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06 novembro 2010

Parabéns ao Porto pela vitória de amanhã

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
06/11/2010



Manda o desportivismo felicitar o adversário quando ganha, e eu aproveito para me antecipar. No jogo de amanhã, tudo está a favor do Porto. O Benfica vai, provavelmente, apresentar a sua segunda equipa. Creio que a inteligente estratégia inaugurada pelo Leiria pode ter feito escola, e não me surpreenderia que todos os clubes passassem a jogar no Dragão com as reservas. Dizem que poupar jogadores no Dragão é duplamente saudável: refresca os titulares que descansam, e também revigora os clubes. Quando se sabe gerir o esforço é outra coisa. Além disso, o árbitro será Pedro Proença, que é benfiquista (como Vale e Azevedo), e é o célebre inventor do penalty inexistente de Yebda sobre Lisandro López, há dois anos.




Talvez Proença e Vilas Boas possam, no fim do jogo, trocar algumas impressões acerca da actividade de detectar penalties que mais ninguém vê, da qual são ambos orgulhosos praticantes. De acordo com o jornal Semanário Privado de 26 de Agosto de 2009 (que só li para não ser excluído da discussão pública), Pedro Proença é também referido na escuta de uma conversa entre Pinto da Costa e Pinto de Sousa. Pinto da Costa pergunta ao amigo quem vai ser o árbitro de determinado jogo do Porto, e Pinto de Sousa responde, referindo-se a Pedro Proença: «É o que a gente combinou». O futebol português pode ter muitos defeitos, mas do ponto de vista da organização é irrepreensível: quase tudo está combinado. Mais: o Benfica tornou a preparar-se de forma deficiente para o jogo. Como se viu em Coimbra, bola na mão na área do Porto é bola na mão; bola na mão na área do adversário é penalty, o que constitui uma vantagem inestimável para os portistas. A prática maneira de contrariar esta vantagem do Porto é reforçar o plantel com jogadores manetas, e o Benfica teima em não o fazer. Por outro lado, a equipa volta a apresentar-se no Dragão apenas com os onze jogadores, e não com onze jogadores e onze caddies. É indigno que tenham de ser os próprios futebolistas a apanhar as bolas de golfe.

ACADÉMICA e Porto encontraram-se na semana passada para jogar urna modalidade desconhecida, e o resultado final foi a vitória do Porto. Surpreendentemente, os três pontos obtidos contaram para o campeonato de futebol. Foram várias as pessoas que disseram que o jogo não se deveria ter realizado, mas compreende-se a decisão de não adiar. Se o jogo tivesse sido adiado, o Porto chegaria ao encontro com o Benfica com apenas quatro pontos de avanço. Se se realizasse na data prevista, poderia chegar com sete. Valia a pena arriscar.

MIGUEL SOUSA TAVARES insiste que «a Declaração de Independência dos Estados Unidos é parte integrante da Constituição americana, escrita oito anos depois». Lamento, mas é falso. A Declaração de Independência não é — repito, não é — parte integrante da Constituição americana, que por sua vez não foi — repito, não foi — escrita oito anos depois, mas mais de dez anos depois. Não é bem uma questão de opinião, é um facto que pode ser comprovado por qualquer leitor, por exemplo no sítio da biblioteca do Congresso. Os leitores interessados podem ainda consultar Os Lusíadas, o Pantagruel e o Kama Sutra e verificar a curiosa coincidência de todas essas obras terem em comum com a Constituição americana o facto de a Declaração de Independência não ser — repito, não ser — parte integrante delas.

Creio que, após ter confundido a Constituição com a Declaração de Independência, MST confunde agora a Declaração de Independência com a Declaração dos Direitos dos Cidadãos (a chamada Bill of Rights), que contém as primeiras dez emendas à Constituição. Começam a faltar documentos históricos importantes para MST confundir com a Declaração de Independência, pelo que tomo a liberdade de sugerir, para confusões futuras, os seguintes: a Magna Carta, o Tratado de Tordesilhas e os Estatutos do Clube Desportivo Arrifanense. Resumindo: como tenho vindo a dizer, a frase que MST citou como sendo da Constituição é da Declaração de Independência — e atribuí-la à Constituição é, aliás, um erro comum.

Mas não é grave. É sem dúvida menos grave do que a incapacidade de admitir erros. MST gaba-se de ter sido, juntamente com Cavaco Silva, «o único de todos os convidados a recusar o convite» para ir ao Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios. Lamento, mas é falso. Confesso que desconheço como é que MST, sem recurso a poderes mediúnicos, julga saber quem é que foi ou não convidado por nós, mas esta nova mistificação tem um objectivo claro: sugerir que os textos de MST são de tal modo excelentes que a mais pequena crítica que lhes seja feita só pode ser produto de uma mesquinha vingança. No entanto, ao contrário do que MST pretende, recusaram ir ao programa Cavaco Silva, Jorge Sampaio, Pinto Monteiro, Manuel Pinho, Maria José Morgado, Belmiro de Azevedo, José Mourinho, Cristiano Ronaldo, Azeredo Lopes, Maria de Lurdes Rodrigues, Alberto João Jardim, Manuel Alegre, Pacheco Pereira, José Eduardo Moniz, Manuela Moura Guedes, Medina Carreira e Miguel Sousa Tavares. Faça-se justiça: Nisto, não tendo sido o único a recusar, foi, sim, o único a pedir 24 horas para pensar.

Todos os outros decidiram mais depressa. Quanto a nós, nem retaliamos contra quem recusa nem premiamos quem aceita. Basta lembrar que Rui Moreira aceitou participar num programa nosso e leva o mesmo tratamento. Mas, tal como MST, também eu me tenho lembrado, por estes dias, do Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios. Era um programa cuja estratégia humorística principal consistia em apresentar declarações de determinado político a defender urna dada posição, seguidas de outras declarações do mesmo político a defender a posição oposta. A incoerência, quando é assim flagrante, tem graça. E, como vivemos em democracia, apontar as incoerências dos mais altos (e também de alguns dos menos altos) dignitários da nação é legítimo. Fazer o mesmo com as doutas opiniões de comentadores desportivos é que parece ser intolerável.

É obrigatório não perder

Devo admitir que não sou grande entusiasta das crónicas que Sílvio Cervan escreve regularmente. Mas hoje, ao ler no blog SLBenfica Crónicas & Imagens a sua última, publicada no jornal A Bola, fiquei (positivamente) surpreendido, a ponto de achar que valia a pena reproduzi-la aqui. A primeira parte merece destaque. Boa crónica e muito bom trabalho do BoyGenius no SLBenfica Crónicas & Imagens.




Crónica de Sílvio Cervan in A Bola


O Benfica chega desmoralizado ao jogo do Dragão. Esta é a conclusão óbvia de quem lê a imprensa, depois da modesta vitória, para a pouco importante Liga dos Campeões, contra o fraquíssimo Olympique de Lyon, pouco habituado a jogos internacionais. Já o Porto chega no auge depois do jogo com um colosso do futebol mundial, na mais importante competição do planeta. Teremos que ser humildes e reconhecer. Houve até quem alvitrasse que a vitória tinha sido má porque agora o Benfica vai perder o Coentrão. Génios assim não podem ser contrariados.

Ao contrário daqueles que dizem que só a vitória interessa ao Benfica eu baixo a ambição, para mim não perder no Dragão é obrigatório e se tal acontecer vamos disputar o título até ao fim com grandes possibilidades de o vencer. Só a derrota torna essa ambição quase impossível a 20 jornadas do fim.

A vantagem do Porto é boa, mas a partir de Domingo o calendário do Benfica passa a ser mais fácil. Das seis saídas mais complicadas do campeonato temos quatro realizadas (Nacional, Marítimo, Guimarães, Porto, Sporting, Braga). Será especulativo mas não perder no Dragão fazia-me acreditar mais no título daquilo que hoje, antes do jogo, julgo possível. Dito isto, reconheço que ganhar é melhor que empatar.

Não é um jogo qualquer, é uma deslocação que pôs no mapa futebolístico grandes figuras do futebol, este jogo já imortalizou Donato Ramos, Carlos Calheiros, Azevedo Duarte, Martins dos Santos, e até Paulo Costa, que hoje comenta nomeações, já nos deixou a jogar com oito no inesquecível clássico. Quem conhece o histórico aceita que o empate é dos deuses e que as regras não são as da FIFA.

De Pedro Proença queria a mesma competência (é claramente dos melhores árbitros) com mais personalidade.

Bela vitória sobre o Porto na Supertaça de basquetebol, num jogo onde ninguém parecia querer ganhar.

02 novembro 2010

A greve

Crónica de Miguel Góis in Record



Uma ação de protesto levada a cabo pelos árbitros portugueses pode colocar em risco a deslocação do Benfica à Faixa da Gaza, no próximo fim-de-semana. De acordo com os seus representantes, os árbitros colocam a hipótese de não apitar o FC Porto-Benfica da próxima jornada, o que não se pode dizer que constitua uma grande ameaça. Se atentarmos nos lances que esta época se têm passado dentro da grande área do FC Porto, já é isso que os árbitros fazem: não apitam. Ou seja, a verdadeira ameaça dos árbitros é não apitarem os lances do FC Porto-Benfica que acontecerem nos restantes dois terços do terreno de jogo. Trata-se, portanto, de uma greve relativa.

Entretanto, o “Correio da Manhã” noticiou que uma das alternativas que estariam em cima da mesa seria a contratação de um árbitro espanhol para apitar o clássico do golfe português. Devo dizer que se trata de uma opção que não me tranquiliza minimamente. Temo que isso fornecesse um pretexto para que houvesse ainda mais portugueses a queixarem-se da fruta espanhola.

Ainda assim, esta ameaça de greve serviu para nos inteirarmos um pouco mais sobre os regimes fiscais e de segurança social que abrangem os árbitros. É curioso que estejamos, desde os anos 80, a falar publicamente sobre o que recebem os árbitros, e esta seja a primeira vez que estamos a falar especificamente dos seus ordenados. Posso dizer que outra surpresa foi a categoria fiscal em que estão inseridos: julgo que só quem não tem assistido às arbitragens dos últimos jogos do Benfica e do FC Porto é que pode dizer que os árbitros portugueses são trabalhadores independentes. Confesso que, não sei bem porquê, sempre deduzi que fossem trabalhadores por conta de outrem.

30 outubro 2010

Depois do treinador de bancada, o árbitro de bancada: uma evolução natural

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
30/10/2010



Confesso que tenho dificuldade em compreender os receios que rodeiam a hipotética greve dos árbitros na semana do Porto – Benfica. Não sei se ainda mantém em rigor a velha regra segundo a qual, na ausência do árbitro, deve ser recrutado um espectador na bancada para arbitrar a partida. Se assim fosse, o mais provável seria que o árbitro do jogo acabasse por ser um adepto do Porto. Sinceramente, creio que ninguém daria pela diferença. Seria um Porto – Benfica perfeitamente normal. Já aqui recordei a noite histórica em que o Sr. Donato Ramos, depois de ter permitido que o Vítor Baía defendesse com as mãos fora da área, anulou um autogolo do Porto por fora-de-jogo posicional de um jogador do Benfica. Hoje, lembro o saudoso árbitro Carlos Calheiros (que é também o eminente turista José Amorim), que um dia assinalou um penalty contra o Benfica por uma razão que permanece misteriosa até agora. Na primeira repetição, José Nicolau de Melo descortinou (e José Nicolau de Melo descortinava como ninguém) uma falta de Mozer. Na segunda repetição, julgo que aventou uma mão de Hélder. E, na terceira repetição, concluiu que não existia falta nenhuma das infracções anteriores nem qualquer outra, mas optou por dar o benefício da dúvida ao árbitro. Gente maldosa comentou que o benefício da dúvida tinha sido o menor dos benefícios que o árbitro tinha recebido nessa noite. Acredito mesmo que qualquer adepto do Porto faria um trabalho mais isento.

Quanto à greve, não sei se tem razão de ser, mas não percebo a forma do protesto. Quando os trabalhadores da TAP fazem greve, não comparecem na TAP, que é a morada do patrão. Quando os funcionários da EDP fazem greve, abstêm-se de comparecer na EDP, que é a morada do patrão. Quando os árbitros fazem greve, ameaçam não comparecer no estádio do Dragão? Que esquisito.

Todos estes meses depois, o túnel da Luz continua a afastar o inigualável Givanildo da convocatória da selecção brasileira. Há, perversa infra-estrutura! Perversa e sectária, que o David Luiz passa lá todas as semanas e continua a ser convocado.

“ (…) é assustador verificar a frequência com que, graças a uma redacção voluntariamente ambígua da lei, são anuladas em julgamento as escutas telefónicas.”
MIGUEL SOUSA TAVARES
Expresso, 11 de Junho de 2007

“ Durante quatro semanas a fio, o jornal «Sol» levou a cabo, tranquilamente, a divulgação de escutas telefónicas recolhidas num processo em segredo de justiça e abrangendo até alguma gente que, tanto quanto sabemos, não é suspeita de qualquer crime. (…) E todos nós, mesmo os discordantes, fomos obrigados a ler as escutas e concluir a partir dos factos e indícios nelas contidos, sob pena de sermos excluídos da discussão pública”.
MIGUEL SOUSA TAVARES
Expresso, 25 de Março de 2010

Como já aqui tive ocasião de notar, há um grande consenso social em torno do fenómeno das escutas. Até gente de clubes diferentes se encontra no essencial, o que é notável e bonito. Por exemplo, eu concordo com o Miguel Sousa Tavares quando diz que é assustador o número de escutas telefónicas, algumas bem incriminadoras, que são anuladas em tribunal. E também me sinto obrigado a tomar conhecimento dos factos e indício nelas contidos, para não ser excluído da discussão pública. O que pretende quem deseja fingir que as escutas não existem é decretar a obrigatoriedade da hipocrisia. E isso, fiquem sabendo, Miguel Sousa Tavares nunca permitiria. E eu estou com ele nesta luta. Juntos venceremos, tenho a certeza.

Jornalista – O best seller de Carolina assume foros de escândalo. As críticas vêm até indefectíveis portistas.
Rui Moreira – O Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa devia ter falado com os adeptos, devia ter falado com os sócios, sobre esta matéria. E devia ter-lhes pedido desculpa
(…)
Jornalista – As críticas aos administradores da SAD não se limitam à gestão.
Rui Moreira – À volta daqueles que são os grandes líderes, aquilo que acontece é que se começa a confundir a fidelidade com o cortesão. Perante o Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa são absolutamente acríticas, mas nas costas do Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa são as pessoas mais críticas. E esta tendência, que é típica dos cortesãos, como nós sabemos, aquilo a que se chama jogos de corredor, é típica também de uma instituição cuja a liderança se aguenta durante muitos anos. (…) Aquele passeio da fama que o FC Porto tem, Faltam lá alguns nomes, claramente.
Jornalista – Mas quem é que é o responsável por isso?
Rui Moreira – É a política de guerrilha”.

Numa interessante reportagem da RTP, disponível aqui: http://www.youtube.com/watch?v=5yjllkmd4wg&feature=related.

Tenho acompanhado com muito interesse o Trio D’Ataque na sequência do despedimento com justa causa de Rui Moreira. Por muito que me custe admiti-lo, o comunicado emitido pela SAD do Porto estava correcto: de facto, o novo elemento (além de ter a estanha mania de permanecer no estúdio durante toda a duração do programa, honrando o contrato que o liga à RTP), emite livremente opiniões que são da sua exclusiva responsabilidade. O novo modelo do programa faz lembrar o tempo em que Rui Moreira não era sequer candidato a sócio do ano, antes de ter percebido que as suas opiniões não eram as mais correctas, quer para as suas ambições inconfessadas, quer para a sua saúde. Espero que o estádio do Dragão tenha corredores espaçosos: há mais um jogador para albergar.

P.S. - Tanto Miguel Sousa Tavares (que esta semana nos obsequiou com uma excelente redacção subordinada ao tema A Caça aos Patos) como Rui Moreira (que fornece aos leitores informações interessantíssimas, como o facto de não ter visto um jogo por estar a entreter um Sr. Que até é comendador) insistem que eu não escrevo aqui sobre o que devia. O jurista que cita a declaração de independência pensando estar a citar a constituição americana considera que eu não sei do que falo; o comentador desportivo que foi despedido por não comentar tem reparos a fazer aos meus comentários. Vivemos num mundo estranho.

25 outubro 2010

E isso me envaidece

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
24/10/2010



ESTIVE ontem mais de duas horas a conversar com um adepto do Benfica. Chama-se Lobo Antunes e é, além de benfiquista, um grande escritor. Um dos maiores do mundo. Sempre que lhe dão um prémio literário, e já lhos deram quase todos, fica mais prestigiado o prémio do que ele. Tem diplomas, medalhas, vários quadros de grandes pintores que quiseram pintar-lhe o retrato. Creio, por isso, que os leitores não serão capazes de lhe censurar a vaidade se disser que, em casa dele, na parede do quarto, está, emoldurada, a sua ficha de inscrição como sócio do Sport Lisboa e Benfica. Cada um tem as suas honrarias, e a vontade de exibir as maiores apenas humana.

«É extraordinário», disse ele a olhar para a moldura, «como um clube fundado por órfãos da Casa Pia – ao contrário do Sporting, fundado por um Visconde, e do Porto, fundado por banqueiros – consegue…» E, entretanto, faltaram-lhe as palavras. «É extraordinário», limitou-se a repetir. Confesso que fiquei desapontado. Afinal, um grande escritor não fazia milagres: quando alguma coisa era do domínio do indizível, não havia vocabulário, nem talento, nem nada que lhe valesse. Mas, nesse mesmo segundo, Lobo Antunes desmentiu-me. Encontrou as palavras que lhe faltavam, e começou a recitá-las: «Domiciano Barrocal Gomes Cavém. José Pinto de Carvalho Santos Águas. Mário Esteves Coluna. Alberto da Costa Pereira. José Augusto Pinto de Almeida. Ângelo Gaspar Martins. António José Simões da Costa.» Assim mesmo, com os nomes completos e sem hesitações. Mais adiante, nessa mesma tarde, António Lobo Antunes haveria de declamar um poema de Dylan Thomas. Mas não voltou a ser tão poético como naquele momento, à frente de uma ficha amarelecida por mais de 60 anos.

Antes de nos despedirmos, ainda registámos uma coincidência. No dia 23 de Maio de 1990, eu tinha 16 anos e estava a chorar em minha casa; António Lobo Antunes tinha 47 e estava a chorar na dele. Claro, Lobo Antunes é um génio, e eu sou apenas, e só quando consigo, eu. Mas, ao menos naqueles minutos que sucederam à final da Taça dos Campeões (duas ou três horas, no meu caso), a minha sensibilidade foi igual à dele. Não é a primeira vez que o Benfica faz de mim uma pessoa melhor, mas nunca deixa de ser surpreendente.

Feito este curto mas importante parêntesis, para a semana voltarei a dedicar-me às grotescas incongruências de Rui Moreira e Miguel Sousa Tavares, que é para isso que cá estou.

18 outubro 2010

Pai e filho

Crónica de Miguel Góis in Record
18/10/2010
 
 
 
– Desliga o computador. Temos de ter uma conversa muito séria...
– Para quê tanto suspense? A stôra de Português avisou-me que ia falar contigo hoje.
– E então? O que é que tens a dizer em tua defesa?
– Nada.
– Nada? Portanto, o teu teste de Português está igualzinho ao teste do Vasco, que por sinal é o melhor aluno da turma, e tu não tens nenhuma explicação para isso.
– A stôra só veio com essa, porque estava à espera que eu tivesse outra nega para me chumbar.
– Eu vi os testes, meu menino. As respostas são textualmente as mesmas, palavra por palavra. É impossível não teres copiado. Sabes o que isto quer dizer? Dois meses sem semanada. DOIS MESES!
– Sim, mas como é que se prova?
– Desculpa?
– Como é que se prova que fui eu que copiei, e não o Vasco? Estás a entender a questão?
– Não estou a acreditar no que estou a ouvir. Quer dizer que não serviu para nada ter andado estes anos todos a gastar a minha saliva contigo sobre a importância de sermos honestos, sobre o valor da integridade e da...
– ... retidão moral. Eu lembro-me. Mas, ó pai, quando o Porto ganha o campeonato, não vamos para os Aliados festejar?
– O que é que isso tem a ver?
– Pai, eu tenho 11 anos: como todos os rapazes da minha idade, estou todos os dias no YouTube.
– No YouTube?
– No YouTube. Eu já não sou uma criança, pai. Sei como é que as coisas funcionam. E tu também sabes, há mais tempo do que eu. Desde que não sejamos apanhados, às vezes temos de dizer “toca a andar!”, temos de recorrer à “fruta de dormir” e ao “nosso juiz”, se queremos atingir os nossos objetivos. Queres que eu chumbe o ano? Queres ir outra vez à Liga Europa? Vá, que cara é essa? Anima-te, pai. Não me dás os parabéns pela nota a Português?
– Os parabéns? Bom, foi efetivamente uma boa surpresa.
– Obrigado, pai. Só mais uma coisa.
– O que é?
– Dava-me jeito que me desses a semanada agora...
– Vou buscar a carteira.

17 outubro 2010

Rival ou Inimigo

Crónica de António-Pedro Vasconcelos in Master Groove



Perante o silêncio cúmplice com que a Direcção do SCP e a maioria dos comentadores afectos ao clube de Alvalade acompanharam, nestes últimos anos, os castigos do processo do Apito Final e as absolvições do Apito Dourado, muitas vezes me tenho perguntado: será que já não há sportinguistas decentes, que não confundem o RIVAL com o INIMIGO?

Nestes últimos anos, depois de Dias da Cunha ter denunciado o SISTEMA e ter chamado os bois pelos nomes, a cumplicidade com o FCP por parte das direcções que se lhe seguiram (Filipe Soares Franco e, agora, Bettencourt) foi demasiado evidente: o inimigo era o Benfica e tudo o que servisse para atacar o Glorioso era bem-vindo, nem que para isso tivessem que pactuar com a batota e associar-se ao clube cujo presidente se gaba de ter deixado Bettencourt de mão estendida e lhes levou o Ruben Micael, o Moutinho e mesmo o treinador que eles julgavam que iam exibir este ano como um D. Sebastião: o Villas-Boas. E tudo o Porto levou!

A cumplicidade era tão grande que houve quem julgasse que a sigla SCP queria dizer Sporting Clube do Porto! Até ao ano passado, o SCP calou-se: não comentou os escandalosos resultados do Processo, não falou das escutas, pactuou com arbitragens indecentes, porque teve o segundo lugar garantido, e porque alguns sportinguistas sem brilho nem brio preferiam um segundo lugar várias vezes do que um primeiro de vez em quando! Desde que o Benfica ficasse atrás!

Esta cegueira e esta obsessão reduziram o nosso grande rival a um clube de bairro, mergulhado numa crise de onde não se vê como vão sair, condenado a disputar um lugar na Europa ao Braga, ao Vitória de Guimarães ou ao Marítimo.

Mas, desde o ano passado, a coisa ganhou foros de delírio. Perante a evidência de um futebol brilhante, um treinador vitorioso e uma equipa confiante e ganhadora, que passeava a sua superioridade e sua classe pelos relvados, e que, sem batota, teria deixado os outros clubes muitos pontos atrás, era preciso arrasar o RIVAL, apoiando a vergonhosa campanha do FCP, matraqueada todos os dias com mentiras repetidas sobre os túneis e o andor, e que, à falta de argumentos, ressuscitava a indecorosa campanha contra o Calabote e reeditava a caluniosa campanha do “Clube do Regime”!

Nos tempos da Guerra Fria, os comunistas chamavam, com desprezo, aos que os apoiavam sem pedir nada em troca os “Idiotas úteis”.

E, desde o ano passado, houve comentadores que se prestaram miseravelmente a essa vassalagem. Ora, de há umas semanas para cá, quiçá por efeito da divulgação das novas escutas, houve alguns sportinguistas que acordaram e devolveram a decência à instituição: foi o caso do Jorge Gabriel, do Daniel Oliveira, do Alfredo Barroso e do José Diogo Quintela, que assinaram nos jornais e proclamaram na rádio que as escutas os indignavam e que, ao contrário do que outros vendem, a equipa do Sporting também foi prejudicada por arbitragens viciadas que a afastaram do título em épocas recentes. Aleluia!

É tempo de os sportinguistas, mesmo que a sua Direcção se cale, perceberem que só poderão voltar a ser um grande clube quando a VERDADE DESPORTIVA voltar ao futebol, e isso implica aliar-se ao Benfica na luta pela independência dos órgãos que irão superintender à Arbitragem e à Disciplina e à decência dos seus membros, na próxima estrutura da Federação!

Sem isso, os nossos clubes vão continuar a ter que redobrar o esforço desportivo e financeiro para ganhar no campo contra todas as forças que, dentro e fora dele (a violência à volta dos estádios, os corredores do poder, os túneis, o apito e as bandeirinhas) fazem todos os possíveis para incendiar Lisboa e manter o poder no Norte.

ACORDEM LEÕES! OU SERÁ QUE ACHAM QUE, PARA ELES, VOCÊS NÃO SÃO MOUROS?!

Batotas que temos como evidentes

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
16/10/2010

 
 
“A Constituição americana – até hoje considerada como um dos melhores textos jurídicos jamais escritos – enumera o que os Founding Fathers chamaram de «verdades que temos como evidentes».

Miguel Sousa Tavares
A Bola, 12 de Outubro de 2010


Aparentemente, há juristas que lêem a Constituição americana sem o cuidado que é devido a um dos melhores textos jurídicos jamais escritos. Na verdade, não é Constituição americana que enumera aquilo a que os Founding Fathers chamaram verdades que temos como evidentes. Essas são enumeradas na Declaração de Independência, que foi escrita uma boa década antes da Constituição. É, então, na Declaração de Independência que os chamados países fundadores dos Estados Unidos expõem as verdades que consideram evidentes: que todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, e que entre esses direitos se contam o direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade. Uma das verdades que não é evidente, quer para a Constituição, quer para a Declaração de Independência, é que os cidadãos tenham o direito inalienável de não serem escutados. Como é evidente, todos os cidadãos têm o direito à privacidade – mas esse direito não é absoluto. E a magnífica lei americana permite o uso das escutas como meio de investigação, assim como a lei portuguesa. Que horror! Mas não era a PIDE que também escutava? Era. Se bem me lembro, a PIDE também prendia e, apesar disso, no regime democrático há quem continue a ir preso. A diferença é simples, mas parece que é difícil de entender: a PIDE escutava e prendia arbitrária e ilegitimamente, como é próprio das polícias políticas das ditaduras; a polícia das democracias escuta e prende justificada e legitimamente, como é próprio do Estado de direito democrático. O mais intrigante, no caso das escutas do Apito Dourado, é o facto de haver discussão quando, afinal, estamos todos de acordo. Por exemplo, estou de acordo com Miguel Sousa Tavares quando, depois de José Sócrates lhe ter dito que não devíamos conhecer o conteúdo das escutas do processo Face Oculta, respondeu: ‘Mas conhecemos. Eu também acho que não devíamos conhecer, mas conhecemos. E, uma vez que as conhecemos, não podemos fingir que conhecemos. Eu, pelo menos, não posso’. (http://www.toutube.com/watch?v=R1WI8t7JY6Y&t=08m07s) E estou de acordo com Rui Moreira, quando ontem confessou aqui a razão pela qual comentou as escutas que envolviam o nome de José Sócrates: «(…) limitei-me a não ignorar o que era público, ainda que resultasse de uma ilegalidade. Ninguém se pode alhear do que é público e das suas consequências». A única diferença é que eu tenho esse opinião relativamente a todas menos as do Apito Dourado. Também acho que não devíamos conhecer a escuta em que Pinto da Costa combina com António Araújo oferecer fruta para dormir ao JP, mas conhecemos. E, uma vez que a conhecemos, não podemos fingir que não conhecemos.

Eu, pelo menos, não posso. Quando comento a escuta em que Pinto da Costa dá indicações a um árbitro para que vá a sua casa nas vésperas de um jogo, limito-me a não ignorar o que é público, ainda que resulte de uma ilegalidade. Até porque ninguém se pode alhear do que é público e das suas consequências. Além disso, note-se, até concordo com MST quando diz que as escutas vieram a público nesta altura por causa do Porto – Benfica. O objectivo é prejudicar o Benfica: os jogadores que tiverem conhecimento das escutas ficam a saber que, por mais que se esforcem, se o árbitro estiver trabalhado não têm hipóteses de ganhar. Desmoraliza qualquer um.

Rui Moreira desfez-se em explicações para justificar que comentar umas escutas é um acto legítimo e comentar outras é uma vileza sem nome. Agora que foi despedido, talvez Rui Moreira tenha mais tempo livre para entrar num negócio que gostaria de lhe propor: formarmos um circo. Como ele já aqui tem sugerido várias vezes, eu seria, evidentemente, o palhaço. Ele seria o contorcionista. Não são muitos os artistas que se podem gabar de ter um número tão bom como o dele. A única maneira de Rui Moreira e MST comentarem uma escuta de Pinto da Costa é o presidente do Porto ser apanhado numa conversa telefónica com José Sócrates. Mesmo assim, suponho que fizessem um comentário misto, debruçando-se apenas sobre intervenção de Sócrates reforça a nossa desconfiança nele. Agora temos uma parte do telefonema que não devíamos conhecer e temos nojo de quem a comenta. Agora está Sócrates novamente a fragilizar a sua credibilidade. E agora temos mais uma parte da conversa que é indigno estarmos a ouvir’.

Umas coisas são picardias maliciosas, típicas do mundo do futebol; outra, bem diferente, são ofensas. E Villas Boas ofendeu-me gravemente numa conferência de imprensa que deu esta semana. Disse que as minhas crónicas eram as únicas que gostava de ler porque eu o fazia rir. Sinceramente, creio que não merecia o insulto. Todas as semanas faço aqui o melhor que posso para provocar Villas Boas. Já recorri a tudo: sarcasmo, ironia, escárnio, simples sacanice, E Villas Boas tem a repugnante nobreza de carácter, o asqueroso desportivismo de achar graça. Para ele, se bem percebo, isto do futebol é a coisa mais importante do mundo para todos, mas no fim acaba por ser um jogo de que nos podemos rir juntos, seja qual for o nosso clube. Simplesmente infame. Exijo que passe a ter o fair-play de um Rui Moreira, que gosta muito de piadas desde que não sejam sobre ele. Obrigado.

09 outubro 2010

António Araújo e judeus do século XVII: vítimas diferentes, a mesma ignomínia

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
09/10/2010
 
 
 
“Obviamente, o João pode ser o João não podia ter sido nomeado para este jogo”
Rui Moreira, A Bola, 13 de Agosto de 2010

Embora quase ninguém tenha dado por isso, há cerca de dois meses foi cometido um crime nestas mesmas páginas. Não é segredo para ninguém que a divulgação do conteúdo das escutas é proibida. Ora, quando usou a expressão o João pode ser o João, Rui Moreira estava, como se sabe, a citar propositadamente uma escuta em que intervém o presidente do Benfica, publicitando o seu conteúdo. Trata-se de um comportamento completamente inaceitável e extremamente pidesco. E vice-versa. Pela minha parte, devo dizer que não participo em autos de fé, e não posso continuar a colaborar passivamente num jornal que se transforma num auto de fé. Não tenho, por isso, outra alternativa senão abandonar esta crónica durante dois parágrafos.

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Creio que a minha posição ficou clara, e espero que esta atitude simbólica contribua para moralizar o debate futebolístico e o próprio mundo em geral. Lamento ter chegado a este ponto, mas o caso é mais grave do que parece: Rui Moreira é reincidente neste tipo de conduta vergonhosa. No dia 26 de Fevereiro de 2010, o jornal i colocou a várias personalidades a seguinte pergunta: Depois dos episódios recentes relacionados com as escutas e o caso Face Oculta, mantém a confiança no primeiro-ministro? A resposta de Rui Moreira foi: «O primeiro-ministro tem que ser um factor de confiança perante o exterior e agora acho que passou a ser um factor de desconfiança perante o exterior». Sei que o leitor está tão chocado como eu. Rui Moreira não faz qualquer comparação entre a Santa Inquisição e as escutas (que todos os historiadores acham parecidíssimas), não condena os bandidos que as publicaram, nem se demarca da porcaria, da canalhice e da insídia. Não só conhece as escutas como as comenta, tendo mesmo o descaramento de tirar conclusões com base no seu conteúdo. Repugnante. Quando é que esta gente compreende que, nisto das escutas, tudo é indigno (menos o que lá é dito)?

Entretanto, parece que houve problemas no Trio d'Ataque, da RTPN. Não costumo assistir mas, ao que me disseram, um dos representantes do Porto no programa abandonou o estúdio — o que acabou por beneficiar o clube. Segundo ouvi dizer, a cadeira vazia teve, no resto do debate, uma postura mais sensata e digna do que o seu ocupante habitual costuma ter. Até nisto têm sorte, os portistas. Evidentemente satisfeitos com a nova representação, os responsáveis da SAD do Porto emitiram um comunicado no qual afirmam que o clube «não apoiará qualquer sócio ou adepto que venha a ser enquadrado como representante do clube, nem lhe prestará qualquer tipo de informação, pelo que todas as suas posições serão sempre pessoais» Na tentativa de manter a excelente cadeira como representante, o Porto decreta um blackout preventivo a um possível futuro comentador. Percebo a intenção, mas gostava que a RTPN arranjasse um substituto. Sem desprimor para os porta-vozes oficiais, seria refrescante ver um comentador do Porto cujas posições fossem, desta vez, sempre pessoais.

OS adeptos de futebol assistiram , na semana que passou, a um fenómeno meteorológico interessante. Todos conhecíamos o fogo-de-santelmo, uma luz provocada por descargas eléctricas na atmosfera, observada frequentemente pelos marinheiros. Parece mesmo fogo, mas não é. «Vi claramente visto o lume vivo», diz Camões n’Os Lusíadas. Esta semana, Portugal conheceu o penalty de Santelmo. Vi claramente visto o penalti nítido, teria dito o poeta, se tivesse escrito a epopeia do futebol português (e em hendecassílabos). De facto, na segunda- feira, o penalty era claríssimo. «São muitos dos meus jogadores a dizerem que é demasiado claro», declarou Villas-Boas. Apelou a que toda a gente metesse pressão na TVI para mostrar as imagens que, por capricho ou conspiração, se recusava a transmitir. «77:53!», bradava o director de comunicação, sem que se percebesse ao certo se estava a indicar um minuto do jogo ou um versículo da Bíblia que anunciava que o fim estava próximo para todos os que não vissem o penalty. As imagens, por manifesta má vontade, é que teimavam em não mostrar nada. Passou um dia. Deve ter havido reuniões. Que fazer? Atacar a credibilidade das imagens? Se as escutas não podem ser aceites como meio de prova, era o que faltava que as imagens pudessem sê-lo. Não, está muito visto. Não havia alternativa: era mesmo preciso fazer um mea culpa. Afinal, 24 horas depois, as buscas terminaram e o penalty não apareceu. O que era claríssimo passou a inexistente. Pois bem, devo dizer que não concordo. Na minha opinião, André Villas-Boas tinha razão na segunda-feira à noite. O lance que ocorre aos 77 minutos e 53 segundos do Guimarães - Porto é mesmo penalty. Trata se de uma jogada em que nenhum jogador adversário comete qualquer infracção às leis do jogo. Normalmente, é o que basta para ser penalty a favor do Porto. Há jurisprudência neste sentido. As regras do futebol são uma coisa, a tradição é outra. Um jogo em que o árbitro se limita a perdoar um penalty ao Porto e a protelar a expulsão do Fucile durante vários minutos continua a ser um escândalo, e não há imagens que me convençam do contrário.

No final do jogo, nem todas as declarações foram absurdas. «Vou ficar atento para saber se este árbitro vai de férias», avisou Pinto da Costa. Ora até que enfim. Não foi precisamente por falta de atenção às férias dos árbitros que certas facturas da Cosmos que foram pagas por engano? Pode ser que alguma coisa esteja a mudar.

07 outubro 2010

Peçam lá para repetir o jogo...

Crónica de Leonor Pinhão em A Bola
07/10/2010



Na noite da passada segunda-feira, o simpático jogador uruguaio Jorge Fucile fez ao FC Porto em Guimarães precisamente a mesma coisa que umas semanas antes, no mesmo recinto, o árbitro Olegário Benquerença fizera ao Benfica.
Para quem ande distraído ou sofra de compreensão lenta, talvez seja necessário explicar melhor a ideia expressa no parágrafo anterior.
Tal como Olegário Benquerença, de apito na boca, enterrou o Benfica, na 4.ª jornada do campeonato, sonegando pontos aos campeões nacionais, Jorge Fucile, à 7.ª jornada, enterrou o FC Porto, que é a sua equipa, com uma exibição deplorável: numa desatenção sua nasceu o golo do Vitória de Guimarães, terminou o jogo mais cedo do que os companheiros porque foi expulso, e muito bem expulso, acrescente-se.
Fucile, ainda na primeira parte, rubricou ainda um outro momento que poderia ser fatal se o árbitro, Carlos Xistra, não tivesse deixado passar em claro a falta sobre um atacante adversário que cometeu dentro da sua área e que não foi sancionada com a grande penalidade que consta das leis do jogo tal como as conhecemos.
Tal como já lhe tinha acontecido na temporada passada, em Londres, no jogo com o Arsenal para a Liga dos Campeões, Fucile teve em Guimarães uma noite que gostará de esquecer porque foi altamente penalizadora para o seu clube.
Entre alguns benfiquistas mais versados no tema conspirativo das arbitragens, até há quem sugira que a expulsão de Fucile foi uma encomenda gritada do banco do FC Porto para o sempre obediente Carlos Xistra.
Qualquer coisa assim:
- Expulsa-nos lá o Fucile antes que ele dê mais cabo da equipa!

O que explicaria o momento dramático furioso de André Villas Boas, no fundo um grande canastrão, gritando junto à linha lateral a sua falsa revolta pela expulsão que tinha pedido. Ou seja, era para disfarçar.
Mas a coisa saiu-lhe mal porque o actor, como já referimos, também não é grande espingarda e o próprio árbitro acabou por se sentir incomodado coma péssima representação do moranguito que é como por aqui se chamam aos actores que estão em início de carreira.
Carlos Xistra, antes de lhe mostrar o cartão vermelho, ainda lhe recomendou:
- Menos, André, menos…
Mas foi em vão.
Também há quem defenda uma ideia contrária. É que não foi nada para disfarçar. André Villas Boas foi expulso para imitar José Mourinho, sua referência de palco. O problema aqui é que não é José Mourinho quem quer, só é José Mourinho quem pode, como o próprio, aliás, tão bem vem demonstrando ao longo de dez anos de carreira.
Depois enfim, aconteceu o que já se sabe.
O moranguito induziu-se por sua alta recreação num monólogo desastrado, clamou por imagens que lhe dessem razão, prometeu arrependimento público no caso de estar enganado e acabou sozinho em palco a meter os pés pelas mãos num ror de petulâncias que José Mourinho jamais assinaria porque ninguém o imagina a expor-se, assim, ao ridículo de ter de se desmentir a si próprio.
O desvario cénico por um empatezinho, para o qual o árbitro não foi tido nem achado, não acrescenta louros ao brasão de um treinador que segue isolado no comando da tabela com 7 pontos de avanço sobre os seus mais directos perseguidores e que ainda não perdeu um jogo oficial na corrente temporada.
Mas se não sabemos ainda se André Villas Boas tem mau perder, já é um dado adquirido que tem péssimo empatar.
Quanto às suas queixas sobre dois fora-de-jogo mal assinalados ao ataque portista, a que se juntou a voz sempre autorizada, quando se fala de árbitros, de Pinto da Costa, é o caso para lhe dizer:
- Peçam lá para repetir o jogo!

Comemorou-se o centenário da República e um novo pacote de escutas do processo Apito Dourado foi disponibilizado no Youtube certamente com o intuito de acrescentar algum brilho cívico à efeméride.
O inevitável constrangimento de alguns opinantes leva-os a indignar-se muito com o assunto.
E, em nome da nossa República, da democracia que é de todos e das boas maneiras, que nem todos têm, reclamam um silêncio total sobre esse material não só porque é «ilegal» como também porque é feio escutar as conversas dos outros.
Discordo da argumentação. É muito importante para o triunfo dos ideais republicanos sobre a chafurda reinante tomar o povo conhecimento, por exemplo, da escuta do «nosso amigo juiz». Já ouviram?
Então vão ouvir como é que um juiz de um tribunal civil, trata como «o nosso amigo juiz», depois de passar uma manhã a ajuizar sobre uma questão que diz directamente respeito a um clube de futebol, finda a sessão pede, republicanamente, dois convites para ir ver a bola com o filho na tribuna presidencial de estádio do dito clube.
Liberdade, Igualdade, Fraternidade.
Principalmente uma grande fraternidade.

Carlos Martins foi chamado à Selecção Nacional por Paulo Bento, treinador com quem teve alguns conflitos quando ambos eram funcionários do Sporting.
As razões desses conflitos nunca foram bem conhecidas mas, se fosse hoje, com o código Costinha para vestuário e comportamentos já em vigor, certamente que não teriam acontecido porque quer Paulo Bento quer Carlos Martins só teriam a lucrar humana e profissionalmente com os ensinamentos e ditames do actual director do Sporting, tal como já estão a lucrar os jogadores que compõem o actual plantel de Alvalade.
Mas, para Paulo Bento e Martins, os tempos já são outros. E Carlos Martins merece, sem dúvida, a confiança de Paulo Bento porque está a jogar que é uma maravilha. É até estranho como é que um jogador com esta qualidade, que foi criado nas escolas de Sporting, está hoje ao serviço do Benfica…
Enfim, foi um que escapou para o clube rival ao contrário de alguns outros, também de excelente dimensão, que de Alvalade rumaram alegremente para um clube amigo, como Ricardo Quaresma, Varela e, mais recentemente, João Moutinho. Com certeza que são rapazes que não se vestem bem.

03 outubro 2010

O Totobola da opinião

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
02/10/2010



"A Bola tem três cronistas portistas – o Francisco José Viegas, o Rui Moreira e eu próprio. E, fora os da casa, tem três benfiquistas: o RAP, o Sílvio Cervan e a Leonor Pinhão. Nós, os três portistas, todos aqui escrevemos que (apesar do túnel da verdade, de quase metade dos jogos terminados com superioridade numérica e tudo o resto), o campeonato do ano passado ganho pelo Benfica foi inteiramente justo, porque jogou o melhor futebol. (…) Mas alguém já viu algum dos cronistas benfiquistas reconhecer mérito (…) a uma vitória do FC Porto (…)?"
Miguel Sousa Tavares
28 de Setembro de 2010

"Durante muito tempo, achei (…) que, com túnel ou sem túnel, o Benfica merecia ganhar este campeonato, porque era a equipa que melhor jogava (…). Mas a verdade é que um campeonato não são 15, nem 20, nem 25 jornadas: são 30 e o saldo final deve-se fazer às 30. E, no último terço do campeonato, desapareceu aquele Benfica que jogava mais e melhor"
Miguel Sousa Tavares
11 de Maio de 2010

"O Fernando Guerra pode, pois, tomar nota desde já: dificilmente os portistas e os bracarenses irão reconhecer o mérito de um campeonato ganho pelo Benfica nestas circunstâncias"
Miguel Sousa Tavares
16 de Fevereiro de 2010

NÃO tenho outro remédio senão admitir que Miguel Sousa Tavares tem sempre razão. Ter sempre razão não é fácil, e MST consegue-o da maneira mais trabalhosa. MST não tem sempre razão por conseguir exprimir constantemente a opinião mais correcta, mas sim por exprimir uma grande variedade de opiniões sobre o mesmo assunto. Nisto das convicções, MST joga com múltiplas. Acerca do último campeonato, às segundas, quartas e sextas reconhece o mérito do Benfica; às terças, quintas e sábados assegura que o Benfica não teve mérito nenhum. Aos domingos, provavelmente, descansa a espinha dorsal, que deve chegar dorida ao fim-de-semana. No entanto, mais notável do que a capacidade para estar sempre certo é o talento para manter a mesma superioridade moral quando diz uma coisa e o seu rigoroso inverso. É muito raro uma trampolinice ser eticamente irrepreensível, mas para MST não há impossíveis. Nos dias em que garante que os portistas são os únicos que reconhecem o mérito dos adversários, MST tem a superioridade moral dos que aceitam a derrota com desportivismo; nos dias em que exige que fique registado que os portistas nunca reconhecerão o mérito dos adversários, tem a superioridade moral dos que não pactuam com fraudes.

Quanto a mim, é evidente que não possuo arcaboiço para competir neste campeonato de moralidade com MST – quer com o que tem a nobreza de reconhecer méritos, quer com o que tem a dignidade de não reconhecer méritos nenhuns. Só posso prometer que, se o presidente do Benfica for apanhado em escutas a indicar o caminho para sua casa a um árbitro nas vésperas de um jogo, a Leonor Pinhão, o Sílvio Cervan e eu viremos aqui escrever que esse tipo de conduta nos envergonha. E daremos razão a todos os adversários que não reconhecerem mérito a títulos conquistados à custa desse modelo de dirigismo desportivo. É pouco, mas é o que tenho para oferecer.

"Realmente, Luís Filipe Vieira e Ricardo Araújo Pereira têm razão: O Hulk é uma banalidade. Deve ser por isso que tão empenhadamente manobraram para o tirar de jogo"
Miguel Sousa Tavares
28 de Setembro de 2010

COMO se não fizesse já demasiado, MST ainda tem a simpatia de ser meu arquivista. E dos mais competentes: tanto colecciona o que vou dizendo, como também arquiva o que nunca disse. Na verdade, eu nunca disse que o Givanildo era banal. Posso ter tido o atrevimento de pensar, como o seleccionador do Brasil, que não é igualável. Talvez tenha a insolência de acreditar – como, aparentemente, a generalidade do mercado -, que não vale 100 milhões de euros. Mas, no que diz respeito a críticas, nunca fui tão violento como o vigilante Rui Moreira, que ainda há um ano escrevia: «Hulk (…) não sabe jogar de costas para a área (…). Além disso, parece ter entendido mal os recados do treinador e o mais que dele se viu foi que se entreteve a adornar as jogadas, a tentar ‘quaresmices’ e a simular faltas.» Nunca fui tão acintoso como o mesmo Rui Moreira, que dois meses depois acrescentou: «Gostei de ver Hulk sentado no banco. (…) talvez lhe devessem ter explicado que fora preterido por causa dos seus tiques e individualismo, das suas inócuas simulações. Talvez assim tivesse optado por uma outra atitude, logo que surgisse a oportunidade de jogar. Em vez disso, e como tem sido costume, Hulk foi de pequena utilidade quando entrou.» E nunca disse que, na época passada, as prestações do Givanildo estavam «a léguas do desempenho do ano anterior», como escreveu aqui MST escassos 40 dias antes de o jogador, talvez por causa do fraco desempenho futebolístico ter resolvido dedicar-se ao pugilismo.

Por outro lado, sou dolorosamente forçado a reconhecer que MST me desmascarou quando revela que, em concluio com o presidente do Benfica, eu «manobrei empenhadamente para tirar o Givanildo de jogo». Normalmente, as teorias da conspiração consistem em palermices mais ou menos lunáticas, sem qualquer sustentação em provas. Não é o caso desta. A pujança da minha influência no futebol português é bem conhecida. As conversas conspiratórias que mantenho com Luís Filipe Vieira estão amplamente documentadas no YouTube. MST e Rui Moreira ainda tentaram enganar-me, escrevendo várias vezes que o rendimento do Givanildo era pobre, para que eu fosse levado a pensar que o jogador não era assim tão fundamental na manobra da equipa do Porto, na época transacta. Mas a mim ninguém passa a perna, e foi precisamente o Givanildo que eu escolhi para tirar de jogo através das minhas maquinações. Confesso: o castigo do Givanildo foi ideia minha.

Por absoluta falta de espaço, deixo para a semana a confissão do meu envolvimento na morte do Kennedy.

02 outubro 2010

Presidente inseguro

Crónica de Miguel Góis in Record
02/10/2010
 
 
 
Foi azar. Na semana em que Pinto da Costa, aludindo à conferência de imprensa de Vítor Pereira, veio dizer que nunca viu um responsável, seja do que for, censurar publicamente aqueles que dirige, José Mourinho – uma das mais reconhecidas autoridades do Mundo em matéria de liderança – criticou em público um dos seus jogadores. E para isso nem foi preciso que o jogador do Real Madrid em questão tivesse errado em quatro lances de golo iminente. Na realidade, Pedro León limitou-se a não seguir as instruções que lhe deram antes de um jogo. Um erro que, a bem da verdade, Olegário Benquerença nunca comete.

Mas voltando atrás, a infelicidade das declarações do presidente do FC Porto não me surpreendeu. Pessoalmente, nunca julguei que Pinto da Costa possuísse competências de liderança. Um líder deve confiar plenamente nas suas capacidades. Pinto da Costa, pelo contrário, é demasiado inseguro: contrata jogadores e treinadores que lhe parecem mais competentes, mas, à última da hora, não acredita nas escolhas que fez, e tenta resolver a coisa de outra forma. Um internauta que vá ao youtube, por exemplo, não encontra uma única conversa telefónica de ou para Pinto da Costa sobre atletas promissores ou treinadores talentosos. Talvez por isso muitos dos jogadores do FC Porto digam que assinaram em quatro ou cinco minutos – o presidente do clube deve, em seguida, ser libertado para tarefas mais decisivas.

De resto, fala-se muito nos valores de Pinto da Costa, mas o certo é que as escutas revelam um homem preocupado com o nosso planeta. Vê-se que está assustado com a pegada ecológica deixada pelos árbitros nas suas deslocações até aos estádios, quando repete várias vezes frases como “esse é de muito longe!”, ou “porque é que não pões um do Porto?”

"O senhor, na funerária, vira à esquerda" ou como no GPS Dourado não há túneis

Crónica de Leonor Pinhão em A Bola
01/10/2010



O presidente do FC Porto disse esta semana que ao FC Porto «só falta o título dos túneis». É capaz de ter razão porque no caminho que levou o árbitro Augusto Duarte até sua casa, na Madalena, com as indicações preciosas e precisas que Pinto da Costa foi prestando ao condutor do veículo, qual GPS Dourado, nunca houve que passar em nenhum túnel.
Bendita seja a Madalena que não tem túneis, que alimentem suposições estéreis!
Mas se não tem túneis, pois tem rotundas. E por lá passaram. «Na rotunda, vem para baixo», disse.
E também tem edifício dos CTT. «Vai passar por uns correios» e «na rua larga vira à esquerda». Então tem correios e também tem uma rua larga e não tem sequer um mísero túnel?
E também passaram por outros lugares bem identificados pela voz monocórdica como convém ao GPS Dourado disponível no youtube para todos os automobilistas que não acreditem que não há túneis na Madalena.
«Tem uma escola do lado direito», «o senhor na Funerária, vira à esquerda», «vai passar nuns columbófilos», «vira à esquerda, sempre para baixo», «passa o Orfeão», «passa a Junta de Freguesia da Madalena», «a clínica dentária», «na rua larga vira à esquerda», «vai passar no Clube da Madalena», «tem uma tabuleta que diz Porto», «passa o estaleiro», «sempre para baixo, sempre para baixo», «tem uma seta que diz praia» até chegar «a uma casa iluminada» …
Incrível, não é? E nem um único túnel!
E, pronto, está explicada a razão que impediu o FC Porto de arrebatar o título dos túneis. Também não lhe faz falta nenhuma.
Eu, por exemplo, dispensaria bem o regozijo se visse o meu clube a ganhar o maldito campeonato das suposições estéreis numa enfiada de títulos, como o título da fruta, o título do café com leite, o título das viagens ao Brasil, o título do sprint de José Pratas, o título do marfim, o título do chefe da caixa, o título dos quinhentinhos…

O facto de não terem acontecido condenações no processo que ficou conhecido como Apito Dourado poderá explicar o actual regabofe no sector da arbitragem. É natural, é humana, e até pode ser subconsciente em alguns casos, esta pândega que não é mais do que a celebração do triunfo do estatuto de impunidade avalizado pelos tribunais civis.
E este, sendo o primeiro campeonato que se disputa depois do coro de absolvições de dirigentes e árbitros reputadamente promíscuos nas suas relações, não podia deixar de ser um campeonato muito, mas mesmo muito especial.
Pois se ninguém, foi de cana, o que era impensável, e nem uma simples irradiação desportiva emanou de tanta matéria de prova, como impedir este fartar de folia que tem vindo a marcar as primeiras jornadas da nossa Liga e que já obrigou o próprio Vítor Pereira, presidente do sector, a vir a terreiro meter os pés pelas mãos, que foi, precisamente, o que fez o árbitro Bruno Paixão, na ilha da Madeira, quando viu Rolando, o central portista, meter as mãos pelos pés na sua área?
Estes velhos protagonistas, dado que o tempo é de justificada descompressão judicial, dão-se a luxos que os põem a jeito das interpretações mais torpes.
Noticiada por um jornal generalista e até hoje ainda não desmentida por nenhum dos presentes, a madrugada de convívio de Bruno Paixão com Lourenço Pinto, presidente da Associação de Futebol do Porto, e com José António Pinto de Sousa, ex-presidente absolvido do Conselho de Arbitragem da FPF, no bar de um hotel de Lisboa, depois de consumada a discutida arbitragem de Paixão no Nacional - FC Porto, só poderá fazer adivinhar, além da bonomia geral, uma próxima homenagem pública da AF Porto a Bruno Paixão, na sequência de idêntico preito em oportuna hora prestado a Olegário Benquerença.
Lamentavelmente, nunca a opinião pública conhecerá o teor dos diálogos entre Bruno Paixão, Lourenço Pinto e Pinto de Sousa visto que os tempos da perseguição policial e das escutas ilegais estão mortos e enterrados e não é de crer que, estando todos juntos na mesma assoalhada, tenham falado pelo telemóvel uns com os outros.
É assim a vida. Se há conversas que ficam legitimamente entre quem as conversou, outras há que nascem para saltar para a praça pública com a naturalidade das coisas naturais.
Por exemplo, no sábado passado, Olegário Benquerença que ficou de fora do calendário desportivo do fim-de-semana por razões sanitárias, aproveitou a mais do que merecida folga para receber uma nova homenagem. Sim, porque não há maior homenagem do que o desafio de ensinar os mais jovens a trilhar os bons caminhos de uma profissão, de um mister, de uma carreira.
Olegário Benquerença, na sua qualidade de émulo, ou seja, de modelo a seguir, a igualar ou a superar, respondeu afirmativamente ao convite do Encontro Nacional do Árbitro Jovem, organizado em Rio Maior pela Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol e foi dar uma lição a 60 árbitros com idades compreendidas entre os 14 e os 18 anos.
Como seria de esperar numa iniciativa pedagógica do género, as incidências do seu trabalho no último Vitória de Guimarães - Benfica mereceram a curiosidade da juvenil plateia de educandos que questionaram o educador sobre as sequelas desse seu estrondoso sucesso. O mestre, num incentivo claro à formação de herdeiros que não temam protestos de ninguém, respondeu: «Esta capacidade só está ao alcance de meia dúzia de predestinados. Não tenho dúvidas de que todos vocês gostariam de ser atacados como eu e os outros colegas porque isso significa que chegaram ao patamar mediático.»
Anda um pai a mandar o filho à escola (de árbitros) para isto.

O próximo Benfica - Braga promete. Mais do que em função do campeonato português, em função dos dois respectivos estampanços europeus desta semana. É verdade que o resultado do Benfica foi menos mau do que o do Sporting de Braga. Mas também é verdade que o Braga vai chegar à Luz com um dia a mais de descanso do que o Benfica. E estas coisas têm a sua importância. O Sporting que, por exemplo, lamentou ter dado tantos dias de descanso ao Benfica antes do derby, vai agora jogar a Aveiro contra o Beira-Mar que tem quase mais uma semana de descanso do que os leões. São as contas…

27 setembro 2010

Eu acredito!

Crónica de Miguel Góis in Record
27/09/2010
 
 
 
Pessoalmente, sempre gostei muito de ficção científica. Talvez por isso tenha apreciado de forma particular a seguinte pergunta que um jornalista fez, esta semana, a André Villas-Boas: “Coloque-se perante este cenário: no jogo com o Olhanense, o FC Porto é prejudicado pelo árbitro…”

Assim, de repente, lembro-me de vários episódios do “Star trek” com pontos de partida mais verosímeis. Por outro lado, na ressaca da falência do comunismo, podemos estar perante o dealbar de uma nova utopia vermelha – milhões de seres humanos, espalhados pelo Mundo inteiro, que acreditam ser possível construir uma sociedade onde um árbitro marque um penálti contra o FC Porto! Eu acredito! Junte-se o leitor também a este movimento! André Villas-Boas já o fez, nomeadamente quando, em resposta à pergunta acima citada, afirmou: “Há de chegar o dia em que nós nos sentiremos injustiçados (…).” Ele também acredita!

Mas o treinador do FC Porto ainda teve tempo para comentar a reação do Benfica à arbitragem de Olegário Benquerença: “O refúgio para as derrotas vai sempre ser o mesmo”. Isto vindo de um homem que nunca se refugiou na arbitragem para justificar as derrotas tem outra credibilidade. Infelizmente, André Villas-Boas não é esse homem. Basta recordar as suas palavras na última partida que o FC Porto perdeu, em agosto, no Torneio de Paris: “É um árbitro que ajudou à festa dos clubes franceses do torneio (…) Sinto um sentimento de injustiça perante o que se passou no golo”. Só quem já foi prejudicado num lance – e não em quatro – de um jogo particular – e não de uma partida a contar para o campeonato – é que consegue compreender este sentimento de revolta.

26 setembro 2010

A mão (de Rolando) que segura o andor

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
25/09/2010
 
 
 
A dureza com que a equipa do Sporting foi criticada após a derrota na Luz deixa-me na posição ingrata de ter de a defender. Concedo que a exibição não foi boa, o que acaba por ser normal. Como já aqui escrevi, parece-me que o Sporting não está tão forte como no ano passado. No entanto, os riscos de desflorestação não se confirmam. É verdade que saiu uma maçã e o pinheiro acabou por não vir, mas o modo como Aimar e Saviola se mexeram entre o meio campo e a defesa do Sporting deu a entender que os jogadores leoninos estavam bem plantados na relva. No fim do jogo, pareceu-me ver o preparador físico do Sporting a desenraizar o Maniche da entrada da área. E um dos adjuntos teve de enxotar a águia Vitória, que se preparava para começar a fazer o ninho no ombro do Nuno André Coelho.


DESEJO aderir ao novo modelo de crónica futebolística em que o autor revela, para mais que previsível gáudio dos leitores, onde, como e quando, viu determinado jogo, e ainda tem a gentileza de fazer a resenha das opiniões emitidas por comentadores estrangeiros – que são sempre os mais perspicazes e informados sobre o futebol português.

Antigamente, o público não sabia se um cronista tinha assistido a determinado desafio em directo ou se tinha sido obrigado a ver uma gravação, se tinha visto a partida em território nacional ou estrangeiro. Esses tempos, felizmente, acabaram. Informo então que assisti ao Nacional – Porto no Brasil, através de um canal televisivo local. Estava uma temperatura agradável. Ingeri 72 tremoços durante a transmissão. Os comentadores consideram claríssimo o penalty não assinalado após evidente mão de Rolando na área (que bobagem!, exclamaram os comentadores) e perceberam, sem recurso à repetição, que tinha sido mal tirado o fora-de-jogo ao ataque do Nacional. Um dos comentadores, especialmente bem preparado, lembrou a propósito a célebre conferência de imprensa em que Alex Ferguson afirmou que o Porto comprava os seus títulos no supermercado. De facto, o futebol português, visto no estrangeiro, tem outro interesse.

MAIS um escândalo que resulta de inomináveis injustiças: o seleccionador do Brasil, evidentemente seguindo instruções do dr. Ricardo Costa, chamou David Luiz e deixou de fora da convocatória o inigualável Givanildo. Creio que se impõe uma vigília.

ACOMPANHEI, com alguma surpresa, as reacções da imprensa nacional à derrota do Braga frente ao Arsenal. Pareceram-me exageradas. É verdade que o Braga levou 6, mas a equipa portuguesa que lá foi no ano passado levou 5. É possível que, em Londres, ninguém tenha dado pela diferença. O único pormenor que verdadeiramente distinguiu as duas derrotas talvez tenha sido este: desta vez, o presidente da equipa goleada apareceu no aeroporto juntamente com a equipa, à chegada a Portugal.

O comunicado da direcção do Benfica continua a suscitar os mais variados comentários. Uns apoiam-no, outros reprovam-no, e até o treinador André Villas Boas fez uma observação da qual não retive mais do que o facto de incluir a palavra quaisqueres. Uma das críticas mais frequentes, e à qual sou particularmente sensível, tem a ver com a circunstância de o comunicado disparar em direcções tão díspares como a arbitragem e a comunicação social. Também me parece descabido. Ainda se tivessem sido publicadas escutas em que se ouvisse o presidente de um clube a dar indicações a um árbitro sobre o melhor caminho a tomar em direcção a sua casa, talvez se percebessem melhor as referências à arbitragem. Bem assim, se fosse pública outra escuta em que se ouvisse o presidente do mesmo clube a dar indicações a um jornalista sobre o que devia escrever, talvez se compreendesse a desconfiança relativamente à comunicação social - e talvez se percebesse que o tema é, afinal, mais ou menos o mesmo. Uma vez que nada disso sucedeu, o comunicado parece bater-se contra moinhos de vento que mais ninguém vê (nem ouve).

18 setembro 2010

Um protesto sem vigílias não é um protesto

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
18/09/2010
 
 
 
O comunicado emitido pela direcção do Benfica teve, até ver, pelo menos um grande mérito: causou igual desagrado a portistas e sportinguistas (passe o pleonasmo). Os portistas até apreciam comunicados, mas só se forem lidos pelo terceiro guarda-redes. Gostam de queixas sobre a arbitragem, mas só se forem feitas ainda na pré-época, como fez Villas Boas no torneio de Paris. E levam a mal que uma iniciativa destas não inclua uma comovente vigília previamente anunciada na TV. Organizar romarias à sede da Liga para repudiar o castigo aplicado a um inocente que se limitou a participar num espancamento é pugnar pela justiça e pela verdade; lamentar a existência de vários erros graves de arbitragem é uma palermice folclórica.
Quanto aos sportinguistas, preferem tomadas de posição mais funéreas como um luto, por exemplo. Comunicados são, para eles, queixinhas.
Queixinhas essas que podem eventualmente vir a prejudicá-los, pelo que, após aturada reflexão, decidiram fazer queixinhas das queixinhas do Benfica, inaugurando assim as queixinhas por antecipação. Queixinhas preventivas e dignas, que antecipam factos hipotéticos, e que contrastam flagrantemente com as queixinhas condenáveis, que são as que se referem a factos consumados e comprovados. Donde se conclui que o Benfica foi prejudicado em Guimarães para seu próprio benefício, e para grave prejuízo do Sporting. Só não vê quem não quer.


A homenagem da Associação de Futebol do Porto a Olegário Benquerença gerou uma comoção que não pode deixar de se considerar admirável. Fico sempre impressionado com as pessoas que ainda conseguem surpreender-se com o futebol português. Se é absolutamente normal que um árbitro visite a casa do presidente do Porto («Sempre em frente!») nas vésperas de arbitrar um jogo do mesmo clube, porque haveria de ser menos normal que um árbitro de Leiria fosse homenageado pela Associação de Futebol do Porto nas vésperas de dirigir um jogo do Benfica e mais de dois meses depois das extraordinárias façanhas merecedoras da homenagem? Ambas as situações foram explicadas tão convincentemente que só poderiam deixar dúvidas em espíritos menos puros.
O árbitro Augusto Duarte buscava aconselhamento matrimonial para o papá, e foi por isso que quis escutar a opinião ponderada de um homem cujo talento para manter matrimónios estáveis e discretos é publicamente conhecido e aclamado.
A Associação de Futebol do Porto quis homenagear Olegário Benquerença, natural de Leiria, porque os seus auxiliares são portuenses. No fundo, o procedimento habitual nestes casos.
Quem não se lembra da linda homenagem que a Associação de Futebol de Beja prestou a Carlos Valente, que esteve no Mundial de 1990 com um assistente que tinha uma vizinha que era alentejana? Ou a festa de arromba que a Associação de Futebol da Guarda organizou em honra de Vítor Pereira, presente no mundial de 1998, e que na altura era dono de um cão de raça Serra da Estrela, o que muito orgulhou os organismos do futebol da região?

Jorge Costa prossegue a sua magnífica recuperação da Académica, que se encontra neste momento em terceiro lugar, bem longe do triste 11º posto em que terminou no ano passado. Com um plantel praticamente idêntico ao da época anterior, o novo treinador dos estudantes - que, recorde-se, nunca redigiu relatórios para Mourinho -, insiste em fazer melhor que o seu antecessor. Uma impertinência que lhe pode sair cara.

11 setembro 2010

O Futebol Português rejuvenesce

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
11/09/2010
 
 
 
Há duas semanas, escrevi aqui que a época 2010/2011 começava naquele dia, quando o Benfica jogasse com o Vitória de Setúbal. O jogo acabou com a vitória do Benfica por 3-0, e eu convenci-me de que tinha razão. Afinal, devo confessar que me enganei. Não estamos a assistir ao início da época 2010/2011. O campeonato que agora começa é o respeitante à época 1996/1997. Aquele ano em que se juntaram, na primeira divisão, árbitros como José Pratas, Augusto Duarte, Soares Dias e Isidoro Rodrigues, entre tantos outros. A arbitragem de ontem, em Guimarães, foi de 96/97. Até quem viu o jogo em casa sentiu o cheiro a naftalina. E os apreciadores de antiguidades terão admirado o rigor com que Olegário Benquerença aplicou as regras daquela altura.
Foi um espectáculo comovente. Quando um jogador vimaranense tentou separar a perna do Aimar do resto do corpo com um pontapé, dentro da área do Vitória. Senti-me 14 anos mais novo. A falta não assinalada que Carlos Martins sofreu, também dentro da área, fez me recuar à juventude. O fora de jogo inexistente que impediu Saviola de ficar isolado à frente de Nilson trouxe me à memória o viço dos meus vinte anos. E, quando Cardozo viu um cartão amarelo por ter marcado um golo limpo, quase chorei de nostalgia. Sou um sentimental, e estes regressos ao passado comovem-me. Só não percebo a razão pela qual este Vitória de Guimarães Benfica foi transmitido pela SportTV, em lugar de ter passado na RTP Memória. Quanto a Olegário Benquerença, já conhecíamos o seu talento como imitador de Quim Barreiros (quem não conhecer, veja o vídeo no YouTube). Mas não sabíamos que ele também tinha jeito para imitar o Martins dos Santos.

Que se saiba, ninguém seguiu o conselho de higiene institucional que Carlos Queiroz nos deixou, gratuitamente, em meados da década de 90: não há notícia de alguém ter varrido a porcaria da Federação. Não serei eu a pôr em causa a necessidade de varrer porcaria, seja na Federação ou noutro sítio, mas, não tendo a porcaria sido varrida, foi com porcaria que Humberto Coelho chegou às meias-finais de um Europeu, e foi na companhia da mesma porcaria que Scolari conseguiu ser vice-campeão da Europa e quarto classificado num Campeonato do Mundo. Bem sei, bem sei: o mérito dos feitos de Humberto Coelho e Scolari é todo de Carlos Queiroz. Foi ele quem lançou as bases. Construiu a estrutura. Pensou o edifício das selecções. E a responsabilidade pelo actual momento da Selecção é de todos menos de Queiroz. Por azar, ele tomou conta da Selecção precisamente na altura em que o efeito da sua obra começou a desvanecer-se. Os seus predecessores destruíram as bases, ignoraram a estrutura e borrifaram se no edifício. Curiosamente, Carlos Queiroz tem mais mérito e influência nos resultados da Selecção quando não está a treiná-la do que quando é seleccionador nacional. E, mesmo quando está longe, Queiroz consegue ser autor moral apenas dos êxitos: é ele o responsável pelo sucesso da equipa que fez um brilharete no Euro 2000, mas não tem responsabilidade nenhuma no desastre do Mundial de 2002, sendo que a chegada à final do Euro 2004 volta a ter o seu dedo.

O despedimento de Queiroz deve agradar, por isso, a ambas as partes: à Federação — que, com processos disciplinares consecutivos, fez tudo para o despedir sem nunca dizer que queria despedi-lo; e ao seleccionador — que, insultando os médicos na Covilhã e o vice-presidente da Federação no Expresso, fez tudo para ser demitido sem nunca dizer que queria demitir-se. Por um lado, é uma pena que Queiroz e a Federação se separem. Fazem um lindo par.

No fim, a cabeça do polvo, pelos vistos, conseguiu o que queria — o que significa que este é o segundo octópode a ser bem sucedido no mundo do futebol em meia dúzia de meses. Infelizmente, dizem-me que ficávamos mais bem servidos se o polvo alemão que adivinhava resultados viesse ocupar o cargo de vice-presidente da Federação e Amândio de Carvalho fosse para dentro daquele aquário na Alemanha.

04 setembro 2010

Jorge Sousa, um árbitro do Porto...

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
04/09/2010
 
 
 
Reza a lenda que o árbitro Jorge Sousa foi membro dos Super-Dragões. Não sei se o boato começou porque alguém testemunhou a sua presença na claque ou porque, nos jogos que arbitra, Jorge Sousa parece mais portista que o Jorge Nuno.

No Braga-Benfica do ano passado, ficou célebre o golo anulado ao Benfica porque, ao que supuseram os especialistas na altura, Luisão teria respirado com demasiada força no momento de cabecear.

Na final da Taça da Liga, permitiu que Bruno Alves e Raul Meireles ficassem em campo até ao fim, provavelmente para ver qual dos dois venceria o seu campeonato privado de agressões. Foi renhido, mas julgo que ganhou Bruno Alves por 4-3.

No Rio Ave-Porto desta semana, deixou que Falcão se pusesse às cavalitas de um adversário no primeiro golo e admoestou, com cartão amarelo, um jogador vila-condense por ter tido a desfaçatez de sofrer um penalty.

Quando se diz que determinado jogo vai ser arbitrado por Jorge Sousa, árbitro do Porto, sou eu o único que suspeita que não se estão a referir à origem geográfica do juiz?

A interessante entrevista que Jesualdo Ferreira deu esta semana parece explicar o motivo pelo qual Pinto da Costa só costuma prometer títulos a treinadores já falecidos: é da natureza dos defuntos não concederem entrevistas. Três meses depois do fim do campeonato brilhantemente conquistado pelo Benfica, o treinador da equipa que terminou atrás do Braga — e que é, aliás, o homem a quem mais conviria arranjar uma desculpa para a posição em que ficou classificado —, veio admitir que o Porto ficou em terceiro porque «houve duas equipas, nomeadamente a que foi campeã, que foi mais competente». Para surpresa de todos, não fez referências a túneis nem a burocratas. Que estranho. Jesualdo Ferreira deve ter estado distraído. Todos vimos, por exemplo, como o Benfica bateu o Porto no Algarve, na final da Taça da Liga.

No primeiro golo, o túnel de Braga recuperou uma bola no meio campo, fez uma tabelinha com o túnel da Luz e passou ao dr. Ricardo Costa, que rematou de fora da área, batendo Nuno. No segundo golo, o dr. Ricardo Costa apontou superiormente um livre directo fazendo a bola entrar no ângulo superior direito da baliza. E no terceiro, o dr. Ricardo Costa completou o seu hattrick após jogada de insistência do túnel de Braga pela direita. Foi a época toda nisto, e agora Jesualdo Ferreira vem atirar-nos areia para os olhos dizendo que o Benfica venceu porque foi melhor. Ele há cada uma!

O jogo que a selecção fez ontem teve, pelo menos, a virtude de revelar quem tem razão no caso Carlos Queiroz. Este Portugal-Chipre demonstrou cabalmente que a Autoridade Anti-Dopagem não tinha qualquer motivo válido para invadir o estágio dos jogadores portugueses. Passa pela cabeça de alguém que uma equipa que não consegue bater o Chipre em casa esteja a tomar substâncias proibidas? Parece-me um caso evidente de excesso de zelo.
Quanto à selecção de sub-21, apesar da derrota frente à Inglaterra acredito que esteja no bom caminho. O ponta-de-lança Bebé, por quem o Manchester United deu cerca de 10 milhões de euros, parece-me ser um jogador de futuro. Trata-se, aliás, do segundo bebé mais caro do futebol português, a seguir ao de Cristiano Ronaldo, o que indica a qualidade do atleta.

28 agosto 2010

Agora sem mãos

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
28/08/2010



É a questão que os benfiquistas mais descrentes colocam a si próprios por estes dias: o Benfica já perdeu o campeonato em Agosto ou os quatro pontos de atraso para o Braga ainda são recuperáveis? É uma inquietação legítima, mas temo que o verdadeiro alcance deste início de época não esteja a ser compreendido por todos.

O problema é este: um campeonato até Jaime Pacheco ganha. Mas ganhar um campeonato à Benfica, às vezes nem o Benfica consegue. O último campeonato foi ganho à Benfica. Com grandes exibições, goleadas, enfrentando o melhor Braga de sempre e um Porto orientado por um treinador tricampeão. Este ano parece-me que faltava alguma motivação. O Braga, desfalcado e empenhado nas competições europeias, aparenta estar menos capaz de suportar uma prova tão longa, e o Porto passou a ser treinado pelo Mourinho de pechisbeque. Era óbvio que o Benfica precisava de um desafio. Daquela emoção que o artista do poço da morte procura quando grita: «Agora mais difícil: sem mãos!» Que se passou, desde há três meses? Jesus é o mesmo. Os jogadores também, quase todos. O que equivale a dizer que o poço é o mesmo e a mota também. Um aborrecimento. As cabriolas do ano passado já não nos impressionariam. Era altura de gritar: «Agora mais difícil: sem vitórias até 28 de Agosto!» O campeonato começa hoje, meus amigos.


“ (…) se, como eu prevejo, o Braga, ficando em segundo lugar, não sobrevive às eliminatórias da Champions, isso significa que o Benfica faz sua toda a receita dos direitos televisivos, sem ter de a dividir a meias com outro clube português participante na competição. Há que estar atento, Sr. Vítor Pereira”
                                                                                  
                                                                                                     Miguel Sousa Tavares, 6 de Abril de 2010


Quando se percebe de futebol é outra coisa. Há quatro meses, o Braga estava a ser beneficiado pela arbitragem – o que, surpreendentemente, favorecia o Benfica. O mesmo Braga que só perdeu o campeonato na última jornada, o mesmo Braga que amealhou pontos suficientes para ser campeão em vários dos últimos campeonatos, estava a ser beneficiado para ajudar o clube cujos calcanhares andou a morder até ao fim. O raciocínio, chamemos-lhe assim, era simples: como, depois de apurado para a Champions, o Braga não passaria à fase de grupos, o Benfica receberia a totalidade dos direitos televisivos, perante a passividade do desatento Sr. Vítor Pereira. Talvez fosse útil a publicação de um manual de instruções para teorias de conspiração. O primeiro mandamento estipularia: se a teoria não tiver pés nem cabeça e se basear apenas numa previsão com a pujança premonitória das do professor Bambo, abandone-a. Aí está uma obra que evitaria alguns embaraços, uma vez que a realidade se encarregou de demonstrar que, tal como pensavam todos os que não estavam de má-fé, este Braga ficou em segundo lugar porque era mesmo superior ao plantel mais caro de sempre do futebol português. Que o Sporting de Braga seja, então, bem-vindo à Liga dos Campeões, até porque não é todos os dias que se consegue ver um Sporting nesta competição.

21 agosto 2010

Uma semana humilhante

Crónica de Ricardo Araújo Pereira in A Bola
21/08/2010



A derrota do Benfica em casa, frente à Académica, não pode deixar de ser considerada humilhante. Humilhante para o Porto, bem entendido: em tão pouco tempo e com um plantel muito semelhante, Jorge Costa já está a fazer melhor do que André Villas-Boas. Quem assistiu, no ano passado, à derrota da Académica de Villas-Boas no Estádio da Luz por 4-0 constata sem dificuldades que a Académica de Jorge Costa está muito mais bem orientada.

Como se a vergonha do fim-de-semana não bastasse, o Porto viria a ser reincidente na desonra dias depois, perdendo Salvio para o Benfica. Ciente da dimensão do enxovalho, André Villas-Boas tentou fingir que o que toda a gente sabia era mentira numa conferência de imprensa em que, por incrível que pareça, não usou uma vez que fosse a palavra «exacerbação». Disse o treinador do Porto que, se o seu clube estivesse interessado em Salvio, o jogador estaria no plantel - uma vez que os portistas se antecipam ao Benfica nas contratações sempre que o desejam. Sem querer exacerbar, todos sabemos que tal não é verdade. Se o Porto conseguisse roubar ao Benfica todos os profissionais que interessam a ambos os clubes, a esta hora Villas-Boas ainda seria treinador da Académica.

PAULO SÉRGIO prepara-se para, no espaço de cerca de três meses, colocar duas equipas fora da Liga Europa. Julgo que estamos perante um especialista. Primeiro foi o Guimarães, afastado das competições europeias no último jogo do campeonato pelo Marítimo, e agora é o Sporting, que está prestes a ser eliminado pelo poderoso Brondby. Na mesma semana, o treinador do Sporting disse que tinha a melhor equipa do Mundo e perdeu em Paços de Ferreira, e depois disse que o Sporting era favorito em todos os jogos e perdeu em Alvalade. Não me surpreende que a melhor equipa do Mundo perca em Paços de Ferreira. O que acho verdadeiramente estranho é que Anderson Polga consiga ser titular na melhor equipa do Mundo.

OUÇO dizer que os jornalistas do Expresso captaram boas declarações de Pinto da Costa. Não li a entrevista, mas custa-me a crer que sejam melhores que as declarações que a Judiciária captou e ainda pontificam no YouTube. Sem querer beliscar o brio profissional dos jornalistas que, ao longo dos anos, têm entrevistado Pinto da Costa, é apenas justo referir que meia dúzia de polícias fizeram melhor jornalismo – e sem precisarem de colocar uma única pergunta. Quando se tem talento…

É impressionante o modo como Carlos Queiroz, um treinador cujas equipas praticam um futebol tão pouco emocionante, consegue despertar tantas emoções fora do relvado. Dificilmente se chegará a um consenso a propósito deste intrincado caso disciplinar. Quem tem razão? Queiroz? A brigada antidoping? As amostras de urina? É difícil dizer, sobretudo quando ainda ninguém concorda sobre a prestação de Portugal no Campeonato do Mundo. Foi boa ou má? É verdade que a Selecção só foi eliminada pela equipa campeã do Mundo, mas não é menos verdade que Portugal não consegui marcar um único golo a quartetos defensivos que não fossem formados por Ji Yun-nam, Ri Kwang-chon, Ri Jun-li e Pak Chol-jin. Todos os defesas que neste momento não se encontram em campos de trabalhos forçados revelaram-se intransponíveis para a estratégia ofensiva portuguesa. Sim, mas seria realista esperar que Portugal conseguisse a proeza sobre-humana de bater a Espanha? Bom, a Suíça conseguiu. Digamos que não era propriamente impossível. Creio que o grande problema da Selecção é que Carlos Queiroz só joga ao ataque nas entrevistas ao Expresso. No entanto, não sou daqueles que dizem que o futuro é negro. Se a federação conseguir arranjar maneira de suspender Queiroz até Agosto de 2012, julgo que Portugal tem boas hipóteses de se sagrar campeão da Europa.