinha".
Há ainda muita gente que se recorda desta personagem estranha, gente natural da Meda, de Trancoso, de Foz Côa, desta região, enfim. Muitos o viram, por aqui também, nos seus espantosos "trabalhos". Não desapareceu, por isso, da nossa memória colectiva a estória deste homem singular, mas o caso do Albaninho corre o risco de se transformar num "mito” à medida que os anos vão passando e, com o decurso do tempo, aumenta igualmente o número dos incréus...

O Albaninho...
Os mais velhos, os que tenham mais de 80 anos, poderão lembrar-se dos seus feitos. Morreu com 94 anos, em 1976, há 27 anos. Se fosse vivo teria agora para fazer nada menos do que 122. Era um homem de estatura menor que a média, bem encorpado, simpático, cara redonda e franca, consciente da sua humildade, de carácter eminentemente beirão, mas deixando sobressair, de quando em vez, uma certa consciência de que era, na sua infelicidade, uma pessoa invulgar. Nasceu em 1882, na freguesia do Aveloso, concelho da Meda, ao lado da Ribeira Teja, cujas paisagens tanto embelezam a povoação. Puseram-lhe o nome de Albano de Jesus. Seu pai era das Astúrias, Espanha, donde tinha fugido e onde tinha apanhado gazes num movimento revolucionário. Sua mãe ficou viúva pouco tempo após o nascimento da criança e voltou a casar. A família, simples, vivia do amanho dos campos.
(…)

Excerto de um excelente e muito interessante relato da vida Albano de Jesus Beirão publicado na CÔAVISÃO nº 6 2004.

Episódio da série televisiva "Fenómeno", produzida pela Mínima Ideia para a RTP 2, dedicado a Albano Beirão e aos estranhos acontecimentos que marcaram a sua vida.

Fenómeno - Albano Beirão (Parte 1)

Fenómeno - Albano Beirão (Parte 2)

Fenómeno - Albano Beirão (Parte 3)

Fenómeno - Albano Beirão (Parte 4)