segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Tão veloz como o desejo.

Vê-a dançar ao longe, aproxima-se cautelosamente. A vida já lhe ensinara por várias vezes que há mulheres que são perigosas.
Vê-o caminhar lentamente, empurrando corpos na multidão em direcção ao seu, que dança. Certifica-se que lhe guarda um ângulo de vista permanente, a vida já lhe ensinara por várias vezes que há homens que são perigosos.
Não é muito alta, mas não se diria uma rapariga baixa. Tem o cabelo muito liso, uma disciplina brilhante que contrasta com a rebelia com que se meneia. O seu vestido é de um azul oceano, acima do joelho que escapa à bota alta por uns centímetros, e o seu pescoço é longo e cruamente apeticivel, como um pêssego careca. De quando em quando os seus olhos encontram o corpo dele, mas não tem tempo ou luz para lhes distinguir a cor.
Ele deve estar perto do metro e oitenta, o cabelo despenteado fá-lo parecer mais novo mas este seu corpo maduro não engana. O pólo branco, que veste como se uma luva, marca-lhe o tronco e está em disputa com a sua pele, muito morena. Os seus lábios, pelo contrário, estão em perfeita harmonia com o seu bonito sorriso, parecem desenhados por uma mão firme, uma mão generosa.
Vai puxá-la para si, a cautela perde-se tão veloz como o desejo. Falar-lhe-á ao ouvido, uma mão no seu pescoço nu e outra na sua cintura fina. Concentra-se para não as arrastar, explorando-lhe o peito e a anca que alarga em forma de tulipa invertida.
Ela vai marca-lhe o tronco com as suas mãos, reservar-lhe toda a sua visão porque há lições que a vida não deixou bem claro. A respiração dele é, apesar de quente, arrepiante. Está assustada, não quer deixar-se ir por um estranho. Sabe-lhe o nome, a altura e a agilidade com que dança com o corpo, no seu. Mas nada mais. E há mais numa vida para além do desejo, da respiração ofegante. Olha-o nos olhos. São da cor dos seus, entre um avelã morto e um mel vibrante. Mas não lhe parecem assustados. Estão atentos, vigilantes. Escutará ao seu ouvido um "está tudo bem?" e fechará os olhos para tentar perceber se sim se não.
Foge-lhe das mãos, tão veloz como o desejo. Uma não muito alta mancha azul oceano, escapulindo-se pela multidão, assustada. Não olha para trás, não hesita na rebelia com que fura caminho. Sabe-lhe o nome, o tacto do pescoço como se pêssego e a forma do seu corpo, como se desenhado por uma mão firme, uma mão pouco dada a avarezas. Mas sabe, no íntimo da sua alma cor de avelã, que não se ficará por aqui. Beijará a noite dos seus lábios e sugar-lhe-á o medo com a sua própria língua. Porque há mais numa vida para além de lições.

3 comentários:

  1. eu precisava tanto de uma não muito alta lição destas, que a raiva que tinha se foi tão veloz como o desejo.

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  2. gostava de ver a continuação deste, gostava mesmo.

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