É
verdade que ainda nos entretemos a desejar maravilhas para o próximo ano, facto
que só pode significar duas coisas, ou
um optimismo indefectível e até um
bocadinho parolo. Ou um forte desejo, mas com muito travo de descrença. E neste
interim de nos auto convencermos da mudança positiva na conjuntura do mundo e, mais
que tudo, na saúde dos homens, nesta esperança de que uma vacina mundial –
nunca tal nos existiu – nos devolva o mundo conhecido, venho eu falar de
livros. Porque, apesar de ter lido menos, sou como certo filósofo, prefiro
pensar noutra coisa. Portanto, sei que li menos mas não me lembro do que li e, nem
que quisesse, poderia fazer uma listagem. Li e arrumei. E terei preferido umas
obras em detrimento de outras.
Ora
acontece que me deram uma prendinha de Natal com antecedência e a abri devido à
curiosidade do doador com a minha reacção. Portanto, aproveitei estar ali
nuazinha e li-a antes do Natal. Surpresa agradável. Suponho eu nunca ter lido
Julian Barnes. Lembro-me de ter andado em busca da obra “O papagaio de Flaubert”,
de me dizerem na livraria que só estava disponível para compras on line e
entretanto me ter passado. O livro que me ofereceram chama-se “A única história”.
É um romance que prende o leitor quase à moda antiga e me parece abordar de
forma algo original a solidão dos homens. É certo, tem personagens específicos,
mas o que ali se retrata é o homem. Depois há afirmações que nos entram e como
que encaixam, podiam ser nossas, “andamos todos à procura de um lugar seguro.
E, se não o encontramos, então, temos de aprender a passar o tempo.” E sentimos
que não é uma visão desencantada, é assim mesmo. A única história é, afinal, a
história de amor de cada um, não é apenas a do livro, é a nossa, a que um dia
vivemos, a que não vivemos mas sonhámos, a que imaginámos. Porque, como diz Julian
Barnes, “mesmo que fosse um fiasco, que se tivesse desvanecido, que nunca
funcionasse ou que, desde o início, fosse só mental: isso não a tornava menos
real. E era a única história.” Bom, para além destas verdades há outras; e há também
a história do livro cuja não vou desvendar nem de leve. Uma outra afirmação que
gostei de ler, diz respeito ao valor da palavra, “as palavras, uma vez ditas,
não podem desdizer-se(…) podemos declarar que tudo esquecemos, mas o nosso
íntimo mais íntimo não esquece, porque nos transformámos para sempre.”. E
depois há assim umas frases simples que nos comovem de tão necessitadas. Por
exemplo, “onde estiveste a minha vida toda”. Ou, “Não me deixas já, pois não,
Casey Paul”. E há ainda uma grande e herética verdade, bastante necessária
ainda que pouco romântica, “conhecia a satisfação de sentir menos”.
Conclusão,
encontro-me na disposição de vir a ler outras obras do autor.
E faz muito bem bea, já li alguns e nunca me senti defraudada: diria mesmo que é uma excelente ideia ler mais livros do Julian Barnes :-)
ResponderEliminarBom Ano e boas leituras.
📚
Obrigada pela opinião, Maria. Hei-de ver esse assunto. Mais tarde. Neste momento tenho Lobo Antunes à cabeceira e estou a gostar.
ResponderEliminar... assim sendo, levo a sugestão!
ResponderEliminarBoas leituras em 2021 👏
Obrigada, Gracinha. Hei-de ir lendo alguma coisa, tenho alguns em espera desde o verão.
EliminarNunca li nada dele, e creio que não tenho nenhum livro dele, mas vou tomar nota.
ResponderEliminarDo Lobo Antunes sou fã.
Boas leituras e um bom fim-de-semana:))
O último livro é um bocadinho diferente, tem um inesperado lado de ternura e fala de um lugar que quase conheci. Estou a gostar bastante.
ResponderEliminarObrigada, Isabel. É um fim de semana de frio e recato, factores que até conjugam.
Também li menos em 2020, o que não deixa de ser paradoxal, considerando o tempo aumentado das longas horas de confinamento. Mas a mente andava mais ocupada com o receio do vírus e a excessiva higienização.
ResponderEliminarJulian Barnes ainda não consta das minhas leituras. Terei de corrigir essa falha. :)
O escritor também não constava das minhas leituras:).
EliminarNo meu caso de certeza não foi pela preocupação com o vírus. Foi porque sim.
Concordo consigo Bea, temos todos uma espécie de esperança quase infundada no ano que agora começou. Vejo isto assim como alguém que não é crente e num dia de tempestade chama por Santa Bárbara - temos de nos agarrar a qualquer coisa, ajuda. Como alguém dizia, este ano vamos precisar de coragem para viver, generosidade e solidariedade para conviver e prudência para sobreviver.
ResponderEliminarNo ano que acabou, muitos de nós encontraram nos livros (e nos filmes e nas séries) uma espécie de ópio contra a pandemia, de forma a libertar a mente durante algumas horas. Neste Natal pedi para não me oferecerem mais livros, pois para além da falta de espaço, queria dedicar-me a algumas releituras e acima de tudo, porque acho que tenho mais livros do que tempo de vida para os ler.
Infelizmente não fui persuasivo o suficiente e recebi o Kafka à Beira-mar, 590 páginas para me afundar num mundo surreal e fantástico. Não sei se vou gostar, talvez tivesse preferido A Amiga Genial, a ver vamos.
Que bom foi ter gostado do seu livro Bea, quando assim acontece, a gente fica com a sensação que o autor está a escrever para nós ou que é nosso porta-voz, não é?
Vou-lhe dizer mais uma heresia Bea, pois li há alguns anos O Papagaio de Flaubert e não gostei. Não gostei talvez por ser um livro tão aclamado e porque tinha as expectativas muito altas, mas deve ser defeito meu, porque ia a contar com uma coisa e saiu-me outra. Sobre isto, hoje em dia até faço uma coisa interessante, quando vou ler um livro que sei que sai da minha órbita, tento apaladar-me a ele, como saber que vou almoçar peixe cozido, e então levo para a mesa a maionese, um copinho de branco do bom, um pouco de feijão verde, e no fim o peixe até me sabe bem... é tudo uma questão de mentalização, de preparação. Comigo funciona!
Quanto à afirmação que gostou de ler, respeitante ao valor da palavra, “as palavras, uma vez ditas, não podem desdizer-se", deixou-me pensativo. Pretender dar à palavra o mesmo valor da ação parece correcto, ainda há contratos que se celebram com um aperto de mãos, sem necessidade de outra formalidade - está dito, está feito - numa sociedade ideal, talvez utópica. Mas também faz parte da vida as pessoas se arrependerem, de atos, de palavras e talvez muito mais de pensamentos. E, já agora que penso nisto, nunca ouvi ninguém dizer que se arrependeu de pensamentos...
PS - morreu Carlos do Carmo; gostava de o ouvir cantar, mas mais que o ouvir cantar, encantava-me ouvi-lo falar. Raramente encontro gente no meio artístico com o à vontade, a presença de espírito, o savoir dire, o pensar pela sua cabeça, como este cavalheiro. E sempre ficava com a impressão que ele também se deliciava com isso. Vaidade? Talvez... mas quem tem só virtudes?
Um resto de boa tarde.
Suponho ter o livro Kafka à beira mar. Que não me levou a repetir o autor. A amiga genial, penso eu que é livro que agrade mais a mulheres:), é descomplicado, uma história à antiga contada em vários livros.
ResponderEliminarVamos lá a ver, não julgo que o autor escreveu para mim senão enquanto elemento do género humano. Julgo, isso sim, que ele conhece o bicho homem e o retrata. E, nesse sentido, me retrata.
Quanto à afirmação sobre as palavras, o que retive e acho mesmo muito verdadeiro, é que elas fazem mossa, deixam marca. Podemos enganar-nos, desdizer, mas a marca está lá. Aliás, convenço-me que quase tudo deixa marca, não apenas as palavras. Mas, facto curioso e verdadeiro é o de usarmos as mesmas palavras e expressões referidas a amores diferentes. Julian Barnes escreve também sobre isso. Dei por mim a pensar se serão as mesmas por sermos nós os mesmos e o sentimento ser semelhante e afinal enfeitamos o outro com termos tão gastos e nada originais.
Bom, eu vivo bastante a peixe cozido e grelhado:), já me habituei a gostar. O papagaio de Flaubert é um livro barato, não tenho ideia do tema e nem quero ter, nunca leio as contracapas, faço questão que os livros me surpreendam.
O arrependimento tem muito a ver com a acção e o mal que causa. Por alguma razão se diz que o pensamento é livre:), tão livre que nem precisa arrepender-se. Mas, além de livre é secretíssimo.
Carlos do Carmo era um senhor. E cantava com a alma de Portugal na voz. Não parecia pessoa vaidosa. Mas saber conversar e pensar pela sua cabeça é motivo de orgulho. Diferente de vaidade. Não tive o prazer de o ouvir a discorrer. Os seus fados sobre Lisboa são encanto que não passa.
Não conheço o autor.
ResponderEliminarRegisto a sugestão e espero que este ano me traga mais disposição para a leitura.
Boa noite Bea.
Também acho que vou ler mais, a vida invernosa permite isso:)
ResponderEliminarBoa noite, Magui.
Não conhecia o Autor nem as suas obras.
ResponderEliminarMas pelos "excertos" não parece mau =)
Beijocas bom ano!
Cláudia:), então eu nem tinha respondido aocomentário? Ora esta. Estou em dívida desde 4 de Janeiro:)))
EliminarVou seguir a tua sugestão e pôr na minha lista o Julian Barnes com a sua
ResponderEliminar"a única história". Abraço!
Foi um livro que gostei de ler, prosa.
EliminarBea, que bom foi vir aqui e ler uma opinião/sugestão de leitura.
ResponderEliminarDe Julian Barnes tenho para ler "Nada a temer" e terei de comprar "A única história", pois percebi que dele retirarei belas pétalas.
Beijo, bom fim-de-semana quentinho.
Muitas (ou poucas mas boas) leituras em 2021.
Bem Teresa, mais vale tarde que nunca. Muito obrigada pelas suas palavras e sugestões para 2021 que oxalá se cumpram. Até agora tenho gostado do que li:). Vai ver foram os seus desejos a cumprir-se mesmo sem que eu os soubesse.
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