sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

À espera de um eclipse




Quando ouvi tua voz pela primeira vez, uma explosão de silêncios me fez entender que nunca mais eu seria a mesma pessoa. Teu rosto veio depois, por detrás do tumulto das nuvens que anunciavam um temporal. Não, não foste como a primeira paixão, platônica e ansiosa, foste o pasmo essencial dos desesperados que correm no meio da tempestade sem saber aonde ir. 


Passei anos de janela aberta para as estrelas,  procurando as constelações em que te escondias. A cada encontro, um véu caía, e tua nova face refazia todos os percursos e me enredava num amor novo que, eu sabia, era o mesmo, só que travestido de realidade. Da realidade que revelava tuas imperfeições e te tirava do céu, mas te trazia à terra e nos aproximava.

À espera de um eclipse, dormi muitas vezes em braços que não eram os teus. Depois os esquecia e deixava o tempo reacender teu cheiro até tua voz me chamar pelo nome, o nome de estrela que me deste antes de me perderes entre os rascunhos dos teus poemas. 

Descobri, tantos anos depois dessas idas e vindas, que a matéria de que foi feito nosso amor não se desintegra. Repousa invisível, mas sempre desperta na carnação dos sentidos, mesmo quando, na atonia dos desesperados que correm na tempestade, não sabe exatamente aonde ir, mas vai. E sempre nos encontra à espera um do outro, como na primeira vez em que nos vimos. Como na primeira vez em que ouvi a tua voz e uma explosão de silêncios me ensurdeceu para o resto do mundo.




Aíla Sampaio  

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