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terça-feira, 29 de setembro de 2009

O diálogo de Sócrates e Cavaco



Silvia de Oliveira - Jornal I


Para mal do primeiro-ministro, esperemos que não do país, muita coisa mudou nestas eleições, da esquerda à direita.


Depois de duas semanas de uma campanha eleitoral capaz de fazer corar Cavaco, Sócrates e Manuela Ferreira Leite, pelo menos, e de uma noite eleitoral onde a maior emoção foi saber quem seria a terceiro maior partido no Parlamento, se o Bloco, se o CDS-PP, nada como uma série de números gelados para nos devolver à realidade. O reporte enviado ontem pelo INE a Bruxelas, não poderia ter saído num momento mais apropriado. No day after, segundo as contas do instituto nacional de estatítica, o défice orçamental deverá duplicar este ano, de 2,7% para 5,9% do PIB - um valor que coincide com a previsão oficial do Governo -, e a dívida pública degradar-se-á de 66,3% do PIB, em 2008, para 74,5%, no final deste ano. É que é esta a dura realidade, a de um país em crise apertado pela sua dívida - se se contabilizassem os encargos com as parcerias público-privadas e a dívida das empresas públicas, o peso da dívida pública no PIB não seria de 74,5%, mas antes acima dos 100%. Quanto ao défice orçamental, o inevitável.

Já dentro de dois meses, é esperada a primeira reprimenda da Comissão Europeia, através de um novo procedimento por défice excessivo. Ou seja, a exigência de um rumo para endireitar a prazo as contas públicas. E, mais uma vez, de nenhum consolo serve ao país que metade dos Vinte e Sete tenha o mesmo problema.

Não somos a Alemanha, aliás, a economia portuguesa só recuperará se antes a alemã sair desta crise.

Perante este cenário, a primeira pergunta para este governo é simples: como irá Sócrates, depois de uma vitória tudo menos "estrondosa", tudo menos "extraordinária", conseguir cumprir o seu programa eleitoral? Terá dinheiro para executar as medidas de apoio às empresas e às famílias, ao mesmo tempo que controla a vontade de desapertar o sufocante colete da disciplina orçamental? Terá determinação para avançar com as reformas e ainda a inteligência emocional necessária para envolver a Oposição numa governação de alto risco? No seu discurso de vitória, José Sócrates disse que esperaria agora pela indigitação presidencial do primeiro-ministro para iniciar as consultas com todos os partidos com assento parlamentar, numa "atitude de diálogo democrático". Muito bem.


Resta saber qual é o conceito de Sócrates para diálogo. As suas credenciais nesta área não são as melhores e também não são poucas as dúvidas sobre quão apurado será o sentido de responsabilidade dos seus vários interlocutores no Parlamento, de Paulo Portas ao futuro líder do PSD.

Para mal de Sócrates, esperemos que não do país, muita coisa mudou e ainda vai mudar, da esquerda à direita. Não se sabe, sequer, quem sucederá a Manuela Ferreira Leite no principal partido da Oposição. Ironicamente, o Presidente da República foi ate hoje, o melhor aliado do primeiro-ministro. Refém de uma história que não pode, não sabe ou não quer contar, Cavaco Silva sabe que assim, sem explicações plausíveis sobre o caso das escutas a Belém, terá de pensar duas vezes antes de incomodar o Governo.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A obra de Isaltino não é arte


http://www.ionline.pt/conteudo/16735-a-obra-isaltino-nao-e-arte


por Sílvia De Oliveira, Publicado em 05 de Agosto de 2009 Jornal “I”

Voltas e mais voltas à cabeça, algum esforço de projecção, mas é difícil, praticamente impossível, entender quem mantém o voto em Isaltino Morais, depois de conhecida a pesada sentença do Tribunal de Sintra. O presidente da Câmara Municipal de Oeiras e candidato a um novo mandato, nas eleições de 11 de Outubro, foi condenado, na primeira instância, a uma pena de prisão efectiva de sete anos e à suspensão de mandato. Mas mesmo assim, a actriz Eunice Muñoz vai voltar a apoiar a sua reeleição. Ficaram provados, também na primeira instância, os crimes de fraude fiscal, abuso de poder, corrupção passiva e branqueamento de capitais, mas tamanho veredicto também parece não importar ao capitão de Abril Otelo Saraiva de Carvalho. E, como estes, estão mais oeirenses.

Ora, é no mínimo estranho, que quem tanto se queixa do funcionamento da justiça e dos políticos, em muitos casos com razão, tenha um repente e fique cego, logo agora que a justiça está a funcionar.

Isaltino Morais vai recorrer para o Tribunal da Relação e a decisão deste colectivo de juízes até pode vir a ser contrariada. É importante repetir que ninguém é culpado até trânsito em julgado, mas também é bom sublinhar que, neste momento, o que existe é um duro acórdão. O recurso de Isaltino não rasga este documento. E o que está lá escrito, palavra por palavra, é que Isaltino Morais cometeu, não um, mas quatro crimes.

Mas, mesmo assim, uma parte dos que votam em Oeiras, ao que parece significativa, está empenhada em depositar outra vez a sua confiança em Isaltino Morais, patrocinando, através do voto, a sua gestão camarária. Como se a familiaridade e os jardins, as boas estradas e todas as coisas bem feitas em Oeiras pela equipa de Isaltino valessem mais que uma decisão de um tribunal. Como se a obra fosse o que mais importasse, independentemente do seu criador.

Mas no final de tudo, o que aqui está em causa é grave e revela, sobretudo, duas coisas: mais um voto de desconfiança na justiça e uma tolerância indevida com alguns políticos. Os que parecem ignorar a sentença, desejam que o tribunal tenha falhado, porque, talvez pensem que, no meio da mediocridade que aparenta reinar pelo reino do poder local, pelo menos Isaltino tem obra feita. Imagino que pensem qualquer coisa como abusos há por todo o lado, este já sabemos quem é, o que faz e bem. Que confortável. Pouco interessa de que forma a obra aparece feita e se existiram ou não envelopes de dinheiro pelo meio. Que estranhos são os que, neste momento, parecem não duvidar de mais nada, a não ser da justiça. Estão no seu direito apoiar a reeleição, arriscar uma conivência com práticas criminosas, como ficou, para já, provado em tribunal. Felizmente, nada nem ninguém proíbe, a não ser a consciência de cada um. Mas depois não se queixem da justiça e dos políticos, não se sentem nos bancos de jardim de Oeiras a falar da aparente impunidade de alguns. A obra de Isaltino não é arte, não é de artistas que falamos. Votar não é o mesmo que desfrutar de uma bela sinfonia ou de um grande filme.