quarta-feira, 28 de setembro de 2011
O dia em que a Morte visitou o Jornal Impresso
- A Morte. Nunca ouviu falar?
- Porra, claro que sim. Mas por que hoje, agora?
- Porque é a sua vez, ora. Todo dia visito alguém.
- A senhora vai me desculpar, mas hoje eu não estou pra brincadeira.
- Posso ao menos entrar? Podemos conversar com civilidade?
(Minutos depois, ambos tomam um café na sala)
- Sabia, dona Morte, que a senhora já me visitou antes?
- Ah, é? E quando foi? (colocando o adoçante)
- Quando inventaram a televisão.
- Mas isso faz muito tempo. Devia ser outra Morte. Eu estou no ramo há 15 anos apenas.
- Que seja. Mas era a Morte. A televisão vai acabar com você, me ameaçou. Hora de ir, de descansar. E cá estou eu, vivinho da silva.
- Eu não vim aqui para discutir o passado. O que me importa é o hoje. E hoje eu tenho ordens para te levar. Entendo que ninguém quer ir, mas é o meu trabalho.
- Pior que até sei a justificativa desta vez.
- A razão está aqui, no mandado de busca.
- Então, leia. Só para confirmar minha suspeita.
- Causa: pre-fe-rên-cia do pú-bli-co pela no-tí-cia na in-ter-net.
- Putz, que falta de originalidade! A velha história de que uma nova tecnologia de comunicação vai decretar o meu fim.
- Já disse, só cumpro ordens.
- Lamento, mas a senhora se deu mal. Pode acabar o seu café, levantar e ir embora.
- De mãos vazias, eu não saio.
(Silêncio)
- Bom, dona Morte, podemos negociar então?
- Podemos, mas não me venha com a merda do jogo de xadrez que isso é a coisa mais clichê que existe.
- Claro, sem jogo de xadrez. Também sou contra o clichê, embora viva cheio deles.
- Quero que você me dê três bons motivos para não ser levado. Se forem convincentes, deixo você viver por mais um tempo.
- Três?
- Isso, só três.
- Mas assim, pá-pum, sem pensar?
- Pá-pum! Estou dando a você a chance de salvar essa sua pele cheia de tinta. E não vale falar do feirante que enrola peixe, ok? Isso não é argumento.
- Bom, senhora Morte, digo que aceito sua proposta, mas peço 24 horas para responder. É justo, não? Quero fazer a coisa bem-feita.
- Amanhã à tarde, estou aqui. Sem atraso.
(E a Morte foi embora. Mal fechou a porta, ele correu para o escritório, abriu seu notebook e tratou de jogar a frase “razões para o jornal impresso não morrer” no Google)
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
Alguns tipos de jornalistas “high-tech”
Patrícia decidiu ter um blog, afinal todos os seus jovens amigos jornalistas tinham um blog. Ouviu alguém dizer – aliás, quem mesmo? – que o jornalista hoje tem obrigação de ter um blog. Seu primeiro dilema foi: o que escrever? Descobriu que não tinha nada de interessante para escrever, mas isso não inibiria sua empreitada. Como não arrumava emprego mesmo, até que não era uma má idéia ter um blog. Decidiu que seria uma página opinativa. Comentaria sobre tudo, política, cinema e até futebol, mesmo sem entender do assunto. O diferencial seria o tom polêmico. Ouviu alguém dizer – quem mesmo? – que jornalista tem de ser provocador. Apenas as suas duas melhores amigas leram seu primeiro post – o impacto do fenômeno Lady Gaga na determinação da sexualidade das futuras gerações. Acharam o texto meio sem nexo, mas Patrícia considerou a discordância saudável. Empolgou-se tanto com o blog que, além de opiniões diversas - e muitas vezes sem nexo -, criou um canal para divulgar, “em primeira mão”, notícias que chupa dos grandes portais.
Eduardo gaba-se de ter rompido com o primitivismo das clássicas ferramentas de trabalho de um jornalista. Coisas de velho. É um jornalista impregnado de tecnologia. Novos tempos, enfim. Aboliu o bloquinho de anotações e a caneta, que lhe eram completamente inúteis. Nunca saía da redação para fazer reportagens mesmo. Bloquinho pra quê? Sua praia é outra. Manja tudo de softwares de edição de texto, de fotos, de vídeos. Vive falando de podcasts, webcasts, novas plataformas, redes sociais. E nisso é bom mesmo, melhor do que qualquer um na redação. Até que num dia o editor convocou Eduardo para uma força-tarefa nas ruas. Participaria de uma grande cobertura, deveria entrevistar gente comum. “Mas como se entrevista gente de verdade?” O editor lhe deu algumas instruções rápidas de como fazer uma apuração minimamente decente e, por fim, acrescentou: “preste muita atenção nas pessoas, nas coisas ao redor. Observar é muito importante. E quer saber? Ao vivo é bem melhor do que pela webcam!”.
quarta-feira, 15 de abril de 2009
Quem tá preocupado com a crise?
A exploração do mundo das celebridades ganha, a cada dia, mais espaço em nossa mídia. Falo, particularmente, dos sítios de fofoca, que se proliferam aos montes pela internê. Abordam, em geral, temas de grande relevância para a humanidade, como as novidades das novelas, festinhas de jogadores de futebol com travestis ou a separação de algum casalzinho de famosos. Tudo com muito glamour, é claro.
São alimento para leitores que adoram bisbilhotar a vida alheia ou, simplesmente, buscam algum assunto interessante para debater na casa da sogra, durante o almoço de domingo. Eu adoro os flagras de atrizes gostosas que vão sintetizar a vitamina D de seus corpos em alguma praia carioca. Não me prendo muito aos textos. Valorizo mais as fotos dos paparazzi.
Em época de crise, a mídia da fofoca é a salvação dos artistas que chafurdam no limbo. E dos jornalistas desempregados também. Hoje em dia, qualquer subcelebridade tem um assessor de imprensa, que não precisa de muita criatividade para gerar pautas. Mas deve ser um porre escrever um release sobre a morte do cachorrinho de uma mulher-fruta ou sobre o novo corte de cabelo de uma apresentadora decadente de TV.
E como sofrem nossos coleguinhas que trabalham nestes sítios! É cruel manter um contato mais inteligente com muitos dos entrevistados. Eu, que já atuei na imprensa esportiva, não sei o que é pior: conversar com um jogador de futebol ou uma celebridade que agoniza.
- Tá sumido?
- Pois é, tô dando um tempo, estudando muito...
- Projetos?
- Tô com um projeto bárbaro que deve rolar em breve, mas, por enquanto, é segredo, não posso revelar... Brasil, me aguarde!
- E TV? Quando vai voltar a fazer?
- Você sabe que TV é tudo, é onde eu fico mais à vontade. Tô esperando convites...
Os sítios de fofoca fomentam discussões filosóficas. Será que o Max, o novo milionário do BBB, é viado? Teria Alexandre Frota desistido mesmo dos filmes pornôs? Adriano, o Imperador, cheira ou não cheira quando sobe o Morro da Chatuba? E tem gente que ainda está preocupada com a crise econômica mundial.