A Pantera
De tanto olhar as grades seu olhar
esmoreceu e nada mais aferra.
Como se houvesse só grades na terra:
grades, apenas grades para olhar.
A onda andante e flexível do seu vulto
em círculos concêntricos decresce,
dança de força em torno a um ponto oculto
no qual um grande impulso se arrefece.
De vez em quando o fecho da pupila
se abre em silêncio.
Uma imagem,
então,na tensa paz dos músculos se instila
para morrer no coração
Rainer Maria Rilke
Meu coração: uma foto amarelada na parede Hoje é comum o registro de momentos em fotografia, algo extremamente simples.
Você viaja para Paris, vê a Tour Eiffel e daí tira mil fotografias num único dia. Uma maravilha... Belas poses, álbuns e até filmes, que se cumulam ano após ano.
Recordar é saudável e até divertido. Quem não gosta de se ver numa foto antiga, numa daquelas roupinhas de bebê?
O mesmo não pode ser dito sobre a idéia de guardar em nosso sentimento - e em nosso coração - memórias de coisas desagradáveis e perdidas, que efetivamente não retornarão jamais.
Um ente querido que se foi. Um emprego dos sonhos não-conquistado. Um relacionamento quebrado subitamente. Um comportamento inconveniente que feriu. A violência das palavras que agrediram. E por aí afora...
Ora, prender-se a tais coisas pode significar viver no túnel do passado, no tempo dos “retratos amarelados” do remorso e da tristeza.
Toda essa consciência “amarga” lança espessa sombra sobre os novos dias, as novas chances, as novas pessoas que encontramos a cada manhã.
Se você se enquadra em tal perfil de comportamento, HOJE é tempo de fazer uma revisão.
APENAS UM SONETO
Eu pensei em demonstrar o meu amor
Exprimi-lo nas estrofes de um poema
Transmiti-lo com eloquência e ardor
Permitir que a emoção fosse seu tema.
Eu pensei em expressar meu sentimento
Na cadência das sílabas em simetria
Flutuar por seus sonhos e pensamentos
Nas asas imaginárias da poesia.
Vi, porém, que o meu amor vai muito além
Dos quartetos e tercetos de um soneto
Tamanha a grandiosidade que ele tem!
Amor imenso como o meu não caberia
Na extensão de um só texto em verso ou prosa,
Pois descrevê-lo inteiro eu não conseguiria.
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ESSES SEUS OLHOS
I
Esses seus olhos portadores de encanto
Que eu reconheço mesmo em plena multidão
Explicam toda a existência do meu pranto
E destes versos dolentes são a razão
II
Olhos profundos, belos e enternecedores
Cuja presença em minha insônia é constante
Venham servir de alívio para as minhas dores
A fim de que eu seja feliz por um instante
III
Olhos matreiros envolvidos em mistério
Tu bem conheces os meus sonhos mais latentes
Mas preferes nunca me levar a sério
Deixando em mim uma lágrima intermitente
IV
Desde o dia em que esses olhos prazenteiros
Cruzaram, por acaso, o meu caminho
Meu coração ora é insolente, ora é fagueiro
Acostumou-se a viver em desalinho
V
O que estava ao meu alcance eu quis fazer
Para afastar de mim esses olhos fugazes
Nos quais por um momento eu cheguei a crer
Mas percebi que eles são por si falazes
VI
Embora sejam sinal de aleivosia
Esses seus olhos causam-me embevecimento
Por isso mesmo eu me perco em sua magia
E eles vão brincando com o meu sentimento
VII
Todas as vezes que esses olhos mutantes
Vão se achegando para bem junto dos meus
Viajo rumo a um cenário alucinante
E me esqueço sempre de dizer adeus
Marcas do tempo - Por Pedro Renzi
Uma deusa
Uma borboleta
Um carvalho
Um descalvado
Um aleijado deitado no chão
Um tempo marítmo
Uma sala de verão
Um ritmo, um desejo.
Um solo intímo
Uma hora com o jornalista
Uma folha amarelada
Um sótão e uma
Sofreguidão!
Um teor sem marca
Uma marca no posto
Um rosto sem tempo
Um tempo com solução!
-
Pedro Renzi é
Sociólogo formado pela unesp
Mestre em sociologia Unicamp
Poeta e escritor
Estavam ali parados. Marido e mulher.Esperavam o carro. E foi que veio aquela da roçatímida, humilde, sofrida.Contou que o fogo, lá longe, tinha queimado seu rancho,e tudo que tinha dentro.Estava ali no comércio pedindo um auxílio para levantar novo rancho e comprar suas pobrezinhas. O homem ouviu. Abriu a carteira tirou uma cédula, entregou sem palavra.A mulher ouviu. Perguntou, indagou, especulou, aconselhou,se comoveu e disse que Nossa Senhora havia de ajudarE não abriu a bolsa.Qual dos dois ajudou mais?Donde se infere que o homem ajuda sem participar e a mulher participa sem ajudar.Da mesma forma aquela sentença:"A quem te pedir um peixe, dá uma vara de pescar."Pensando bem, não só a vara de pescar, também a linhada,o anzol, a chumbada, a isca, apontar um poço piscosoe ensinar a paciência do pescador.Você faria isso, Leitor?Antes que tudo isso se fizesseo desvalido não morreria de fome?Conclusão:Na prática, a teoria é outra.
Texto extraído do livro "Vintém de cobre - Meias confissões de Aninha", Global Editora — São Paulo, 2001, pág. 174.
"Não existe isso de homem escrever com vigor e mulher escrever com fragilidade. Puta que pariu, não é assim. Isso não existe. É um erro pensar assim. Eu sou uma mulher. Faço tudo de mulher, como mulher. Mas não sou uma mulher que necessita de ajuda de um homem. Não necessito de proteção de homem nenhum. Essas mulheres frageizinhas, que fazem esse gênero, querem mesmo é explorar seus maridos. Isso entra também na questão literária. Não existe isso de homens com escrita vigorosa, enquanto as mulheres se perdem na doçura. Eu fico puta da vida com isso. Eu quero escrever com o vigor de uma mulher. Não me interessa escrever como homem."
Quem é Lya Luft?
Uma mulher gaúcha, brasileira, que faz cada vez mais, aos sessenta e um anos, o que desde os três ou quatro desejava fazer: jogar com as palavras e com personagens, criar, inventar, cismar, tramar, sondar o insondável. "Tento entender a vida, o mundo e o mistério e para isso escrevo. Não conseguirei jamais entender, mas tentar me dá uma enorme alegria. Além disso, sou uma mulher simples, em busca cada vez mais de mais simplicidade. Amo a vida, os amigos, os filhos, a arte, minha casa, o amanhecer. Sou uma amadora da vida. O que você nunca vai esquecer? Escutar o vento e a chuva nas árvores do imenso jardim que cercava a casa de meu pai, na minha infância". Puro maravilhamento. O que lhe causa repugnância? Preconceito, hipocrisia. Vale a pena escrever? "Não escrevo porque “valha a pena”, mas porque me faz feliz, simplesmente". O que falta à literatura brasileira? "Nada, não falta nada. Ela é o que é, simplesmente, cheia de graça, desgraça, florescente, múltipla, lutando com a crise econômica que atinge também as editoras, mas, como não se escreve para ficar rico, tudo bem". E Deus? "Deus eu imagino como força de vida: luminosa, positiva, imperscrutável". E o Brasil? Brasil cujo jeito é parecer não ter jeito. "Não quero jamais ter de morar longe dele. Aqui tudo é possível. E tanto está ainda por fazer". O que fazer para reverter esse quadro de miséria? "Que os responsáveis por isso criem vergonha na cara". Quem não merece respeito algum de ninguém? "Todos merecem algum respeito, no mínimo compaixão". Você costuma rezar? "Não tenho nenhuma religião instituída, mas tenho uma profunda visão “religiosa”, sagrada, da natureza, das pessoas, do outro". Qual é seu momento ideal para escrever? "O momento em que meu livro quer ser escrito. Mas normalmente produzo mais de manhã bem cedo. Gosto de ver o dia nascer, aqui na minha mesa de trabalho e do meu computador". Se confessa uma mulher tímida, embora não pareça.