Este blog surge a partir do módulo "Arte e Literatura: Humanidades Médicas I" do curso de Medicina da Universidade Federal do Ceará. O módulo tem por objetivo explorar, junto com as e os estudantes de graduação em Medicina, outras dimensões da práxis médica que não apenas as competências tecnológicas duras. Para isso, lança mão de recursos pedagógicos vivenciais e audio-visuais, trazendo elementos da Literatura, das Artes Plásticas, do Cinema, bem como das experiências pessoais compartilhadas pelas e pelos estudantes.
Apesar disso, hoje o blog não quer se definir. Aqui encontram-se estranhamentos e aleluias cotidianos de um contínuo tornar-se.
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terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Para não emudecer, ou epílogo de uma revolta


A boca seca, a voz rouca, abandonada de poesia.
Escrevo agora aos tropeções
joelhos sangrando.
Para lembrar que gosto tem
dizer.
Eu, que sempre silencio,
que me esgueiro e me esvaio entre os dedos.
Permaneço imóvel
Com um "sim" sufocado entre as mãos.
E a sede que nunca passa.
Que nunca reivindica.
Que se acostumou a não ter o que beber.
Recusa o copo que se oferece.
Sobressaltos.
Aceitar a sede me ressequiu até o sonho.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Fragmentos brutos para ser inútil


I.
Na escuridade aberta da madrugada, a lua branda me noturna.
Meu coração, nessas ocasiões, bruxuleia.

II.
Ao alçar da noite, São Paulo floresce feito um braseiro.

III.
Meu pai represou bondades. 
Gota-a-gota.
Outro dia, escorreu alegria líquida.
Brilhos.

IV.
Minha mãe tem olho de menininha.
Aponta o mundo e diz: olha! 
E tem gargalhadas de cheiros.
A folha seca de inverno não entendeu coisa alguma. Caiu dura, dura.

V.
De repente, compreendi com a pele uma confissão muda que se encontrava atravessada por tudo naquele lugar. Nos olhos das pessoas deitadas no grama, na conversa dos adolescentes embriagados de inflamações vitais, na mulher musgosa que tricotava no metrô. Foi assim: pendia de um mastro metálico que gritava de luz  uma longa e lenhosa trança de bronze que enraizou-se no chão, toda parada. A corda arvorecida era. Envolveu-me um frio silencioso.

VI.
Do alto das nuvens, olhando-se para o chão, veem-se andanças de caramujo.

VII.
Exercito minha miopia para ver melhor pimentinhas-rosa, broches, esqueletos de folhas e resto de cigarro jogado na vida. Tenho admiração por grãos de areia.

...

sábado, 9 de abril de 2011

Como se fosse Domingo à tardinha...


E existem também as alegrias mansas. Elas nos chegam assim tão macias e mornas quanto a lembrança de um abraço de avó. A alegria mansa não se localiza. Ela vem não se sabe de onde, e fica até a percebermos. Assim, descoberta, perde sua razão e evanesce. O instante mesmo em que o dedinho da criança toca a bolha de sabão. Sorriso bobo que não se sabe sorriso. Nomeado, já é outra coisa.

Só pode ter candura quem já sentiu a chegada doce e a despedida de uma alegria mansa. Ah! como dá saudade, meu Deus... Uma saudade sem rosto, sem nome, sem memória. Saudade que tateia o vazio entre eu e a leveza do mundo. O ar em minúsculos cachinhos escorre diáfano entre os dedos da mão espalmada à procura de quê. E, de repente, se ri por ter percebido que se estava a ponto de chorar só por causa do pôr-do-sol.

Nomeada, a alegria cala tudo. Depois de alegriazinha, fico assim silencioso por três dias, só escutando. É o corpo que escuta a vida. Passado o estremecimento, tudo volta à sua música caótica habitual. Poesia virou carne e sangue. Meu poema só pode ser escrito em braile.


terça-feira, 11 de maio de 2010

Ainda sobre a leveza

É que talvez as coisas tenham ganhado um tom solene demais por aqui... Não, essa não era a intenção. A idéia é apenas sentarmo-nos a uma mesinha para falarmos o que surgir, enquanto se toma café e se escuta, quem sabe, The Doors, ou mesmo Billie Holiday. No intervalo entre duas coisas. Às 16h. Sim, trata-se de viver a intensidade do hiato. E de sorrir, enfim - por que não?


"- Did you know he thought the world as a huge resonating box?
- What a beautiful idea, Jack!"
(Coffee and Cigarettes, 2003)