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sábado, junho 10, 2023

CUBA, por exemplo... o exército de bata branca

  - Nº 2584 (2023/06/7)


O exemplo e a dívida

Opinião

Cuba assinalou há dias 60 anos de cooperação médica com os povos do mundo, porventura a expressão máxima de internacionalismo daquela que Fidel Castro designou de revolução socialista e democrática dos humildes, com os humildes, para os humildes. Na cerimónia oficial comemorativa, em Havana, estiveram o Primeiro Secretário do Partido Comunista de Cuba, e Presidente da República, Miguel Diaz-Canel, e o Comandante José Ramón Machado Ventura, organizador da primeira brigada, que partiu a 23 de Maio de 1963 rumo à recém-independente Argélia, e à data ministro da Saúde Pública do governo revolucionário.

Ao longo de seis décadas, mais de 600 mil profissionais de Saúde cubanos (médicos, enfermeiros, técnicos) integraram missões de solidariedade em 165 países, sobretudo na América Latina, Caraíbas, África e Ásia: hoje, em 58 deles, estão para cima de 22 mil, na maioria mulheres. «São uns heróis», disse o Presidente cubano, secundando as palavras do Comandante-em-Chefe da Revolução, para quem «o pessoal médico que vai a qualquer lado para salvar vidas, com o risco de perder a sua, dá o maior exemplo de solidariedade que o ser humano pode dar, sobretudo quando não é movido por qualquer interesse material».

Entre os feitos mais notáveis deste exército de batas brancas, como são carinhosamente chamados na sua pátria, contam-se o Programa Integral de Saúde, criado em 1998 para responder à devastação causada na América Central pelos furações George e Mitch; o Bairro Adentro, que desde 2003 acorreu a milhões de venezuelanos que décadas de ditadura militar e de neoliberalismo haviam privado dos mais elementares cuidados de saúde; a Operação Milagre, que devolveu a visão a três milhões de seres humanos de 35 países; ou o Mais Médicos, no Brasil, que levou a medicina às populações mais desfavorecidas e isoladas do gigante sul-americano.

Especializado no combate a catástrofes naturais e epidemias, o Contingente Internacional Henry Reeve, criado em 2005, foi desde então onde mais ninguém ousava ir: à Guatemala afectada por chuvas torrenciais; ao Paquistão atingido por um brutal terramoto; ao Haiti durante o pico da cólera; à África Ocidental fustigada pelo ébola; a 42 países (incluindo da Europa) no auge da pandemia de COVID-19. E só não acudiu o povo norte-americano após a passagem do Katrina porque a administração de George W. Bush não o permitiu…

É grande a dívida que a Humanidade tem para com a pequena mas generosa ilha socialista. Elevar a mobilização pelo fim do criminoso e ilegal bloqueio com que a pretendem sufocar aqueles que, em vez de batas brancas, apenas têm para oferecer ao mundo soldados e bombas, é a melhor forma de a saldar. E todos temos o dever de contribuir.

Gustavo Carneiro

sexta-feira, outubro 21, 2022

sábado, novembro 13, 2021

É isto mesmo

  - Nº 2502 (2021/11/11)

O pudim


Os conceitos, quaisquer que eles sejam, só são úteis quando é claro (pelo menos para a maioria) aquilo que representam. Caso contrário, corre-se o risco de se achar que nos referimos todos ao mesmo quando, afinal, falam uns de alhos e outros de bugalhos.


O conceito de esquerda não constitui, a este respeito, qualquer excepção. Nas últimas semanas, tem-se falado muito da convergência da esquerda, das divergências à esquerdado Orçamento também ele muito de esquerdaMas o que é, então, isso de esquerda? Uma atitude? Uma proclamação? Uma tradição? Um posicionamento mais ou menos efémero que se afere apenas e só em relação com o de outros? Ou será algo mais?

Estaremos realmente todos a falar do mesmo?

Será possível colocar numa mesma categoria genérica de esquerda aqueles que assumem a valorização dos salários e o trabalho com direitos como factores de crescimento económico e progresso social e os que, curvando-se perante o poder económico, generalizam a precariedade e dão cobertura a despedimentos colectivos?

Podem ser de algum modo equiparados os que pretendem repor os prazos, montantes e condições de atribuição do subsídio de desemprego praticados antes da troika e aqueles que querem deixar tudo como está?

É aceitável amalgamar sob um mesmo conceito quem se bate por fixar médicos e outros profissionais de saúde no SNS e aqueles que por acção ou inacção promovem a sangria de milhares de médicos, enfermeiros e técnicos para o estrangeiro ou para o sector privado? Os que defendem um real investimento nos hospitais e centros de saúde e simultaneamente os que alimentam com avultados fundos públicos o sinistro negócio da doença? Pode ser de esquerda tanto o que defende o direito à habitação como o que facilita despejos, favorece a especulação e reserva centros históricos para o turismo e para os condomínios de luxo?

Ajudará ao esclarecimento público designar da mesma forma quem pretende controlar os preços dos combustíveis, no momento em que se encontram em máximos históricos, e quem observa passivamente o mercado a funcionar, não estando disposto a beliscar em um cêntimo que seja os interesses das petrolíferas? São semelhantes os que se batem pela criação de um serviço público de cultura e quem pretendia consagrar apenas 0,25% do Orçamento do Estado a este sector fundamental?

Fosse esclarecer e informar a intenção da generalidade da comunicação social e dos comentadores e politólogos e conceitos desta natureza seriam utilizados com maior prudência. No fundo, era importante que se passasse a falar mais de conteúdos e menos de rótulos sem correspondência com a realidade, pois no fim é isso que importa. Como diziam os clássicos, a prova do pudim passa por comê-lo.

Gustavo Carneiro

segunda-feira, outubro 19, 2020

A talhe de foice

 (…)

Pergunto(-me) (ninguém me perguntou…) a razão porque transcrevo com frequência artigos de opinião publicados no avante! no meu blog.

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Respondo(-me) que o faço (e não só artigos de opinião) quase em catarse, evidentemente para divulgar, para informar através de mais uma via (insignificante que é, é mais uma…), porque me custa sentir que a avassaladora desinformação ter muita expressão… mesmo entre “os nossos” que, naturalmente, pela ela são invadidos.  

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EstarMOS na luta é também, e deverá ser!, informarmo-NOS e informar os outros.

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Lutar contra a mentira tem de ter a outra face, a que mostra a face da verdade, mesmo que a verdade não seja um absoluto objectivo.

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Em rigor (democrático, de teoria) chegaria dizer(-me)… para mostrar a nossa versão do que é informado em outras versões.

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Mas é muito mais que isso, é informar a nossa versão contrapondo-a à manipulação, à mentira que é a “informação” veiculada insistente e invasivamente como se fosse a única, a verdadeira.

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Este artigo do Gustavo Carneiro vem a talhe de foice, com a enorme virtude 
de até reconstituir muito do desconstruído (quando não destruído):


 


 - Edição Nº2446  -  15-10-2020

 

O argumento

defesa do mundo livre enquadrou ideologicamente a chamada Guerra Fria, designação pela qual passou à história a autêntica cruzada lançada pelo imperialismo norte-americano contra o impetuoso movimento de libertação nacional e emancipação social que se seguiu ao segundo conflito mundial. A narrativa, tão simplista quanto mistificadora, revelou-se particularmente eficaz: de um lado estaria o mundo livre, liderado (e defendido) pelos Estados Unidos da América; do outro, a tirania, protagonizada pela União Soviética e, em geral, pelas forças do progresso, da paz e do socialismo.

Segundo esta fórmula, a criação da NATO e a participação, na sua fundação, da ditadura fascista portuguesa (com o Campo de Concentração do Tarrafal em pleno funcionamento)    enquadravam-se na defesa do mundo livre, assim como as guerras de extermínio movidas contra os povos da Coreia e do Vietname. Na versão do imperialismo, sempre amplificada e justificada pelos média dominantes, os golpes de Estado promovidos no Irão, na Guatemala, no Brasil, na Indonésia ou no Chile, todos eles acompanhados por banhos de sangue e a instauração de ditaduras reaccionárias ou fascistas, pretendiam defender o tal mundo livre. Segundo esta narrativa, Pinochet, Suharto, Savimbi, Banzer, Salazar, os coronéis gregos, os generais brasileiros e o próprio apartheid encontravam-se do lado do mundo livre. E, no campo contrário, estiveram Lumumba, Cabral, Mandela, Ho Chi Minh, Ché Guevara, Allende...

Já no século XXI, e contando uma vez mais com o prestimoso auxílio das grandes cadeias mediáticas, foi a guerra ao terrorismo o pretexto encontrado para justificar a defesa do mundo livre – ou seja, a expansão do domínio imperialista a novas regiões do globo e a garantia de avultados ganhos para a indústria do armamento. As vítimas, tratadas como danos colaterais, contaram-se uma vez mais aos milhões. No Iraque, no Afeganistão, no Paquistão, na Líbia, na Síria, na Somália...

Esse é, uma vez mais, um dos argumentos a que o imperialismo norte-americano recorre para encobrir a verdadeira natureza da sua acção predadora e exploradora com que pretende responder à grave crise em que se encontra enredado (que é a do próprio sistema capitalista). A República Popular da China e o seu extraordinário desenvolvimento económico e social são, mais do que o alvo preferencial, o pretexto ideal – replicado com dedicado esmero pelos líderes políticos, comentadores e analistas que monopolizam os principais jornais, rádios e televisões um pouco de todo o mundo.

Os métodos para a defesa do mundo livre, já se sabe, serão os de sempre: militarização, agressão, desestabilização, ingerência. Quanto à resposta, terá de ser de luta!

Gustavo Carneiro

 

quinta-feira, junho 25, 2020

O velho e o novo


  • Gustavo Carneiro


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 - Edição Nº2430  -  25-6-2020

O velho e o novo

«A crise consiste precisamente no facto de que o velho está a morrer e o novo ainda não pode nascer. Nesse interregno, uma grande variedade de sintomas mórbidos aparece». A afirmação de Antonio Gramsci, proferida nas primeiras décadas do século XX, ganha hoje flagrante actualidade, à medida que se aprofunda a crise do capitalismo e, com ela, (res)surgem muitos destes sintomas.
Em 2019, 26 capitalistas concentravam uma riqueza equivalente à da metade mais pobre da população mundial, ou seja, 3,8 mil milhões de pessoas. Se a cada dois dias surgia um novo multimilionário, essa mesma metade perdia diariamente 500 milhões de dólares. No mesmo mundo em que alguns têm fortunas superiores à riqueza criada anualmente por países inteiros, 2,2 mil milhões de seres humanos continuam sem acesso a água potável.
Em 2018, estima a UNESCO, 20 milhões de crianças não foram vacinadas contra o sarampo, a difteria e o tétano. Já os gastos militares, não cessam de aumentar, atingindo máximos históricos: em 2020, os EUA destinaram para o sector a maior verba de sempre, superior a 738 mil milhões de dólares, perto de duas vezes e meia o PIB de Portugal e bem mais de 30% do total das despesas militares mundiais. É este o mesmo país que depois de abandonar a UNESCO fez recentemente o mesmo com a Organização Mundial de Saúde.
Nos últimos anos, mais de 16 mil pessoas, fugindo das guerras promovidas pelas potências ocidentais em África e no Médio Oriente, morreram no Mar Mediterrâneo quando tentavam entrar na Europa Fortaleza. Muitas outras (entre elas milhares de crianças) são mantidas em campos de refugiados sem condições ou entram em redes de tráfico humano, seja laboral ou sexual. Nesta mesma Europa, ressurgem os saudosistas de Hitler, Mussolini e Salazar, há partidos comunistas proibidos e quem reclame o confinamento especial para ciganos. Do outro lado do Atlântico, nos EUA ou no Brasil, o aumento da exploração é acompanhado da intensificação do racismo e da xenofobia, da repressão e do obscurantismo.
Ao contrário do que alguns ingenuamente (?) previram, tudo se agravou com a pandemia. Enquanto milhões de norte-americanos (e não só) caíam no desemprego, recorriam à ajuda alimentar e, aos milhares, morriam de COVID-19, um punhado de milionários via as suas riquezas aumentar em largas centenas de milhares de milhões de dólares... Também por cá, grandes empresas distribuem dividendos e recorrem a apoios públicos ao mesmo tempo que despedem, desregulam horários, cortam salários.
Vivemos tempos perigosos e exigentes. A história e a vida já mostraram quão mórbidos e dramáticos podem ser os sintomas de um capitalismo agonizante. A luta aí está, acesa, até que o novo se imponha.