terça-feira, 31 de março de 2009

Três é multidão.

Estás a brincar? O que é que isso quer dizer? Sou demasiado correcto? Não ter ciúmes é mau? Confiei em ti! E tive-os, mas não tos mostrei, não te fiz cenas! Querias que as tivesse feito?! Estás a brincar, não estás? Como é que me ligas para dizer coisas destas?! Não digas mais nada, por favor. A não ser que estejas a brincar. Estás?
Do outro lado da linha um silêncio crepita entre o ruído de fundo das linhas. Sei-a respirar, adivinho-a sentada na beira da cama, uma mão segurando o telemóvel, outra puxando o cabelo ruivo para trás da testa, cotovelo apoiado num dos joelhos. Se isto fosse, de facto, uma brincadeira seria, mais a mais, uma de mau tom e grado. Mas não, ela não se calaria assim, rir-se-ia e poderia, então, adivinhar a sua mão livre do telemóvel gesticulando em vez de segurar a cabeça, o cabelo ruivo para trás num gesto nervoso e irrequieto.
- Estás a brincar?
Responde-me, cortando o silêncio crepitante: Não, desculpa.
Nervoso e irrequieto, desligo o telemóvel e sento-me na beira da cama. Levo as duas mãos à cabeça, a cara escalda-me nas palmas das mãos. Rastejo pela casa, do quarto ao quarto do banho, apoio-me no lavatório e olho-me ao espelho. Pareço mais velho, os olhos resfriam um vermelho estonteante, cansado. Fui demasiado bom e ela deixa-me pelo melhor amigo. O melhor amigo de quem nunca mostrei ciúmes, nas noites que saímos a três em vez de a levar para minha casa, os jantares a dois eram mal contados porque sempre a contar com ele também, e eu sem fazer cenas. Os aniversários, as saídas à noite, os bares, os cafés de fim de tarde, as noites de S.João - não havia festim sem o melhor amigo estar presente, partilhando o seu cabelo ruivo, a sua voz alta e gesticulada. Fui demasiado bom? Não, fui demasiado urso. Agora pareço mais velho e estou sozinho. Que poderia ter feito? Cenas, birras, berrarias? Querias que te acorrentasse à cama, à minha, dizendo que não o poderias ver porque eu te queria só para mim? Que as tuas longas pernas só poderiam passear perto das minhas, os teus braços apenas poderiam abraçar os meus, o meu corpo (agora sozinho)?! Diz-me! Que querias que tivesse feito?! Que te algemasse aos meus olhos claros, ao meu sotaque quente para garantir que estavas presa ao meu coração?!
Querias que eu te mantivesse cativa, implorando perdão e jurando submissão?! Agora era até era capaz de te prender à cama onde me gemeste juras de um amor eterno, de te atirar fotografias dele e perguntar se é disto que um homem é feito. Se procuravas isto, quando adormecias comigo. Quando acordavas e o teu hálito seco chamava o meu nome. O meu nome, o meu..

Não me digas que isto são voltas do coração, coisas do peito, porque eu também tenho um. E as voltas que o meu dá são círculos infindáveis no teu nome, no teu cabelo ruivo e na tua voz alta. Não digas que isto são coisas do coração e voltas do peito porque há ruído crepitante das linhas e eu entretanto desligo.

segunda-feira, 30 de março de 2009

'Takin' Back My Love'.

Se não te importares muito, gostava de ser eu a mulher na nossa relação.

O jovem Ferreira - capítulo I.

O Ferreira vem de uma farta família de alfaiates. Têm a maior oficina do centro da vila e até senhores nobres da cidade vêm arranjar os seus colarinhos e botões de punhos às mãos dos Ferreira. Em miúdo uma cigana lera-lhe a palma da mão e designara-lhe um futuro próspero como padre, quebrando a tradição familiar de que o primogénito seria igualmente alfaiate. Sem hesitar ou duvidar dos desígnios divinos, os seus pais escolheram o seminário da vila para os estudos do pequeno - a cigana teria sido, afinal, um sinal de Deus. Contudo, o chamamento não foi bem recebido pelo jovem Ferreira, que nunca cumpria as regras e demandas das Irmãs nem tão pouco escutava os longos missais do Padre João. Escondia-se na sua camarata e por mais de uma vez destruíra os calços da cama e da única cómoda existente para construir pequenas silhuetas de madeira - já havia traçado a de seus pais, o corpo firme da cigana e o de uma madre superiora do seminário, à qual lhe faltava a cabeça e cujos braços abertos lhe davam uma expressão moribunda, perdida mas burlesca. Entre os companheiros, que já haviam descoberto a careca ao Ferreira, cochichava-se a brincadeira de que o jovem rebelde partilharia, afinal, uma vocação com Deus: a da carpintaria - e as Irmãs sempre que ouviam o burburinho da chalaça puxavam da chibata e dos castigos com dezenas de preces e semanas limpando tachos e panelas.
Uma semana de Dezembro, já o Ferreira dormia no colchão no chão, rodeado de pequenos brinquedos de madeira que construíra do socalco da cama, a madre superiora viera informar o jovem aspirante a padre que recebera visita de seus pais, de braços abertos e expressão moribunda, apesar de sustentar uma cabeça sobre os seus ombros largos e burlescos. Ganhara, até então, coragem para lhes admitir que não queria ser padre. Uma vez reunidos os três, os seus pais deram as mãos de um contentamento nervoso, esperando que o primogénito pronunciasse, então, a sua vontade de ser alfaiate e se juntar ao negócio da família na oficina. O silêncio do jovem assustou-os e deram as mãos com mais força, trocando olhares impacientes. Esperançoso de que os pais não só compreendessem a sua vocação como admirassem o seu trabalho a partir de ninharias de madeira que desencantava pelo seminário, com a ajuda dos seus companheiros, o Ferreira encaminhou a visita para o seu quarto. Abriu a porta com um braço e com o outro fez uma vénia orgulhosa aos pais. Soltaram as mãos para se precipitarem na camarata do filho e as juntarem perto da boca, espantados e ainda nervosos. O colchão estava a um canto do quarto escuro, ainda com a roupa da cama por fazer, a cómoda parecia roída por traças ou ratos, trabalhada pela navalha do Ferreira em bonecos rústicos, baloiços em miniatura, aldeias desenhadas em minúsculas casinhas de ripas. Para finalizar a visita, esperançoso, o jovem tirara do bolso as figurinhas de madeira que havia em primeiro lugar trabalhado e envergava-as contra a luz: lá estava o seu pai, de braços cruzados e postura rígida e a sua mãe de estatura média e de agulha na mão, da qual escapavam uns fios que entrelaçavam no seu pescoço alto. A reacção não foi, de todo, a esperada. A mãe sentara-se no chão, devastada por uma repentina quebra de açúcares e o pai pontapeara os trabalhos do filho, fechando a porta como se uma vergonha ali se escondesse. As Irmãs cá fora, atentas à agitação da família, estendiam panos brancos na porta, rezavam baixinho terços infindos. Não se sabe ao certo que batalhas se travaram lá dentro, quem pisou que bonequinhos de madeira, que desilusões o pequeno trouxe consigo, quando expulso tanto do seminário como de casa. Fizera-lhe a mala a mãe, ainda pálida, ainda envergonhada até ao tutano e partiu no mesmo dia, não se sabe ao certo para onde. As Irmãs haviam estendido panos brancos na entrada, rezavam baixinho terços infindos, jubilando secretamente a agitação feliz de saber mandar embora um rebelde que não havia de ser, nunca, padre ou pregador.
(To be continued..)

domingo, 29 de março de 2009

Casa de bonecas.

Será sempre o nosso porto seguro, saído de uma história antiga, ilustrada e feliz.

sábado, 28 de março de 2009

Promessas e telefonemas.

Prometeu ligar.
Passaram-se horas, os ponteiros do relógios tontos em volta de um mesmo círculo.
Prometeu ligar e passaram-se horas, pobres ponteiros do peito.
Ligou antes ainda de o dia acabar, já os ponteiros tacteavam derrota.
A sua voz morna e alegre compensou toda a espera, círculos intermináveis em volta de uma mesma agonia.
Podia ter-me dito apenas Boa noite, e teria bastado. Teria compensado a agonia de quase provar a derrota, o medo de ser esquecida. Porque a sua voz é morna e alegre e teria, então, uma boa noite. Porque ligara - não se esquecera.
Hoje talvez lhe ligue eu, para lhe desejar um Bom dia.
Quem sabe se não terá também ponteiros tontos esperando ouvir a minha voz, num peito morno e alegre, temendo derrota ou esquecimento.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Somos mais que colegas...

.. não somos?

quinta-feira, 26 de março de 2009

O amor é para tolos.

Sento-me direita no banco de autocarro. Está calor e vamos, para não fugir ao hábito que nos predestina, à pinha. Um senhor, com idade para ser meu pai, tarado e mal-educado - o hábito ajudou a comprová-lo -, senta-se (não tão) direito no banco ao meu lado. Está calor e ele remexe-se no assento, reza baixinho obscenidades e volto-lhe a cara, revogada com a náusea que me lamacenta o estômago, o céu da boca.
Atrás de mim um rapaz novo, bem parecido e respeitável, pousa suavemente a mão no meu ombro. Um papel pequenino voa dos seus dedos para o meu colo, não me assusto: a força do hábito que nos predestina deixa um travo a deja vu no estômago, no céu da boca. Desdobro o papel pequenino até ser quase do tamanho da palma da minha mão: «Não tenhas medo, eu vou aqui.»
O meu primeiro pensamento foi para o meu ex-namorado. Pagava para ver a cara dele se soubesse que sou assediada por um homem com idade que baste para ser meu pai e ainda protegida por um rapaz novo e de carácter físico que baste para o tornar interessante. Sorrio, pagava para ver. Sacudo pensamentos menos felizes, o meu ex-namorado não deve ter destes momentos fugazes, e tiro uma caneta da carteira: «Não tinha, mas podes ter tu - eu vou aqui.»
Entrego o recado disfarçadamente, enquanto brinco com os caracóis que o rapaz novo, bem parecido e respeitável, fita. Cai-lhe no colo, adivinho-lhe o sorriso.
Na próxima paragem o senhor no banco ao meu lado, salivando obscenidades, levanta-se e leva consigo as suas preces indecentes. Olha-me de relance à saída, de novo a minha cara voltada.
Está calor e vamos, para não fugir ao hábito que nos predestina, à pinha. Um rapaz novo, sentado nas minhas costas, levanta-se e traz consigo o seu carácter físico, o meu papelinho dobrado em quatro. Senta-se do meu lado e sorrimos os dois.
Não escolhemos a paragem do amor, não somos tolos - mas sorrimos os dois como se o fossemos.
Nessa mesma noite ela sentou-se e o recado não veio por escrito, mas as preces indecorosas foram, todas elas, ouvidas.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Alma e castigo.

Acendo um cigarro e a noite apaga-se na faísca de nicotina ardendo. Parece silvar, numa linguagem assobiada que me entretém na noite escura.
Fumo pausadamente, pouso as chaves de casa no degrau da entrada. Está frio e o fumo aquece-me o peito, num peso que não se sei se extenuante se relaxante. Acendo um outro, a ver se descubro, se extenuante se relaxante, e de novo o sedimento no peito. Oh, antes pudesse consolidá-lo, ao peito, fumo como sedimento..
Talvez se tenham passado horas, entre o meu primeiro cigarro e a chegada atabalhoada da vizinha. Esfolou o carro nas beiras do passeio, trancou-o três vezes e das três vezes deixara um filho lá dentro, trancado com um clique à distância. Assisto à cena do meu degrau da entrada, fumando pausada e apaticamente. A vizinha recolhe a catrafada de miúdos que concebeu sabe-se lá por que alma, por que castigo, atiça-me um olhar que, antevejo, condenador. Não a culpabilizo, tem uma catrafada de miúdos para criar e não sou exemplo para nenhum, nem vivendo ali ao lado, sabe-se lá por que alma ou por que castigo. Tranca o carro uma quarta vez, já os miúdos berram que não querem ir para a cama, chega-se ao muro de cimento que separa a sua casa da minha e fala-me num tom condescendente e cansado: Isso vai matá-la, menina.
Fumo pausada e apaticamente, brinco com as chaves de casa pousadas no degrau da entrada.
- Amanhã deixo.
- Diz isso desde Fevereiro..
- Ainda só estamos em Março.
- Fevereiro do ano passado, menina.
Apago o cigarro e encaro-a, à mulher que perde tempo com uma estranha vizinha em vez de ir cantar músicas de embalar aos miúdos - são cinco, reparo agora.
- Não a condeno. A menina fuma, eu procrio canalhada.
Rio-me secamente - perdi vivacidade há tanto, reparo agora.
- Sabe-se lá por que alma.
- Sabe-se lá por que castigo, menina, e que castigo..
Que castigo, minha senhora, que não deixa o peito consolidar da mágoa, do despeito, das noites sofridas, do frio. Que castigo, qual sedimento pesado, sufocante. Extenuante, descubro.
Acendo um cigarro e a noite apaga-se na faísca de nicotina ardendo. Parece silvar, numa linguagem assobiada que me entreterá no que resta da noite escura. No que resta de mim, minha senhora, e do meu peito silvando.

terça-feira, 24 de março de 2009

Conforma-te ou tenta janelas.

Há portas que nunca se vão abrir.

Facadinha, AUTCH.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Esperei. E nada aconteceu.

Acordo e instintivamente alço o braço para o outro lado da cama. Sei que vão estar apenas lençóis mas abraço o vazio. Aliso a cama, tomo banho timidamente. A água corre quente pelo meu corpo, seguro o cabelo com as duas mãos, no cocuruto da cabeça, deixo que me caia pelas costas e escorra espuma até aos joelhos. Seco-me rápido, visto as tuas cores preferidas, a túnica que me trouxeste de Paris, seda como os meus lábios pintados de um rosa pouco forte, um pouco brilhante. Entro no carro e não pouso a carteira no banco da frente, espreito a porta de casa a ver quando sais. Tiro o carro e procuro-te pelos espelhos. Não estás mas a carteira continua no banco de trás. Arranco e passo o dia a olhar por cima do ombro. Assusto-me com portas abrindo, no escritório dizem que estou distante. Elogiaram-me a túnica, os lábios seda de Paris, e eu nem ouvi. Contaram-me, eu sei lá, estava atenta em portas abrindo-se. No final do dia regresso a casa, entro reticente, podes estar atrás do móvel do hall para me surpreender, elogiando-me o cabelo preso atrás como tu preferes ver. Sento-me no divã da sala, depois de confirmar que não estás atrás de mobília, em sítio que não seja nas nossas molduras (já) velhas. Continuarei a olhar por cima do ombro, assustando-me com barulhos distantes, portas que não se abrem.
E vou esperar, meu amor.

Amanhã vou acordar e instintivamente alçar o braço para o outro lado da cama, como se lá estivesses. Sei que vão estar apenas lençóis mas abraçarei o vazio, como se a ti te abraçasse. Alisarei a cama, tomarei banho timidamente, como se tomasses banho comigo. Secar-me-ei rápido, vou até vestir as tuas cores preferidas, a túnica que me trouxeste de Paris, seda como os meus lábios pintados de um rosa pouco forte, um pouco brilhante. Entrarei no carro sem pousar a carteira no banco da frente, como se lá fosses tu. Vou esperar-te à porta, pelos espelhos do carro também. Mais um dia no escritório e continuarei distante, assustada, olhando por cima do ombro. Esperar-me-á em casa (somente) o divã. De ti, (somente) molduras já velhas.

Sei que não vais voltar...

domingo, 22 de março de 2009

É frutó legume! (*)

Tenho uma amiga parecida com a Gyselle Soares.
(*) Private Joke.

sábado, 21 de março de 2009

Feliz nostalgia.

Hoje acordei com a sensação de ter passado a noite com o Jason Mraz.

quinta-feira, 19 de março de 2009

As palavras que nunca te direi.

Pergunto-me como não temos mais fotografias juntos, quando passavas a vida a fotografar a menina.
Eras o primeiro a acordar de noite, assustado com os berros da menina, e ias sempre confirmar que tinha os sinais vitais em ordem enquanto passavas a pasta mais chata prá mãe. Não adormecias enquanto não te dissessem que a menina já dorme que nem anjo e o choro desvanecesse serenamente, como o sono que a ti regressava, qual fiel servo.
Ensinaste-me a andar de triciclo, a cair dele também, deste-me pontos na cabeça, três, e fugia de ti quando vinhas de vacina na mão dizendo que era um lápis especial. Corriamos a volta da mesa redonda da sala e fechava-me na varanda com o teu medo que eu caísse redonda no rés-do-chão no bolso. Tantas vezes me disseste que não me chegasse perto da berma que ganhei vertigens, enjoos em sítios altos. Aprendi contigo a andar de bicicleta e de patins também, na garagem poeirenta que inundava de meio em meio ano e me fazia rir porque podia andar de galochas e chapinhar-te as calças do fato, sem perceber porque não te rias também.
Quando tinha medo de noite queria sempre dormir do teu lado e nunca te disse que fui eu, e não o Pantufas, quem comeu a planta que estava na cozinha e sabia a resina doce. Compraste-me uma mota quando era pequena demais para saber que devia ter guardado o pedido para quando fizesse dezasseis e cresci mais parecida com a mãe.
Mas tenho os teus olhos, os teus genes para o sono e para a resmunguice, os teus discursos longos e a tua escrita densa. Tenho a tua dificuldade em transparecer sentimentos por gestos, a tua facilidade em fazer-me de forte e de dura. Às vezes não te consigo perceber, não me vejo nas tuas acções e tenho pena. Lamento quando não chego a ti como quando era pequena e podia chapinhar-te calças de fato com água lamacenta, esperando que te resignasses e me pegasses de pernas para o ar.
Estou crescida demais para malabarices dessas, não tive uma mota quando fiz dessazeis e o meu pai não está por casa neste seu dia.
Ainda assim, feliz dia ao Pai que me ensinou a ser filha, irmã e mulher, apesar de ainda me ver como a sua menina. A da imagem, que já devia estar a resmungar com tantas fotografias, com os olhos do pai e a roupa parola que ele escolhera.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Não me vires as costas quando falo contigo!


Para orgulho grande, forte e teimoso, basta o meu.

Quem te avisa..

As mulheres são tanto mais perigosas quanto mais inteligentes forem.


terça-feira, 17 de março de 2009

EU ODEIO ACORDAR CEDO.

Deito-me às 3 e picos da manhã porque estou às voltas com impressoras armadas em rebeldes, computadores que não arrancam, folhas que escasseiam e tinteiros daltónicos, com portefólios para entregar Sem falta Joana Mendes!.
Deito-me as 3h e picos e acordo às 6h40, com olhos do tamanho de ervilhinhas e um (mau) humor matinal (tão) maior e (tão) capaz de endoidecer até o André e a David. E, mais a mais, não dou o ar da minha graça como a Adriana Lima.

Amanhã o café das dez fica por minha conta, companheiros -

Sem falta Joana Mendes!

segunda-feira, 16 de março de 2009

Pipocas, uvas e salmão pelo pequeno almoço.

- Sabes ir ter à faculdade de letras?
- Eu? Eu só sei ir ter à venda nova ou a tua casa.
A tua casa. Ainda lá está o meu secador, a minha escova de dentes e o meu roupão cor de salmão. Se está ainda, digamos. A tua casa. Abrias a porta sempre com um cuidado exímio, talvez tivesses medo de acordar fantasmas que pudessem destruir o que eximimianente construímos debaixo desse teu tecto. Acordavas tarde, espreguiçavas-te e ouvia-te entre bocejos dizer Cheira a pipocas, enquanto eu me ria com a destreza de pipocas saltitando em oléo, Sou eu que estou a secar o cabelo, trengo. Havia de pousar o difusor e levar-te o pequeno almoço à cama, coberta apenas pelo meu roupão cor de salmão. Deixavas as torradas de lado, puxavas-me mais para ti. Estás tão bonita, dizias-me entre beijos que não sei se ternos se meigos. Gostavas de uvas pela manhã, mas só quando servidas no meu umbigo, uma a uma. O teu sopro, enquanto devoravas, uma a uma, uvas verdes do meu umbigo, arrepiava-me as pernas e ninguém tem arrepios nas pernas, resmungavas entre risos e sumo de uvas verdes que sorvias desses teus lábios doces. Pergunto-me se te lembras das horas procurando estrelas em noites de nevoeiro imenso, das vezes que me deixaste pegar no teu carro só para me ver agarrada ao volante como uma senhora de idade. Tenho medo de me esquecer do teu riso, da tua voz não sei se terna se meiga de quando me chamavas tua.
- É um mundo que me assusta, sabes?
- O das faculdades?
Não, o de viver sem ti! Sem o meu secador, a minha escova de dentes e o meu roupão cor de salmão. Sem o meu umbigo servindo uvas e os meu riso saltitando como pipocas em óleo.
- Sim, que mais poderia ser?
Ainda me perco olhando o telemóvel, sem to admitir. O meu secador, a minha escova de dentes e o meu roupão cor de salmão ainda estão em tua casa e ainda me sabe a sumo doce de uvas verdes dizer a tua casa. O meu secador, a minha escova de dentes e o meu roupão cor de salmão ainda estão aí, contigo, - se estiverem ainda - mas trouxe comigo o amor - esse ainda aqui está. Faz com que me perca olhando o telemóvel, pensando como dou com a tua casa até sem querer, o amor. Como dou com o teu corpo embrulhado em salmão, nas minhas mãos sempre frias. Os meus lábios sempre querendo os teus. Agora mais ainda..
A minha voz, não sei se terna se meiga, implorando que percebas e que, mais que isso, sintas também.
Não foram fantasmas que destruíram o que eximiamente construímos num mesmo tecto, um só peito. É pena, preferia culpar filosofias e metafísicas a apontar o dedo ao (que julguei ser) meu melhor amigo.

domingo, 15 de março de 2009

Acto de Contrição.

Sei o que fizeste no Verão passado.

sábado, 14 de março de 2009

Lençóis solitários, noite fria e o peito de luto.

A cama está mais fria desde que partiste. Puxo os lençóis passados, solitários lençóis desde que partiste. O gato costumava deitar-se nas tuas costas, imitar-te mimos que tinhas com as minhas, e descansaríamos como felinos preguiçosos, os três, costas sob costas.
As noites são mais escuras desde que partiste, adormecer é sempre um suplício agora.
Choro baixinho, deitada sob solitários lençóis passados. Estão quentes e macios, como a pele do teu peito quando me beijavas a testa de boa noite. A cama está fria e é escuro lá fora, e eu nunca conheci frio nem escuro como este cá dentro. O gato tem feito luto por nós, sabes? Não se arrasta mais por estas terras, não vem descansar a sua preguiça felina para as minhas costas quando aqui estou. Nestes lençóis onde costumavas abraçar-me num sono suplicamente terno, suplicamente caloroso. Mia-me condescendências, de soslaio. Acho que me culpa, sabes? Também me culpas como ele, descansando as tuas preguiças por outras terras, outras costas? Porque as minhas têm aquela cova entre o ombro esquerdo e a nuca, a mesma que a maioria das pessoas tem no rosto quando sorriem e onde o teu queixo cabe e encaixa perfeitamente como uma luva, uma peça de Lego. O teu braço passaria então pelo meu e segurarias no meu pulso delicadamente, como se se pudesse partir pelo alento que veemente te corria no peito. E nunca me deixavas conhecer o frio, então.
Choro baixinho, deitada sob solitários lençóis passados. Estão quentes e macios, troçando o inverno que veementemente marcha cá dentro, do lado esquerdo do peito, com um alento escuro como a noite lá fora e o luto do maldito gato.

Patient X.

You don't leave the people you love alone, Dr Grey.

sexta-feira, 13 de março de 2009

duas mãos, uma Só.

Não percebes de timing. Não sabes que palavras ou que deixas dizer, não deduzes nem induzes porque perguntar é o caminho mais fácil e tu não queres difícil. Procuras fórmulas, equações em domínios que conheças, derivadas que já saibas de cor, formatações padrão.
Não percebes de timing nem de deixas. Não tens por costume dizer as coisas certas nem procurar sinais porque perguntar é o caminho mais fácil e tu não queres difícil. Procuras pontas soltas, porque nós são complicados - longe com eles! Oh, tão longe com eles!
Não tens por costume dizer as coisas certas, perceber as erradas.
E eu fiquei sempre. Mesmo quando não disseste as coisas certas, não percebeste nem deduziste ou induziste as erradas - os sinais, difusos, longe com eles - porque só caminhas por trilhos fáceis. Não moro nessa rua, onde nós se desfazem em pontas soltas e os sinais se concretizam em respostas lineares, tão perfeitamente lineares como uma fórmula, equações em domínios que conheças ou derivadas que saibas de cor, qual formatação padrão. Estou, aliás, do outro lado do bairro.
Hoje só queria que te tivesses aventurado no desconhecido, cruzasses avenidas onde vivem as letras e morrem as ciências, enfrentando berros altos e loucos em domínios que desconhecesses.
Tinhas uma escolha. Tiveste sempre.
Não me resigno mais à minha. Sou esquerdina, descendente de gerações tidas como filhas do Diabo, assassinadas na Idade Média porque o destro era o inteligente, o puro, o normal. Fujo à regra, berro, alto e loucamente, letras que me moram no peito - oh, longe com ele!
Longe contigo: escolho hoje. Cada um na sua rua, quando pensei partilhar contigo um tecto, uma casa e, mais a mais, um coração (em demasia). Cada qual no seu domínio, se assim percebes melhor.
Escolho hoje: não vou mais ficar. Não percebes de timing, não tens por costume dizer as palavras certas e pior que não procurares as erradas é preferires sempre o caminho mais fácil. Afinal, sou esquerdina descendente de filhas do Diabo, tu fruto da inteligência destra, a ciência do perguntar e ficares-te por respostas padrão. Não as há, não percebes?! Não vês que não existem para lá das tuas estúpidas fórmulas?!
Não te iludas pensando que, porque tens uma mão esquerdina e outra destra, podendo elas coexistir, poderemos nós também: por alguma razão não sabes escrever com as duas.

Hoje consegui sacar «Anatomia de Grey» sem te pedir ajuda. Não te mandei mensagem quando os olhos vibraram inchaço vermelho, chorando berros loucos e altos. Olhei-me ao espelho sem ter de te perguntar se (ainda) me achas bonita. Até falei de ti sem deixar que o peito dilacerasse mercúrio penoso. Não foi fácil.

Mas o difícil, a mim, não me assusta.

Afinal, sou esquerdina, filha de filhas do Diabo e cruzo, pelo amanhecer, travessias onde moram letras e morrem as ciências. Morrem as ciências, porque não as há, neste bairro que é a vida.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Amor de ouro e de ferro.

Um velho, de aspecto venerando, tem em mim olhos postos, meneando três vezes a cabeça, descontente. A voz pesada, um pouco alevantando, com um saber de experiências feito, tais palavras tirou do experto peito: "Não vás".
Ergo uma epopeia renascentista a seu despeito, abano solenemente a cabeça, três vezes meneando, nego, berro e aponto. Não seremos todos Prometeus, Ícaros ou filhos de Apolos descuidados. A ganância levou-lhes a melhor, nasceu a mitologia do pecado, a concepção do bem e do mal como estigma que, no final do dia, não me diz nada. Não me marca, como o sinal no olho direito dele. O seu beijo, selo na minha carne que abre em ferida na sua ausência. Não é ambição, isso. Este querer maior, o desafio do Além, o sacrifício que os navegadores dos Descobrimentos não conheceram nem com as ninfas mais libertinas - o (do) Amor. Esse sorve-me infames vitupérios e põe em cheque qualquer linha, ténue ou evidente, entre o certo e o errado. O que devo fazer e aquilo que quero - o que peito inflama, chorando. Porque, no final do dia, não me ficam concepções ditadas senão por esta paixão que me guia os dias numa escuridão mais e mais embrenhada. Desconheço, então, a diferença entre o bem e o mal, enquanto faço ouvidos de mercador a um velho que me adivinha e amaldiçoa, longe, a eterna pena do Profundo. Não temo o Inferno tanto quanto receio a solidão, meu senhor.
"Vou sim."
E, assim, sem mais demoras, parto em busca do derradeiro sentimento desta estranha condição, ou mísera sorte, que nos é tão inerente quão humana - o Amor.

Que promessas de reinos e de minas

De ouro, que lhe farás tão facilmente?
Que famas lhe prometerás? Que histórias?
Que triunfos? Que palmas? Que vitórias?
(«Os Lusíadas», Luís de Camões.)

quarta-feira, 11 de março de 2009

Estádio do Dragão, 19h40.

Uma idosa com um ar simpático aproxima-se de mim, à saída do metro do Dragão e comenta o tempo, o frio que fica agora de noite não é?, a multidão que está para ver o jogo - estes espanhóis só querem confusão menina.
- Não está um cheirinho aqui?, pergunta-me com voz de avozinha.
- A torradinhas com manteiga não é?, respondo com voz de netinha.
Um senhor agente da lei, não tão bem humorado, levanta o braço enquanto me fala uns decibéis acima do regular:
- Oh menina, isto é cheiro a ganza! Até o raio do cão sabe isso!
Indignada, defendo-me:
- Desculpe lá, ele foi treinado para isso..
- Pelos vistos a menina não, não é?
Ora essa, e ainda bem!
E não, a minha mãe não me dá ganza pelo lanche sob pretexto de serem torradas com becel. Mas aprendi a ficar calada quando velhinhas com ar de vóvó se avistarem.

Que vença o melhor. (*)

Não me preocupam mais moralidades.
Desculpa, mas (também) já me partiram o coração.
(*) private joke.

domingo, 8 de março de 2009

Novidades nada, tudo na mesma.

Meu amor, há quanto tempo não te via!
Novidades? Oh, cá andamos, estou mais velha. Tu estás na mesma! Como vai a tua mulher? Sempre casaram em Dezembro? Mês de glória, o meu preferido, claro que já não te lembras, faz tanto tempo..
Dezasseis anos e sete meses, mais precisamente. Não, não ando a contar, que tolice! Sei foi que nessa data me faleceu uma tia-avó, prós lados de Foz Côa, casualidades a que o luto obriga, vê lá tu. Ai está grávida? Oh, que feliz notícia, os meus parabéns! Já se sabe se menino se menina? Vai ter os olhos do pai, pela certa. Não, eu não casei e estou a viver nos arredores do Porto. Mas é uma casa maneirinha, aconselhou-ma uma amiga. Fica perto da estação de comboios, dá sempre jeito. Tens de ir? Está bem, pois, eu também tenho sítios para ir, pessoas para ver e coisas importantes para fazer. Não, não acabei o curso mas estou atrás de uma secretária maneirinha, sirvo cafés quando não organizo pastas chatas, nem queiras saber. Não, não são meias do serviço, porquê? Olha lá, tu sempre ficaste na empresa do teu pai? Ah não, foste para a Faculdade. Não sabia que tinhas ido conhecer Europa, foi lá que conheceste a tua mulher? Que ano em grande, sim senhor. Bem, até um dia então. Aperta-me a mão que não estamos com confianças para beijinhos e felicidades à menina.
Como se vai chamar, é verdade?
Joana, como a avó. (silêncio)
Ironias destas matam-me - Literalmente.
Volto-te costas e páro no regresso a casa. Não me sentei ao balcão do café do costume, esticando perna e pedindo mais um. Sento-me na linha fria da estação e a perna lá está esticada. Não, não são meias de serviço, continuo sem perceber onde querias chegar. Sim, quando perguntaste isso. E quando te casaste com outra mulher, uma europeia qualquer, que espera uma menina que há-de ter os teus olhos e o meu nome.. Quando eu esperei dezasseis anos, sete meses e mentiras de tias-avós falecidas.
Sentada na linha de comboio, ouço ao fundo um Pôca-Terra familiar. Chega quase a ser acolhedor este tremer de chão, vacilar de alma.
Tenho de ter cuidado com quê? Tens de falar mais alto que o comboio está perto e não te oiço bem daqui.
O quê?! Morta? Já eu estou, meu amor, já eu estou. Mas felicidades à menina Joana.

Não incomodar (*)

Que hoje não é um domingo qualquer.
(*) sujeito a interpretações pessoais.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Irmãos e Irmãs.

Queria poder tocar à campainha, depois de ter andado à deriva com transportes públicos e horários confusos, e ser recebida com os teus grandes braços abertos. Adivinho já o sorriso que se abriria então no teu rosto, raiando na surpresa de me ver ali, pingando chuva do cabelo no chão do condomínio.
- Posso jantar?
Abraçavas-me e tiravas-me o casaco encharcado, enquanto me empurravas soleira da porta dentro e me davas uma toalha seca para o cabelo e um copo de sumo com gás.
- Não tem problema?
Rir-te-ias da minha falsa modéstia e o orgulho de me saberes contigo roubava-te palavras encantadas. Nunca fui de cerimónias e sabe-lo bem, estou aqui porque preciso de ti e não há como ter problema eu precisar de ti.
A tua mãe provava a sopa do jantar com uma grande colher de pau e fazia cara de caso, às tantas esquecera-se do sal. Via-me de toalha amarrando madeixas negras, o cabelo molhado preso num pano branco seco imenso, e de novo um sorriso raiando surpresa. Dois beijinhos, um abraço e deixa cá ver se não tens febre com a chuvada que apanhaste.
Sorrio, deixando o carinho roubar-me palavras encantadas.
A tua irmã haveria de pôr mais um prato na mesa e ao jantar falaríamos de candidaturas como doutores, discutiríamos «A Mensagem» como poetas de então e eu até falaria o meu quê de música como se de música um quê percebesse.
Arrumada a mesa e a cozinha, beijavas-me a testa levemente:
- Ficas para dormir?
Os teus olhos brilham, raiando.
- Sim, preciso de ti.
Sorris, (sem) palavras encantadas.
- Vou pôr dois colchões na sala, adormecemos a ver «Irmãos e Irmãs», se quiseres.
- Três!, berra a tua irmã de um qualquer recanto da casa.
Três seriam. Colchões espalhados entre tapetes, almofadas e séries de TV.
- Não tem problema?, perguntar-te-ia já no escuro.
- Não há como ter problema eu precisar de ti, responder-me-ias então.
E não haveriam palavras encantadas senão estas.
Eu queria...

(A minha porta está sempre aberta, a minha mãe tem sempre dois beijinhos e um caldo de sopa quente, copos e sumos com gás. E terei sempre este sentimento encantado.)

quarta-feira, 4 de março de 2009

Desaparecida.

Passei vinte anos à procura da felicidade.
Procurei-a nos lençóis com amantes fervorosos, beijando-me o umbigo e prometendo amores mais que perfeitos. Subi à Torre dos Clérigos para berrar ao Porto que estou viva, que tenho sede e garra, que falo rápido porque vírgulas atrapalham e pontos finais chateiam. Exclamei suspiros em Coimbra, procurei esplendor na capital, comprei bolinhos de ovos moles em Aveiro. Fotografei metade do globo, sonhei com o resto do mundo que escapou à minha lente. Um fim de semana fiz as malas, quis descobrir-me e regressei a casa antes do alvorar de terça, chorei sozinha na cama. Acampei em tocas remotas, dancei com pavões franceses e mergulhei mãos em canais vienenses. Toquei no pólo norte com a ponta dos dedos dos pés e nadei nua no Mediterrâneo, há muitos, muitos anos - e bebidas a mais. Aprendi árabe com a diligência com que um marroquino me impingiu um turbante no deserto do Sarah e atropelei uma rena na Finlândia. Fui procurada pela polícia italiana, qual filme de segunda, e desde então não vejo a Ponte dos Suspiros senão em fotografias. Fumei nas Caraíbas e perdi uma manhã de praia em Miami no aeroporto local. Fui a melhor amiga da insónia durante uma semana inteira e adormeci de pé no chuveiro. Proc
urei conforto em promessas furadas, desabonei amizade em tardes solitárias e telefonemas por atender.
Procurei a felicidade pelo globo fora, lente captando momentos fugazes.
Olhos que choraram desespero, frustração, carências de alma. Procurei-a, sim.

Vinte anos depois, encontrei-a.

{E o mundo inteiro não será suficientemente grande para os nossos corações (em demasia). Não que o conheça por inteiro - como vos conheço a vocês - mas garanto-vos que não vos fará sombra.}

terça-feira, 3 de março de 2009

Este ano,

O flirt vai ser a minha tendência Primavera/Verão.

{Museu do Carro Eléctrico com a melhor amiga e 5 gatos}