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quinta-feira, 10 de julho de 2008

Da série matérias não publicadas....

A seguir, trechos de uma matéria que escrevi há cinco anos antes de uma viagem de Lula à África e antes das eleições autárquicas em Moçambique. Pois bem, escrevi a matéria que seria publicada por um jornal de circulação nacional com sede em São Paulo. Tudo certo até o dia da publicação. O editor me avisa de última hora que não teria como me pagar pela matéria, mas que o espaço estava aberto se eu quisesse publicar o texto. @#$$%^^&&, pensei. E não publiquei não apenas pelo desrespeito profissional, mas também porque acho deplorável essa mentalidade de que é um favor que o jornal faz em dar espaço para uma matéria escrita a partir de Moçambique.
Cinco anos depois, aqui está. O assunto ainda gera polêmica.


Frelimo pode se beneficiar de visita de Lula

A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Moçambique às vésperas das eleições municipais que acontecem no país no dia 19 de novembro poderá beneficiar os candidatos da Frente para a Libertação de Moçambique (Frelimo), principalmente nas regiões onde o partido de oposição Resistência Nacional de Moçambique (Renamo) teve maior adesão nas eleições presidenciais anteriores. A Frelimo é o partido do presidente moçambicano, Joaquim Chissano, conhecido por sua linha ideológica de esquerda. A análise é do articulista político do jornal independente moçambicano Zambeze, Alberto Paulo Chissico.

O motivo, segundo ele, é que a vinda de Lula e de mais uma delegação de empresários poderá ser utilizada na campanha política que se iniciou na terça-feira passada em favor da Frelimo. Segundo a lei eleitoral moçambicana, somente 15 dias antes da realização da votação os candidatos podem começar a campanha eleitoral, com showmícios e a divulgação direta aos eleitores de seus planos de governo. Estima-se que mais de dois milhões de moçambicanos irão às urnas no próximo dia 19, nos 2.688 postos eleitorais espalhados pelo país. Em Moçambique, o voto não é obrigatório, e todas as pessoas com mais de 18 anos, que possuem título de eleitor podem votar.

“Os moçambicanos confundem partido político com atividade de estadista”, diz Chissico. “Por isso, não ficarei surpreso se a Frelimo usar a visita do chefe de Estado brasileiro a seu favor, instigando o povo a achar que a Frelimo, como partido político, é que é a responsável pela vinda de Lula e dos empresários, e dos conseqüentes investimentos e empregos que isso possa vir a gerar”, afirma ele, que considera a visita muito positiva para Moçambique do ponto de vista econômico. A Frelimo diz que a visita de Lula coincidiu com a proximidade das eleições, mas que não interferirá na campanha política.

Essas são as segundas eleições municipais no país. As primeiras, realizadas há cinco anos, foram boicotadas pela Renamo, maior partido de oposição, que alegou à época que a legislação para a formação dos 33 municípios do país apresentava algumas inconstitucionalidades. Sem concorrência, a Frelimo elegeu todos os prefeitos.

Dessa vez, depois de mudanças nas leis, a Renamo está disputando as eleições em 32 dos 33 municípios. Em Mocuba, município do estado Zambézia, na região central de Moçambique, o candidato da Renamo José Manteiga foi impedido de concorrer às eleições pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) porque apresentou atestado falso de residência.

Segundo o jornalista Rodrigues Luis, do jornal independente Savana, os candidatos da Renamo teriam mais possibilidades de ganhar as eleições na região central e em alguns municípios do norte do país, onde o partido recebeu maioria dos votos nas últimas eleições presidenciais, em 1999. A imprensa local tem divulgado pesquisas eleitorais que apontam vitória da Renamo em 14 municípios do país. Se as previsões se confirmarem, será uma derrota política para a Frelimo e um forte indicativo de que, no próximo ano, quando se realizam as eleições presidenciais, o partido que sempre governou o país terá dificuldades para continuar no comando.

Oposição tem receio

A passagem de Lula por Moçambique tem motivado o ressurgimento de boatos sobre uma possível fraude nas primeiras eleições presidenciais em Moçambique, realizadas em 1994. Na ocasião, um instituto de pesquisa brasileiro foi contratado pela Frelimo para fazer as pesquisas de intenção de votos dos moçambicanos. Em todas as regiões, as pesquisas apontavam uma vitória esmagadora da Frelimo contra o candidato da Renamo, o que não se confirmou nas urnas em várias cidades.

Segundo a Renamo, o instituto de pesquisa brasileiro teria fraudado as pesquisas, o que teria ajudado a levar a eleição de Joaquim Chissano para a presidência do país. Em troca da contratação da empresa brasileira e da suposta fraude nas pesquisas, o Brasil receberia facilidades e benefícios para a exploração de alguns setores em Moçambique.

“Espero que a visita de Lula não seja uma opção política, mas econômica, de cooperação”, diz o dono de uma empresa de comércio de camarão vivo, Mario Barbito. “Se ele vem como camarada, a visita fica vazia. Que venha como presidente brasileiro. O interesse é de todos em ampliar os laços de cooperação entre os dois paises”, completa ele, que estuda a possibilidade de fechar um acordo com uma empresa brasileira na área de aquacultura.

Nas duas eleições presidenciais realizadas no país, em 1994 e em 1999, a Renamo alegou fraudes nos resultados, que deram vitória a Frelimo. Em 1999, o partido de oposição submeteu um recurso ao Tribunal Supremo na tentativa de invalidar os resultados das eleições, mas o recurso foi julgado improcedente.

Inconformada com os resultados, a Renamo liderou manifestações populares em todo o pais, que resultaram com a morte de policiais. Vários suspeitos de terem participado dos protestos foram detidos arbitrariamente, e 200 deles morreram numa cela por asfixia.

O presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, afirma que não vai tolerar mais fraudes. Em caso de fraudes, ele diz que a Renamo irá governar mesmo que oficialmente não seja declarada como vencedora.