Ele veio sem aviso.
Do nada.
Eu não conhecia o som
Daquele silvo no ar…
E depois a dor, o prazer.
Agora conheço o som
Do novo brinquedo.
Agora sei
Quando ele vem
O silvo vem como um arauto
E Te peço mais… mais…
por {rianah}·····Lestat
Em uma recente conversa com uma amiga, surgiu o tema SSC, sobre o qual discordamos em alguns aspectos...
Levando-se em conta que existe uma evolução, que buscamos por ela, não seria, então, a hora de revermos nossos conceitos, perguntarmos quais das técnicas BDSM são, mesmo, 100% seguras e livres de risco, e o quanto há de consensualidade e sanidade em nossas práticas? E quanto à co-responsabilidade do bottom?
O texto a seguir, originalmente em inglês, é de Gary Switch, que propõe o conceito RACK ao invés do SSC, tão colocado por nós até agora como lema e bandeira do BDSM. Eu proporia o RACK como complemento do SSC...
ORIGEM do RACK: RACK X SSC
por Gary Switch
“Nada é perfeitamente seguro. Atravessar uma rua não é perfeitamente seguro. Lembrem-se que tecnicamente falamos de “sexo mais seguro” e não “sexo seguro”. Se quisermos limitar o BDSM ao que é seguro, não faremos nada mais radical do que chicotearmos alguém com um espaguete cozido. Escaladores de montanhas não chamam seu esporte de “seguro”, pela simples razão de não o ser; o risco é parte essencial da emoção. Eles administram isso identificando e minimizando o risco através do estudo, treino, técnica e prática. Acredito que este método funcionará melhor para nós, BDSMistas, do que afirmar que o que fazemos é seguro. Queremos fomentar a noção que desenvolvemos especialização, que para fazer o que fazemos do modo correto preciamos de habilidades desenvolvidas através de um processo similar de educação, treinamento e prática.
A negociação não pode ser válida sem o prévio conhecimento de possíveis riscos envolvidos na atividade que está sendo negociada. “Risk-aware” (consciente do risco) significa que ambos os lados da negociação estudaram as atividades propostas, estão informados sobre os riscos envolvidos e concordam no modo de como administrá-los. Daí “risk-aware” ao invés de “seguro”.
A parte “Sã” do SSC é muito subjetiva. Quem dá as cartas? A pessoa A pode pensar que fisting não é são; as pessoas B e C podem gostar muito disto. “São” sempre me lembra o slogan da campanha do velho show Smothers Brothers, a favor de Pat Paulsen: “Vote em Paulsen; ele não é insano!” Se ficarmos constantemente reafirmando a todos que você não é louco, vão começar a desconfiar.
Já ouvi “São” ser interpretado como “capaz de distinguir fantasia da realidade” e “não intoxicado”, ambos válidos, apesar desta última definição ser similar à citada acima – não ficamos reafirmando constantemente que não estamos bêbados, tão pouco.
“Consensual” é a essência, implica negociação, a qual implica ter a capacidade de distinguir fantasia da realidade, como também lidar responsavelmente com fatores de risco. Se você desconhece os fatores de risco, ou não sabe o que vai acontecer na realidade, então não sabe discernir no quê está consentindo. Uma negociação significativa tem sempre que acontecer no senso comum da realidade consensual.
A parte “kink” (perversão, tara) entrou para que ficasse um acrônimo interessante e porque SSC não nos diz sobre o quê você deveria ser SSC. Seria a Pesca de Truta Segura, Sã e Consensual? Fazer alusão ao rack, um instrumento de tortura, foi criticado, mas para mim isto significa nossa transformação de atrocidade em êxtase, e é admitir que apesar de gostarmos de algumas fantasias obscuras, nós as realizamos sem causar danos.
RACK é admitidamente mais confrontacional que SSC. É desafiante, do mesmo modo que a comunidade GLBT usa o termo “queer” (estranho). RACK nos permite a liberdade de termos fantasias que não sejam PC (politicamente corretas). Muitos de nós não apreciam fantasias não-consensuais, tanto Tops como bottoms? Nós as apreciamos em nossa literatura; podemos muito bem apreciá-las enquanto as colocamos
A relação D/s é a troca de poder existente entre Top e bottom, a nível psicológico, onde a submissa entrega ao Dominador o poder de decisão sobre sua vida, e Este toma as rédeas para guiá-la . O quão longe isso pode ir vai depender do nível de confiança, necessidade intenção e, ouso dizer, amor de cada uma. Esta entrega é independente de dor, cenas, qualquer contato físico, uma vez que se dá no âmbito da interação intelectual. (SM é apenas uma parte da relação D/s.)
A motivação do Dominador se dá através do desejo da submissa de se entregar ao controle do Dominador. Ela, por sua vez, é motivada pelo desejo de agradar e se render a Ele. É uma via de duas mãos, uma troca.
Todas as atividades encontradas numa relação D/s dependem das necessidades e negociações entre os envolvidos, sem nunca se esquecer que a base disto deve ser o SSC (São, Seguro e Consensual). A submissa é responsável por encontrar o parceiro Dominante que tenha idéias compatíveis com suas expectativas, para entregar a Ele sua submissão e respeitar, posteriormente, Suas decisões. Ele, por sua vez, será o condutor da relação, exigindo sempre a obediência de sua sub, pois o Dominador SEMPRE agirá e tomará decisões para o benefício e crescimento dela.
por {rianah}·····Lestat
Este documento tenta descrever os diferentes estágios que uma pessoa, de um modo geral, atravessa quando desenvolve sentimentos e emoções relacionados à troca de poder erótica (normalmente chamada de BDSM ou SM). Esta teoria de estágios é baseada em algumas pesquisas científicas feitas a respeito de BDSM e/ou sadomasoquismo, entrevistas com BDSMistas e discussões entre membros do grupo de discussão Maledom (Internet).
Sentimentos e emoções referentes ao BDSM são frequentemente descobertos bastante cedo (às vezes na pré-adolescência), apesar dos mesmos poderem emergir ou se desenvolver mais tarde também. Com muita frequência as pessoas descobrem estes sentimentos depois de passarem por um período difícil em suas vidas, como um divórcio. Isto porque provavelmente tais eventos fazem com que as pessoas se auto-avaliem e avaliem o ambiente à sua volta. Uma vez que o contexto é o BDSM, estes sentimentos sempre têm conotações sexuais e podem coincidir com o desenvolvimento geral da sexualidade do indivíduo.
É essencial neste estágio que estes sentimentos não sejam nem explicitamente dominadores ou submissos, mas relacionados à troca de poder. Sentimentos dominadores e submissos podem – e provavelmente vão – existir próximos uns dos outros na mesma pessoa e vão certamente – exceto para aqueles que nutrirão gosto por ambos os aspectos (switchers) – encontrar sua direção.
Ninguém é 100% dominador ou 100% submisso. O que evolui é uma tendência a crescer em direção a uma das pontas da escala, seja ela dominadora ou submissa. O tamanho destes sentimentos dominadores ou submissos podem eventualmente diferir de pessoa para pessoa. Não está claro o que causa exatamente a diferença no desenvolvimento, apesar de aspectos como educação, liberdade de pensamento, criatividade, background familiar e religião serem influentes. Infelizmente, às vezes, histórico de abuso também é um fator. O primeiro estágio é muito frequentemente marcado pela incerteza.
A incerteza adicionada a fatores sociais normalmente levam ao medo de alguns sentimentos e emoções e podem acarretar a períodos mais curtos ou longos de reclusão. Mais uma vez, a criação, religião e educação são os fatores influentes aqui, combinados com o tabu social, a falta de informação sobre o assunto, legislação desnecessariamente limitativa, preconceito social, estereotipagem e um enorme vazio na educação sexual geral.
Tanto Dominadores quanto submissas neste estágio têm a idéia de que são os únicos que possuem estes sentimentos e em quase todos os casos não falam (ainda) sobre eles. Alguns buscam ativamente informação, outros, apenas escondem, e ao mesmo tempo, secretamente nutrem seus sentimentos. Para a pessoa envolvida, os sentimentos não são identificados como “errados”, e sim como positivos e especiais e principalmente “muito próprios dela”. No entanto, há um conflito direto com os aspectos gerais sociais e legais e o comportamento politicamente correto.
Não é esperado que uma mulher, na sociedade moderna, seja submissa ou fraca e estas que nutrem fantasias de estupro, sequestro, etc serão vistas com frequência por outras mulheres como um perigo para o gênero. Na verdade, é questionável se as pessoas as veriam desta maneira, mas a própria pessoa pensa que é vista deste modo – na maioria dos casos. O homem, por outro lado, que não deve bater em sua esposa ou namorada, frequentemente terá medo de ser marcado como um monstro ou um sádico.
Mesmo quando mantém suas fantasias para si próprias, as pessoas começam a experimentar, em muitos casos com elas próprias, ativamente incorporando tanto o papel dominador quanto o submisso. Começam a procurar mais informação. Na maioria das vezes, estas “informações” são fortemente relacionadas às suas fantasias (por ex. procurando por livros e histórias sobre elas, como também imagens).
Este é normalmente o estágio onde a pessoa descobre que existem outros semelhantes a ela. Se não é possível contatá-los diretamente, a linha geral de pensamento é “deve haver mais, de outro modo, não escreveriam estes livros, revistas, histórias e não fariam estes desenhos, fotos e vídeos”. Descobrir que outros têm os mesmos sentimentos é um alívio para a maioria das pessoas neste estágio, mas às vezes também é, ao mesmo tempo, assustador. Por esta razão leva-se um tempo antes que se procure por outros para conversar ou por um parceiro.
Na verdade, o Estágio 3 normalmente dispara o Estágio 4, onde se inicia uma busca ativa por outros que compartilhem os mesmos sentimentos, ou tenham esta intenção. Se isto acontece em uma relação já existente, o maior problema para a pessoa envolvida é o risco que se corre, uma vez que é possível (e muitas vezes acontece), da relação se acabar. É tido como fato que por causa dos riscos envolvidos algumas pessoas tendem a parar seu desenvolvimento aqui e voltam a nutrir seus sentimentos
A pessoa envolvida prioriza em excesso estes sentimentos, colocando-os acima de todos os outros aspectos de uma relação e os super-idealiza ao mesmo tempo;
As pessoas têm problemas por um longo período com o equilíbrio na vida cotidiana, tentando ser uma pessoa uma hora e outra pessoa em outra hora. É sabido que especialmente as submissas têm problemas com seus diferentes papéis como mães, profissionais e submissas;
Outro problema, especificamente para as submissas, é priorizar ideais. Por um lado querem ter auto-confiança e ser fortes. Por outro, existem emoções submissas, que parecem estar em conflito direto com isso.
Estes problemas de prioridade, especialmente o "priorizar em excesso", levam às vezes ao desaponto e à desilusão, como por exemplo não encontrar um parceiro ou forçar esta prioridade ao parceiro existente ou cônjuge. Submissas neste estágio às vezes são muito vulneráveis a uma relação abusiva, devido à ênfase exagerada de suas tendências BDSMistas.
Neste estágio muita informação foi coletada, coisas foram experimentadas e de alguma maneira um parceiro, ou outros para compartilhar, foram encontrados. A pessoa envolvida começa agora a compreender o que está acontecendo em sua mente.
Um fator de grande importância aqui é que somente agora (e o processo descrito nos diferentes estágios até agora podem levar anos) a pessoa será reconhecida pela comunidade BDSM, caso ela decida entrar nesta comunidade. Será imediatamente identificada como “novata”, quando, na verdade, já é bastante experiente com emoções de troca de poder e lhe falta apenas experiência “pública”.
As desilusões do Estágio 4 são agora uma parte da curva de aprendizagem. Usamos o plural aqui, porque a maioria dos BDSMistas passam por mais de um relacionamento (às vezes alguns bem curtos em duração) e outras experiências BDSM antes de encontrar o parceiro e o ambiente certos.
Pode haver um parceiro disponível neste momento, porém, é hora dos parceiros alcançarem o mesmo nível de informação e compreensão e ambos agora têm de identificar seu “lugar comum”. Para os que estão sem parceiros é o momento de lamber suas feridas dos estágios anteriores e recomeçar a busca por um parceiro, desta vez, melhor equipado.
Este é o infindável estágio onde a relação realmente vai florescer através da experimentação e aprendizagem
Tanto Dominadores quanto submissas passam por estes estágios, apesar de que as experiências individuais podem ser diferentes da figura geral, descrita aqui. As pessoas podem pular estágios, e estes também podem ser combinados ou misturados.
Os estágios normalmente não têm início ou fim definidos. Em geral, flui-se de um estágio para o outro. Também não há idade específica, onde as pessoas desenvolvem os sentimentos BDSM. Isto tanto pode começar cedo, aos 5 anos de idade, como aos 55 ou 60. Adolescentes normalmente passam por um período de experimentação sexual. BDSM pode fazer parte disso, mas esta não é, de maneira alguma, uma indicação de que a pessoa envolvida desenvolva sentimentos BDSM no curso de sua vida.
Não há uma duração específica para os estágios. O processo todo pode durar anos e algumas pessoas – devido a circunstâncias e habilidades pessoais – atravessam certos estágios mais rapidamente que outras. A quantidade de acesso à informação e a habilidade que se tem de encontrar tal informação é vital à velocidade do desenvolvimento. Desilusões prematuras e abuso podem trazer conflitos extras e demandam mais tempo em certos estágios.
Nem todas as pessoas passam por todos os estágios. Algumas param de seguir seus sentimentos/interesses BDSM e não dão continuidade a esse desenvolvimento. Às vezes, este é o fim do BDSM para elas, e às vezes isto pode marcar apenas uma interrupção, com a continuidade meses, anos ou décadas mais tarde. Medo ou (temporariamente) não ser capaz de superar o tabu social e problemas gerais relacionados são frequentemente razões para isso.
Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel
Não saber se se ausenta ou se te espera.
Aflição de te amar, se te comove.
E sendo água, amor, querer ser terra."
Hilda Hilst