Educação,
Trabalho, Dignidade,...
Por
Alessandra Leles Rocha
A sociedade do século XXI vive os
reflexos de um “efeito enxame”, no que diz respeito aos seus modos de
comunicação e disseminação das informações. São nesses (des) caminhos ruidosos que, há pelo
menos duas décadas, o clima de hostilidade ideológica vem se acirrando no
Brasil e promovendo um grave prejuízo no que diz respeito a enxergar os fatos
como na verdade são. Em tempos de mudanças no Ensino Médio brasileiro e a
realidade do desemprego no país, vejo que é necessário romper com esses tais “ruídos”
e ponderar os fatos de forma sensata e realista.
Assim, começando pela Educação, ninguém
discorda que o ingresso a quaisquer níveis de ensino é direito de todos os
cidadãos e não, privilégio para alguns.
Mas, ela é apenas uma etapa do processo, porque dela se conquista o
trabalho, a sobrevivência, a dignidade cidadã. Portanto, escolher qual caminho
seguir, para sentir-se mais amparado pelas oportunidades, é também um direito
de todos; daí, a importância de termos todos os níveis de ensino bem
estruturados e modernizados à realidade do país e do mundo.
No entanto, durante décadas o
Brasil tem se esquivado dessa responsabilidade, como se ela não dissesse respeito
ao dia a dia do cidadão, a sua autonomia em decidir o que fazer da própria
vida. Ao contrário, nossos gestores tentaram de formas bastante equivocadas
atenderem as demandas do mercado de trabalho; sem, contudo, alcançar os
resultados esperados. Então, ficamos à
beira do caminho, repetindo e acumulando resultados pífios em todas as direções
da nossa Educação.
Enquanto isso, nos países
desenvolvidos, ou com melhor expectativa de desenvolvimento, a estrutura
educacional oferece há muito tempo uma educação básica, ensino Fundamental e
Médio, que contemplam tanto os caminhos da formação superior (e pós-graduação)
quanto da formação técnica. De forma que o cidadão, independente do seu status
social, possa escolher o que lhe parece mais satisfatório. Além disso, não há
nenhum discurso que venha se opor ao fato de um aluno optar por uma formação técnica; porque essa
decisão não impede ninguém de seguir adiante nos estudos e conquistar
oportunamente uma formação superior.
Mas o que aconteceu por aqui foi que
as duas últimas décadas foram pródigas na promoção ao acesso aos cursos
universitários; ainda que, se continuasse a não pensar na garantia da qualidade
e da excelência de todos os ensinos, especialmente o Fundamental e o Médio. Paralelamente
a esse “descuido”, também, nos esquecemos de pensar se o mercado de trabalho
poderia de fato receber todo esse novo contingente de pessoas qualificadas em
nível superior e proporcionar-lhes vagas em abundância, com um salário digno e
compatível aos seus longos anos de estudo e dedicação. Sim, porque quem estuda tanto
almeja por um futuro melhor.
E, como diz a Lei da Oferta e da
Procura, quanto mais pessoas qualificadas, menores ficam os salários. Além
disso, sem contar a possibilidade de rotatividade desse contingente, a
mecanização dos meios de produção conduziu inevitavelmente a uma realidade em
que se torna necessário um número menor de profissionais com curso superior.
Ao se observar um organograma de
qualquer empresa é fácil perceber que os cargos ou funções que exigem formação
universitária – diretores, coordenadores, supervisores, analistas – são os que
oferecem um número reduzido de vagas; portanto, está nos níveis operacionais,
aqueles que exigem ensino fundamental e médio (profissionalizante,
principalmente), o grande volume de vagas disponíveis.
Frente a esse gargalo gerado, não é
de se espantar a frustração de milhares de recém-diplomados. Sem trabalho, sem
esperanças, o que fazer? Se tornarem pequenos empreendedores? Exercer
atividades informais? Ampliar a qualificação através de cursos técnicos? Escolha
difícil; sobretudo, em tempos de crise, como agora. Porque, ainda que
concordassem em exercer atividades operacionais, para manterem-se de alguma
forma no mercado de trabalho, muitos empregadores rejeitam a ideia por temerem
eventuais ações trabalhistas dadas à incompatibilidade entre a função e o nível
de qualificação do funcionário.
E como disse o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), no dia de hoje, a taxa de desemprego bateu
novo recorde, ou seja, atingiu 13,2% no trimestre encerrado no mês de
fevereiro. Isso significa 13,5 milhões de pessoas, homens e mulheres, em
diferentes faixas etárias e graus de escolaridade, que se encontram fora do
mercado de trabalho; sem contar, outros tantos que chegam a ele todos os dias,
posto que o processo é dinâmico e ininterrupto. Aí fica a pergunta, e agora?
Enquanto os “ruídos”, praticamente
histéricos, tentam levar a dissociação desses dois problemas para um campo
meramente filosófico, a população brasileira padece sem uma solução clara para
os seus problemas práticos. A fragilidade de nosso sistema educacional, no
frigir dos ovos, só faz crescer uma legião de inaptos a sua cidadania e
subservientes as migalhas que lhes são entregues dentro e fora dos muros da
escola.
Reformas que não se sabe por onde
começar e aonde se quer chegar, discutidas em âmbito restrito, sinceramente,
não podem se intitular reformas, porque não geram mudanças reais e positivas,
na medida em que não deram voz e vez aos principais interessados. Além disso,
seus ares de remendo se reafirmam na contradição explícita do discurso com uma
economia em franca crise e recessão, que impõe severos cortes e restrições,
visivelmente, inibidores de um eventual sucesso educacional.
Por outro lado, o mercado de
trabalho, no momento atual pouco disponível a oferta de vagas por causa,
também, da realidade econômica, ainda clama a carência de um perfil de
trabalhadores que realmente lhe satisfaça. Algo que parece longe de ser
alcançado; pois, nem mesmo, a enxurrada de “novos diplomados” conseguiu exibir a
garantia da qualidade e da excelência.
Portanto, paremos de ler a vida
através da superficialidade de suas manchetes e demos mais atenção ao conteúdo
que se estampa nas linhas e entrelinhas dos discursos de gregos e troianos;
pois, quem fica em cima do muro, uma hora há de cair para algum lado. Precisamos ter, ao menos, bons argumentos
para justificar nossas escolhas, reflexões e atitudes.