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domingo, 2 de novembro de 2008

O lidar com o deficiente - II

Há poucos dias escrevi sobre como as pessoas, por falta de preparo e preconceito, não lidam de maneira adequada com os deficientes, ou seja, da mesma forma que lidamos com os outros, de modo natural, simples. Evitam uma abordagem direta, muitas vezes por medo, ou adotam uma postura paternalista, infantilizando a linguagem. Ao assim procederem, em geral erram, e feio.

Na ocasião, citei alguns fatos ocorridos comigo. Dentre tantos outros que poderia registrar, concentrei-me em casos envolvendo profissionais da área de saúde, pois é nesse setor onde esperamos encontrar pessoas habituadas e mais bem preparadas para tratar com os portadores das mais diversas deficiências.

Hoje, ainda sobre a forma de lidar com o deficiente, quero contar sobre um depoimento que assisti da Dorina Nowill, num programa espetacular sobre deficiência visual, apresentado, se não me engano, na TV Cultura.

Antes de prosseguir, desculpo-me pela falta de melhores referências e por eventuais erros, pois comecei a ver o programa após o seu início, há tempos, e escrevo de memória. De todo modo, se há erros em detalhes do caso, não há na essência.

A Dorina contou que viajava de avião para receber uma homenagem, acho que na Suécia, e precisou sentar-se numa poltrona distante de sua filha. Lá pelas tantas, iniciaram o serviço de bordo e a aeromoça, ao lado de Dorina para poder servi-la, gritava para a filha, perguntando se deveria oferecer coca-cola ou guaraná. A Dorina interveio, recusou a oferta e pediu um uísque, porque alguns deficientes visuais, pasmem os desavisados, também tomam bebidas alcoólicas.

Depois, quando passou a tratar diretamente com Dorina, a aeromoça falava com voz alta e pausada – A - SE – NHO – RA - DE – SE – JA - MA-IS - AL-GU-MA - COI-SA? - como se Dorina fosse surda, ao invés de cega, ou como se, por causa da cegueira, tivesse alguma dificuldade de compreensão.

A história é esta. Mais um flagrante exemplo de preconceito e falta de preparo no lidar com portadores de deficiência, que ocorre no dia-a-dia, até mesmo em relação à Dorina Nowill, pessoa cujas realizações dão prova de suas muitas e extraordinárias capacidades.

O programa, é lógico, tem muito mais. Mostra as tapeçarias feitas por Dorina, fala sobre seu trabalho para os cegos, o relacionamento com os filhos, etc. Outros cegos, inclusive um advogado, dão depoimentos interessantes. Enfim, se tiver oportunidade, vale muito à pena.

domingo, 26 de outubro de 2008

Livro Acessível

Mais um descaso a ser enfrentado.


A Terapeuta Ocupacional Júnia J. Rjeille Cordeiro, Consultora de Políticas e Práticas Assistenciais da Soc. Benef. Israelita Bras. Albert Einstein, escreve-me para contar sobre a luta pelo Livro Acessível, que vem sendo capitaneada pelo MOLLA - Movimento pelo Livro e Leitura Acessíveis no Brasil.

Em 21 de setembro último, o MOLLA enviou uma Carta Aberta ao Ministério da Cultura, Ministério Público Federal, CORDE*, CONADE** e a toda sociedade brasileira. Nesta carta, subscrita por mais de uma centena de entidades com tradição na defesa dos portadores de deficiência, reclama-se do descaso das autoridades em regulamentar os Incisos VII e VIII, do Art. 2º, da Lei 10.753/03, que impõem o acesso a qualquer publicação pelos portadores de dificuldades ou impedimentos para a leitura de livros convencionais.

Desnecessário dizer que o acesso a livros e publicações afins é essencial para que milhares de pessoas ingressem no universo da leitura, adquiram conhecimentos básicos, estudem, aprendam uma profissão, exerçam, de fato, o direito à informação e à cultura.

Vejamos, então, um resumo dessa história.

Em 2005, a Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo, Eugênia Fávero, ajuizou ação civil pública contra a União para cumprimento das leis que determinam a produção de livros em braile e em meio magnético. Referida obrigação, vale anotar, existe a mais de 45 anos, com base na Lei 4.196/62, mas nunca foi cumprida por falta de regulamentação.

Depois da referida ação judicial, a elaboração do regulamento foi inicialmente atribuída à CORDE que, após longo período, declarou-se inepta para a função, passando a tarefa ao Ministério da Cultura. O fato é que, após 3 anos de início da ação judicial, muito debate e reflexão, em 14 de Abril passado, chegou-se a um acordo histórico entre representantes das pessoas com deficiência e o mercado editorial brasileiro. Escreveu-se e todos anuíram com uma minuta de regulamento.

A minuta, então, foi encaminhada ao setor jurídico do Ministério da Cultura para refinamentos finais, com o compromisso de ser colocada em consulta pública até Maio de 2008. Porém – e, inacreditavelmente, sempre há um "porém" nestas histórias – o compromisso não foi honrado e isto até agora não ocorreu.

Com a ausência de respostas, o MOLLA já enviou uma segunda e, em 10 de outubro, uma terceira Carta Aberta, sem receber qualquer satisfação.

Diante desses fatos, pergunto: O que se passa no Ministério da Cultura acerca de tais refinamentos? Que dificuldades estão a impedir que eles sejam concluídos, visto que o mais difícil já foi alcançado, afinal tratam-se apenas de refinamentos? Haveria vozes dissonantes, covardes o bastante para só atuarem à surdina, mas suficientemente fortes para obstaculizarem a efetivação do acordo? Ou seria pura desídia?

Bom, aguardamos uma resposta que, já não podendo ser breve, esperamos seja ao menos convincente, satisfatória e definitiva.

Termino agradecendo à Júnia pelo toque e parabenizando o MOLLA e demais entidades por esta luta, que também é nossa e de todos aqueles que acreditam numa sociedade verdadeiramente justa, fraterna e inclusiva.



* Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência

** Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência