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sábado, 16 de janeiro de 2010

Deixai vir a mim as criancinhas


Pode parecer que, em tempos recentes, este blogue se acomodou na crista de uma vaga, aparentemente libertadora, de pedoterapia regressiva – um imergir curativo na massa obscura e decerto informe da minha mente, onde se preservam as cicatrizes da pressão de forças contrárias que moldaram o meu ego. Porém, a frase que ilumina o título não é nova – ó luz do mundo (recomenda-se o lenitivo óleo sobre tela de Holman Hunt). Uma só (e breve) ablução involuntária no rio sagrado da doutrina cristã na tenra idade, ministrada por um afanoso proselitista, confere ao púbere prosélito uma certeza da sua prolação há, pelo menos, 1977 anos. Assim nos transformam em objectos de fé que almejam alcançar o estatuto de pobres santos das agruras do mundo, todavia alegres na nossa vivência. Mas como dizia Michaux, num dos seus opúsculos místicos dedicados à repressão do eu, mesmo os santos alegres por vezes não conseguem escapar às violências.
Retornemos à frase. Um título. Ela acha-se lá no primeiro de Gutenberg, na repartição dos sinópticos – exceptua-se, por isso, o apocalíptico. E dá-me imenso jeito para esboçar uma tentativa de gracejo pela ambiguidade semântica e apertar O Laço Branco. A pureza que advém da Palavra. Só que Haneke subverteu a palavra, embora filmando como Dreyer, inóspito, austero e perfeccionista, optou pela desesperança e a indelével crueldade da Reforma, ao sobrelevar a mácula sem redenção, nem por força de uma directa intervenção divina – o deus ex machina dreyeriano de Ordet.
Uma parábola negra? Era uma vez um austríaco, nascido numa aldeia dos arrabaldes de Linz que se tornou alemão…
Es war einmal um alemão de Munique de nascimento (onde tudo começou, porventura nascido bem perto da Bürgerbräukeller ou da Löwenbräukeller) que se tornou austríaco e assim cresceu na aldeia de Wiener Neustadt…
Uma aldeia-tipo, situada no norte da Alemanha, incubadora da malignidade: Eichwald. A acção decorre em pleno advento das atrocidades do século alemão (1913-1914). Elíptico, tal como as secura e indiferença daquela assembleia imperturbável ante a sordícia de um passado recente bárbaro e criminoso (ver imagem), contrastando com a perturbadora surdez, sob o negro que se dissemina aos olhos atónitos do espectador, no fade out final – o habitual apelo exegético de Haneke.
Em suma, permite-se até ao mais pueril dos exegetas uma interpretação reducionista em apenas uma frase: «A liberalização do onanismo teria evitado o holocausto.»
Notas:
  1. Não tendo visto dois dos cinco filmes candidatos ao Globo de Ouro de “Melhor Filme em Língua Estrangeira” – acho inacreditável que o (segundo dizem) monumental Baaria de Tornatore não tenha ainda data marcada para a sua estreia em cinema no nosso país –, prevejo, ainda assim, pelo que pude ver dos três que restam, uma votação cerrada que ditará o seu vencedor no próximo domingo. Embora conceda uma preferência milimétrica a Um Profeta (Un Prophète) de Audiard, não posso afastar o maravilhoso e inesquecível drama enredado de Almodóvar e este Haneke (Palma de Ouro em Cannes em 2009) – todos tão diferentes entre si, nos planos técnico, ético e estético, o que dificulta a tarefa do prognóstico.
  2. É de recordar o subtítulo original de O Laço Branco: «Eine Deutsche Kindergeschichte» escrito, numa lentidão estudada, a vermelho sangue no genérico inicial num cursivo indecifrável («Uma história alemã para crianças».)

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Vera Lynn

«Does anybody here remember Vera Lynn?
Remember how she said that
We would meet again
Some sunny day?
Vera! Vera!
What has become of you?
Does anybody else here
Feel the way I do?»
Pink Floyd, “Vera”, do álbum The Wall (1979)
Estes são os inesquecíveis oito versos de Roger Waters incluídos num dos inúmeros momentos altos do álbum The Wall (1979) dos Pink Floyd e do filme epónimo de Alan Parker, que precede o famosíssimo grito antiguerra “Bring the Boys Back Home” (don’t leave the children on their own, no, no) numa retumbante e antinómica marcha marcial. Waters perdeu o pai na II Guerra Mundial, tal como Pink – interpretado por Bob Geldof – o protagonista do filme de Parker de 1982.
O terceiro verso menciona a famosa canção de 1939 “We'll Meet Again” imortalizada por Vera Lynn. Estávamos no dealbar da II Grande Guerra, e a canção de Lynn serviu, durante seis anos de horror e morticínio, como um hino de campanha para as forças armadas britânicas além-mar.

Eis Vera Lynn (hoje, com 92 anos) com “We'll Meet Again”, de regresso aos tops musicais pela efeméride que marcou os 70 anos da invasão da Polónia por Hitler (1 de Setembro de 1939):




PS – recordação pinkfloydiana – com apenas 11 anos já dispunha toda a sua discografia em vinil – induzida por este excelente texto do Pedro Correia no Delito de Opinião.