segunda-feira, março 18, 2013

quarta-feira, março 06, 2013

Beppe Grillo e a água do banho

Há muito tempo, confesso para minha grande vergonha, que não seguia o blog do Beppe Grillo. 
O meu italiano não é grande coisa, por isso costumava preferir a edição em inglês onde lia frequentemente comentários algo contundentes às políticas europeias. Talvez porque nos idos de 2006, 2007, a Crise, esta malfadada Crise, era ainda uma ameaça longínqua, e porque tínhamos aqui mais ao pé coisas com que nos preocupar, uma direita cada vez mais agressiva e um partido que se dizia socialista e cada vez mais colado às mesmas políticas, esqueci-me do Beppe Grillo. 
A sério: esqueci-me.
Erros meus, má fortuna, e, suponho, infortúnio de muita gente.
Quando voltámos a ouvir falar dele, foi em grande. 
A Itália resolvera correr com o seu eurocrata de serviço - nós ainda não conseguimos livrar-nos dos nossos - e o Movimento Cinco Estrelas (raio de nome!), acusado de populismo por todos os lados, recusava-se a emprestar os seus 25% de votos às soluções tipo «mais do mesmo».
Beppe Grillo, que já era o «comediante» para toda a gente, sobretudo para quem nunca o tinha lido, foi promovido: passou a ser o «palhaço».  
E entretanto toda a gente se esquecia de que o movimento M5S, tem muito mais gente e que não é assim tão certo que sejam todos tão apalhaçados como se gosta de pensar que é o seu chefe: reuniram-se, elegeram por braço no ar os seus lideres no parlamento e no senado e declararam-nos cargos rotativos.
Será populismo, não tenho a certeza. 
O populismo é, diz o meu dicionário, um «movimento protagonizado por um chefe carismático e paternalista que apela à simpatia das bases populares». 
Quanto a «carisma», estamos conversados: estou farto dos moscas-mortas tipo Cavaco Silva, Vítor Gaspar ou Miguel Relvas. Prefiro as pessoas com o tal carisma - seja isso o que for - aos velhacos, aos sonsos, aos que dissimulam a sua mesquinhez e as suas ambiçõezinhas medíocres.
E quanto ao «paternalismo», francamente, qual é o político que se pode gabar de nunca a ele ter recorrido? O Gaspar, quando se põe a dizer que somos «o melhor povo do mundo»? O Soares? O Barroso? Os banqueiros, como o o João Salgueiro quando nos manda limpar as matas se perdermos o emprego?
Mas populista ou não, o M5S tem lá imensa gente muito, muito jovem. 
E a «revolução», escrevi eu próprio em 75, a um ano do 25 de Abril, «é quando os jovens enxotam os velhos e realizam, com a doce inconsciência de que são capazes, as coisas impossíveis». 
Quem sabe?
A esperança é como o bebé: não deve ser deitado fora com a água suja das políticas profissionais, pois não?

terça-feira, fevereiro 19, 2013

O Número de contribuinte, o Topless e os Buracos negros


Calhou. Ou veio a propósito, tanto faz.
Eu sei que não é bonito falarmos assim de nós mesmos, mas as constipações, sobretudo aquelas que nos aprisionam num aquário de infelicidade e de mal estar, são propícias a estas recapitulações. E por estes dias lacrimejantes e de nariz entupido, a estante do corredor sempre nos vai fornecendo um ou outro livro, alternativa aos jornais da véspera onde o Pacheco Pereira nos adverte de que "num computador do fisco está toda a nossa vida já inventariada e cruzada através do número do contribuinte e dos poderes discricionários da Autoridade Tributária". E acrescenta que esse "verdadeiro número único dos portugueses [...] permite todos os cruzamentos de dados e uma violação sem limites da privacidade de cada cidadão" (Público de .16 de Fev.)
E de facto, qualquer Pide (ou pior do que isso, qualquer chefe de segurança de um Banco), subornando um funcionário ou, as leis dão para tudo, tendo acesso legal, pode saber que livros compro ali na Bertrand, o que costumo comer ao pequeno almoço e que prendas ofereço à minha amante.
É, como nota Pacheco Pereira, a realização do pesadelo Orwelliano retratado em 1984. E é curioso pensar que a personagem do Big Brother e a sociedade a que ele pertencia se inspiravam sobretudo no modelo soviético. Mas o pesadelo tornou-se realidade, pelo contrário, no mundo que nos diziam livre, sob o mais absoluto regime liberal de que há memória.
Irónico, não é?
Sentimo-nos como se nos tivessem roubado as próprias palavras: liberal, para não irmos mais longe, quis sempre dizer «generoso», «tolerante», «de espírito aberto»; era uma palavra que trazia implícita a ideia de liberdade, de oposição à tirania e ao poder absoluto dos Senhores Dons Miguéis e dos seus Salazares de serviço.
Agora, pelos vistos, traz consigo apenas a ideia de abandono: desenrasca-te, pá. Emigra! Rebenta para aí. Se fores demasiado pobre, anda cá que te damos uma sopa e agradece que já vais com sorte.
Nós que nos julgávamos homens livres e orgulhosos lá iremos, humildes, de boné na mão e os olhos baixos, à «sopa do Sidónio». 
Luis Spúlveda, no livro que a constipação me fez tirar da estante, narra que os que voltavam ao Chile post Pinochet, vindos do exílio, "andavam desorientados, a cidade não era a mesma, procuravam os seus bares e encontravam lojas de chineses, na farmácia da sua infância havia um bar de topless, a velha escola era agora um concessionário de automóveis, o cinema do bairro uma igreja dos irmãos pentecostais." (A sombra do que fomos, 2009, Porto Editora, p. 87)
A nós, mesmo sem sairmos de cá, mudaram-nos o país sem nos perguntarem nada. Em Lisboa, o Monumental, ali ao Saldanha foi abaixo, o Europa em Campo de Ourique também, o velho Império das sessões clássicas está nas mãos de uns outros irmãos que dão pelo nome de IURD.
Mas não foram só os cinemas: os cafés, os velhos e grandes cafés onde nos reuníamos, onde estudávamos, trocávamos livros e discutíamos sem fim, também deram de frosques: o Montecarlo, por exemplo, ou o Vává. Ou então, tranformaram-se em restaurantecos mixorucas, uma sopa, bica e nata ao balcão e fecham todos lá pelas dez horas quando tens sorte. Em compensação, vá lá que nem tudo é mau, barzinhos iam abrindo por tudo o que é lado.
E, de um dia para outro, zás! A cidade cobriu-se de parquímetros (que nós pagamos, mas que dão prejuízo) sem que o estacionamento tenha melhorado grande coisa e os táxis, esses mudaram de cor por causa de uma tal CEE de que éramos bons alunos.
Mas houve mais.
Lembro-me, por exemplo, do dia em que, lá no emprego, nos começaram a exigir que andássemos com um cartão plastificado pendurado ao pescoço a dizer que nós éramos quem toda a gente sabia que nós éramos, excepto uns rapazes supostamente «seguranças», contratados a peso de oiro para substituir os velhos contínuos que faziam de porteiros e conheciam toda a gente.
Tal como no Chile de Pinochet e de Kissinger, a nossa vida "encheu-se de buracos negros que surgem em qualquer parte; alguém diz luz e é engolido pelas sombras..." Ibid, p. 62 (com a adaptação dos tempos verbais).
Claro, tudo isto quer dizer que envelhecemos, que o tempo - um dos mais implacáveis de todos os buracos negros - foi comendo os nossos amanhãs que cantavam, ó sim, se cantavam!
E até o Fidel Castro, quando aparece na Televisão, ou quando o vemos numa fotografia, tem o ar de um velho náufrago, encalhado na praia do comunismo - ligeiramente primário, é certo, mas, que alternativa tinha ele face ao poder das máfias de Chicago e do exército americano?
A guarda morre, mas não se rende, não é?
É o que dizem.
Mas que remédio tem ela senão poisar a arma de vez em quando e assoar o nariz congestionado pela constipação?
 
 

segunda-feira, fevereiro 11, 2013

domingo, fevereiro 03, 2013

Ora Zico!

Já não há muito a dizer sobre o pittbull, actualmente a residir num canil em Beja, se ainda não morreu, que dá (ou dava) pelo nome de Zico.
Não foi, como só acontece ao Mário de Carvalho (onde é que eu já escrevi isto? nem me lembro...) o caso de um Bispo ter mordido o cão, mas foi quase.
Na falta de melhor, cortes de subsídios de doença, por exemplo, ou despedimentos em massa, a malta precipitou-se quando viu - num vídeo, suponho - o Zico a ser levado entre duas cordas. E, para mais, com aquele ar de parvo que os cães têm quando não percebem o que lhes está a acontecer.
Não faço a mais pequena ideia de quantos habitantes deste rectângulo esquecido por Deus têm conta aberta - e algumas delas bem chorudas - nesse BPN da banalidade que é o facebook.
Seja que número fôr, setenta mil dessas pessoas a assinar uma petição para que a vida do Zico fosse poupada, é obra. Sobretudo se pensarmos que sobre a cabeça do canídeo pesava a suspeita de ser um assassino e que a lei portuguesa, boa ou má, manda que os animais perigosos sejam abatidos, ponto final.
Se estas setenta mil assinaturas - e o chorrilho de asneiras e de insultos cruzados entre os assinantes e os que se recusaram a assinar - não são um sinal claríssimo do mal-estar da nossa cultura, não sei o que sejam.
Não tenhamos ilusões: em Portugal, na Espanha, na China, milhares e milhares de cães são mortos todos os anos. Até na filantrópica Inglaterra de onde nos vieram as primeiras preocupações com o bem-estar dos cavalos!
Porquê agora e porquê o Zico?
Que matou realmente uma criança de ano e meio, não oferece grandes dúvidas.
Argumentou-se, um pouco por todo o lado, que a criança não apresentava marcas das dentadas que não deixaria de apresentar caso tivesse sido morta pelo cão e, sim, tinha sofrido um traumatismo craneano. Mas o relatório da autópsia, a acreditar nos jornais, é bastante claro: há marcas do ataque, sim senhor, características, insofismáveis.
Se a palavra assassino tem significado, então o Zico é um cão assassino, e outro ponto final.
Mas alto!
«Merde! a guarda morre, mas não se rende!», como disse exemplarmente o general Cambronne. Os defensores do Zico têm mais argumentos.
Partindo do princípio sagrado de que o bicho é meigo, incapaz de actos violentos, só poderia ter sido trocado: um outro pittbull, esse sim, agressivo e bom para a luta seria o responsável pela morte da criança. Valia, porém, demasiado dinheiro em combates clandestinos. O Zico, bom e carinhoso, teria sido sacrificado em nome da ganância do dono que preferia perder um palerma sem préstimo a ficar sem o seu gladiador.
A dúvida metódica que tanto trouxe à cultura ocidental obriga-nos a levar a sério essa hipótese. Se uma coisa é possível, de certeza acontece, nem que seja na infinidade dos mundos - ou na infinidade do tempo, como pretendia Gell-Mann, o prémio Nobel da Física de 1969.
Terá acontecido justamente aqui e agora, neste mundo e no ano da graça de 2013? Será o Zico um outro Zico?
Talvez se possa ainda saber: se os defensores da tese do «Zico meigo» ainda forem a tempo e quiserem provar a sua (dele) inocência, que se prestem a pagar o teste de ADN, como vemos nas televisivas séries do CSI-Qualquer Coisa: há-de haver vestígios da saliva do cão em qualquer sítio, não?
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Os defensores do Zico têm-se dividido em dois grupos principais: os que afirmam a sua inocência a todo o custo - não, o cão não matou a criança - e os que, aceitando que tenha sido ele o autor das dentadas fatais, atiram as responsabilidades para os donos do animal.
E chegamos aqui à razão de ser deste post.
Nem uns nem outros têm razão.
A começar pelos que acham que um cão meigo não pode ter atitudes de uma extrema violência, são cegos ou nunca viram o caniche deles próprios atirar-se com os dentes todos de fora ao gato da vizinha. Podem, claro, como as crianças, como nós próprios: o caso é haver uma provocação que vá para lá dos limites da educação ou do medo. Um gato, por exemplo.
E os que acham que o cão, por ser um animal irracional, não pode ser responsabilizado, também não se mostram muito mais razoáveis.
Em primeiro lugar: irracional é o quê?
«Razão» nunca foi fácil de definir. Parece, no entanto pacífico que ser capaz de abstrair, de concluir acerca de coisas que não se vêem a partir dos dados percepcionados, é a capacidade fundamental da razão; e sabe-se, desde Crisipo (sec. III aC) que os cães são capazes deste tipo de raciocínios. Continuar a chamar-lhes, a eles e tantos outros, irracionais, diria eu, parece-se imenso com um preconceito, tanto mais que está solidamente estabelecido o uso da linguagem por espécies não humanas: chimpanzés, por exemplo, ou papagaios.
Porque não o cão? Tal como nós, humanos, também o cão é um animal social. E como todos os animais sociais, também ele necessita de uma linguagem que lhe permita ocupar um lugar na sociedade, interpretar sinais, dar a conhecer os seus estados interiores: com fome, amigável ou agressivo, aborrecido, interessado e curioso, desconfiado, com medo.
Que estes sinais são claramente interpretados pelos outros cães não parece oferecer grandes dúvidas:  cada um deles corresponde a um (chamemos-lhe assim:) protoconceito, a que correspondem comportamentos adequados, quer sejam inatos, quer adquiridos através dos mecanismos de inserção nas diferentes matilhas. E parece evidente que todos os cães aprendem a controlar, por exemplo, a fome enquanto esperam que os mais velhos, os mais acima na hierarquia, os donos, os deixem comer. O mesmo se passa com os outros impulsos, como é óbvio.
Também o Zico trouxe consigo, desde que nasceu, impulsos destes que a vida em sociedade lhe teria ensinado a controlar, moderando ou inibindo os seus esquemas básicos de comportamento. Quando nasceu, não era meigo ou agressivo: não dava afectuosas lambidelas nem mordia a torto e a direito; mas esses comportamentos faziam parte do seu equipamento de sobrevivência e ensaiou-os abundantemente enquanto bebé: mordiscou, lambeu, lutou e adormeceu aquietado junto dos seus irmãos de ninhada.
Teve de ser ensinado a que a sua agressividade é inútil porque na sua matilha - constituida geralmente pelos donos - não o agride; e que a «meiguice» lhe permite uma muito melhor integração. As escolas tentam fazer isso mesmo aos nossos filhos, mas raramente são bem sucedidas porque nós não os ensinámos de forma eficiente enquanto eram cachorrinhos.
E depois lá vem a desculpa:
- Pois, coitadinho do puto! Vem de uma família disfuncional ...
E são perdoados, como foram os assassinos da Gisberta, também eles institucionalizados porque as famílias de que vinham não os controlavam, não é?
E o Zico, veio de onde?
Alguma assistente social avaliou se alguém o mandava à escola, se estava bem alimentado, se fazia exercício, se, se, se?
Porque esses eram os seus direitos, e são os direitos o que lhe conferia deveres.
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Não tenhamos dúvida: um cão pode ser culpado e não apenas causador de um prejuízo. Ou pode estar inocente.
Quero dizer que ele tem capacidade para aprender normas, que interiorizou os seus deveres e que sabe quando os desrespeita.
A prova é que o faz justamente quando nós não estamos a olhar; tem medo de ser castigado, pois tem. É como eu: até hoje nunca entendi por que raio têm as câmaras municipais o direito de me alugar o espaço público (que, por ser público, já é meu) quando quero estacionar o carro. E se o fiscal da EMEL não fosse uma ameaça bem presente no meu espírito, eu bem vos digo quem é que lá metia as moedas.
Tal como o meu cão quando resolve trepar para o sofá e dormir lá uma sesta bem quentinha.
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Dizer que os animais, por serem irracionais não podem ser julgados ou que podem ser castigados sem julgamento, não se parece demasiado com afirmações do tipo «ah! os pretos não percebem nada de nada, são todos terroristas»? E que, portanto, a tropa portuguesa podia entrar por uma aldeia adentro e matar a torto e a direito? Não era semelhante a justificação da escravatura?
Não é essa a justificação das toiradas, dos ferros cravados, do animal torturado para gáudio dos espectadores?
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E para terminar, já agora, uma perguntinha só:
O leitor já leu O Mandarim, do Eça de Queiroz.
Se o leitor visse um homem a torturar um cão e tivesse uma campaínha, do género da que o Senhor Diabo deu ao amanuense Teodoro, ou vá lá: uma caçadeira - e a certeza de que não seria descoberto - a quem matava?
O homem ou o cão? 

quinta-feira, janeiro 17, 2013

O Gato e o Rato (fábula interminável)

O que raio se passa por aqui?

quarta-feira, janeiro 09, 2013

O Gato e o Rato (fábula encravada)

O Blogger, simpático como é, volta e meia, pimba! Prega-me uma partida. De repente, sem avisos nem água vai, muda as regras do jogo.
Deve achar que é pecado ser assim como eu sou, conservador, apegado a costumes antiquados, apreciador de velhas fábulas e põe-me de castigo.
Não que o Blogger não tenha alguma razão. Eu mereço!
Mesmo sem ser contrário às mudanças (tenho várias no meu carro e até as uso a todas), há coisas que me irritam: por exemplo, porque diabo achou alguém que as velhas e boas Finanças, uma praga a que já estávamos acostumados, haviam de mudar de nome?
Chega um cidadão ali à vila e pergunta, «o senhor, fachavor, dizia-me onde é que é as finanças?» e o prestável transeunte aponta, «é logo ali, vocemecê corta ali à direita e é a primeira porta...»
E o cidadão, com ar triste diz que «pois, também ele pensava, as Finanças sempre tinha sido ali, mas agora estava lá uma coisa, a Autoridade Fiscal e Aduaneira... E agora, onde é que ele ia pagar o imposto de não sei quê, aquela coisa que dantes era o selo do carro, mas agora é só um papel...»
E a conversa podia não ficar por aqui.
Se o cidadão tivesse tempo e paciência bem podia ouvir dizer que um tal Vítor Gaspar até já tinha dado fazer cartões de visita novos:
Vítor Gaspar
Ministro da Autoridade
(Fiscal, Aduaneira e Correlativos)
Mas, enfim, parece ser um arraigado costume indígena que muito estranharia a um ser civilizado por aqui de visita (felizmente não veio nenhum com a Engenheira Merkl e os que cá havia já emigraram); o Marcelo Caetano, que em tempos ocupou o lugar do Sr. Passos Coelho, para dar um primeiro exemplo, mudou o nome ao Partido Único, a União Nacional e já ninguem se lembra como lhe chamou. E à Pide de má memória, chamou Direção Geral de Segurança, como se rebaptizar as coisas lhes apagassem os curriculo. Não sei mesmo porque é que o Obama não aproveita o exemplo deste velho aliado da Nato e não chama Acapulco à famigerada prisão de Guantanamo: dava para propagandear que uns quantos prisioneiros afinal estavam era de férias.
E não ficamos por aqui. Não bastava que o Terreiro do Paço em Lisboa tivesse passado a ser a Praça do Comércio e o Rossio Praça de D. Pedro IV: foi preciso que o Largo do Caldas passasse também a chamar-se Largo Adelino Amaro da Costa.
Já viram?
Era um endereço pequenino, duas palavrinhas, treze letras contando com o «do»; agora é preciso escrever vinte e quatro. Deve ser uma simplificação, mesmo se eu não vejo como. 
E lembram-se? No tempo do tal Marcelo, e antes dele, do Salazar, os jovens podiam frequentar uma escola comercial, uma industrial ou então ir para o liceu. Quando ser quis uniformizar os cursos, o que, quanto a mim era uma necessidade premente, algum génio achou que a palavra liceu evocava não sei que elitismos e resolveu chamar a esse ensino unificado e aos estabelecimentos onde era ministrado «secundário». Podia ter-lhe chamado Liceu, que era bonito, tinha um sabor clássico e escrevia-se com cinco letrinhas. Agora «escola secundária» escreve-se com dezasseis, mais um espaço e um acento.
Simplicidade, a quanto obrigas!
E, já que o Obama não aprendeu nada connosco, o Blogger podia ter-lhe seguido o altivo exemplo.
Mas não: também o Blogger deve ter querido simplificar qualquer coisa e agora para aqui estou eu às aranhas: é que o Portugal, caramba! foi, desde o início, um blog ilustrado.
Bem sei que não era lá grande coisa, mas eu divertia-me a escrever umas coisinhas e depois pintava uns bonequinhos, e pumba! Clicava ali em cima onde diz «inserir imagem» e procurava num dos meus arquivos o boneco que queria inserir. Depois era só «publicar».
Agora, se lá for clicar, manda-me seleccionar um ficheiro e dá-me como opções coisas como a minha webcam, este próprio blog ou «a partir dos Albuns Web Picasa» que não sei o que seja, mas onde me aparecem três o quatro dos meus próprios desenhos já antigos e só esses.
Como faço agora?
Publico outra vez o que já está no blog? Não me apetecia muito. Queria fazer coisas novas, brincar com elas no photoshop e pô-las depois por aqui.
Porque diabo havia o Blogger de mudar as regras do jogo?
E agora? O que é que eu faço, não me dizem?
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 E pronto: quando não os podes combater, junta-te a eles e escolhe uma coisa qualquer. Este desenhinho, por exemplo, chamava-se «Alice encontrou os ratos que roeram a rolha da garrafa do Rei da Rússia» e eu não desgosto dele. Sempre são uns ratitos. Os gatos que se lixem. 
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segunda-feira, dezembro 31, 2012

O Gato e o Rato (fábula interminável)

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O Portugal, Caramba! deseja-vos a todos - excepto ao governo, claro - um Ano Novo espetacular.

quinta-feira, dezembro 27, 2012

quarta-feira, dezembro 12, 2012

O Gato e o Rato (fábula interminável)

Diga-se desde já que não devo à Drª. Isabel Jonet coisa nenhuma: limito-me, como sempre fiz, a corresponder o melhor que posso às frequentes presenças de escuteirinhos no supermercado e pousar no carrinho um saco com umas massas e uns feijões, as tradicionais conservas e umas latas de salsichas.
É facto que nunca me pediram bifes, nisso a Drª. Isabel tem razão, nem bilhetes para concertos de rock. Já me pediram radiografias, sim, mas velhas, com os meus ossos e uns pulmões em mau estado, mas isso é outra coisa, é mais a campanha para a reciclagem, entregue os seus medicamentos fora de prazo na farmácia e outras coisas dessas.
Mas, todo este aranzel de opiniões contra a pobre Senhora, dá-me que pensar: alguma coisa nela  oscila entre a militância ecológica (poupar água quando se lava os dentes, por exemplo), a disciplina conventual (nada de bifes, a carne estimula uma hormonas perigosas) e a moralidade rígida da pobreza envergonhada (não vás aos concertos, pá, não vês que os pobres não têm nada que se divertir?).
Eu sei que pensar nestas coisas me incomoda, é como uma comichão vagamente dolorosa, mas que está lá, como para me recordar que a solução pode não ser esta, tem mesmo de ser outra, mas tem de ser uma.
Ouvir a Drª. Isabel Jonet, para mim, foi um pouco como regressar a uma infância, nem por isso demasiado feliz, quando íamos todos na procissão com a capa da Irmandade do Senhor dos Passos (que ainda não era Coelho), quando as Senhoras davam aos necessitados desde que não bebessem vinho nem se rissem despropositadamente e quando as mulheres sem direito a maiúscula trabalhavam e cuidavam dos futuros necessitados.
Não juro que goste deste regresso de coisas tão velhas, com um tão intenso cheiro a bolor.
Mas a Drª. Isabel Jonet será a culpada?
E de quê?
De ter falado das suas convicções mais profundas e de ter dito umas inconveniências?
Ora! Que se lixe.
O Senhor Pinto da Costa, para não falar dos nossos ministros mais ministros, claro, diz bastantes mais e nem se rala com os pontapés na gramática! E nós perdemos o nosso precioso tempo (de desempregados até) a comentar estas coisas? 
Francamente!
Tenham tento e percebam que o que vos moveu foi a tristeza de ver que o Banco Alimentar contra a Fome não correspondia a nenhum ideal de solidariedade senão nas vossas cabeças. No mais, é o que os humanos conseguem fazer: uma organização que, quando não se dedica a tiranizar os outros, segue o seu caminha a manquejar, com risco de cair de vez em quando. 

O Gato e o Rato (fábula intermiável)


quinta-feira, novembro 08, 2012

segunda-feira, outubro 22, 2012

A Lei da Caça

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Há coisas, francamente, que eu não entendo.
Por que diabo a caça, os animaizinhos de Deus que andam aos pulos por aqui e por ali, a tratar das suas vidinhas, hão-de ser resnúlia.
«Resnúlia», expliquemo-nos, é uma palavra que eu, sem a certeza de a ter inventado, pelo menos adoptei, fiado no bom exemplo do nosso Luís Vaz.
Se bem se lembram, ele inventava as palavras de que sentia necessidade aportuguesando o latim. E o Eça não se livra da fama de ter feito o mesmo a partir do francês.
Eu, seguro de que os grandes espíritos são sempre melhor exemplo do que os encolhidos, fui-me também aos clássicos e aportuguesei a expressão do Direito Romano, res nullius. 
Res significa «coisa», objecto, qualquer que ele seja, terras, casas, alfaias, escravo ou cão de que se não possa afirmar que têm direitos, mas que podem ser objecto deles. E nullius pode traduzir-se por «de ninguém».
Há coisas, portanto, que não são de ninguém. 
Um escravo abandonado não é um homem livre: continua a não ter direitos, mas não tem dono. Pode, portanto, ser apropriado pelo primeiro que lhe deite a mão. O mesmo acontece com um barco abandonado pela tripulação e deixado à deriva. E a uma carteira perdida e não reclamada, aplica-se o provérbio «quem perdeu, perdeu, quem acha é seu». 
Em muitas culturas esta incapacidade para ser sujeito de direitos ainda abrange os filhos, abrange as mulheres: se o pater (o macho alfa daquela família) morrer, outro macho terá de lhe suceder, sem o que as esposas e os filhos desprotegidos poderão ser considerados res nullios e apropriados pelo primeiro que se apresentar, para os fins que lhe aprouver.
E, se não acreditam que esta mentalidade ainda por aí persiste, perguntem a qualquer jovem bonita: ela vos dirá que uma mulher sozinha num bar, num restaurante ou no cinema corre o risco de ser vista como «resnúlia» e que já está habituada a ser alvo das mais variadas tentativas de apropriação por tudo o que nas redondezas for candidato a macho.
Salvas as devidas proporções (e só porque a mulher, de há uns tempitos para cá foi aprendendo a defender-se) a caça, as perdizes e as rolas, os coelhos, as raposas e os saca-rabos são a mesma coisa.
Pelo simples facto de existirem, qualquer pinto calçudo se arroga o direito de os perseguir e matar: não têm direito a nada.
Experimentem as gentis Leitoras e os bondosos Leitores abordar um grupo de caçadores e, com a mais caridosa das intenções, falar-lhes nos direitos dos animais. Vão a ver como é engraçado.
Responderão, com a educação que a prudência lhes recomendar - mas nem mais um grama - que os animais não têm disso, que são bichos ruins e dão cabo de tudo, desde as hortas até às árvores novas, que transmitem doenças e que têm de ser caçados... por eles próprios, claro.
E vá de passar pelas terras das outras pessoas, pelo quintal se não estiver bem vedado. Cortam as redes ovelheiras e pisam o que lhes estiver no caminho porque a lei da caça lhes dá o direito de perseguição.
E a gente, a vê-los ali com ar de guerrilheiros do Sendero Luminoso, ou de jagunços de um livro do Jorge Amado: o melhor é sermos prudentes, digo eu.
Há um par de anos, dei com um deles empoleirado no muro do meu poço, a uns trinta metros aqui de casa, de arma em punho, à espera de que o cão lhe levantasse um coelhito numa moita, ao que parecia. 
Mandei-lhe um berro aqui de baixo, a cautelosa distância porque não sou parvo - enfim, espero que não muito, pelo menos - e lá se foi ele, vagaroso e gingão, caminho acima.
Vedámos o poço, que remédio, com uma rede alta.
Que mais havíamos de fazer?
Estão a ver porque é que eu sou contra a Lei da Caça, não estão?
Até por autodefesa.
Se me for permitido, acrescentarei ainda, mesmo se a despropósito, que de há tempos a esta parte me ando a sentir assim, tipo Resnúlio, perseguido pelo Gaspar e pelo seu bando de caçadores da Autoridade Fiscal e Aduaneira e tenho a impressão de que nem as comissões venatórias me protegem.
Acham que é delírio e que tenho de ir urgentemente ao meu psiquiatra?
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segunda-feira, outubro 08, 2012