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sexta-feira, 15 de maio de 2020

A pandemia incide no ano mais importante da história da humanidade. Serão as próximas zoonoses gestadas no Brasil?


AutorLuiz Marques Edição de imagemRenan Garcia IlustraçãoDivulgação


O ano de 2020 será lembrado como o ano em que a pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2 precipitou uma ruptura maior no funcionamento das sociedades contemporâneas. Será provavelmente lembrado também como o momento de uma ruptura da qual nossas sociedades não mais se recuperaram completamente. Isso porque a atual pandemia intervém num momento em que três crises estruturais na relação entre as sociedades hegemônicas contemporâneas e o sistema Terra se reforçam reciprocamente, convergindo em direção a uma regressão econômica global, ainda que com eventuais surtos conjunturais de recuperação. Essas três crises são, como reiterado pela ciência, a emergência climática, a aniquilação em curso da biodiversidade e o adoecimento coletivo dos organismos, intoxicados pela indústria química.i Os impactos cada vez mais avassaladores decorrentes da sinergia entre essas três crises sistêmicas deixarão doravante as sociedades, mesmo as mais ricas, ainda mais desiguais e mais vulneráveis, menos aptas, portanto, a recuperar seu desempenho anterior. São justamente tais perdas parciais, cada vez mais frequentes, de funcionalidade na relação das sociedades com o meio ambiente que caracterizam essencialmente o processo de colapso socioambiental em curso (Homer-Dixon et al. 2015; Steffen et al. 2018; Marques 2015/2018 e 2020).

O ano da pandemia é o do mais crucial ponto de inflexão da história humana

terça-feira, 5 de maio de 2015

África: o agronegócio é a nova versão do colonialismo

Os países do G-8 querem assumir a terra do continente africano, exportando suas tecnologias e ignorando qualquer conhecimento agroecológico.

Najar Tubino

Os 53 países da África tem uma população de 1,111 bilhão de habitantes, sendo que 863 milhões moram na África Subsaariana – 34 países -, e 539 milhões continuam vivendo no campo. Mais de 90% são agricultores familiares, que as instituições internacionais insistem em qualificar de pequenos agricultores sem recursos. Além disso, 75% dos que trabalham e vivem da agricultura são mulheres, outro dado negligenciado pelas agências internacionais, como a USAID dos EUA, que está envolvida na maioria dos projetos de cooperação no continente africano. O próprio G-8 definiu há dois anos uma estratégia até 2022, para retirar 50 milhões de pessoas da situação de fome. Uma hipocrisia que de tempos em tempos os governantes ricos do planeta transformam em anúncios pomposos e planos detalhados. Este ano, por exemplo, era para ser a data em que a fome no mundo seria reduzida a metade. Isso foi anunciado no início do novo milênio.

Na verdade, o que os países do G-8 e suas agências, além é claro, das suas corporações, querem mesmo é assumir a terra do continente africano, que é habitada há milênios por comunidades de povos tradicionais e de indígenas. Parte dessa estratégia é traçar novas regulamentações nas próprias terras, iniciando o processo de regulamentação e da emissão de títulos individuais para os povos tradicionais, que obviamente, não tem documentos sobre suas terras. A USAID tem investido milhões de dólares em projetos neste sentido. Mas outra entidade chamada Millennium Challenge Corporation (MCC), criada pelo Congresso dos EUA em 2004 com o objetivo de promover o mercado livre em países pobres já investiu US$260 milhões para regulamentar as terras africanas. A rede de ONGs GRAIN, do Canadá, especialista na questão fundiária denunciou que os países africanos já promoveram 243 mudanças em suas legislações fundiárias e outras 43 na alteração do mercado de sementes.

Agroecologia é totalmente boicotada

A outra ponta da estratégia dos países ricos é implantar o agronegócio nas terras das comunidades tradicionais, para fazer o que já fazem em outras regiões, inclusive no Brasil: plantar soja, milho e algodão, cana e em alguns casos, como na África, culturas como caju, amendoim e tabaco. O pacote envolve sementes certificadas e patenteadas, fertilizantes químicos e agrotóxicos, o trio universal que tomou conta do planeta. A organização WWI (World Watch Institute), de Washington, criada pelo agrônomo Lester Brown, fez um trabalho de pesquisa de campo em 25 países africanos nos anos de 2009-2010, para o relatório lançado em 2011 – “Estado do Mundo: Inovações que nutrem”.

Os pesquisadores do WWI relataram dezenas de experiências em agroecologia na África – onde quase um milhão de agricultores trabalham com agroecologia e produção orgânica- em regiões difíceis como o Níger, a Etiópia, Mali e Malawi, que não são difundidas. Aliás, as agências internacionais não fazem a menor questão de divulgar este tipo de trabalho. Muito menos as fundações Gates, Soros, Rockefeller que definiram que a estratégia é implantar as sementes transgênicas no território africano, gastando mais de 200 milhões de dólares, se contabilizarmos os projetos de apenas duas delas – Gates e Rockefeller.

Milhões serão exilados pela mudança climática

Isso inclui criar semente transgênica de batata doce e de mandioca, duas culturas básicas na dieta dos africanos do campo. É preciso acrescentar nestas estatísticas futuras, que nos próximos cinco anos, entre 75 e 250 milhões de pessoas se tornarão exilados, em consequência das mudanças climáticas na África. As secas atingem as colheitas em dois de um período de três anos. A cada década uma seca grave. Então o problema básico dos povos tradicionais da África é a falta de umidade no solo, a falta de armazenamento da água da chuva e a inexistência de fertilidade do solo, ou seja, matéria orgânica, que em algumas regiões desapareceu. Não há pacote agroquímico no mundo capaz de resolver o problema.

Uma das fantasias criada pela Monsanto no Quênia é a promoção de uma semente transgênica lançada nos EUA em 2013, que é “resistente à seca”, e na verdade é tolerante a uma seca moderada. Coisa que qualquer semente crioula adaptada ao seu local de origem exerce em seu ciclo produtivo. Este é outro ponto que a estratégia dos países ricos pretende implantar na África. Em todos os países estão sendo introduzidas mudanças para regulamentar o mercado de sementes. Num continente onde mais de 90% da produção agrícola é familiar e tradicional, ou seja, faz parte dos costumes a troca e a partilha do conhecimento, portanto, das sementes crioulas, os agentes das corporações querem segurança para as patentes de suas marcas transgênicas.

Prosavana denunciado pelos camponeses de Moçambique

É lamentável que entre esses programas da USAID, das fundações filantrópicas norte-americanas estão iniciativas do governo Brasileiro, em projetos de cooperação técnica com vários países, especialmente Moçambique. A Embrapa desenvolve um programa de inovação agrícola em parceria com USAID em Moçambique. Existem dois projetos envolvendo a implantação do Programa de Aquisição de Alimentos e do Mais Alimentos. Até recentemente os programas filantrópicos dos EUA e da União Europeia compravam grãos dos seus agricultores para levar como ajuda humanitária à África, através do Programa Mundial de Alimentos. Agora mudaram a estratégia em parte, comprando de agricultores africanos.

Entretanto, o Prosavana é o mais conhecido dos programas a ser realizado no Corredor de Nacala, onde o ponto final é o porto, e onde uma ferrovia atravessa o norte do país. O discurso é o mesmo: ajudar a agricultura dos 4,5 milhões de pequenos produtores, melhorar a eficiência, combater a fome, mas depois de tudo isso, organizá-los em cooperativas para que se enquadrem no agronegócio e mergulhem no mercado de commodities mundial. Trabalhar para regulamentar a terra e nos projetos de reassentamentos. A Vale que explora carvão em Moatize tem uma área de 23 mil hectares e reassentou mais de mil famílias. A União Nacional dos Camponeses de Moçambique tem denunciado o Prosavana justamente por não contemplar as comunidades locais, de usurparem das suas terras e de implantar um programa sem consulta pública. Sem contar que a Fundação Getúlio Vargas estava fazendo a estruturação do Fundo Nacala, com sede em Luxemburgo e que pretendia captar dois bilhões de dólares de investidores e que receberiam seus lucros em 10 anos. Não vingou.

Algumas empresas portuguesas, da Suécia, da Finlândia, dos EUA, do Brasil já estão implantando projetos no Corredor de Nacala. Em Niassa, uma das províncias da região, o governo de Moçambique pretende incentivar o plantio de três milhões de hectares de eucalipto. Por ironia trágica, as empresas Hoyo Hoyo e Grupo Américo Amorin, além da Portucel, de Portugal, atuavam em Moçambique durante a colonização. Do Brasil o grupo Agromoz, dos Estados Unidos a Africa Century Agriculture Rei do Agro. É muito educativa a declaração da CEO do African Agricultural Land Fund, Susan Payne:

“- As terras e a mão de obra são tão baratas na África que vale a pena correr os riscos para investir”.

Programa para transformar em revendedor de agroquímicos

Na maioria dos países o governo concede licenças – no caso de Moçambique de 50 anos – para exploração por preços irrisórios, afinal, as empresas, fundos, corporações querem ajudar a combater a fome, melhorar a renda dos pequenos agricultores de parcos recursos e que necessitam da modernização da agricultura, das suas sementes transgênicas, dos seus fertilizantes químicos e de seus venenos. Um dos programas da USAID, patrocinado pelas corporações químicas é o PROFIT. Trata-se de um caso realmente engenhosos: formar agentes locais para revenda de produtos e também divulgadores das tecnologias do agronegócio. Eles treinaram milhares de agricultores na Zâmbia, que na zona rural de Mkushi, transformaram a paisagem num campo igual aos de Iowa, maior produtor de milho transgênico dos EUA. Em meio às choupanas de palha, como o relato de Andrew Rice no relatório do WWI. 

Enquanto isso, no Níger, país com 14 milhões de habitantes que enfrenta fome crônica e uma seca que devastou as criações de animais, situado na região do Sahel, os povos tradicionais fizeram uma recuperação da mata nativa, de espécies lenhosas, que em muitos casos são leguminosas, que naturalmente fixam nitrogênio na terra e conseguiram mudar o panorama numa área de cinco milhões de hectares. Isso ocorre nas regiões de Maradi e Zinder. Mesmo tipo de iniciativa o povo Dogon, no Mali, realizou. Fazendo cobertura vegetal, implantando sistemas agroflorestais e cultivando plantas nativas como painço e a espécie crioula do feijão-fradinho, além de rotação com noz de bambara, fanio e amendoim.

Sobrevivem com dignidade há milênios

Na Etiópia os povos das aldeias Wukro e Wenchi produzem mel de excelente qualidade – o país produz mais de 24 mil toneladas por ano, é o maior produtor da África -, que entrou no circuito internacional através de uma iniciativa do Slow Food International, que também já implantou mais de mil hortas comunitárias com espécies crioulas. As mulheres Massai, do distrito de Kajiado, no Quênia, construíram cisternas de ferrocimento para armazenar água, um projeto do Programa de Meio Ambiente da ONU. Em cada cisterna plantam 100 árvores.

Nos planaltos da Etiópia um grupo de agricultores descobriu e formulou um novo tipo de fertilizante usando uma planta nativa. Na mesma região onde até hoje produzem café selvagem, o mesmo que deu origem as plantações do Brasil, Colômbia e outros países.

Esta é uma realidade que não tem apoio dos governos locais todos interessados nas verbas das agências internacionais e das corporações, incluindo a elite local, que como sempre faz o seu papel de introdutor do pacote neoliberal agrovenenoso. Também não tem divulgação a não ser nos veículos alternativos ou de entidades. O pacote inclui a informação manipulada de uma realidade que só pode mudar se os povos tradicionais abrirem mão das suas terras, da sua história, enfim, da vida que levam a milhares de anos. E que agora os países do G-8, as fundações Rockefeller, Gates, Soros, Buffet, e as corporações Monsanto, Syngenta, Dupont e Bayer querem transformar, liquidando com a única coisa que eles mantiveram depois da escravidão, da colonização – a dignidade de viver de acordo com seus costumes e tradições, mesmo passando fome em muitos momentos. 

Créditos da foto: Africa Renewal / Flickr

Texto original: CARTA MAIOR

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Compramos a água que jogamos fora!

 
Cada vez mais a água potável está se tornando uma coisa rara. Juntando a diminuição das chuvas com o aumento de consumo a aguá disponível ficou pouco para as necessidades humanas. Grande parte dessas necessidades poderiam ser evitadas diminuindo o desmatamento, quando desmatasse se fizesse o reflorestamento e tem o inconveniente do desperdício. Grande parte desta falta d'água é decorrente de problemas ecológicos provocados pela chamada SOCIEDADE DE CONSUMO. Para que a empresas tenham lucros e o Estado possa arrecadar cada vez mais se faz necessário que as pessoas consumam cada vez mais além das necessidades. Em decorrência disso, as prevenções para evitar o desperdício , a poluição e o desmatamentos não tem a devida atenção por parte do governo e das empresas.

terça-feira, 28 de abril de 2015

Agrotóxicos e transgênicos: o rolo compressor imperialista

Agência Internacional de Pesquisa em Câncer classificou o herbicida Glifosato e os inseticidas Malationa e Diazinona como prováveis agentes carcinogênicos.

Najar Tubino

Antigamente a indústria fabricava venenos para a agricultura industrializada e outras empresas produziam sementes híbridas. Há 20 anos este negócio foi profundamente alterado. As plantas se transformaram em veneno e a indústria química virou produtora de semente. Um negócio internacional, que hoje em dia está sendo implantado com o apoio da Agência de Desenvolvimento Internacional dos EUA, a famosa USAID – atuando principalmente na África e na Ásia. O Brasil, além de ser um “fértil mercado de agrotóxicos”, como definiu a Agência Reuters recentemente, é o segundo maior mercado das sementes transgênicas. As últimas duas notícias da CTNBio foram: a liberação do milho transgênico contendo o veneno 2,4-D, também conhecido por ser a porção do bem do Agente Laranja. A Dow Agrosciences fabrica o produto há 60 anos. E o eucalipto transgênico da empresa FuturaGene, um empreendimento britânico, com centros de pesquisa no Brasil, na China e em Israel, e que desde 2010 faz parte da Suzano Papel e Celulose. O eucalipto não será usado apenas para produzir celulose, mas biocombustíveis (etanol) e energia.

Na realidade o rolo compressor dos transgênicos já atinge 28 países e uma área de 181,5 milhões de hectares, preenchidos por 10 variedades comerciais, a maior parte de soja, milho e algodão, segundo o ISAAA (Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações de Agrobiotecnologia), o porta-voz mundial dos transgênicos, mantido pelas transnacionais. Em seu relatório de 2014 ele faz a seguinte citação do Brasil:

“- Os transgênicos ocuparam uma área de 42,2 milhões de hectares, aumento de 1,9 milhões, o maior dos últimos cinco anos. Futuramente o Brasil deverá fechar a lacuna com os Estados Unidos. Um sistema eficiente e com base científica de aprovação no Brasil facilita uma adoção rápida das sementes transgênicas”.

Parceria da Embrapa com a BASF

Cita a Embrapa, uma organização de P&D com um orçamento de um bilhão de dólares, que lançará em 2016 uma semente de feijão resistente a vírus em 2016 e no ano seguinte, uma semente de soja resistente ao herbicida imidazolinona, em parceria com a BASF – a variedade chama-se Cultivance. O ISAAA usa o método, já quantificar, mesmo antes de aprovado, o tamanho do mercado que a semente usufruirá, neste caso da soja da Embrapa-BASF 20% e uma exportação de 17 bilhões de dólares. Faz parte da estratégia imperialista. O resultado futuro é antecipado, a aprovação assegurada por pressão das empresas e de governos favoráveis aos transgênicos. Nunca esquecendo que de toda a área ocupado por estas sementes no mundo 40% estão nos Estados Unidos.

Como assegura a Monsanto, maior produtora individual de sementes transgênicas “investimos um bilhão de dólares em pesquisa e novos produtos por ano”. É apenas uma referência do rolo compressor, que sofreu um revés importante nos últimos dias, com a divulgação pela Organização Mundial da Saúde (OMS) do estudo de revisão de várias pesquisas da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), na Monografia IARC Volume 112 sobre a avaliação de cinco ingredientes ativos de agrotóxicos por uma equipe de pesquisadores de 11 países, incluindo o Brasil.

Agência Internacional do Câncer e o glifosato

A Agência classificou o herbicida Glifosato e os inseticidas Malationa e Diazinona como prováveis agentes carcinogênicos – provocam câncer – em humanos. E na mesma condição foram enquadrados os inseticidas tetraclorvinfós e parationa. A Malationa e o Diazinona são usados no Brasil em campanhas públicas contra vetores. O alerta foi divulgado em um comunicado do Instituto Nacional do Câncer (INCA), em um documento de cinco páginas que demonstra a preocupação dos pesquisadores com a disseminação de agrotóxicos no país, além da falta de recursos do Ministério da Saúde. Na verdade, em se tratando de agrotóxicos, temos uma realidade ao contrário no Brasil, onde o agronegócio corresponde a 30% do PIB, mas não sabemos a quantidade de veneno que estão nas águas que correm pelas bacias hidrográficas do país. Muito menos a quantidade de veneno que a população ingere diariamente em doses homeopáticas.

Pior: nunca haverá uma relação de causa e efeito com os venenos porque o acúmulo pode ocorrer por décadas até que surja um problema grave de saúde. O Brasil não tem sistema para detectar este tipo de informação – o sistema atual detecta as ocorrências graves. Mas faltam pessoas treinadas, laboratórios, esclarecimento por parte dos médicos, entre muitas outras coisas.

Projeto quer retirar rótulo dos transgênicos

Esta situação está definida e detalhada no Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos, que foi organizado no âmbito da Comissão Nacional de Produção Orgânica, como uma das estratégias do Programa Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, lançado pelo governo federal no ano passado. O problema é quando o governo vai aprovar e implantar o PRONARA. Há mais de sete anos a ANVISA tenta fazer a reavaliação de 14 princípios ativos de agrotóxicos no país e não consegue concluir o trabalho. As corporações entram na justiça com sucessivas medidas contra os processos. Acrescente isso à pressão política do Congresso Nacional, cuja maior expressão está em projetos que visam retirar a ANVISA do controle dos agrotóxicos.

O Projeto de Lei 4148, do deputado Luiz Carlos Heinze, um líder do PP na Bancada do Agronegócio e pescado pela espetacular Operação Lava Jato – assim como o resto da bancada no RS- simplesmente quer retirar a rotulagem dos transgênicos nos alimentos industrializados ou não. E está na pauta do Congresso. Outra característica do rolo compressor é misturar transgênico com as espécies naturais e seus produtos industrializados. A iniciativa é dos Estados Unidos que definiram que não há diferença entre plantas transgênicas e naturais, portanto, não precisariam ser avaliadas de forma diferente. Esse mantra destrutivo virou lei mundo afora.

Sementes imunes a vários tipos de herbicidas

No mês de março a Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) decidiu agir contra o glifosato e a expansão das ervas daninhas. A porção de terra que 14 ervas daninhas ocupa naquele país chegou a 15 milhões de hectares. Isso obrigou as corporações, que lançaram o Cavalo de Tróia transgênico como um passo da humanidade para acabar com a fome, a produzir uma segunda geração de sementes, imunes a mais de um tipo de veneno – além do glifosato. A EPA quer relatórios sobre a expansão das ervas daninhas, plano de manejo e plano de restauração. O mesmo vale para a Dow AgroSciences. Agora, vejam o que a Monsanto divulga em seu programa Sistema Roundup Ready Plus, lançado em janeiro do ano passado, “que enfatiza a necessidade do uso de herbicidas com diferentes mecanismos de ação por hectare durante todo o ano agrícola”. Como exemplo cita os herbicidas de ação residual na pré-emergência, ou seja, antes das plantas nascerem, e por absoluta coincidência apresenta seu novo herbicida pré-emergente Sumisoya, cujo princípio ativo é a Flumioxazina, que compõem os herbicidas pré-emergentes mais vendidos nos Estados Unidos para a cultura da soja.

“- O Sumisoya é recomendado pelo Sistema Roundup Ready Plus como importante parceiro do Roundup no combate de plantas daninhas resistentes e de difícil controle na cultura da soja. Sumisoya será importante ferramenta neste sentido associada a outros princípios ativos que compõem as recomendações do Sistema Roundup Ready Plus”, explica a Monsanto.

Berinjela transgênica em Bangladesh

A questão é que o rolo compressor pretende expandir cada vez mais suas fronteiras e conta com parceiros bilionários. Como ressalta o ISAAA em seu relatório na última década muitas agências e fundações criaram projetos para facilitar a doação e a transferência da aplicação de biotecnologia agrícola de setores privado e público “para beneficiar os países em desenvolvimento, particularmente os pequenos agricultores de parcos recursos”. Para o porta-voz do rolo compressor não existe agricultura familiar. O ISAAA cita os exemplos de parcerias:

“- Alguns dos exemplos são a AATF (Fundação de Desenvolvimento de Tecnologia Agrícola), com sede em Nairóbi e atendendo as necessidades dos países africanos. Outro é o Projeto de Apoio à Biotecnologia Agrícola (ABSPII), que é um programa bilateral da Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), com atividades mundiais e operado pela Universidade Cornell. Os projetos de parceria público privados têm sido motivadoramente bem-sucedidos e têm oferecido vantagens que aumentam a probabilidade de entrega de um produto transgênico aprovado para o agricultor dentro de um prazo razoável”.

A berinjela Bari BtBegun, variedade transgênica produzida pela empresa indiana Mahyco e “generosamente” doada ao Instituto de Pesquisa Agrícola de Bangladesh, foi aprovada em 100 dias, um recorde. Tudo facilitado por se tratar de um projeto da USAID e implantado pela Universidade de Cornell. São apenas 12 hectares em 50 mil ocupados pela cultura da berinjela, que em Bangladesh é considerada a verdura dos pobres. O detalhe é insano: está sendo vendida como uma berinjela livre de agrotóxicos. Na África a atuação dos Estados e fundações como a Rockfeller, Gates e Howard Buffet é muito mais pesada, articulada e avassaladora. Será o tema do próximo texto. Infelizmente o Brasil faz parte deste circuito com o Prosavana, um programa implantado em Moçambique, que envolve também o Japão. Pretendem fazer o que fizeram no cerrado brasileiro, entretanto, com um problema gravíssimo – em uma área com 4,5 milhões de pessoas, que habitam o Corredor de Nacala – uma população maior do que os MS e MT juntos.

PS : no próximo dia 28, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva em parceria com a Fiocruz e a Editora Expressão Popular, lançará o livro Dossiê ABRASCO, contendo as três partes revisadas do material publicado ao longo de 2012 sobre o uso de agrotóxicos e suas consequências. 

Texto original: CARTA MAIOR

domingo, 28 de dezembro de 2014

Soberania alimentar: 5 passos para esfriar o planeta e alimentar sua população

Entre 44% e 57% de todas as emissões dos gases estufa provêm dos sistemas de alimentação globais. Entenda como isso funciona e as soluções para o problema.

La Via Campesina


Como a cadeia de produção global de alimentos contribui para o aquecimento global:


Desflorestamento: 15-18%


Antes que as plantações comecem, os tratores fazem seu trabalho. Pelo mundo todo, a agricultura industrial está se lançando sobre as savanas, as áreas úmidas e as florestas, lavrando uma enorme quantidade de terrenos. A FAO diz que a expansão da fronteira agrícola é responsável por volta de 70-90% do desflorestamento global, e a metade disto para a produção de alguns poucos commodities voltados à exportação. A parte agrícola do desflorestamento contribui com 15-18% das emissões globais de Gases do Efeito Estufa 


Agricultura: 11-15%


Se reconhece que a agricultura contribui com 11-15% de todos os gases estufa produzidos no mundo. A maior parte destas emissões resultam do uso de insumos industriais, como fertilizantes químicos e combustível para os tratores e maquinário agrícola, assim como o excesso de estrume gerado pela criação de gado.


Transporte: 5-6%


A cadeia produtiva da alimentação atua como uma agência de viagens global. Plantações para a alimentação de animais podem ser feitas na Argentina, para alimentarem frangos no Chile, que serão exportados para a China, onde serão processados e comidos em McDonalds dos EUA. Muita da nossa comida, produzida sob condições industriais em lugares distantes, viajam milhares de quilômetros antes de alcançarem nossos pratos. Nós podemos estimar que o transporte de comida está ligada a um quarto dos gases estufa produzidos pelo transporte mundial, ou 5-6% do total destas emissões.


Processamento e embalamento: 8-10%


O processamento é um passo altamente lucrativo da cadeia industrial do alimento. A transformação de alimentos em refeições prontas, salgadinhos e bebidas necessitam de uma enorme quantidade de energia, principalmente na forma de carbono. Assim como o embalamento e enlatamento desta comida.


Comercialização e refrigeração: 2-4%


A refrigeração é o sustentáculo das cadeias de supermercado e fast food. Onde quer que o sistema industrial de alimentos vá, a cadeia da refrigeração o acompanhará. Considerando que a refrigeração é responsável por 15% de todo consumo de eletricidade no mundo, e que o vazamento de químicos são uma grande fonte de gases estufa, podemos dizer com segurança que a refrigeração dos alimentos contribui para cerca de 1-2% de toda a emissão de gases estufa. O comércio varejista contribui para outros 1-2%.


Desperdício: 3-4%


O sistema industrial de alimentos descarta mais da metade de toda comida que ele produz, jogada fora na longa jornada entre as fazendas e os distribuidores, os processadores de alimentos e os varejistas e restaurantes. Boa parte do que é desperdiçado apodrece em montes de lixo e aterros sanitários, produzindo uma quantidade substantiva de gases estufa. Entre 3,5-4,5% das emissões globais destes gases vêm do lixo, e mais de 90% deles são produzidos por materiais originários do sistema de produção de comida.


Soberania alimentar: 5 passos para esfriar o planeta e alimentar sua população.

1- Tomar conta do solo.


A equação comida/clima está baseada na terra. A expansão da agricultura insustentável no século passado levou à destruição de cerca de 30-75% do material orgânico das terra aráveis, e 50% do material orgânico nas pastagens e pradarias. Esta perda massiva de matéria orgânica é responsável por entre 25% e 40% do atual excesso de CO2 na atmosfera terrestre. Mas a boa notícia é que este CO2 que mandamos à atmosfera pode ser devolvido ao solo apenas restaurando as práticas que pequenos agricultores desenvolveram por gerações. Se as políticas e incentivos corretos forem colocados em prática no mundo todo, a matéria orgânica do solo poderia ser restaurada a níveis pré-industriais dentro de 50 anos - que foi mais ou menos o tempo que a indústria levou para reduzi-la. Isto iria compensar entre 24% e 30% de todos os gases estufa atuais.


2- Agricultura natural, sem químicos.


O uso de químicos na agroindústria está sempre aumentando, enquanto os solos estão cada vez mais empobrecidos e as pestes estão se tornando imunes aos inseticidas e herbicidas. No entanto, pequenos agricultores pelo mundo ainda possuem o conhecimento e a diversidade de culturas e animais para plantar produtivamente sem o uso de químicos e diversificando os sistemas, integrando agricultura e criação de animais, incorporando tudo isso à vegetação nativa. Estas práticas aumentam a produtividade potencial da terra pois melhoram a fertilidade do solo e previnem a erosão. A cada ano mais matéria orgânica é produzida no solo, possibilitando a produção de mais e mais comida.


3- Acabar com a distância da comida e focar em alimentos frescos


A lógica corporativa que resulta nos envios de comida ao redor do mundo não faz nenhum sentido do ponto de vista ambiental ou de qualquer outra perspectiva importante. O comércio global de comida, da abertura de trechos de terras e florestas para a produção de commodities agrícolas até a comida congelada vendida nos supermercados: estes são os principais culpados do sistema na contribuição às emissões de gases estufa. Muitas das emissões do sistema poderiam ser eliminadas se a produção de comida fosse reorientada na direção dos mercados locais e dos alimentos frescos, e longe das carnes baratas e comidas processadas. Mas alcançar este patamar é provavelmente a luta mais dura, enquanto os governos e as corporações estão comprometidos com a expansão do comércio de alimentos.


4- Devolvam a terra aos agricultores e parem com as mega plantações.


Nos últimos 50 anos, 140 milhões de hectares - o tamanho de todas as terras de agricultura da Índia - foram tomados por quatro culturas que crescem predominantemente em grandes plantações: soja, dendê, canola e cana de açucar. A área global sob estes e outros commodities agrícolas - todos notáveis emissores de gases estufa - irá aumentar se as políticas públicas não mudarem. Hoje, pequenos agricultores estão espremidos em menos de um quarto das terras, mas produzem a maior parte da comida mundial - 80% de toda comida em países não-industrializados, segundo a FAO. Pequenos agricultores produzem estes alimentos de maneira muito mais eficiente do que as grandes plantações, e de uma maneira melhor para o planeta. Uma redistribuição mundial das terras aos pequenos agricultores, combinada com políticas que ajudem a reconstruir a fertilidade do solo e políticas que apoiem os mercados locais podem reduzir os gases estufa pela metade em poucas décadas.


5- Esqueça as soluções falsas e foque no que funciona


Há um crescente reconhecimento de que a comida é central nas mudanças climáticas. Os últimos relatórios do IPCC reconheceram que a comida e a agricultura são grandes contribuintes das emissões de gases estufa e que as mudanças climáticas impõem desafios gigantescos à nossa capacidade de alimentar uma população em crescimento. Ainda não houve nenhuma vontade política para desafiar o modelo dominante de distribuição e produção industrial de comida. Ao invés disso, os governos e corporações estão propondo inúmeras falsas soluções. Há uma proposta vazia do Climate Smart Agriculture, que é essencialmente apenas uma repaginação da Revolução Verde. Há tecnologias novas e arriscadas como culturas geneticamente modificadas, para resistirem a secas ou projetos de geoengenharia de larga escala. Há projetos de biocombustíveis, que estão levando à grilagem de terras no Sul. E há os mercados de carbono, que permitem que os piores agressores do meio ambiente não precisem cortar suas emissões apenas transformando florestas e a terra de camponeses e indígenas em áreas de conservação. Nenhuma destas “soluções” funcionarão, pois elas trabalham contra a única solução efetiva: uma mudança do sistema industrial globalizado de alimentos, governado pelas corporações, em direção de sistemas de alimentação locais que estejam nas mãos dos pequenos agricultores.

Tradução de Roberto Brilhante

Créditos da foto: CCAFS/2014/Prashanth Vishwanathan

Texto orIginal: CARTA MAIOR