Ainda no âmbito do evento
Braga em Risco - Encontro de ilustração, fui convidado a fazer uma pintura ao vivo e ainda uma pequena oficina com os miúdos e os graúdos dos miúdos que ainda adoram ser miúdos, a que muito a propósito batizei de
"Uma oficina que rima com cafeína". Tudo isto no dia 13 de Novembro.
Seguindo a tendência das minhas últimas sessões de pintura ao vivo, voltei uma vez mais a mergulhar no mundo dos materiais de pintura inusitados. Falo de café, de vinho reduzido, de açafrão, de pimentão-doce, de pó de carvão (...). E porque teimo eu neste materiais? porque são divertidos, algo anárquicos, belos, baratos / democráticos, naturalmente harmoniosos entre si, aromáticos, desconcertantes e visualmente dinâmicos conforme vão envelhecendo na tela (uma homenagem ao livro O retrato de Dorian Gray de Oscar Wilde).
A inspiração para a imagem a ilustrar chegou-me com grande intensidade pelas palavras do saudoso cavalheiro Leonard Cohen - por quem sempre nutri um enorme carinho - no tema
"Anthem", a quem muito humildemente quis prestar uma sentida homenagem:
"There is a crack, a crack in everything
That's how the light gets in."
Esta frase tem sido para mim um mantra ao qual tenho recorrido ultimamente para sobreviver à escuridão e ao caos que parecem estar a cobrir uma vez mais a humanidade.
Este tipo de ilustrações, feitas ao vivo e sem rede têm um carácter tosco e experimental que me agrada sobremaneira. Não são nem pretendem ser produtos acabados - muito pelo contrário - mas sim um esboço de uma eventual ilustração futura e, acima de tudo, um exercício de libertação pessoal, porque crescemos sempre que vamos para fora de pé. Esta é pois, mais uma imagem que sei, voltarei daqui a uns tempos.
Quanto à oficina, foi uma vez mais deliciosa, porque uma vez mais os miúdos não precisaram de mim para nada. O que pretendo com estes momentos não é ensinar qualquer coisa no sentido mais lato do termo... seria uma grande presunção da minha parte acreditar que poderia ensinar o que quer que seja a um espírito livre. O que pretendo unicamente é devolver aos miúdos o prazer imenso que é desenhar, pintar, rabiscar pelo mais puro e primitivo dos prazeres. Há 20.000 anos atrás já os nossos antepassados peludos marcaram para a posterioridade, nas paredes das cavernas, esse impulso mais forte do que a vontade. Não pretendo imagens bonitas (se bem que elas aparecem sempre... seja lá o que isso signifique), não pô-los a desenhar uma qualquer coisa previamente desenhado por mim, nem definir um tema nem sequer fazer comparações ou fomentar competições para ver quem esteve mais à altura. Isso já eles têm de sobra, para dar e vender, na escola.
É o prazer que eu quero (re)visitar. O prazer das texturas, dos cheiros, das manchas aparentemente casuais, das cores que se harmonizam naturalmente entre si, das mãos sujas, da surpresa com que descobrimos que existem infinitos materiais de desenho e pintura, do olhar que se perde nos pormenores das marcas que vamos imprimindo no papel e que a maior parte das vezes nem reparamos (experimentem pintar com um material qualquer, e depois observar com uma lupa). E, acima de tudo, quero plantar a semente da vontade... A vontade de voltar muitas vezes a esse Lugar. Porque é nesse Lugar que tudo o que vem a seguir deverá assentar.
Se conseguir fazer retinir essa corda numa só pessoa,
já ganhei o dia,
o mês,
o ano.
A workshop that rhymed with caffeine
Still in the ambit of the event Braga en Risco - Illustration Meeting, I was invited to do a live painting and also a small workshop with the kids and the fathers of the kids who still love being kids, to which I very much called "A workshop Which rhymes with caffeine". All this on November 13th.
Following the trend of my last live painting sessions, I went back once more to immerse myself in the world of unusual painting materials. I speak of coffee, reduced wine, saffron, sweet pepper, coal dust (...). And why I stubborn in this materials? Because they are fun, somewhat anarchic, beautiful, cheap / democratic, naturally harmonious, aromatic, disconcerting, and visually dynamic as they age on the canvas (a tribute to Oscar Wilde's The Portrait of Dorian Gray).
The inspiration for thus illustration came to me with great intensity from the words of the late gentleman Leonard Cohen - someone i always had a great affection - on the theme "Anthem", to whom i very humbly wished to pay a heartfelt tribute:
"There is a crack, crack everything
That's how the light gets in. "
This phrase has been for me a mantra to which I have lately come to survive the darkness and chaos that seem to be covering humanity once again.
This type of illustrations, made live and without a net, has a crude and experimental nature that I like very much. They are not and do not pretend to be finished products - quite the contrary - but rather a sketch of a future illustration and, above all, an exercise in personal liberation, because we grow up whenever we go outside the box. So, this is an image that I know, I will return one day.
As for the workshop, it was once again delicious, because once again the kids did not need me at all. What I want to do with these moments is not to teach anything in the broadest sense of the term ... it would be a great presumption to believe that I could teach anything to a free spirit. What I intend to do is to return to the children the immense pleasure of drawing, painting, and scribbling as purest and primitive pleasures. Twenty thousand years ago, our hairy ancestors marked this impulse stronger than the will on the walls of the caves. I do not want beautiful images (although they always appear ... whatever that means), I did not make them draw something previously designed by me, nor define a theme or even make comparisons or encourage competitions to see who is the best. That they already have plenty of, to give and to sell, in school.
It's the pleasure that I want to (re)visit. The pleasure of the textures, of the smells, of the seemingly casual spots, of the colors that harmonize naturally with each other, of the dirty hands, of the surprise with which we discover that there are infinite materials for drawing and painting, of get lost in the details of the marks that are printing on paper and most of the time we do not even notice it (try painting with some material, and then observe with a magnifying glass). And, above all, I want to plant the seed of the will ... The will to return often to this Place. Because it is in this Place that everything that comes next should rest.
If i can strum this rope in just one person,
I'll have won the day,
the month,
the year.