Não me digas que isto são voltas do coração, coisas do peito, porque eu também tenho um. E as voltas que o meu dá são círculos infindáveis no teu nome, no teu cabelo ruivo e na tua voz alta. Não digas que isto são coisas do coração e voltas do peito porque há ruído crepitante das linhas e eu entretanto desligo.
terça-feira, 31 de março de 2009
Três é multidão.
segunda-feira, 30 de março de 2009
O jovem Ferreira - capítulo I.
domingo, 29 de março de 2009
sábado, 28 de março de 2009
Promessas e telefonemas.
Passaram-se horas, os ponteiros do relógios tontos em volta de um mesmo círculo.
Prometeu ligar e passaram-se horas, pobres ponteiros do peito.
Ligou antes ainda de o dia acabar, já os ponteiros tacteavam derrota.
A sua voz morna e alegre compensou toda a espera, círculos intermináveis em volta de uma mesma agonia.
Podia ter-me dito apenas Boa noite, e teria bastado. Teria compensado a agonia de quase provar a derrota, o medo de ser esquecida. Porque a sua voz é morna e alegre e teria, então, uma boa noite. Porque ligara - não se esquecera.
Hoje talvez lhe ligue eu, para lhe desejar um Bom dia.
Quem sabe se não terá também ponteiros tontos esperando ouvir a minha voz, num peito morno e alegre, temendo derrota ou esquecimento.
sexta-feira, 27 de março de 2009
quinta-feira, 26 de março de 2009
O amor é para tolos.
Atrás de mim um rapaz novo, bem parecido e respeitável, pousa suavemente a mão no meu ombro. Um papel pequenino voa dos seus dedos para o meu colo, não me assusto: a força do hábito que nos predestina deixa um travo a deja vu no estômago, no céu da boca. Desdobro o papel pequenino até ser quase do tamanho da palma da minha mão: «Não tenhas medo, eu vou aqui.»
O meu primeiro pensamento foi para o meu ex-namorado. Pagava para ver a cara dele se soubesse que sou assediada por um homem com idade que baste para ser meu pai e ainda protegida por um rapaz novo e de carácter físico que baste para o tornar interessante. Sorrio, pagava para ver. Sacudo pensamentos menos felizes, o meu ex-namorado não deve ter destes momentos fugazes, e tiro uma caneta da carteira: «Não tinha, mas podes ter tu - eu vou aqui.»
Entrego o recado disfarçadamente, enquanto brinco com os caracóis que o rapaz novo, bem parecido e respeitável, fita. Cai-lhe no colo, adivinho-lhe o sorriso.
Na próxima paragem o senhor no banco ao meu lado, salivando obscenidades, levanta-se e leva consigo as suas preces indecentes. Olha-me de relance à saída, de novo a minha cara voltada.
Está calor e vamos, para não fugir ao hábito que nos predestina, à pinha. Um rapaz novo, sentado nas minhas costas, levanta-se e traz consigo o seu carácter físico, o meu papelinho dobrado em quatro. Senta-se do meu lado e sorrimos os dois.
Não escolhemos a paragem do amor, não somos tolos - mas sorrimos os dois como se o fossemos.
quarta-feira, 25 de março de 2009
Alma e castigo.
Fumo pausadamente, pouso as chaves de casa no degrau da entrada. Está frio e o fumo aquece-me o peito, num peso que não se sei se extenuante se relaxante. Acendo um outro, a ver se descubro, se extenuante se relaxante, e de novo o sedimento no peito. Oh, antes pudesse consolidá-lo, ao peito, fumo como sedimento..
Talvez se tenham passado horas, entre o meu primeiro cigarro e a chegada atabalhoada da vizinha. Esfolou o carro nas beiras do passeio, trancou-o três vezes e das três vezes deixara um filho lá dentro, trancado com um clique à distância. Assisto à cena do meu degrau da entrada, fumando pausada e apaticamente. A vizinha recolhe a catrafada de miúdos que concebeu sabe-se lá por que alma, por que castigo, atiça-me um olhar que, antevejo, condenador. Não a culpabilizo, tem uma catrafada de miúdos para criar e não sou exemplo para nenhum, nem vivendo ali ao lado, sabe-se lá por que alma ou por que castigo. Tranca o carro uma quarta vez, já os miúdos berram que não querem ir para a cama, chega-se ao muro de cimento que separa a sua casa da minha e fala-me num tom condescendente e cansado: Isso vai matá-la, menina.
Fumo pausada e apaticamente, brinco com as chaves de casa pousadas no degrau da entrada.
- Amanhã deixo.
- Diz isso desde Fevereiro..
- Ainda só estamos em Março.
- Fevereiro do ano passado, menina.
Apago o cigarro e encaro-a, à mulher que perde tempo com uma estranha vizinha em vez de ir cantar músicas de embalar aos miúdos - são cinco, reparo agora.
- Não a condeno. A menina fuma, eu procrio canalhada.
Rio-me secamente - perdi vivacidade há tanto, reparo agora.
- Sabe-se lá por que alma.
- Sabe-se lá por que castigo, menina, e que castigo..
Que castigo, minha senhora, que não deixa o peito consolidar da mágoa, do despeito, das noites sofridas, do frio. Que castigo, qual sedimento pesado, sufocante. Extenuante, descubro.
Acendo um cigarro e a noite apaga-se na faísca de nicotina ardendo. Parece silvar, numa linguagem assobiada que me entreterá no que resta da noite escura. No que resta de mim, minha senhora, e do meu peito silvando.
terça-feira, 24 de março de 2009
segunda-feira, 23 de março de 2009
Esperei. E nada aconteceu.
Amanhã vou acordar e instintivamente alçar o braço para o outro lado da cama, como se lá estivesses. Sei que vão estar apenas lençóis mas abraçarei o vazio, como se a ti te abraçasse. Alisarei a cama, tomarei banho timidamente, como se tomasses banho comigo. Secar-me-ei rápido, vou até vestir as tuas cores preferidas, a túnica que me trouxeste de Paris, seda como os meus lábios pintados de um rosa pouco forte, um pouco brilhante. Entrarei no carro sem pousar a carteira no banco da frente, como se lá fosses tu. Vou esperar-te à porta, pelos espelhos do carro também. Mais um dia no escritório e continuarei distante, assustada, olhando por cima do ombro. Esperar-me-á em casa (somente) o divã. De ti, (somente) molduras já velhas.
Sei que não vais voltar...
domingo, 22 de março de 2009
sábado, 21 de março de 2009
quinta-feira, 19 de março de 2009
As palavras que nunca te direi.
quarta-feira, 18 de março de 2009
terça-feira, 17 de março de 2009
EU ODEIO ACORDAR CEDO.
Amanhã o café das dez fica por minha conta, companheiros -
segunda-feira, 16 de março de 2009
Pipocas, uvas e salmão pelo pequeno almoço.
domingo, 15 de março de 2009
sábado, 14 de março de 2009
Lençóis solitários, noite fria e o peito de luto.
As noites são mais escuras desde que partiste, adormecer é sempre um suplício agora.
sexta-feira, 13 de março de 2009
duas mãos, uma Só.
Hoje consegui sacar «Anatomia de Grey» sem te pedir ajuda. Não te mandei mensagem quando os olhos vibraram inchaço vermelho, chorando berros loucos e altos. Olhei-me ao espelho sem ter de te perguntar se (ainda) me achas bonita. Até falei de ti sem deixar que o peito dilacerasse mercúrio penoso. Não foi fácil.
Mas o difícil, a mim, não me assusta.
Afinal, sou esquerdina, filha de filhas do Diabo e cruzo, pelo amanhecer, travessias onde moram letras e morrem as ciências. Morrem as ciências, porque não as há, neste bairro que é a vida.
quinta-feira, 12 de março de 2009
Amor de ouro e de ferro.
Que promessas de reinos e de minas
quarta-feira, 11 de março de 2009
Estádio do Dragão, 19h40.
domingo, 8 de março de 2009
Novidades nada, tudo na mesma.
sexta-feira, 6 de março de 2009
Irmãos e Irmãs.
(A minha porta está sempre aberta, a minha mãe tem sempre dois beijinhos e um caldo de sopa quente, copos e sumos com gás. E terei sempre este sentimento encantado.)
quarta-feira, 4 de março de 2009
Desaparecida.
Passei vinte anos à procura da felicidade.
Procurei-a nos lençóis com amantes fervorosos, beijando-me o umbigo e prometendo amores mais que perfeitos. Subi à Torre dos Clérigos para berrar ao Porto que estou viva, que tenho sede e garra, que falo rápido porque vírgulas atrapalham e pontos finais chateiam. Exclamei suspiros em Coimbra, procurei esplendor na capital, comprei bolinhos de ovos moles em Aveiro. Fotografei metade do globo, sonhei com o resto do mundo que escapou à minha lente. Um fim de semana fiz as malas, quis descobrir-me e regressei a casa antes do alvorar de terça, chorei sozinha na cama. Acampei em tocas remotas, dancei com pavões franceses e mergulhei mãos em canais vienenses. Toquei no pólo norte com a ponta dos dedos dos pés e nadei nua no Mediterrâneo, há muitos, muitos anos - e bebidas a mais. Aprendi árabe com a diligência com que um marroquino me impingiu um turbante no deserto do Sarah e atropelei uma rena na Finlândia. Fui procurada pela polícia italiana, qual filme de segunda, e desde então não vejo a Ponte dos Suspiros senão em fotografias. Fumei nas Caraíbas e perdi uma manhã de praia em Miami no aeroporto local. Fui a melhor amiga da insónia durante uma semana inteira e adormeci de pé no chuveiro. Procurei conforto em promessas furadas, desabonei amizade em tardes solitárias e telefonemas por atender.
Procurei a felicidade pelo globo fora, lente captando momentos fugazes.
Olhos que choraram desespero, frustração, carências de alma. Procurei-a, sim.
Vinte anos depois, encontrei-a.
{E o mundo inteiro não será suficientemente grande para os nossos corações (em demasia). Não que o conheça por inteiro - como vos conheço a vocês - mas garanto-vos que não vos fará sombra.}