10.12.04

Post Scriptum # 422



Clement Magloire Saint-Aude
(Haiti, 1912-1971)

A presente tradução, a primeira em língua portuguesa, foi feita a partir dos fragmentos poéticos encontrados na OPUS INTERNATIONAL nº 19/20. O volume inteiro deste autor haitiano teve recentemente a sua republicação em França, com chancela da Gallimard


REFLEXOS

Atado, franzino, o mofo do nada
na minha gravata de cavalo
flácido como o desconhecido e sobre os caminhos.

Lamentações nos escarros dos mortos.

A negligente franquia paga para falar
fora das minhas ancas
como um alazão árabe.
O êxtase o luto a luxúria
na gordura dos repiques dos estertores.

No calafrio das rendas, ó minha bela emoção
- frio de lâmpadas frias.

Doce e gelada a rua da Madalena
hortelã-pimenta de extintos lumes.

Eu saio dos liames do meu sol invulgar.
Serei eu o intérprete dos séculos
a escultura dos ventos dos centauros?

Desço, desenraizado repetido
num cabelo antecedido p'los meus dedos.

E como a suavidade da carícia
para onde vai, ó paz, o meu coração?

No galope dos mudos zeladores
dobro-os congelo-os
- castos de vida
nos faróis recortados.

Amargo é quem nasce para os elogios
e a vós deseja, espíritos
enclausurados e marmóreos



Pois este é o poema do prisioneiro
o tilintar dos sóis rememorados

E as matracas enterradas
no coração do peregrino.

Eis o meu sudário sem coroa
na vaidade deste baile
nos saltos de Antinéa
enluvada por este ideal.

A estrela do mendigo ouve
ouve o respirar vazio
da minha morte
da minha angustiada estupefacta
escrita
este meu lenço rendilhado de cambraia.

Retorcidos nos meus olhos apagados
a caneta e o poema que não atende a causas.

Limitado à desgraça sem repouso
Edith é a minha própria face lívida.

Mas meus olhos sempre os retiro
do enterro dos olhos ressuscitados?


In "Poèmes"

Tradução e nota de Nicolau Saião