quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

O dia em que a Terra parou (Adeus ao Mestre - Harry Bates ) Parte 5/7


ADEUS AO MESTRE - HARRY BATES

Parte 5

Cliff ficou atrás das grades por toda aquela noite, até as oito da manhã seguinte, quando alguém do sindicato finalmente arranjou um advogado para tirá-lo de lá.
E quando estava saindo, um federal o segurou pelo pulso.
‘Você será levado para responder perguntas no Bureau Continental de Investigação’, o agente lhe disse. Cliff atendeu de bom grado.
Trinta e cinco oficias federais de alta patente estavam esperando-o numa sala de conferência, alguns secretários do presidente, subsecretários de estado, assessores do ministério da defesa, cientistas, um coronel, executivos, chefes de departamento e o terceiro escalão.
O velho Sanders de bigodes grisalhos, chefe da CHI, presidia a sessão.
Fizeram com que Cliff contasse várias vezes a história, e outra vez e mais uma vez, tudo de novo e mais uma vez ainda, não por que não acreditassem nele, mas por que pretendiam encontrar respostas para fatos sem explicação, como o comportamento misterioso de Gnut e os acontecimentos das últimas três noites.

Pacientemente, Cliff revirou sua cabeça em cada detalhe.
Chefe Sanders fazia a maioria das perguntas.
Por mais de uma hora, quando Cliff achou ter encerrado, Sanders vinha com mais perguntas, envolvendo a opinião de seu pessoal sobre o que ocorrera.
‘O senhor pensa que Gnut foi avariado de alguma forma pelos raios, ácidos, calor aplicado pelos cientistas?’
‘Não vi nenhuma evidência disso.’
‘Pensa que ele consegue ver?’
‘Estou certo que sim, ou tem outros poderes que equivalem à visão.’
‘Pensa que consegue nos ouvir?’
‘Sim, senhor. Quando sussurrei que Stillwell estava morto, ele se curvou para ver por si mesmo. E não me surpreenderia se ele entendesse o que falamos.’
‘Em momento algum ele falou, a não ser para emitir os sons que abriram a nave?’
‘Nenhuma palavra em inglês ou qualquer outra língua. Nenhum som de seus lábios.’
‘Em sua opinião, sua força pode ter sido afetada pelo nosso tratamento?’ perguntou um dos cientistas.
‘Já contei como ele levantou o gorila. Ele atacou o animal e o atirou de costas, depois disso o animal passou a ter medo dele.’
‘Como explica que nossas autópsias não revelem a causa da morte de nenhum deles, do gorila, do rouxinol ou dos dois Stillwell idênticos?’ perguntou um oficial médico.
‘Não posso explicar.’
‘Acha que Gnut é perigoso?’ perguntou Sanders.
‘Potencialmente muito perigoso.’
‘Ainda assim diz ter a impressão de que não é hostil?’
‘Para mim, quero dizer. Tenho esta sensação e não tenho nenhuma boa explicação para isso, exceto o fato dele ter me poupado por duas vezes quando me tinha em seu poder. Acho que pela maneira gentil com que segurou os corpos e talvez a tristeza que vi em sua face nas duas vezes.’
‘Se arriscaria a ficar no prédio uma terceira noite sozinho?’
‘Não, por nada deste mundo!’
Alguns riram.
‘Tirou alguma foto do que aconteceu lá na noite passada?’
‘Não senhor.’ Cliff esforçou-se para recompor-se, apesar da vergonha que sentia.
Um homem, quebrando o silêncio, salvou-o dizendo:
‘Poucos minutos atrás, usou a palavra ‘propósito’ em relação às ações de Gnut. Pode explicar melhor?’
‘Sim, esta é uma das coisas que me intrigou. Gnut não parecia mover-se sem razão. Podia mover-se com velocidade impressionante quando queria, vi quando atacou o gorila, mas na maioria das outras vezes andava como se metodicamente cumprindo uma tarefa simples. O que me lembra de uma coisa bastante peculiar, quando ele às vezes assumia uma posição, qualquer que fosse, reclinado ou observando, e ficava assim por muitos minutos. Como se a sua escala de tempo fosse diferente da nossa, algumas vezes era surpreendentemente rápido e em outras passava longos períodos imóvel.’
‘Isso é interessante. Como você explica ele mover-se apenas à noite?’ Perguntou um cientista.
‘Acho que ele está fazendo alguma coisa que não quer que ninguém veja, e de noite ele fica sozinho.’
‘Mas ele continuou mesmo com você lá.’
‘Eu sei. Mas não tenho outra explicação, a não ser que ele me considere inofensivo ou incapaz de impedi-lo, o que certamente é o caso.’
‘Antes de você chegar, nós estávamos considerando a possibilidade de prender Gnut dentro de um imenso bloco de glasstex. Acha que ele permitiria?’
‘Eu não sei. Provavelmente sim, ele permitiu os ácidos e os raios e o calor. Mas é melhor que seja feito de dia, pois a noite parece ser quando ele se move.’
‘Mas ele se moveu de dia, quando o viajante apareceu.’
‘Eu sei.’
Parecia que não tinham mais perguntas para ele. Sanders bateu a mão na mesa.
‘Bem, acho que é tudo, Mr. Sutherland. Obrigado pela sua ajuda e deixe-me congratulá-lo pela sua valentia, meu jovem homem de negócios.’
Sorriu gentil e continuou: ‘Está livre para ir embora, mas podemos precisar chamá-lo de volta. Veremos.’
‘Posso ficar um pouco mais, enquanto decidem-se pelo glasstex? Gostaria de poder dar esta notícia.’
‘A decisão já foi tomada. A notícia é sua. A operação de envolver Gnut em glasstex está prestes a começar.’
‘Obrigado senhor’ disse Cliff calmo e depois perguntou: ‘E o senhor poderia me autorizar estar presente do lado de fora do prédio esta noite? Tenho a sensação de que algo vai acontecer.’
‘O senhor quer outra exclusiva, eu percebo.’ Disse Sanders não muito simpático. ‘E provavelmente deixará a policia esperando enquanto acaba de realizar seus negócios.’
‘Não o farei de novo senhor. Se algo acontecer, eles serão os primeiros a saber.’
O homem hesitava.
‘Eu não sei... eu lhe direi o seguinte: todos os serviços de notícias vão querer um homem por lá, e nós não queremos isso, mas você poderá arranjar para ser o único representante, apenas você. Por minha parte, eu aceito. Nada irá acontecer, mas sua reportagem servirá para deixar os histéricos mais calmos.’
Cliff agradeceu e correu para telefonar para seu sindicato, para contar as novas – de graça – e a proposta de Sanders. Dez minutos depois ele era chamado de volta e ficou sabendo que estava tudo arranjado, e lhe disseram para ir descansar. Eles cobririam o evento.
Com o coração mais leve, Cliff voltou ao museu.

Centenas de curiosos cercavam o prédio, mantidos à distância por um cordão de isolamento policial. Não pôde passar, apesar de ter sido reconhecido, a polícia ainda estava zangada.
Não deu importância. Estava cansado e foi para o hotel e para a cama.
Tinha dormido apenas alguns minutos quando o telefone tocou.
Com os olhos fechados, atendeu. Era um dos caras do sindicato, com novidades.
Stillwell havia sido encontrado, vivo, muito vivo – o verdadeiro Stillwell.
Os dois outros mortos eram cópias; e ele não pudera explicar como. Ele sequer tinha irmãos.
Cliff permaneceu alguns minutos acordado então deitou-se.
Nada mais lhe pareceria fantástico, nunca mais.


terça-feira, 30 de dezembro de 2008

O dia em que a Terra parou (Adeus ao Mestre - Harry Bates ) Parte 4/7



ADEUS AO MESTRE - HARRY BATES

Parte 4


Cliff aguçou a audição para ter certeza de que o último guarda havia ido embora, o silêncio na ala era total. Estava feliz com isso, mas não completamente.
A escuridão e a idéia de que não estaria seguro fez a possibilidade de uma companhia algo não de todo desagradável.
Uma hora após o escurecer por completo, retirou os sapatos, amarrou-os juntos, pendurando-os no ombro e percorreu o corredor que o deixaria na área de exibição.
Tudo se assemelhava a noite anterior.

Gnut era uma grande sombra distinta no fundo do salão. Seus olhos vermelhos brilhando de novo como se sobre Cliff.
Igual a vez anterior, mas ainda mais cauteloso, Cliff esgueirou-se como uma cobra, com o estômago ao chão e lentamente alcançou a plataforma onde ficava o painel de controle.
Uma vez em seu esconderijo, colocou sua câmera a postos, assim como a arma no coldre do ombro, apertado contra o peito.
Desta vez, disse a si mesmo, ele conseguiria as fotos.
Sentou-se numa posição de onde pudesse manter Gnut à vista o tempo todo. Sua visão já se adptara à falta de luz.
Eventualmente sentia-se solitário e com um pouco de medo, os olhos vermelhos estavam lhe dando nos nervos, o fazendo pensar que Gnut não lhe faria mal de jeito algum.
Ainda tinha dúvidas se estava sendo observado.

Horas se passaram.
De tempos em tempos, ouvia alguns sons da entrada, do lado de fora, um guarda talvez, ou alguns curiosos passando.
Lá pelas nove da noite ele viu Gnut se mover. Primeiro sua cabeça, virou-se de tal modo que seus olhos brilharam mais intensamente, pois olhava para Cliff. Por um tempo foi só isso, então o vulto de metal escuro deslizou pra frente e então direto na sua direção.
Cliff pensou que não sentiria medo agora, mas seu coração parara. O que iria acontecer?
Com um silêncio surpreendente, Gnut chegou perto, sua sombra cobrindo Cliff, seus olhos vermelhos queimando em direção ao homem minúsculo. Cliff tremia, pois sentia mais medo do que a primeira vez. Não havia planejado isso, e quando viu, falava com a criatura:
‘Não me machuque. Só estava curioso, queria saber o que estava acontecendo. É o meu trabalho. Você me entende? Não vou machucar ou ferir você, eu... não faria isso mesmo se pudesse. Por favor!’
O robô não se moveu e Cliff não sabia se suas palavras haviam sido compreendidas.
Quando sentiu que não conseguiria suportar mais o suspense, Gnut se esticou e pegou algo da mesa ou talvez colocou algo nela, então virou e recuou.
Cliff estava seguro! Novamente o robô o havia poupado.
Cliff perdera parte de seu medo. Sentiu que estava seguro agora e que Gnut realmente não o faria mal. Por duas vezes tivera esta possibilidade e nas duas vezes apenas olhara para ele e se afastara.
Cliff não sabia o que Gnut tirara da mesa.
Como da vez passada, o robô fôra até a nave, fizera uma série de ruídos e então a porta se abriu e quando a rampa desceu, ele entrou.
Cliff ficou sozinho por provavelmente quase duas horas.
Nenhum som vinha lá de dentro.
Cliff podia espiar da porta, mas não estava certo de que devia fazê-lo.
Com a arma ele poderia enfrentar outro gorila, mas se Gnut o pegasse então seria o fim.
Esperou que algo fantástico acontecesse, sem saber o quê; talvez o rouxinol de novo, talvez o gorila, talvez nada.
O que quer que acontecesse, mais uma vez o pegaria completamente de surpresa.
Ouviu um som abafado e então palavras, voz humana, até familiar.

‘Senhoras e senhores. O instituto Smithsonian os saúda nesta nova ala interplanetária e as maravilhas que no momento presenciam.’

Era a gravação da voz de Stillwell, mas não vinha dos falantes do teto, mas de algum lugar de dentro da nave. Depois de uma pausa, continuou:

‘Todos vocês devem...devem...’ e então parou.

O cabelo de Cliff se arrepiou. Esta não era a gravação.
Houve silencio por pouco tempo então um grito, um grito humano abafado, de dentro do coração da nave; seguido por tosse e choro de um homem em grande terror.

Cada nervo de Cliff se retesou quando ele chegou até a porta. O som que ouvira saindo de dentro agora se aproximava, saindo das sombras, uma forma certamente humana. Tossindo e meio cambaleante, correu na direção de Cliff.
Três metros atrás, a sombra enorme de Gnut surgiu na porta, seguindo-o.
Cliff parou sem respiração.
O homem era Stillwell, ele corria para a mesa que antes Cliff usara como esconderijo, estava bem perto dela quando seus joelhos dobraram e ele caiu ao chão. Gnut já o alcançara, mas Stillwell não o vira ainda. Parecia bastante doente, fazendo esforços espasmódicos.
Gnut não se moveu, então Cliff disse:
‘O que foi, Stillwell? Eu posso te ajudar? Não tenha medo! Sou eu, Cliff Sutherland, você me conhece, o repórter.’
Sem mostrar surpresa em encontrar Cliff ali e tossindo como um afogado, Stillwell gemeu:
‘Me ajude! Gnut... Gnut.’
Parecia não conseguir falar.
‘Gnut o quê?’
Consciente dos olhos vermelhos sobre ele e receoso de ir até o sujeito, Cliff disse afirmativo:
‘Gnut não vai machucá-lo. Tenho certeza que não. Ele não me feriu. Qual o problema? O que eu posso fazer?’
Então, num acesso de energia, Stillwell levantou-se nos cotovelos.
‘Onde eu estou?’ perguntou.
‘Na ala interplanetária do museu. Não reconhece?’
Somente a respiração pesada de Stillwell era ouvida. Então fraco perguntou:
‘Como cheguei aqui?’
‘Eu não sei.’ Respondeu Cliff.
‘Eu estava fazendo uma gravação, quando de repente, estava aqui, ou melhor, lá...’
O medo tomou-o novamente.
‘Então o quê?’ perguntou Cliff gentil.
‘Eu estava numa mesa e Gnut estava sobre mim. Gnut! Eles o inutilizaram. Ele nunca poderia se mover!’
‘Agora ele pode. Mas acho que não irá machucá-lo.’
Stillwell caiu de costas ao chão.
‘Estou muito fraco. Você me consegue um médico?’
Não parecia se dar conta que o robô estava bem próximo dele, olhando-o na escuridão.
Como Cliff hesitou sobre o que fazer, o homem começou a tossir, regular como um relógio.
Cliff não ousava se mover, mas nada que fizesse poderia ajudá-lo agora.
De repente Stillwell estava silencioso e quieto.
Cliff temia pelo seu coração, então olhou para a os olhos nas sombras sobre ele.
‘Ele morreu.’ Sussurrou Cliff.
O robô pareceu entender, ou ao menos o ouviu. Curvou-se para a frente e contemplou a figura imóvel.
‘O que é isso, Gnut? O que você está fazendo? Posso ajudá-lo de algum jeito? De alguma forma eu sei que você não é hostil, e não acredito que tenha morto este homem. Mas o que aconteceu? Pode me compreender? Você fala? O que está tentando fazer?’
Gnut não fez qualquer som ou movimento, apenas olhava para o corpo aos seus pés.
Na face do robô, Cliff viu triste contemplação.’
Gnut permaneceu de pé por muitos minutos, até que se abaixou, agarrou o morto com cuidado, até gentileza, pensou Cliff, e em seus poderosos braços carregou-o para perto da parede onde jaziam os pedaços desmembrados dos robôs atendentes. Deitou-o ao lado deles e então deu as costas e voltou para a nave.
Sem nenhum traço de medo, Cliff começou a andar até a parede, onde estavam os robôs desmantelados. Quando parou, Gnut voltava emergindo da nave de novo.
Carregava num braço outra forma de vida, uma maior, e algo na sua mão. Colocou-as ao lado do corpo de Stillwell, o que Cliff não conseguiu ver bem, e então voltou à nave e de lá trouxe um novo corpo, que colocou junto aos outros e desta vez, ao voltar para a nave, parou na rampa olhando para trás, imerso em pensamentos profundos.
Cliff reteve sua curiosidade enquanto pode e então foi ver o que Gnut depositara ao chão.
O primeiro da fila era o corpo de Stillwell, como esperava, a seguir estava a grande massa do gorila morto, aquele da última noite. Ao lado do gorila estava o pequeno rouxinol.
Estes dois haviam estado dentro da nave durante o dia e Gnut, apesar da gentileza com que os tratara, pensou, estava apenas limpando a casa.
Mas havia um quarto corpo na história, e que ele não conhecia.
Teve que chegar bem perto para olhar bem.
O que ele viu, o fez perder o fôlego.
Impossível! Seu sangue gelou.
O primeiro corpo era o de Stillwell, mas o último era Stillwell também, haviam dois corpos de Stillwell, ambos idênticos e ambos mortos.
Cliff recuou com um grito e então o pânico o fez correr de Gnut e gritar e chutar freneticamente a porta de entrada. Ouviu sons de fora.
‘Deixe-me sair! Gritava aterrorizado. Deixe-me sair! Deixe-me sair! Rápido!’
Uma abertura surgiu entre as portas e ele passou por ela como um animal selvagem e correu pelo caminho.
Um casal que passava próximo parou para vê-lo correndo até que alguma razão penetrasse em sua cabeça, então diminuiu a velocidade até parar.
Olhou para o prédio onde tudo parecia normal como sempre e apesar do medo, Gnut não o perseguia.
Estava descalço e respirava com dificuldade.
Sentou no gramado úmido e calçou os sapatos, então parou para observar o prédio e recompor-se.
Que reunião incrível. Um Stillwell morto, um gorila morto e o rouxinol morto, todos diante dos seus olhos. E a última e assustadora coisa, o segundo Stillwell morto, que ele não vira morrer.
E a estranha gentileza de Gnut para com eles e sua expressão de tristeza, que vira por duas vezes em seu rosto.

Enquanto olhava, as coisas ao redor do prédio já não eram as mesmas.
Muitas pessoas apareceram à porta, o som de sirenes de um helicóptero da polícia e de outros lugares, pessoas chegavam correndo, a princípio poucas, mas daí mais e mais.
Os helicópteros policias pousavam do lado de fora do prédio e ele pensou já ver alguns policiais espiando o interior do prédio. Então de repente as luzes do prédio se acenderam.
Controlado, Cliff voltou. Entrou.
Achava ter visto Gnut pela última vez subindo a rampa, mas agora ele estava na posição de sempre, como se nunca tivesse saído de lá. A porta da nave estava fechada e a rampa desaparecera.
Mas os corpos, os quatro corpos estranhamente colocados em linha, continuavam deitados entre os restos dos robôs destroçados, exatamente onde ele os deixara na escuridão.
Ouviu assustado um grito atrás de si. Um guarda uniformizado do museu apontava para ele.
‘É aquele homem! Quando eu abri a porta ele a forçou para sair de dentro e correu como um louco!’
Os policiais cercaram Cliff. ‘Quem é você e o que é isso tudo?’ perguntou um deles áspero.
‘Me chamo Cliff Sutherland, repórter fotográfico. Era eu que estava aqui dentro e que saiu correndo, como disse o guarda.’
‘O que fazia? E de onde apareceram aqueles corpos?’
‘Senhores, terei prazer em responder, mas primeiro os negócios. Coisas fantásticas aconteceram nesta sala e eu vi tudo e sei da história toda, mas...’ Sorriu. ‘Eu declino de responder suas perguntas antes que eu tenha vendido a minha história para os jornais. Sabem como é. Se me deixarem usar o rádio da polícia, apenas por um momento, os senhores terão toda a história em seguida, digamos, em meia hora, quando a televisão a transmitir. Enquanto isso podem acreditar, não há nada que possam fazer e nada perderão com o atraso.’
O policial que fizera a pergunta piscou para um dos outros, decerto não se tratava de um cavalheiro; avançou para Cliff com algemas, que só reagiu mostrando suas credenciais de imprensa. Ele as olhou rapidamente e as guardou em seu bolso.
Umas cinqüenta pessoas já estavam por ali e entre elas dois membros do sindicato, que Cliff conhecia. Eles sussurraram algo no ouvido do policial e então saíram todos até o helicóptero.
Lá, por rádio, em cinco minutos, Cliff fechou um acordo onde ganharia mais dinheiro do que receberia trabalhando um ano inteiro. Depois entregou as fotos e negativos, contou toda a história e eles não perderam sequer um segundo, partindo para a central levando a exclusiva.
Mais e mais pessoas chegavam e os policiais faziam a segurança ao redor do prédio.
Dez minutos depois, uma grande equipe de rádio e televisão abriu caminho entre a multidão, mandada ali pelos homens do sindicato com os quais havia feito acordo. E poucos minutos depois, sob as luzes dos refletores montados por operadores, e de pé junto à nave, não muito distante de Gnut – ele recusou-se ficar junto do robô – Cliff contava a sua história para as câmeras e microfones e, numa fração de segundos, para todos os cantos do sistema solar.
Imediatamente após, a polícia o levou para a prisão.
Fizeram isso por princípio, e porque estavam furiosos com ele.

Boca do inferno


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segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

O dia em que a Terra parou (Adeus ao Mestre - Harry Bates ) Parte 3/7


ADEUS AO MESTRE - HARRY BATES

Parte 3

Cliff acordou lentamente no principio sem se dar conta que as imagens que rodavam em sua cabeça eram memóriais reais e não um sonho fantástico.
Foi a lembrança das fotografias que havia tirado que o fez levantar-se e tratar de revelar aquelas em sua máquina.
Nas suas mãos estavam as provas que os eventos da noite passada haviam ocorrido. Ambas haviam saído muito boas. A primeira mostrava claramente a rampa descida da porta até tocar o chão como pudera ver de trás da mesa. A segunda, da porta aberta era desapontadora, pois uma parede impedia a visão.
Isso se devia ao fato de que nenhuma luz vinha do interior da nave quando Gnut lá dentro estava - assumindo que Gnut precisasse de luz para o que quer que fizesse lá.
Cliff olhou os negativos com vergonha de si mesmo. Que péssimo fotografo ele era, por ter apenas tirado duas fotos como aquelas. Tinha tido várias chances de realizar grandes fotos – fotos de Gnut em ação – Gnut lutando contra o gorila – mesmo Gnut segurando o rouxinol – fotos que dariam calafrios a quem as visse, e tudo que tinha eram duas fotos da porta.
Ah sim, tinham valor, mas ele era um grande burro.
E para completar sua brilhante performance, ele havia caído no sono.
Bem, era melhor ir para as ruas e descobrir o que estava acontecendo.

Tomou um banho rápido, barbeou-se e mudou de roupa e logo estava entrando em um restaurante freqüentado por fotógrafos e jornalistas.
Sentou-se em uma mesa e acenou reconhecendo um amigo e competidor.
‘O que vai beber?’ perguntou seu amigo tomando o lugar ao seu lado.
‘Nada, até que eu tenha comido alguma coisa.’ Cliff respondeu.
‘Então você não ouviu?’
‘Ouviu o quê?’ Disse Cliff, como se não soubesse o que estava acontecendo.
‘Você é demais’ comentou o outro. ‘Quando algo realmente grande acontece, você está dormindo na sua cama’.
Então ele contou o que havia sido descoberto esta manhã no museu, para o grande regalo dos jornalistas de todo o mundo. Cliff fez então três coisas.
Tomou seu café da manhã, agradeceu aos céus que ninguém havia o descoberto e continuou mostrando surpresa.
Ainda mastigando, correu de volta ao prédio do museu.

Uma grande multidão de curiosos de avolumava na frente, mas Cliff não teve problemas em entrar, depois de mostrar suas credenciais de repórter.
Gnut e a nave estavam na mesma posição de sempre, mas o piso estava coberto por pedaços dos robôs atendentes destruídos.
Muitos outros repórteres, seus competidores, estavam por perto.
‘Eu estive fora, perdi a coisa toda’ disse para um deles. ‘Gus, qual a explicação para tudo isso?’
‘Me pergunte algo fácil. Ninguém sabe realmente. Pensam que algo saiu da nave, talvez outro robô como Gnut. Mas me diga, onde você andou?’
‘Dormindo’.
‘Melhor prestar atenção. Milhões de bípedes estão apavorados. Vingança pela morte de Klaatu, é o que dizem. A Terra pode ser invadida a qualquer momento.’
‘Mas isso...’
‘Ah, eu sei que é loucura. Mas esta é a história que está correndo por aí e que vende jornais. Mas surgiu um ângulo totalmente novo, muito surpreendente. Venha aqui.’
Levou Cliff até a mesa onde um grupo olhava para algo com interesse, vários objetos guardados por um técnico. Gus apontou para aquilo que parecia serem pêlos marrom-escuros.
‘Aqueles pêlos vieram de um gorila macho.’ Disse Gus com a casualidade de um detetive particular. ‘Foram achados esta manhã pelo chão. Outros foram encontrados junto aos robôs atendentes destruídos’.
Cliff olhou atônito, ou tentou. Gus apontou para um tubo de testes cheio com uma substância.
‘Aquilo é sangue diluído – sangue de gorila. Estava nos braços de Gnut.’
‘Meu Deus!’ Cliff exclamou. ‘E não há explicação?’
‘Nem mesmo uma teoria. Esta é a sua grande chance, garoto maravilha!’
Cliff se afastou de Gus, sem poder continuar a encenar por mais tempo. Não sabia o que fazer com aquela história. O serviço de notícias pagaria bem por aquilo – pelas suas fotos – mas aquilo acabaria por tirar a matéria das suas mãos. Algo na sua cabeça lhe dizia que queria estar na ala novamente aquela noite, mas bem, ele estava com medo. Tivera maus momentos e ainda queria continuar vivo.
Andou por ali por algum tempo e contemplou Gnut.
Ninguém podia imaginar que ele se movia, ou que em seu rosto esverdeado pudesse caber uma expressão genuína de tristeza. Aqueles olhos estranhos.
Cliff pensou se podia estar olhando para ele naquele momento e reconhecendo-o como o intruso da última noite. De que matéria estranha era feito – aquele material colocado no lugar dos olhos por uma raça desconhecida pelos homens, e que toda ciência da Terra não conseguira danificar.
O que Gnut estaria pensando? Quais poderiam ser os pensamentos de um robô – de um mecanismo de metal diferente do barro do qual foi feito o homem? Estaria zangado com ele? Cliff achava que não. Ele o havia tido à sua mercê e o deixado viver.
Deveria se atrever a fazê-lo de novo?
Cliff pensou que sim. Saiu da sala pensando nisso.
Tinha certeza de que Gnut se moveria de novo.
Uma arma de raios Mikton poderia protegê-lo de outro gorila – ou cinqüenta gorilas.
Ele ainda não conseguira a história de verdade. Tinha conseguido apenas duas ridículas fotos de arquitetura.
Devia saber de imediato que iria ficar, em meio ao pó, armado com sua câmera e de uma pequena arma, mais uma vez sob a mesa de instrumentos no laboratório, e ouviria as portas de metal a se fechar à noite.
Desta vez conseguiria a história e as fotografias.
Se nenhum policial fosse destacado para passar a noite de guarda.


SCIFIPEDIA - Enciclopédia de Sci-Fi


Possui grande acervo, nos mesmos moldes da Wikipedia, dentro do site SciFi.com, dividida em categorias: Anime, Art, Audio, Comics, Ets and UFOs, Fandom, Games, Internet, Literature, Movies, Paranormal, Science, Toys, TV.

SCIFIPEDIA

O dia em que a Terra parou (Adeus ao Mestre - Harry Bates ) Parte 2/7


ADEUS AO MESTRE - HARRY BATES

Parte 2


No momento seguinte o grande gongo sobre a entrada, soou a hora de fechamento do museu e imediatamente seguiu-se uma voz vinda dos alto-falantes:
‘Cinco horas, senhoras e senhores. É hora de fechar, senhoras e senhores.’

Os três cientistas, surpresos por ser já tão tarde, correram para lavar as mãos, trocar as roupas e desapareceram por uma porta do corredor, sem ver o jovem debaixo da mesa.
O som dos pés no andar da exibição rapidamente desapareceu até se resumir aos passos dos dois guardas caminhando de uma ponta para outra, verificando que tudo estava certo. Apenas muito rapidamente um deles parou na porta do laboratório e se foi.
As portas de metal foram fechadas e então houve silêncio total.

Cliff aguardou alguns minutos, então cuidadosamente saiu debaixo da mesa. Assim que ficou de pé, um som de algo se quebrando soou perto do seu pé. Encontrou os restos de uma pipeta de vidro, que ele provavelmente tinha derrubado ao sair do esconderijo.
Aquilo fez com que pensasse em algo que até então não lhe ocorrera.
Um Gnut que podia se mover era um Gnut que poderia ver e ouvir; e realmente poderia ser perigoso. Teria que ter mais cuidado.

A sala era margeada por duas partições de fibra que acompanhavam a curva abaixo da nave.
Um dos lados da sala era a nave por si e a outra, ao sul, a parede daquela ala.
E quatro janelas altas. A única entrada era a passagem.

Sem se mover, apenas com seu conhecimento do prédio, bolou seu plano. A ala era conectada a oeste com o fim do museu por uma entrada nunca usada, e a sua extensão leste conduzia ao monumento de Washington. A nave ficava perto da parede sul e Gnut ficava em frente dela, não muito longe do canto norte e o final oposto da sala, próximo da entrada do prédio e do corredor que dava no laboratório. Tomando bastante cuidado, poderia sair no lado mais distante do robô e havia uma pequena plataforma baixa, com o painel do som. Esta mesa era o único lugar que oferecia um esconderijo no qual poderia observar o que acontecia. Os outros únicos objetos na sala eram os seis atendentes em formato do robô em estações fixas ao chão ao longo da parede norte, posicionados para atender as perguntas dos visitantes.
Então, tinha que chegar até aquela mesa.

Na ponta dos pés, deixou o laboratório e seguiu o corredor. Estava bem escuro lá fora, pois a luz de entrada da exibição havia sido apagada. Conseguiu chegar ao final da sala sem fazer som algum. De lado espiou a nave e Gnut. E teve um momentâneo choque. Os olhos do robô estavam fixos nele – ou pareciam estar.
Seria somente um efeito ou, pensou, que ele já fora descoberto? A posição da cabeça de Gnut não parecia ter sido alterada. Provavelmente estava tudo bem, mas ele desejava não precisar cruzar a sala com aquela sensação dos olhos do robô a lhe seguir.
Recuou, sentou-se e esperou.
Teria que estar totalmente escuro antes dele se arriscar chegar até a mesa.
Aguardou por uma hora até que a luz fraca das lâmpadas do lado de fora começou a tornar a sala mais clara, então se levantou e olhou para a nave mais uma vez.
Os olhos do robô pareciam atravessá-lo. Era algo aterrador.
Será que Gnut sabia que ele estava ali? Quais seriam seus pensamentos? O que poderia pensar uma máquina tão incrível quanto Gnut?

Chegara a hora de atravessar a sala; Cliff passou a alça da câmera pelas costas, ficando de quatro, e lentamente seguiu em direção a entrada do hall. Ali, de cócoras, encostado à parede o máximo possível, seguiu centímetro por centímetro sem parar, sem arriscar olhar para os enervantes olhos de Gnut. Levou quase dez minutos para atravessar o espaço de cem metros e estava suado quando seus dedos alcançaram a plataforma onde ficava a mesa.
Ainda devagar, silenciosamente, encontrou abrigo atrás da proteção da mesa de comandos.
Finalmente conseguira. Relaxou então por um momento, ansioso para saber se havia sido visto, e olhou cuidadosamente pelo lado da mesa.
Os olhos de Gnut estavam sobre ele mais uma vez. Ou pareciam estar.
Contra a escuridão geral, o robô assim mesmo emitia uma sombra misteriosa que fazia com que parecesse ter cinqüenta metros, dominando com sua sombra todo salão.
Não conseguia saber se sua posição se alterara ou não.
Mas se Gnut estivesse olhando para ele, ele ao menos não fizera nada além disso. A não ser por aquele movimento que Cliff descobrira, não parecia ter feito mais nada. Sua posição era a mesma que mantivera nos últimos três meses, na escuridão, na chuva e nas últimas três semanas no museu.

Cliff não queria permitir-se ter medo, e agora tinha consciência de seu corpo. Aquela curta viagem havia lhe custado – seus joelhos e ombros doíam e as calças pareciam estragadas.
Mas isso não tinha importância se aquilo que ele esperava ver acontecesse. Se Gnut se movesse ele poderia pegá-lo com sua câmera infravermelho e, com o dinheiro da venda daquela história, poderia comprar cinqüenta calças iguais às que estava usando. E, se além disso, pudesse desvendar o propósito do movimento de Gnut, provando que existia um propósito, então ele teria uma história que faria o mundo ouvi-lo.

Sentou-se por um momento para esperar: não havia nenhuma dica de quando ele se moveria, se ele se movesse naquela noite. Os olhos de Cliff já estavam acostumados à escuridão e de tempos em tempos ele observava intensamente o robô, por bastante tempo até ser obrigado a piscar e descansar seus olhos para não dar vez à sua imaginação.
Mais um minuto, com o ponteiro do relógio percorrendo mais uma volta completa. A inatividade fazia Cliff menos cuidadoso e por um longo tempo permaneceu com a cabeça atrás da proteção da mesa de controle.
Assim que quando Gnut se moveu ele quase desmaiou de susto.

Estava um pouco aborrecido quando deu conta que o robô estava a meio caminho de seu esconderijo. E isso não era o mais assustador.
Mas sim quando percebeu que não conseguia vê-lo se mover. Ele havia parado como um gato em meio do movimento para agarrar o rato. Seus olhos agora mais brilhantes, sem dúvida estavam virados na sua direção. Ele olhava para Cliff!
Sem quase respirar, e meio hipnotizado, Cliff olhou de novo. Seus pensamentos estavam confusos. Qual era a intenção do robô? Por que tinha parado? Estaria cercando-o? Como conseguia mover-se tão silenciosamente?

Em total escuridão os olhos de Gnut moveram-se para mais próximo. Lentamente, mas em um ritmo perfeito que era quase imperceptível o som dos seus passos aos ouvidos de Cliff. Cliff que habitualmente era cheio de recursos, se viu paralisado de medo, incapaz de se mover, enquanto o monstro de metal com olhos de brasa se aproximava. Por um momento esteve a ponto de desmaiar, mas quando se recuperou, ali estava Gnut alçando-se de pé junto dele, com suas pernas quase tocando sua mão. Ligeiramente inclinado e cravando seus olhos nele.
Tarde demais para pensar em correr.
Tremendo como um rato acuado num canto, Cliff esperou ser esmagado.
Esperou uma eternidade. Gnut escrutinava-o sem mais se mover.
Para cada segundo que passou, Cliff esperou ser aniquilado de repente, rápido e completamente.
Então de repente, e sem esperar, tudo terminou. Gnut ficou ereto e afastou-se, virando-se. E então, com um ritmo muito pouco mecânico e que só ele possuía, voltou para o lugar onde estivera antes. Cliff não podia acreditar no que acontecera. Ele poderia tê-lo esmagado como a um inseto e simplesmente tinha se virado e se foi. Por quê? Não podia supor que um robô fosse capaz de considerações humanas.
Gnut chegara agora ao outro lado da nave. Parou e realizou uma curiosa sucessão de sons. Prontamente Cliff viu se abrir, mais escura do que a escuridão, uma abertura na lateral da nave, seguido pelo som da rampa deslizando até tocar o chão. Gnut subiu por ela, parou um segundo e desapareceu no interior da nave.

Pela primeira vez então Cliff lembrou-se da foto que viera tirar. Gnut havia se movido e ele não aproveitara a chance. Mas ao menos agora, ainda podia fotografar a rampa se conectando à porta aberta; então preparou a câmera na posição, ajustou para uma exposição longa e disparou.
Muito tempo transcorreu sem que Gnut reaparecesse. O que poderia estar ocorrendo lá dentro?
Cliff imaginava. Sua coragem já retornara e considerou a idéia de arrastar-se até a porta e olhar para dentro, mas não achou que tinha tanta coragem para isso.

Gnut não lhe fizera mal, porém nada poderia lhe dizer o quanto seria tolerante com ele.
Uma hora se passou então outra, e Gnut estava fazendo algo lá dentro, mas o quê?
Cliff não conseguia imaginar. Se o robô fosse um ser humano, saberia que ele daria uma espiadela, mas do jeito que as coisas estavam, era uma incógnita sem solução. Mesmo os mais simples robôs da terra, sob certas circunstâncias, faziam coisas inexplicáveis; e o que um ser deste tipo, vindo de alguma civilização desconhecida e impensável, com certeza a mais formidável criatura já construída – que superpoderes não poderia ter? Tudo que os cientistas da Terra haviam tentado não conseguiram avariá-lo. Ácido, calor, raios, terríveis golpes - ele suportara a tudo. Poderia enxergar perfeitamente no escuro. E mesmo ser capaz de ouvir, ou de outro jeito, saber precisamente a posição de Cliff.

Mais tempo passou e então próximo das duas horas da manhã, algo completamente banal aconteceu e tão inesperado que por um instante destruiu o equilíbrio de Cliff.
Subitamente, através da escuridão do prédio silencioso ouviu-se um bater de asas e logo um doce canto de pássaro. Um rouxinol. Em algum lugar do salão, acima dele. Límpida e repleta de notas era seu canto, pequenas canções, uma depois da outra, sem pausas, uma canção de amor da primavera talvez, o mais belo cantor de toda natureza. E assim como começou, terminou.
Se todo um exército de invasão saísse da nave, Cliff ficaria menos surpreso.
Era dezembro e mesmo na Flórida os rouxinóis ainda não haviam começado a cantar. Então como um deles fôra entrar no museu? Como e por que cantava ali?
Aguardou cheio de curiosidade, até de repente ver Gnut já parado do lado de fora da porta.
Seus olhos brilhando na direção de Cliff.
Por um momento, o silêncio do local pareceu mais intenso, então foi quebrado por um barulho abafado perto do chão, onde Cliff estava.
A luz dos olhos de Gnut havia mudado e ele começou a andar de seu jeito na direção de Cliff. Quando estava bem perto, parou e se inclinou, pegando algo do chão. Por algum tempo ficou parado olhando para aquele pequeno objeto em sua mão. Cliff sabia, embora não pudesse ver, que se tratava do rouxinol. Pelo menos era seu corpo, mas já não cantava mais.
Então sem olhar para Cliff, Gnut se virou e entrou na nave mais uma vez.

Horas se passaram enquanto Cliff aguardava pela seqüência daquele surpreendente acontecimento.
Quem sabe sua curiosidade fosse responsável por perder o medo.
Certamente se o robô fosse hostil, se desejasse feri-lo, já teria feito antes, quando teve a oportunidade perfeita para isso.
Cliff estava cada vez mais nervoso por desejar dar uma olhada lá para dentro da nave. E tirar uma foto; tinha que se lembrar da foto. Vivia esquecendo o motivo que o trouxera até ali.
Já na mais profunda escuridão de uma falsa madrugada que ele juntou coragem bastante para tomar a iniciativa. Tirou os sapatos e, na ponta dos pés, com os sapatos amarrados e batendo juntos sobre os ombros, ele moveu-se rápido para uma posição mais próxima, então parou esperando algum sinal de que Gnut o percebera se mover.
Sem ouvir nada, passou por detrás de um atendente e parou, então assim, cuidadosamente alcançou a beirada da nave. E ficou desapontado. Nenhuma luz podia ser vista lá dentro, apenas escuridão e o silêncio permeando tudo.
Ainda assim, precisava daquela foto.
Ergueu a câmera, fez foco na escuridão e deu uma longa e boa exposição.
Então ficou lá, sem saber o que mais fazer em seguida.
Quando parou, passou a ouvir uma série de sons peculiares, aparentemente vindos de dentro. Sons de animais, primeiro bem baixo, depois acentuados por cliques, então ranger de dentes, interrompidos por mais rangidos e sons ofegantes, como se uma luta de algum tipo estivesse ocorrendo.

Então de repente, antes que Cliff pudesse se decidir por correr de volta ao seu esconderijo, uma forma baixa, larga e escura surgiu na frente da nave e imediatamente se virou e ficou do tamanho de um homem. Uma sensação de terror total tomou Cliff que reconheceu aquela forma de vida. No segundo seguinte, Gnut surgiu na entrada e, sem hesitar, começou a descer a rampa na direção daquela forma de vida.
Assim que avançou, ela recuou de lado levemente por um metro e então com os braços balançando ao lado do corpo, começou a bater contra o peito feito um tambor enquanto da sua garganta partia um profundo rugido de desafio.
Apenas uma criatura no mundo todo batia no peito daquela maneira e fazia um som como aquele. A criatura era um gorila.
E um gorila dos grandes.

Gnut continuava vindo e quando chegou bastante perto, abaixou-se e abraçou a fera.
Cliff não imaginava que Gnut pudesse se mover tão rápido.
No escuro, não conseguia ver os detalhes do que ocorria, tudo que sabia era que dois grandes vultos: o titã de metal Gnut e o baixo, porém terrivelmente forte gorila.
Eles se fundiram por um instante; o silêncio do robô e os grunhidos e rugidos da besta - e quando os dois se separaram, o gorila estava de costas no chão.
O animal se ergueu rapidamente se pondo a rugir alto.
Gnut avançou contra ele.
Eles se atracaram mais uma vez e ainda uma outra, como ocorreu antes de se separarem. O robô permanecia inexorável e o gorila agora retrocedeu até a parede dos fundos do prédio. Subitamente a fera correu contra a figura do atendente e com um movimento rápido a derrubou, decapitando-o.
Tenso de medo, Cliff se colocou abaixado atrás de um dos robôs atendentes.
Graças a Deus, Gnut estava entre ele e o gorila, que continuava avançando.
O gorila mais uma vez atirou-se contra o robô atendente seguinte e com força quase inacreditável, levantou-o arrancando do chão e o atirou na direção de Gnut. Com um som de metal contra metal, o atendente acertou o robô e o da terra voou para longe detendo-se ao chão.
Cliff amaldiçoou a si mesmo, pois novamente esquecera completamente de fotografar.
O gorila continuava arrancando e destruindo todos os robôs atendentes com ferocidade sem igual e ainda atirava pedaços e peças no implácavel Gnut.

Logo chegaram perto da mesa de controles e Cliff agradeceu por não estar mais lá.
Então seguiu-se um breve silêncio. Cliff, de onde estava não podia ver o que estava acontecendo, mas imaginou que o gorila alcançara o canto da ala e estava encurralado.
Se assim foi, foi apenas por um momento. O silêncio foi quebrado de repente por um rugido e logo o vulto do animal se aproximou na direção de Cliff, ficando entre ele e a porta da nave.
Cliff rezou pelo retorno de Gnut, pois agora restava apenas um robô atendente entre ele e a criatura enfurecida.
E Gnut apareceu.
O gorila mais uma vez se colocou de pé, batendo no peito e rugindo desafiadoramente.
Então, algo bem estranho ocorreu, pois a besta caiu nas quatro patas e rolou de costas como se estivesse fraco ou ferido.
Fazendo ruídos pavorosos, fez-se de pé novamente para enfrentar Gnut que se aproximava.
E enquanto esperava, foi atraído pelo ultimo atendente e talvez por Cliff, abaixado junto dele. Com um acesso repentino de fúria o gorila atirou-se na direção de Cliff, que apesar do pânico viu que o animal movia-se com dificuldade, severamente machucado. Saltou para trás a tempo de se esquivar: o gorila saltou contra o atendente robô e atirou-o violentamente contra Gnut, por pouco não o atingindo.
Fora seu último esforço.
A fraqueza o envolveu e tombou em seguida de lado, rolando de costas.
Estremeceu e então não mais se moveu.

O primeiro clarão pálido da manhã insinuava-se no salão.
Do canto onde se refugiara, Cliff viu o grande robô.
Pareceu-lhe que se comportava estranhamente.
Parou junto ao gorila morto, olhando para baixo com o que num humano poderia ser chamado de tristeza. Cliff reparou com precisão; as feições esverdeadas seriamente contraídas, pensativas e que ele nunca vira antes. Ficou assim algum tempo então como um pai com sua criança doente, ergueu o grande animal nos braços de metal e suavemente o carregou para a nave.
Cliff procurou abrigo de novo na mesa de instrumentos, sentindo medo por conta dos acontecimentos inexplicáveis e perigosos.
Pensou que seria mais seguro abrigar-se no laboratório e, com os joelhos tremendo, fez o caminho até lá, escondendo-se atrás de um grande forno maciço.
Rezou pela luz do sol. Seus pensamentos eram caóticos.
Rapidamente, um após outro, os eventos daquela noite preencheram sua mente, mas tudo era mistério, não parecia haver uma explicação racional para aquilo tudo.
O rouxinol. O gorila. A expressão de tristeza de Gnut e sua docilidade.
Nada explicava tal mescla fantástica de acontecimentos.

Gradualmente a luz do dia chegou.
Um longo tempo se passara. Afinal, começou a acreditar que escaparia vivo dali.
As oito e trinta, ouviu ruídos na entrada e o som maravilhoso de vozes humanas chegou-lhe aos ouvidos. Deixou o forno industrial e caminhou pela passagem.
Os ruídos cessaram subitamente e houve uma exclamação de espanto e o som de pés correndo e então silêncio de novo.
Temeroso, Cliff espiou ao redor da nave.
Lá estava Gnut em sua pose costumeira, na mesma posição que assumira após a morte de seu mestre, junto da nave e sozinho mais uma vez, em meio aos escombros espalhados pelo salão.
As portas da entrada estavam abertas e, com o coração na boca, Cliff correu para fora.
Minutos depois, salvo no seu quarto de hotel, esgotado por total, sentou-se na cama e logo adormecera assim sentado.
Mais tarde, ainda usando as mesmas roupas e ainda sonado, rolou pela cama.
Não voltaria a acordar até o meio dia.


domingo, 28 de dezembro de 2008

The Day the Earth Stood Still - Script original


BRITISH ANNOUNCER
Reports are coming in from all over
the Empire -- from all over the world.
The Government have not yet issued a
statement, but there seems to be no
question that there actually is a
large, unidentified object circling
the earth at incredible speed.

This announcer keeps talking, but his voice fades out, and
now we hear the words the American announcer is saying...

AMERICAN ANNOUNCER
(staccato with excitement)
We still don't know what it is or
where it's from –- but we do know
there's something there. It's been
tracked around the world by radar
traveling at a rate of four thousand
miles an hour.


MED. CLOSE SHOT

Several people on the steps of the Smithsonian have turned
to look. There is cold, frozen fear in their eyes. The awful
sound keeps increasing in volume.

CLOSE SHOT

A man, following the progress of a huge object in the sky
with his eyes. He is held terror-stricken.

LONG SHOT INTO SKY (SERSEN SHOT)

A giant shape, still at some distance, is approaching the
earth at incredible speed.

LONG SHOT ON GROUND

A group of people run wildly across a large expanse of lawn.
A huge shadow cast from above onto the grass seems to be
pursing them.

CLOSE SHOT - GORT

From inside him there comes an ominous crackling sound, as
though power were being generated within him. His eyes flash
toward the tank from which Klaatu was shot.

MED. CLOSE SHOT - TANK

There is a great metallic clatter and the Sherman tank is
suddenly reduced to a pile of junk metal, its parts completely
disintegrated. Only a piece of tank track and twisted gun
barrel emerge from the heap on the ground to identify what
had been there. The tank's crew has remained unharmed.

CLOSE SHOT - GORT

The crackling sound continues as his eyes start to sweep in
a semicircle taking in all the troops.

MED. SHOT - THE TROOPS

SHOOTING FROM BEHIND Gort, with the back of his head in f.g.,
CAMERA PANS to follow Gort's sweeping gaze. In a growing
crash and clatter of metal, every weapon in sight is
destroyed. The two machine guns are little heaps of junk.
The 75's are larger heaps. The second tank, like the first,
is a three-foot pile of scrap. Rifles have dropped from the
soldier's hands and lie on the ground as little mounds of
wood and metal. None of the men has been harmed, but their
faces show the utter terror of what they have experienced.


INT. SMALL CORRIDOR - SPACE SHIP

CAMERA FOLLOWS as Gort carries Helen through the dimly lighted
corridor into the main cabin, where he flips a switch that
lights up the cabin. The robot proceeds to a small door
leading off the main cabin and disappears with Helen inside
it.

INT. SMALL CABIN - FULL SHOT

This is revealed as a weirdly equipped laboratory, the walls
of which are lined with the most complex array of mechanical
and electronic apparatus. Gort sets Helen down on a stool
and indicates for her to stay there. Too terrified to move,
Helen watches as he busies himself with the apparatus. He
starts flipping switches and turning dials. As a result,
lights begin to flash and there's a strange series of
mechanical noises.

CLOSE SHOT - HELEN

Unable to guess the reason for these preparations, she is
gripped with a terrible fear.

KLAATU
We of the other planets have long accepted this principle. We have an
organization for the mutual protection of all planets -- and for the complete
elimination of aggression. A sort of United Nations on the Planetary
level... The test of any such higher authority, of course, is the police
force that supports it. For our policemen, we created a race of robots--
(indicating Gort)
Their function is to patrol the planets -- in space ships like this
one -- and preserve the peace. In matters of aggression we have given
them absolute power over us.

MED. CLOSE SHOT - GORT

emphasizing his great size and inscrutable expression. The
normal blinking of his piercing eyes as he gazes imperturbably
at the audience is his only movement.

KLAATU'S VOICE
(over scene)
At the first sign of violence they act automatically against the
aggressor. And the penalty for provoking their action is too terrible to risk.

CLOSE SHOT - KLAATU

KLAATU
The result is that we live in peace,without arms or armies, secure in the knowledge that we are free from aggression and war -- free to pursue more profitable enterprises.
(after a pause)
We do not pretend to have achieved perfection
-- but we do have a system --
and it works.
(with straightforward candor)
I came here to give you the facts.
It is no concern of ours how you run your own planet -- but if you threaten
to extend your violence, this Earth of yours will be reduced to a burned-out cinder.

QUICK REACTION CUTS

of four delegates, reflecting their stark terror and bewilderment.
And a cut of the Colonel and the soldiers, impressed and held by what Klaatu is saying.

MED. CLOSE SHOT - KLAATU

CAMERA MOVES SLOWLY as he concludes quietly, incisively.

KLAATU
Your choice is simple. Join us and live in peace. Or pursue your present
course -- and face obliteration.
(after a pause)
We will be waiting for your answer.
Decision rests with you.


Script original 'The day the Earth stood still' [ Download ]

Harry Bates

Harry Bates ou Hiram Gilmore Bates III (9 de Outubro, 1900 - Setembro de 1981) nascido na Pensilvânia, Estados Unidos, começou a trabalhar como editor de revistas populares (pulp magazines) em 1920 e é lembrado pela sua contribuição como editor no campo da Ficção Científica. Foi um dos fundadores da 'Astounding Stories of Super-Science', que logo viraria 'Astounding Stories', responsável por mudar os rumos do gênero na América do Norte.

Apesar de sua preocupação com a ação e a construção das histórias, que garantia a qualidade da revista, isso não foi o bastante. Apenas foram publicados 34 exemplares de 'Astouding' e 7 de 'Strange Tales', dedicada a histórias de terror fantástico. A falência veio em 1933.

Durante seu trabalho, Bates escreveu diversos contos, a maioria em colaboração com seu assistente Desmond Hall, muitos deles foram publicados na 'Astouding' com o pseudônimo H.B.Winter ou Anthony Gilmore.

Não há registros de ter publicado algo após 1952. Bates passou os últimos anos de sua vida, no anonimato e doente, acabando por morrer esquecido.

Bates só não foi totalmente esquecido devido ao seu conto 'Farewell to the master', publicado em Outubro de 1940 na 'Astounding Stories', que sequer recebeu capa ou ilustração na época, já que não se tratava da principal história daquela edição (Slan, de A.E.Van Voght), mas que serviu de premissa básica para o filme 'O dia em que a Terra parou' (The day the Earth stood still) lançado em 1951 pelo Diretor Robert Wise, e que viria a se tornar um marco na história do cinema.

No livro, 'Gort' aparece mas seu nome é 'Gnut', e a famosa frase 'Klaatu Barada Niktu' também está ausente, assim como não há nenhuma insinuação romântica com Klaatu.

La dimension Fatal - Harry Bates [ Download ]
Farewell to the master - Harry Bates [ Download ]

sábado, 27 de dezembro de 2008

O dia em que a Terra parou (Adeus ao Mestre - Harry Bates ) Parte 1/7


A edição da revista 'Astouding' de Outubro de 1940, trazia em suas páginas, um conto de Harry Bates intitulado 'Adeus ao Mestre' (Farewell to the Master). O conto passou despercebido para a maioria das pessoas, menos para um roteirista chamado Scott Pearson, que o mostrou para o diretor Robert Wise, que procurava uma boa história para seu próximo filme. Anos depois, e adquirido os direitos, Wise teria sido obrigado a aceitar o roteirista do estúdio (Twentieth Century-Fox), Edmund North, que fez consideráveis mudanças no material, adaptando-o ao gosto do público da época.
Lançado em setembro de 1951, 'The day the Earth stood still' aproveitava-se da onda de filmes com efeitos especiais, dentro da temática do 'perigo que vem do espaço', comum nos anos da Guerra-Fria.
O filme ganhou um Globo de Ouro e se tornou um cult.
Em 2008 ganhou uma nova versão, desta vez com Keanu Reeves no papel do 'embaixador Klaatu'.

O Capacitor Fantástico traz a íntegra de 'Adeus ao Mestre', o conto que deu origem a tudo.


ADEUS AO MESTRE - HARRY BATES

Parte 1

Do alto da escada, acima do chão do museu, Cliff Sutherland estudava cuidadosamente cada linha e sombra do grande robô, então se virou para os visitantes saidos do salão do Sistema Solar para ver Gnut e o viajante, com seus próprios olhos, e ouvir mais uma vez sobre a fantástica e trágica história deles.
Ele mesmo sentia um interesse particular na exibição e com alguma razão.
Ele havia sido o único repórter fotográfico independente na Capital quando os visitantes vindos do desconhecido chegaram, e havia conseguido as primeiras fotos profissionais da nave.
Tinha testemunhado de perto cada evento naqueles dias loucos que se seguiriam. Depois disso havia fotografado muitas vezes o robô de seis metros, a nave e o belo embaixador assassinado, Klaatu, em seu imponente túmulo no Memorial, que se transformara no centro de atenção mundial para bilhões de pessoas, e agora mais uma vez, ele estava ali buscando mais fotos, e se possível de um novo ângulo.

Desta vez estava atrás de uma foto na qual Gnut parecesse ameaçador. Aquelas que havia tirado no dia anterior não haviam tido o efeito esperado e esperava consegui-las ainda hoje, mas a luz ainda não estava apropriada e ele esperava a chegada da tarde.
A última turma admitida estava exaltada diante das curvas esverdeadas do misterioso viajante do espaço-tempo, esquecidos completamente da nave, diante da visão espantosa do gigante Gnut.
Apesar de sua aparência quase humana ser familiar, nada na Terra tinha olhos como aqueles. Gnut possuía quase que exatamente a forma de um homem – um gigante – mas um homem – feito de metal esverdeado ao invés de pele, e músculos metálicos.
Exceto por um pano ao redor da cintura, semelhante a um saiote egípcio, ele estava nu.
De pé, como um poderoso Deus das máquinas saído de uma civilização cientifica nunca imaginada, sua face parecia trazer uma expressão pensativa e solene.
Aqueles que o observavam, não emitiam comentários ou faziam gestos, e aqueles mais próximos sequer falavam. Aqueles estranhos olhos vermelhos iluminados internamente davam a impressão a qualquer um, que estavam a observá-lo também, e transmitia uma sensação de que poderia a qualquer momento, dar um passo a frente em fúria e realizar algo inimaginável.

Um som desagradável veio dos auto-falantes escondidos no teto acima e fez com que todos prestassem atenção. A apresentação gravada estava prestes a começar.
Cliff suspirou resignado; sabia cada fala de cor e estivera presente quando fora gravada, e conhecera o dono daquela voz, um camarada chamado Stillwell.

‘Senhoras e senhores’ iniciava a voz clara e bem modulada, mas Cliff não estava mais prestando atenção. As sombras da face de Gnut começavam a ficar maiores e estava quase na hora de fazer as fotos. Escolheu algumas provas que havia feito no dia anterior e as analisou criticamente comparando com o objeto real.
Enquanto olhava sua testa se enrugou.
Não havia notado antes, mas agora percebeu que em comparação ao dia anterior, algo havia mudado em Gnut.
A pose que tinha diante de si era quase idêntica aquela das fotografias, cada detalhe parecia igual, mas assim mesmo, aquela sensação de estranhamento perdurava. Pegou seu visor de vidro e mais cuidadosamente comparou o objeto com as fotografias, linha por linha.
E então ele viu o que estava diferente.
Subitamente excitado, Cliff escolheu duas fotografias de diferentes exposições.
Ele sabia que devia ter esperado um pouco e ter tirado outras, mas parecia tão decidido a desvendar aquele mistério que tinha que sair dali. Guardou seu equipamento e desceu a escada deixando o lugar. Vinte minutos depois consumido pela curiosidade já processava as novas fotos em seu quarto de hotel.
O que Cliff viu, comparando os negativos tirados no dia anterior com os de hoje, causaram-lhe grande comoção.
Havia realmente uma inclinação diferente.
E aparentemente ninguém a não ser ele havia percebido!
Ainda assim, o que havia descoberto, apesar de lhe render a capa de todos os jornais do sistema solar, era afinal apenas uma pista. A história, do que realmente ocorrera, ele sabia melhor do que ninguém, seria seu trabalho descobrir.
O que significava dizer que precisaria entrar no prédio e permanecer lá durante a noite secretamente. Aquela noite mesmo; havia tempo para chegar lá antes de fechar.
Levaria consigo uma pequena câmera infravermelha capaz de ver no escuro e então conseguiria a foto e a história.
Arrumou-se e correu de volta ao museu.

O lugar estava cheio com outro grupo em fila e a apresentação estava ao fim.
Ele agradeceu a Deus que seu acordo com o museu permitia-lhe entrar e sai à vontade.
Já se havia decidido quanto ao que iria fazer.
Primeiro dirigiu-se ao guarda da ronda e fez-lhe uma simples pergunta já antecipando a resposta que ouviria. A segunda foi encontrar um local que lhe garantiria ficar fora das vistas do homem responsável por fechar o salão a noite. Só havia uma possibilidade, o laboratório que ficava atrás da nave.
Corajosamente ele mostrou suas credenciais ao segundo guarda parado na entrada do laboratório, justificando que viera entrevistar os cientistas e logo já estava no laboratório.
Já havia estado ali diversas vezes e conhecia o lugar.
Era uma área espaçosa, que servia aos cientistas no seu trabalho de conseguir uma entrada na nave, repleta de máquinas e instrumentos pesados, apetrechos de química, coberturas de asbestos, compressores, escadas, microscópios, e todo tipo de equipamento encontrado em laboratórios de metalurgia.
Três homes de branco estavam absorvidos em um experimento num lado distante dali.
Cliff aguardou um bom momento e escorregou para debaixo de uma mesa repleta de suprimentos de trabalho. Sentiu-se razoavelmente seguro ali.
Logo, logo, seria noite e os cientistas iriam para casa.

Além da nave pode ouvir uma outro grupo esperando para entrar - talvez, esperava, o último do dia. Sentou-se tão confortável quanto podia. Logo outra apresentação se iniciava de novo.
Teve que sorrir ao pensar em algo que seria dito na gravação.
A voz treinada e clara de Stillwell começou a ser ouvida.
Os passos e aclamações da multidão desapareceram e Cliff pode ouvir cada palavra, apesar do volume da grande nave que se colocava no caminho.

‘Senhoras e senhores. O instituto Smithsonian os saúda nesta nova ala interplanetária e as maravilhas que no momento presenciam.
Todos vocês devem saber sobre o que ocorreu aqui, três meses atrás, se é que não viram pela televisão. Os fatos são estes. Um pouco após as dezessete horas do dia 16 de Setembro, vários turistas visitando Washington, passaram por estas portas, perdidos em seus pensamentos. O dia era quente e agradável. Um grupo de visitantes deixava a entrada principal do museu, exatamente na direção para a qual estão voltados agora. Claro que não havia esta ala ainda. Todos estavam saudosos de casa, cansados sem dúvida pelas horas de pé, assistindo as exibições do museu e visitando as várias alas, quando então aconteceu.
Na área logo a sua direita, assim como está hoje, apareceram os viajantes do tempo.
Num piscar de olhos.
Não veio dos céus, dezenas de testemunhas podiam jurar, eles simplesmente apareceram.
Um momento não estava lá e no momento seguinte estava.
Apareceu neste mesmo ponto que os senhores estão vendo.
As pessoas mais próximas da nave foram tomadas pelo pânico e correram aos gritos. Uma onda de excitação varreu Washington. Radio, televisão e os jornalistas correram para cá. A policia formou um cordão de isolamento ao redor da nave e unidades do exército apareceram com atiradores.
Desde o inicio ficou claro que não se tratava de uma espaçonave vinda de alguma parte do sistema solar. Toda criança sabe que apenas duas espaçonaves foram feitas na Terra, e uma fora destruída ao ir contra o sol, a outra foi reportado ter chegado intacta em Marte. Além disso, tinham escudos de alumínio, e essa que vêem, é feita de um estranho metal esverdeado.
A nave simplesmente apareceu. Ninguém saiu de dentro e não havia sinal de que contivesse qualquer vida interior de qualquer tipo. Isto fez com que a excitação chegasse a um clímax. Quem ou o que estava lá dentro? Os visitantes eram pacíficos ou hostis? De onde havia vindo? Como havia chegado ali sem cair do céu?
Por dois dias a nave permaneceu ali, como vocês vêem, sem sinal de conter vida. Os cientistas já haviam explicado que não se tratava de uma espaçonave, mas de um viajante tempo-espacial, pois só um aparato assim deste gênero poderia se materializar daquele jeito.
Explicaram que este viajante, teoricamente estaria longe do nosso atual estágio de conhecimento, e que a nave ativada pelos princípios da relatividade, poderia ter vindo do canto mais distante do universo, de uma distância que a luz iria precisar de milhões de anos para atravessar.
Quando esta opinião foi disseminada, a tensão pública só fez crescer, até se tornar quase intolerável. De onde haviam vindo? Quem eram seus ocupantes? Por que a Terra? E acima de tudo, por que não se mostravam? Poderiam estar talvez preparando alguma terrível arma de destruição?
E onde ficava a porta da nave? Aqueles que se atreveram a procurar de perto não conseguiram achar uma. Nem sequer uma fissura na superfície perfeita e ovóide.
Uma delegação de altos oficiais que a haviam visitado, não puderam, convencer seus ocupantes a sair ou mesmo não sabiam se foram ouvidos.
Ao final, após dois dias, diante da vista de dezenas de centenas de pessoas presentes e sobre a proteção das armas dos militares, uma abertura surgiu na parede da nave e uma rampa deslizou para fora e abaixo e de dentro saiu um homem, como um deus em aparência humana, seguido de perto de um gigantesco robô. Assim que alcançaram o chão, a rampa recuou e a porta fechou-se como antes.
Ficou imediatamente claro para a platéia que o estranho era amigável.
A primeira coisa que fez foi erguer seu braço direito num gesto universal de paz, mas não foi isso que impressionou aqueles mais próximos, mas a expressão em sua face, irradiando generosidade, conhecimento, a mais pura nobreza. Em sua túnica roxa e delicada, ele parecia um benevolente deus.
Um grande comitê formado por altos membros do governo e oficiais das forças armadas, que aguardavam pela sua aparição, avançou para cumprimentar o visitante.
Com graciosidade e dignidade o homem apontou para si e depois para o robô companheiro e disse em perfeito inglês, com um peculiar sotaque.
‘Sou Klaatu’, ou algo assim, ‘e este é Gnut’.
Os nomes não foram bem entendidos no instante mas depois, revendo as gravações de áudio e vídeo, ficaram claros para todos.
Foi quanto ocorreu aquilo que seria conhecido para sempre como uma das maiores vergonhas para a raça humana. Do alto de uma árvore, uma centena de metros dali, veio uma luz violeta e Klaatu caiu.
A multidão ficou perplexa por um instante, sem compreender o que ocorrera.
Gnut, pouco atrás e ao lado de seu mestre, lentamente virou seu corpo em direção a ele, moveu duas vezes a sua cabeça e parou, nesta exata posição que vocês vêem agora.
Um pandemônio seguiu-se.
A polícia arrancou o assassino de Klaatu das árvores. Um sujeito mentalmente incapaz que gritava que o diabo viera matar a todos nós na Terra. Ele foi detido e Klaatu, morto, foi levado a um hospital mais próximo, na tentativa de que algo pudesse ser feito para reavivê-lo.
Confusas e assustadas, as pessoas se dispersaram pela Capital, permanecendo vagando pela tarde e por quase toda noite.
A nave permaneceu silenciosa e quieta como antes e Gnut também, nunca se moveu da posição em que ficou. Gnut nunca se moveria de novo.
Permaneceu exatamente como vêem por aquela noite e todos os dias depois.
Quando o mausoléu foi construído, a cerimônia de enterro de Klaatu teve vez neste mesmo lugar onde estão, presenciado pelas maiores autoridades do mundo.
Não foi apenas a coisa mais apropriada a se fazer como também a mais segura, pois se existissem criaturas vivas dentro da nave, elas poderiam perceber a sincera manifestação de pesar dos homens da Terra e pelo que havia acontecido.
Se Gnut estivesse vivo, ou se ainda, melhor dizendo, continuasse operacional, não havia sinal algum. Permaneceu como vêem por toda a cerimônia. Mesmo quando seu mestre foi levado para dentro do mausoléu e encerrado pelos séculos. E ficou ali parado, dia após dia, noite após noite, no sol ou na chuva, sem se mover ou demonstrar o menor sinal de que tinha noção do que ocorreu.
Após o ocorrido, esta nova ala foi construída ao redor do robô e da nave e anexada ao museu, a fim de cobrir e protegê-los. Nada mais poderia ser feito, pois como se descobriu, ambos Gnut e a nave, são pesados demais para serem movidos com segurança por qualquer meio que conhecemos.
Vocês devem ter ouvido dos esforços dos nossos metalúrgicos desde então na tentativa de penetrar no interior da nave e que resultou em total fracasso.
Atrás da nave hoje, como podem ver, uma sala foi acrescentada para este trabalho em especial e tentativas ainda estão sendo feitas. Apesar das tentativas, este maravilhoso metal esverdeado tem se provado inviolável. Não somente não conseguimos entrar, mas sequer descobrimos o ponto exato pelo qual Klaatu e Gnut emergiram.
Muitas pessoas temem que Gnut só esteja temporariamente danificado e que ao retornar ao funcionamento poderá ser perigoso, porêm todos os cientistas desmentiram esta possibilidade.
O metal esverdeado do qual é feito, o mesmo da nave, não pode ser danificado, eles pensam, nem encontraram um jeito de penetrar em seu interior. Atualmente eles estão experimentando aplicar correntes elétricas de alta voltagem e amperagem através deles. Já tentaram com o calor extremo. Os deixaram imersos por dias em gases e ácidos e soluções corrosivas, e já os bombardearam com todo tipo de raios conhecidos.
Não precisam ter medo dele agora.
Ele possivelmente não possui mais a habilidade de funcionar de qualquer jeito.
Mas, uma palavra de atenção. As autoridades sabem que os visitantes não irão mostrar qualquer desrespeito dentro deste prédio. Pode ser que a impensável e poderosa civilização da qual vieram Klaatu e Gnut, possa enviar outros emissários para ver o que aconteceu com eles.
Caso façam ou não, nenhum de nós deve mostrar-se inamistoso com nossa atitude.
Nenhum de nós é capaz de antecipar o que aconteceria, todos nos sentimos pesarosos, mas ainda temos reconhecimento da nossa responsabilidade e devemos fazer o que for preciso para evitar qualquer possível retaliação.
Vocês poderão permanecer por mais cinco minutos e então soará um gongo e pedimos que todos por favor, deixem o local prontamente. Os atendentes ao longo da parede responderão as dúvidas que tiverem.
Olhem bem, diante de vocês estão os símbolos absolutos da realização, do mistério e da fragilidade da raça humana.’

A gravação cessou.
Cliff cuidadosamente moveu com cuidado seus membros doloridos e sorriu.
Se eles soubessem o que eu sei!
Suas fotografias contavam uma história um pouco diferente da apresentação. Uma das linhas do chão, ontem estava visível, próxima ao pé do robô, e hoje estava coberta.
Gnut havia se movido!
Ou sido movido, pensou sem achar ser provável. Onde estaria a outra evidência de seu deslocamento? Não podia ter sido feito em uma noite apenas e todos os sinais apagados. E por que o fariam? Ainda assim, para ter certeza, ele perguntara ao guarda. E ainda se lembrava de sua resposta:
‘Não. Gnut nunca se moveu ou foi movido desde a morte de seu mestre. Tiveram o cuidado de mantê-lo como estava, na posição que assumiu quando da morte de Klaatu. O chão foi construído debaixo dele e os cientistas levantaram seus aparatos ao redor dele. Não precisa ter medo.'
Cliff sorriu de novo. Ele não tinha medo.
Não ainda.


The Day the Earth Stood Still - Arthur Tofte


"...A panel in the ship was slowly opening! Aiming his camera, Sutherland snapped a picture.

He watched as a ramp slowly slid out of the opening.
He took another picture. For several minutes more there was no further activity.

Then, slowly, with a stately tread, there appeared the most striking being Cliff had ever seen. He was tall and very slender. He wore a tight-fitting garment made of a shining silvery material. As he strode down the ramp, it seemed to Cliff that goodness and good will emanated from him in a godlike aura.

Just as perhaps every other person in the huge crowd felt, so Cliff Sutherland sighed in relief. The alien was no enemy. He brought no sense of menace with him, no threat of danger.
Remembering belatedly why he was here, Cliff snapped several pictures of the stranger as he moved down the ramp.

Then he saw a second figure emerge!

This one was completely different. He was half again as tall as the humanlike being who had preceded him. He seemed to be a mechanical robot. Made apparently of the same green material as the ship, he nevertheless moved surely and smoothly as he took his place beside the other. The ramp behind them slid back into the ship and the panel door closed.

For a long moment the two strange figures stood facing the silent crowd.
Then the man spoke up in a loud, clear voice: "I am Klaatu and this is Gnut."

A murmur arose from the people closest, obviously surprised that the alien could speak English.

The alien raised his right arm, palm outward, in the universal symbol of peace.
At that instant there was a sharp report. Turning quickly, Cliff Sutherland saw tendrils of smoke rising from a tree nearby. A wild-eyed man wasdescending. Two policemen grappled with him.
Cliff took one picture of the scuffle. When he saw that the gunman was being dragged away, he turned back to look at the fallen figure of the alien. This too he photographed.

Soldiers were surrounding the stranger as he lay on the ground. In a minute or two they had picked him up and carried him to a nearby army car.

Stunned by the sudden turn of events, Sutherland moved toward the ship.

The robotlike creature had not changed his position in all the turmoil and excitement.
He stood stolidly, his two huge feet firmly placed on the ground.

Cliff approached and was startled to see the robot's eyes, like red beads, glaring back at him.
Within minutes, the police and the soldiers had restored order.

A rope cordon was hurriedly placed around the ship to keep people away. Inside the area, the robot, Gnut, never moved.

Exhausted by his long, 24 hour stint, Sutherland didn't object when a policeman said he'd have to get back with the others in spite of his press card. He desperately needed a shower, food, and sleep. And he wanted to get back to his two-room apartment where he could develop the pictures he had taken.

He was not too happy with the shots he had obtained.
Every news photographer in Washington probably had about the same.
But most of all, right now he needed sleep."



O conto 'Farewell to the master'(1940) de Harry Bates, que deu origem ao conhecido filme 'O dia em que a Terra parou' (The day the Earth stood still, 1951, Diretor Robert Wise) também foi posteriormente transformado em um romance por Arthur Tofte, com o mesmo nome do filme.

THE DAY THE EARTH STOOD STILL (1976) -Arthur Tofte [ Download ]

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

DarkRoastedBlend



Mais de 10.000 resenhas de livros de FC e Fantasia

Terrorzine - 3 e 4


No escuro salão... -Ademir Pascale
O viúvo -João B. dos Santos
Uma tarde e um pouco de... -Paulo Noboru
Vida de escritor -Adriano Siqueira
O salto -Leonardo Brum
Suzana -Rafael Jordan
Lados opostos -Almir Pascale
Gruta Secreta -Leonardo Grasel
Cuidado com o que você... -Renata R. Cezimbra
Olhos de fogo -Carla Ribeiro
Metempsicose -Luciana Fátima
O reflexo da alma -Ricardo Delfin
Calibre 45 -Daniel Frini
Subconsciente -Luciana Muniz
Recuerdo -Roberlandio Pinheiro
Preparativos de Halloween -Diego Piovesan
O Sono -Marcelo Dias Amado
El origen de los... -Roberto Ortiz Falcón
Dever cumprido! -Edson Rossatto
O Invasor -Mario C. C. Junior
A tampa do caixão -Rodrigo Araújo
A cabana -Elenir Alves
Oficial responsável -Martha Argel
Acto de desagravio -Sergio vel Hartman
Mentiras -Frodo Oliveira
Servicio -Miguel Dorelo
El resucitador de estrellas -Tanya Tynjälä
Plantas de carne -Iam Godoy
Do outro lado -Miriam S. dos Santos
Começando pelo olho -Vinícius Vieira
Palavras no vento -James Andrade
Reflexões solitárias -Nelson Magrini
Impressão -Wilson Gorj

Terrorzine 03 [ Download ]



O Atalho -Francisco Pascoal Pinto
Reflexões Peculiares -Nelson Magrini
O Pó -Alexandrine Blume
As Rosas Vermelhas -Gildson Góes
Vaidade -Rafael Jordan
Nunca Estamos a Sós! -Almir Pascale
A Casa Amarela -Giulia Moon
Elegia ao Vinho -Ricardo Delfin
Aprendizado -Angela Oiticica
Amor Materno -Iam Godoy
Dia de Visita -Roberlandio A. Pinheiro
Sob as Leis do Antigo Egito -Angela Schnoor
Acidente na Estrada -J. P. Balbino
Neurosis -Roberto Carlos Ortiz Falcón
Vampírica -Carla Ribeiro
Onophre -James Andrade
Por Dentro do Ser -Rodrigo Araujo
O Fogo do Amor -Celso Junior
Soneto à Eternidade -João Batista dos Santos
Abduzido -Rogério Silvério de Farias
Últimas Palabras -Daniel Frini
Papai! -Leonardo Grasel
Redenção -Rúbia Cunha
A Criatura -Daniele Cardoso
O Mitomaníaco -Luciana Fátima
Cárcere -Samir Mesquita
El Eremita -Dennis Arias Chávez
Hoje eu Passei pela Morte -M. D. Amado
Tú Esencia -Santiago Fernández Subiela
Devorador de Halos -Eduardo Oliveira Freire
A Loucura -Mario Carlos Carneiro J unior
Negociación -Sergio Gaut vel Hartman
Admiradores de Morcegos -Elenir Alves
Feito em Casa -Martha Argel
Caçada Noturna -Wilson Gorj

Terrorzine 04 [ Download ]

Atravessando a fronteira do País Assombrado


Entrevista com William Gibson para a Amazon.com


Amazon.com: Pode começar nos contando um pouco sobre onde se passa este novo livro?

William Gibson: Na verdade, não me preparei para isso.


Amazon.com: É como costumamos fazer, pegamos as pessoas antes que tenham tempo de decorar suas falas.

William Gibson: Sabe, quando faço a promoção do livro, já tenho uma idéia do que se trata. Ou sobre como o livro está sendo entendido, sobre o que se trata realmente. Neste livro temos alguns personagens misteriosos, uma pequena família criminosa de Nova Iorque, um tipo de contrabandistas ou, como se diz, de facilitadores ilegais, que fazem coisas entrarem na America do Norte. E você tem que ler até o fim para entender direito. Então eu imagino que seja um romance criminal.


A: Sim, tem todos os elementos de um thriller -tudo leva a crer que sim. Nós falávamos mais cedo - que você não sabe o que está dentro do pacote, até escrever?

WG: Não, eu não sei. Em certo ponto eu estou certo de que está cheio de objetos de arte retirados do museu de Bagdá (risos) e então me dou conta que contém as lendárias baterias de Bagdá, que Erich Von Daniken se referia nos anos 70 (as baterias seriam uma prova de um paleocontato com alienígenas).


A: Mas nada de armas de destruição em massa.

WG: Bem, estou preocupado com isso. Às vezes eu não gosto de confessar que sei muito pouco sobre como estas coisas começam, mas começo a admitir que quando menos eu souber, melhor.


A: Temos a proposta inicial do livro em seu site, e algo que me pegou foi que nenhuma das possibilidades acaba se concretizando ao fim. Estou curioso sobre como você faz, na medida em que passa de um personagem para outro, enquanto planeja o livro ou o está escrevendo.

WG: Bem, eu acho que a chave é que eu não acredito em propostas.


A: E aqueles que te publicam acreditam?

WG: Eu não sei - parece ser uma espécie de objeto ritualístico e temo realmente que tenha feito um contrato sem uma proposta, mas me surpreendo às vezes quando acaba sobrevivendo à publicação.


A: Mas sempre sobrevive em um livro diferente. Você cria a idéia. a põe de lado e depois encontra um lugar para ela?

WG:É interessante. De verdade, eu nunca percebi isso. Eu costumo não olhar para ter certeza se está lá. (Risos). Definitivamente eu não a procuro enquanto estou escrevendo. Ninguém tem reclamado.


A: A idéia do seu último livro “Reconhecimento de Padrões” (Pattern Recognition) era de que o presente alcançou o futuro de William Gibson. Muito daquilo que você imaginou se tornou realidade, de certa forma como se estivéssemos todos vivendo a ficção científica hoje. Foi assim que você se sentiu ao escrevê-lo, que o mundo real se tornou as suas idéias?

WG: Acho que escrever sobre o mundo de hoje é algo provavelmente mais desafiador, no sentido da ficção científica, mais do que simplesmente continuar a imaginar coisas. E acho que este é absolutamente o caso. Se vou escrever ficção sobre um futuro imaginário hoje, preciso de parâmetros que me dêem uma percepção acurada de quão estranhas estão as coisas. Por que vou precisar ir além daquilo. E penso que na direção apontada dos dois últimos livros - não acho que cheguei lá ainda - trabalho estes parâmetros. Mas não sei se serei capaz de fazê-lo de novo. Não sei se serei capaz de criar um futuro imaginário de novo. Nos anos 80 e 90 - é esquisito falar isso - tínhamos o luxo da estabilidade. As coisas não estavam mudando tão rápido assim, como um dos personagens de Reconhecimento de padrões diz, você não tem aquele lugar onde ficar e poder olhar para um futuro em detalhes.


A: Você já pensou em mover-se no passado? Em Difference Engine você escreveu sua própria versão do passado.

WG: Talvez. Não sei. Ontem, por um motivo qualquer, eu estava tentando imaginar um RPG (real player game) online, multi-jogador, onde o mundo que você entra é algo do tipo Guerra Civil Americana. Não a Guerra Civil Americana dos generais e das tropas, mas um tipo de guerra civil silenciosa, realmente às escondidas, acontecendo fora de um mapa militar. Estava pensando em quem poderia ir para lá, e por que as pessoas poderiam querer ser um comerciante do rio, ou um traficante de escravos e por que não. Estou muito curioso a respeito, mas não fiz nada ainda.


A: Falando sobre mundos de multi-jogadores virtuais, você tem ido ao Second Life? Sei que fará promoção do livro por lá.

WG: Vou fazer algo lá, será a primeira vez desde o último inverno. Foi uma experiência estranha.


A:Trataram você bem?

WG: Não fui como eu mesmo. Fui como outra pessoa e ninguém sabia quem eu era. E hoje aquilo é algo como um shoppping na periferia de Edmonton no meio do inverno, misturado ao pior dia que você passou na escola (risos).


A: Conheço a periferia e é assustadora.

WG: É deserta. Como se para ser funcional precisasse ser assim. Se não estiver deserto então dá erro (crash). Existe todo este vazio, arquitetura vazia. Todas estas cidades onde só há uma pessoa e mesmo assim não querem você por perto. E quando você consegue encontrar um grupo de avatares, elas não são tão legais.


A: São inferiores ao que são - são como as pessoas são em seus carros.

WG: É, são inferiores ao que realmente são no mundo real. Mas podem haver outros lugares que não fui...


A: Se você tivesse dito quem é, provavelmente ficaria bastante popular, eu imagino.

WG: Mas aí você não descobriria como é. Mas também quem acreditaria em mim? (risos) Quem sabe se parte da minha fria recepção se deveu a escolher um avatar bem diferente daquele que a maioria das pessoas escolheria. Eu escolhi um grotesco e gordo smurf azul. Usando um saiote de bailarina. Ninguém sabe, mas foi legal. Quer saber o que na verdade me preocupa sobre o Second Life? Depois de passar umas 4 ou 5 horas por lá, dezembro passado, eu fui a um shopping repleto de compradores na véspera de Natal e todo mundo me pareceu ter saído do Second Life. Tinha algumas pessoas, com menos de 30 anos, que pareciam ter escapado do Second Life,


A: Vestiam-se como avatares.

WG: Sim, se vestem como um avatar, é algo bem assustador. E acho que em algum lugar, no meu arquivo de idéias, existe uma sobre um cara e sua namorada que se parece com aquela que ele tem no Second Life.


A: Então você coleciona idéias que podem acabar sendo usadas para um personagem sem definição?

WG: Sim, mas eu não as uso assim. Eu conto com algum atrito natural da memória para lidar com isso. E às vezes você tenta, mas não funciona ou não encontra o lugar certo, não encontra a aplicação certa para aquele material. Mas quando eu estou trabalhando muito bem com algo, me parece que tudo de alguma forma, funciona. Todas as experiências do mundo podem potencialmente encontrar seu caminho na textura da coisa. E se não acontecer, é por que não ocorre na vida.


A: Tem que ser parte da sua vida.

WG: Sim, tenho que sentir que é parte da minha experiência neste mundo.


A: E como é a sua pesquisa? Se quer escrever sobre, digamos, GPS, como fez no seu último livro, você pesquisa e procura os especialistas ou só observa as coisas aí fora e faz do seu jeito?

WG: Eu googlo (Google) e estrago tudo (risos), ou se tenho sorte, Cory Doctorow (escritor de Ficção Científica expert em tecnologia) me corrige. Uma das coisas que descobri enquanto estava escrevendo ‘Padrão de reconhecimento’ é que todo romance contemporâneo tem uma espécie de aura Google ao redor, pois todo mundo poder googlar tudo do texto. As pessoas - e isso acontece comigo em ‘Reconhecimento de Padrões’, encontrarão minhas pegadas pelo Google: Olha, ele tirou isso daqui e esta informação veio deste site.


A: Suas anotações estão por aí.

WG: Sim, é como se existisse esta extensão texto-nebulosa. Tudo é hiperlincável agora. Isso muda tudo. Tenho certeza de que muitos autores ainda não se deram conta disso, como as coisas mudaram, mas já me vi googlando partes do meu texto e algumas vezes fui levado em diferentes direções.


A: Então você consegue googlar enquanto escreve ou você se desliga de tudo?

WG: Não, tenho o Word (programa editor de texto) aberto no topo do Firefox (navegador de internet).


A: Você tem coragem.

WG: É tipo o único jeito que consigo fazer isso. Tomou o lugar de olhar pela janela, mas eu preciso...


A: Você precisa de um certo estímulo...

WG: Sim, preciso. É como quando você está nadando debaixo d’água e respira pelo canudo. O Firefox é este canudo. Eu poderia sair se eu quisesse. Posso ficar ou ir para o BoingBoing (site para o qual WG escreve) ou qualquer outro site.


A: Acho que alguns escritores nunca pulariam na piscina com o Google.

WG: Não tenho problemas, pois não me atrai tanto. O que me limita em relação ao Google é o que você pode pensar fora dele. Existe um tipo de limitação pessoal nisso, a não ser que você dê sorte e algo que você googlou te leve até algo que você nunca viu antes. Você ainda sim tem uma versão inicial daquilo na cabeça.


A: Certo, ao invés de estar numa livraria onde você pode pesquisar e as coisas virem até você, você está pesquisando dentro de sua própria cabeça.

WG: Na minha internet, as coisas que estão nos meus favoritos são pequenas. Algumas vezes muito pequenas, mas elas estão armazenadas lá.


A: É a sua vizinhança.

WG: Imagino que a maioria das pessoas faz isso.


A: Você não tem escrito não-ficção. É algo que sempre fez, uma extensão do seu trabalho? A sua editora não tem lhe cobrado um livro de memórias?

WG: Não, ninguém me pediu para escrever minhas memórias. Tenho uma proposta - uma proposta bastante bizarra - que eu escreva a biografia de um físico, puxa, nunca fiz nada assim. E me parece tão fora de propósito que penso, ok, vou considerar a idéia. É uma oportunidade batendo à porta. Mas quando penso, e eu penso a respeito, não sei como fazê-lo. Não sou um jornalista, não fui treinado para tal. Bruce Sterling teve aulas na faculdade para isso, e é algo completamente diferente, ele pode escrever algo assim. Ele pode escrever algo sobre o mundo real sem problemas. Eu nem tenho idéia de como fazê-lo.


A: É difícil escrever sobre a vida real.

WG: Entendo como uma extensão do que me permito, sinto que posso, entre as coisas que sei fazer. E história é especulação também. Estou quase convencido. A história muda. Se eu pudesse escolher saber de uma coisa sobre o mundo, daqui a cem anos, ou ter acesso a informações, eu penso que iria querer saber da história do nosso tempo, não somente por que diria muita coisa que eu não sei sobre nosso tempo, mas me diria tudo que preciso saber sobre tempo, como o que eles aceitaram acreditar.


A: Agora que você está escrevendo sobre o presente, você se considera um escritor de ficção científica? Por que, para as pessoas, você ainda é um.

WG: Nunca acreditei nesta separação. Mas a Ficção Científica é definitivamente de onde venho. A ficção científica é minha cultura literária nativa. Foi onde comecei como leitor e o que me faz um pouco diferente dos outros escritores de ficção científica da minha idade, é que eu descobri Edgar Rice Burroughs e William Burroughs ao mesmo tempo. E comecei a ler os poetas beatniks um ano depois e misturei tudo. E é melhor não ser rotulado. É uma questão de onde você está autorizado a estacionar. Se você quiser estacionar na seção de FC da livraria, ótimo. Se puder estacionar em outra seção, é ótimo. Se as pessoas quiserem comprar na Amazon, ótimo também.


A: Sim, nós o colocaremos em todas nossas seções virtuais. De certo modo, isso permite a você fazer o que quer, escrever o livro que desejar, sem se importar com o rótulo que lhe dão.

WG: Sim, tenho certeza de que tenho leitores que me conhecem há vinte anos e que estão desesperados pela ausência daquela coisa ‘ciber’, de garotas com unhas biônicas. Mas é assim mesmo. Hoje tudo está diferente. Acho que nada fica fora de moda tão rápido quanto a ficção científica. Nada fica tão datado quanto um futuro imaginário. Adquire teia de aranha mesmo antes de colocar no envelope e mandar para o editor.


A: Então você acha que é o seu caminho como escritor, estar menos interessado em imaginar o futuro, ou você acha que o mundo está mudando?

WG: As duas coisas. Até recentemente eu pensava que era eu, que havia me cansado deste conjunto de ferramentas que ganhei quando jovem, e tenho usado o velho conjunto para a ficção do século 21. Mas nos últimos cinco ou seis anos, comecei a perceber que tem algo acontecendo, algo que talvez seja o que os personagens do meu livro ‘Idoru’ chamam de ‘Ponto nodal’, ou uma série deles. Estamos em um lugar onde as coisas podem caminhar em qualquer direção. Algumas semanas atrás eu li o argumento de Charles Stross de que nós jamais faremos uma viagem espacial tripulada. Não vai acontecer. Não vamos colonizar Marte. Tudo não passa de fantasia. E foi tão convincente o argumento que li aquilo e pensei ‘Meu Deus, lá se vai toda a ficção que li quando criança. ’


A: Nós sabemos muito sobre o que podemos fazer, mas sabemos muito mais sobre o que não podemos.

WG: Sim, sim. E se for isso? Não somente quanto a estarmos destruindo o planeta, mas e se for o único? O único que a raça humana irá ter? Só por causa das distâncias.


A: Uma coisa que me prendeu em País Assombrado (Spook Country) é que de certo modo o futuro é como viver ao longo do passado recente. Como se alguns daqueles personagens do livro vivesse no futuro e outros não. Tem um momento que Milgrim está voando sobre o Golfo, em seu jato particular e ele se sente tipo ‘Oh, então é assim, com as outras pessoas. ’

WG: Sim, exatamente.


A: Este é o clássico romance do século 19, é tudo sobre divisão de classes e negociação entre elas. É o motor que move o livro.

WG: Existe algo que percebi enquanto escrevia este livro, por que precisei voltar a ler partes de ‘Neuromancer’, pois no mundo de Neuromancer não há classe média. Só há gente muito, muito rica ou desesperadamente pobre, a maioria criminosos. É um mundo bastante vitoriano e quando eu escrevia País Assombrado, eu procurei lutar contra isso que o mundo que eu tentava predizer se tornava mais vitoriano, não menos. Menos classe média, mais como o México, mais como a cidade do México. O que provavelmente não é uma boa direção.


A: Para o livro ou para nós?

WG: Para nós.