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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O Grande Recomeço IV

       

         (última parte)

KJ – Há mais provas dessa manipulação?
WM – Através da análise de uma transcrição de uma reunião da FED em Março de 1978, sabemos que a manipulação do preço do ouro foi um dos pontos discutidos. Durante essa reunião, o governador Miller refere que nem foi necessário vender ouro para fazer baixar o preço, bastou fazer uma declaração aludindo à disponibilidade da FED em fazê-lo. E porque o Tesouro dos EUA não está autorizado a vender as sua reservas, a FED decidiu em 1995 estudar a criação e implementação de mecanismos especiais ´gold-swaps` [contratos de futuros ou papel-ouro – nota tradutor] para poder aceder às reservas dos Bancos Centrais ocidentais. Através destes mecanismos, o ouro pode ser cedido em empréstimo à FED para que possa ser vendido pelos bancos de Wall Street, obtendo com isso a supressão do preço. Por causa destes contratos (swap´s) o ouro é, oficialmente, apenas emprestado, pelo que os Bancos Centrais podem manter nos seus balanços esses activos. A FED também informava antecipadamente os Bancos Centrais se esperava uma descida do metal e, desse modo, as reservas destes inundavam o mercado antes dessa descida. O que, como é obvio, acentuava a queda do preço.
Do ponto de vista logístico esta operação era muito fácil de concretizar, uma vez que os cofres em Nova Iorque tinham a maior colecção das reservas de ouro estrangeiro. Desde a década de 30, muitos países europeus escolheram armazenar o ouro que possuíam nos EUA por receio de uma invasão alemã ou soviética.
KJ – O Reino Unido teve algum papel nessas intervenções?
WM – Entre 1999 e 2002, o Reino Unido deu início a uma venda agressiva das suas reservas de ouro, precisamente, quando o preço estava em mínimos de 20 anos. Antes mesmo de dar início a essa venda, o responsável pelo Tesouro Gordon Brown anunciou que o Reino Unido iria colocar no mercado mais de metade do seu ouro numa série de leilões, com a intenção manifesta de diversificar as reservas do Tesouro. A reacção dos mercados foi de choque, porque nunca um governo tinha anunciado aos investidores que iria vender. Gordon Brown estava a seguir a mesma estratégia da FED que assinalei atrás, para induzir uma quebra do preço por via desses avisos. A intenção dessa acção não era a de obter o melhor preço, antes a de manter uma pressão constante para acentuar a baixa no preço. Assim, o Reino Unido vendeu perto de 400 toneladas ao longo de 17 leilões em apenas três anos. Durante este período o mercado estava a encontrar o seu fundo, ou seja, enquanto estabilizava de uma queda prolongada, esses leilões forçaram mais quedas no preço. No meu entender, a decisão de Gordon Brown foi uma resposta a um pedido dos Estados Unidos. Os EUA apoiaram Gordon Brown desde então.
KJ – Como é que essas manipulações ocorrem hoje?
WM – A transição de um mercado presencial para um mercado electrónico e digital abriu novoas possibilidades para controlar os mercados financeiros. O consagrado advogado de Wall Street Jim Rickards apresentou um artigo em 2006 onde se explica como os ´derivativos podem ser usados para influenciar os mercados físicos do petróleo, do cobre ou do ouro`. No seu sucesso de vendas “Currency Wars”, Rickards explica como a proibição da regulação dos derivativos no Commodity Futures Modernization Act (2000) ´abriu a porta para o aumento do tamanho e variedade destes mecanismos que estão, agora, escondidos e fora dos balanços dos maiores bancos, pelo que é quase impossível de acompanhar ou regular`. Estas mudanças permitem manipular facilmente os mercados financeiros, especialmente porque os preços dos metais (como o ouro ou a prata) são determinados pela negociação dos contratos de futuros no mercado global. E porque 99% destas transacções são conduzidas por especuladores que não querem a entrega física desses metais, ficam satisfeitos com os lucros que retiram desses contratos de futuros. Assim, os mercados do ouro, da prata ou de outras matérias-primas são fortemente condicionados pelas transacções desses contratos [a que se chama também de oferta sintética – nota do tradutor].
A quebra de 200 dólares no preço da onça (oz) de ouro nos dias 12 e 15 de Abril de 2013 é um exemplo perfeito e recente desta estratégia. A quebra no preço da prata, após ter alcançado os 50 dólares/oz no dia 1 de Maio de 2011, é outro claríssimo exemplo.
KJ – Por quanto tempo pode continuar esta guerra?
WM – Como Koos tem tornado público com as suas investigações, são vários os indícios de problemas no mercado físico do ouro. Eu ficaria surpreendido que este jogo de papel-ouro [oferta sintética] pudesse continuar por mais dois anos. Este jogo pode ruir ainda em 2014. O incumprimento num contrato de futuros (em ouro ou prata) no COMEX é uma possibilidade real. Aconteceu algo de semelhante no mercado da batata em 1976, quando um contrato de futuros não foi cumprido no NYMEX. Um magnata da batata vendeu muitos contratos que ficaram por cumprir na data em que expiraram, o que resultou em incumprimentos nas entregas físicas dos bens contratados. Como podemos ver, isso já aconteceu. Num cenário desses, os contratos serão dissolvidos através do pagamento em dinheiro e não através da entrega dos bens contratados. E num preço determinado unilateralmente. Julgo que o COMEX vai recorrer a estes acordos e indeminizações e não serão cumpridos os contrados de entrega dos metais contratados. Isso acontecerá em breve. Depois de um acontecimento desses, o preço do ouro será determinado nos mercados asiáticos como o Shangai Gold Exchange, pelo que espero uma subida rápida de 1000 dólares no preço do ouro e a duplicação do preço da prata, literalmente, da noite para o dia. Essa é uma das razões pelas quais o nosso Commodity Discovery Fund investe em empresas de mineração desvalorizadas, mas com largas reservas por explorar de ouro e prata. Terão, seguramente, um grande potencial de valorização quando o cenário que apresentei se concretizar.


Pela apresentação desta quarta parte, fica concluída a publicação da tradução da entrevista a Willem Middlekoop. Convido os leitores, numa releitura da entrevista, a colocar em perspectiva toda a informação histórica disponibilizada e que procurem ver o momento presente à luz desse enquadramento.       
Nos dias que antecederam a publicação e a tradução desta entrevista alguns acontecimentos tiveram lugar que têm relação com o que, de substancial, nela se abordou, pelo que deixo aqui a sua referência. Que cada um dê a importância e o significado que quiser dar-lhes. 
Para além da polémica do repatriamento do ouro alemão que está nos EUA (a polémica quanto ao  atraso nessa operação), é de notar que um grande banco internacional começou a impor limitações nos movimentos de capital em Inglaterra (o leitor lembra-se da referência ao artigo de Rogoff e Reinhart para o FMI?). Por outro lado, a “casa da moeda” austríaca (responsável pela cunhagem de uma das moedas mais conhecidas para investimento em ouro e prata – Wiener Philarmoniker) estar a trabalhar 24 sobre 24 horas para responder à importante subida nas encomendas dos seus produtos.
        Terá Willem Middlekoop razão e dois anos são um luxo que o sistema financeiro internacional não pode pagar?


(edição) - mais um importante facto que importa assinalar quanto à possibilidade de imposto sobre poupanças bancárias na Europa. É esta a União bancária que desejam os políticos europeus?






sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Primeiro, vagarosamente; depois, o turbilhão súbito

Finda, por agora, a pantominice mediática acerca do shutdown ("apagão") do governo federal e da (nova) elevação do limite de endividamento, deste modo prevenindo, num "dramático último momento", a catástrofe anunciada que impendia não apenas sobre os EUA mas sobre boa parte da humanidade, é tempo de procurar regressar à sanidade.

Assim, é de referir que o acordo alcançado no Capitólio, e visado na Casa Branca, em nada contribuiu para alterar os desequilíbrios gigantescos das finanças federais americanas (muito pelo contrário, vide Obamacare). Consequentemente, a dívida pública continuará a subir acentuando a sua já mais que insustentável trajectória e boa parte dela continuará a ser alvo de uma monetização pelo Fed (através da tecnologia da "printing press" que Ben Bernanke tanto elogiava) pelo que, por conseguinte, continuará a trajectória descendente do valor do dólar. Simon Black, na linha de um par de apontamentos que deixei recentemente aqui e aqui vê, entre outras, razões para valorizar o crescente incómodo das autoridades chinesas, aliás publicamente já assumido em termos vigorosos. Pareceu-me pois útil proporcionar uma tradução da sua missiva, enviada de Santiago do Chile, "Slowly at first, then all at once" até porque começaram a surgir sinais sérios que podem indiciar a intenção de implantar controlos de capitais dentro dos próprios EUA dificultando a movimentação de contas bancárias de e para o exterior.
17 de Outubro de 2013
Santiago do Chile

"Como é que foste à falência?", perguntou o Bill.

"De duas maneiras", respondeu o Mike. "Aos poucos e subitamente."

O diálogo acima faz parte do romance de Ernest Hemingway, de 1926, "O Sol também se levanta".

Ele é muitas vezes atribuído a Mark Twain ou a F. Scott Fitzgerald, ou mal citado como algo do género: "No início, entra-se lentamente em falência; de repente, tudo acontece de uma só vez". Mas o tema é o mesmo.

As nações entram em bancarrota da mesma maneira. Os colapsos bancários ocorrem da mesma maneira. As crises cambiais acontecem da mesma maneira. Todos estes casos acontecem gradualmente... até que, de súbito, tudo se precipita. Por vezes, de um dia para o outro.

A história é generosa em proporcionar exemplos de nações inteiras que sofreram este destino, do colapso da União Soviética, em 1991, à crise financeira do milénio na Argentina, em 2001.

Os sinais de alerta estão sempre lá, logo no início. Ao longo de um período de anos, às vezes de décadas, um pequeno gotejar de sinais de alerta transforma-se num fluxo constante... e, eventualmente, numa grande inundação.

Os Estados Unidos estão claramente dentro deste padrão, algures entre um fluxo constante e uma grande inundação. Isso é evidente.

Ontem à noite, depois de mais de duas semanas de um teatro absolutamente constrangedor, o governo da Terra dos Livres assinou um acordo para tudo adiar por mais alguns meses. E ao fazê-lo, foi estabelecido um precedente muito perigoso.

No âmbito da barganha codificada na HR 2775 (que o presidente Obama promulgou), o Departamento do Tesouro fica autorizado a SUSPENDER o limite de endividamento. Por outras palavras, para todos os fins e propósitos, não há agora NENHUM LIMITE à dívida pública [federal].

Esta autoridade ilimitada para contrair empréstimos expira a 7 de Fevereiro de 2014. Mas estabelece o precedente que ignorar o limite de endividamento é um curso de acção perfeitamente viável.

O Congresso eliminou eficazmente as algemas de que dispunha... pelo que se pode apostar com praticamente toda a segurança que aquela disposição será prorrogada e, a certa altura, se tornará permanente.

Na Terra dos Livres ninguém se parece importar. Mas não é o caso dos estrangeiros. A mensagem essencial do comentário dos media estatais chineses, há dias atrás, foi muito clara:
"É talvez um bom momento para que o mundo confuso comece a considerar a construção de um mundo desamericanizado".
A posição dominante da América está chegar ao fim. Praticamente todas as evidências objectivas apontam para esta conclusão - desde as absurdamente insustentáveis finanças ​​do governo dos EUA à reacção mundial contra as suas tácticas desesperadas de espionagem.

Há já vários anos que este declínio vem acontecendo gradualmente. Mas nós estamos rapidamente chegando ao ponto de bifurcação onde o fluxo constante de sinais de alerta se transformará numa torrente épica de consequências.

Com o desenrolar destes acontecimentos, isto tornar-se-á na maior história do nosso tempo. O fim da hegemonia do dólar dos EUA irá afectar praticamente cada ser humano do planeta. E se a história serve de guia, o que se seguirá será extremamente tumultuoso.

Simon Black