National Geograohic - Ilhas Verdes
Veio à Terceira dar uma conferência intitulada “Os Açores vistos pela moldura amarela”. Como é que a National Geographic vê o arquipélago?
Eu comecei por preparar essa conferência visitando os arquivos históricos da National Geographic e fiquei intrigado. Desde muito cedo - a revista começa a aparecer em 1888 – os Açores interessam a National Geographic. A primeira reportagem é de 1919. Imagino que o fluxo de emigração tivesse justificado esse interesse e também por ser um ponto no Atlântico de paragem para rotas de barcos e, mais tarde, de hidroaviões. Nos primeiros trabalhos a visão é muito etnográfica. Vem-se cá e fotografa-se as largadas de touros da Terceira, o milho e o chá em São Miguel… Mais tarde começa-se a olhar para os Açores com outros olhos. As peças são menos culturais, muito mais científicas: A primeira grande é sobre os Capelinhos, porque há um pretexto forte. A actividade dos baleeiros começa também a ser tratada. É quando aparece a National Geographic Portugal, em 2001, que começamos a olhar para os Açores de outra maneira. Somos portugueses escrevendo para portugueses, a etnografia perde relevância e procuramos outro tipo de coisas nos Açores. Noventa por cento dos materiais que publicamos sobre os Açores são já de pendor científico. O que nos interessa é a Ciência e o Ambiente, e o que tem sido feito de pioneiro nesta Região. Há cinco, seis áreas às quais temos dedicado especial atenção.
Quais são essas áreas em que considera que os Açores são pioneiros?
A biologia marinha, é de longe um dos ex-líbris. Uma das áreas mais reconhecidas da Universidade dos Açores é o Departamento de Oceanografia e Pescas. Ainda ligada ao mar, uma segunda área à qual temos dedicado especial atenção é a Oceanografia no sentido mais lato, ou seja, fontes hidrotermais, montes submarinos, esse tipo de tema. A terceira área é a vulcanologia/geologia. O Açores são a primeira região do país que tem uma carta de geo-monumentos, do Observatório de Vulcanologia. Isto transmite uma mensagem de que os bens geológicos, embora não tão próximos, justificam atenção. Depois, confesso que temos uma lacuna na área do Património construído e da História. Aí, quem tem feito alguma coisa tem sido o canal National Geographic.
A que se deve essa ausência de tratamento do tema Património/ História?
Estou a falar com uma jornalista e, certamente, vai perceber-me melhor que muitos dos leitores… É difícil encontrar valores noticias, âncoras para trazer outra vez para as notícias esse tema. Os leitores querem saber o que há de novo em termos de Património. Ao apanharmos - e essa é uma das ideias que está em cima da mesa - um número redondo como o dos 25 anos de classificação do centro histórico de Angra, essa é uma solução. Outra serão projectos de recuperação… Mas é difícil arranjar âncoras para ir buscar o que está imóvel há anos e anos. Sei que a maior parte das pessoas, sobretudo as ligadas à área, tem dificuldade em aceitar isso, mas o jornalismo opera com valores diferentes.
Mesmo assim, sentem que existe colaboração das instituições locais no sentido de fazerem chegar informação à vossa revista?
Temos colaborado com várias instituições, quer universitárias, quer ONGs, como é o caso dos Montanheiros. Eu diria que se começámos a publicar um pouco mais de peças sobre Património, também teríamos outro diálogo, outro fluxo de informação com as instituições culturais. Até agora não temos recebido muita informação das instituições locais sobre este tema, mas devo dizer que também não a temos procurado muito. É o velho círculo vicioso… Há áreas com sombra, que estamos a esquecer, a primeira é a do Património, outra será a da exploração e aventura, sobretudo aqui na Terceira. São temas a cobrir no futuro.
Pode-se dizer que os Açores são interessantes?
Os leitores têm uma apetência enorme para esta Região. Não há nenhum tema publicado sobre os Açores em relação ao qual não tenhamos recebido cartas de elogio, não só de pessoas que cá vivem e que se sentem reconhecidas, como de outras, que passaram por cá. Os Açores deixam uma marca muito duradoura.
Porquê essa imagem duradoura?
Porque não há Região no país onde haja tanta oferta de exploração, desde o património histórico, até à biologia e vulcanologia. Talvez vocês aqui não tenham noção de quão especiais são… Era perfeitamente possível, embora exaustivo, fazer uma reportagem por mês sobre uma especificidade dos Açores e chegar ao fim do ano e não ter repetido nenhuma. Há muita coisa aqui que as pessoas gostam de ler.
Qual é a imagem que sente que os leitores têm dos Açores? É a da Região verde?
A questão ambiental é, de longe, a que chama mais atenção. A questão geológica/vulcanológica é para uma minoria. É muito difícil fazer alguém gostar de rochas. O património cultural está no fundo da lista. Ainda haverá alguma etnografia até se chegar à ideia dos Açores como Património.
Isso contraria aquilo que diversos entendidos e personalidades ligadas à política e turismo na Região tem vindo a defender: Que o Património será uma das portas para o turismo…
Até aqui imagino que a aposta no turismo de natureza tenha sido bem sucedida. Provavelmente, haverá alguma aposta a fazer na área do Património, sobretudo quanto a Angra. Mas o que vende é a imagem do arquipélago verde. Surpreenderia muito as pessoas se fizesse uma capa que não estivesse ligada a isso. O que nos transporta para a interrogação sobre se essa imagem corresponde à realidade…
E corresponde?
Criam-se muitos mitos, e depende muito dos óculos com que olhamos para a realidade. Faço um balanço extraordinariamente positivo do mandato que terminou esta secretária regional do Ambiente. Foram feitas duas coisas que o Continente deveria seguir: A nível de classificação e consolidação de áreas protegidas, com a Rede Natura 2000 e o passo mais pujante, que é o das áreas marinhas protegidas. O único exemplo que existe no Continente é polémico e controverso, o da Arrábida. Dizendo isto, falta uma fase tão importante como a primeira, que é a da fiscalização e de garantir que esses bens não são delapidados. Aí há muito trabalho a fazer.
Não se esgota na classificação…
Sim, temos muito a ideia de que o trabalho acaba quando os diplomas são publicados, mas não é assim. Há notícias de abusos nos Açores, como as há do resto do país. É necessário entrar numa segunda fase e fazer um investimento forte em vigilantes. As zonas não podem ser apenas demarcadas, têm de ser fiscalizadas.
“Não faço um balanço positivo deste reitor”
Os Açores têm condições para ser o “laboratório” do país?
Na sua opinião quais são os principais problema da Universidade dos Açores?
Tem-se defendido que os três pólos são uma forma de descentralizar…É claro que sim, obviamente, mas causam problemas de concertação de esforços, de sobrecusto e, muitas vezes, até de duplicação de informação. Os pólos têm também muito pouca autonomia financeira. Esse é o terceiro principal ponto: A questão financeira, que começa, imagino, a reflectir-se na própria produção científica. Uma vez mais o Departamento de Oceanografia e Pescas teve um enorme mérito, sobretudo por se ter conseguido destacar, mas também por se conseguir alhear um pouco do financiamento estatal português e ir buscar financeiro europeu e internacional. Isso tornou este departamento um órgão à parte.
Pode-se dizer que há o Departamento de Oceanografia e Pescas e depois a Universidade dos Açores?
Como se podiam solucionar esses problemas?
O que é que a Universidade dos Açores podia ser idealmente? O motor para que os Açores se transformassem no “laboratório” de que falávamos?
O que se pode esperar ver publicado na revista National Geographic, sobre os Açores, num futuro próximo?
Há planos para fazer algo sobre os 25 anos do centro histórico de Angra como Património Mundial e explorar mais a vertente da aventura e actividades de exploração da natureza, no que diz respeito à Terceira. E há os Açores como região científica e ambiental, que estarão sempre presentes.
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