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março 15, 2018

Isto está visto


Gosto de entrevistas. Gosto de ler entrevistas a escritores e a escrevinhadores. Alguns são verdadeiros escritores de entrevistas. Dão bem com os reposteiros, com o branco das paredes, assentam bem com tal ou tal soalho. Um António Lobo Antunes fica sempre bem, e já praticamente só o leio em entrevistas, ou numa ou outra página em que o acaso lírico me visita, fora isso, quase nada. Deu-me ultimamente para ler dois livros com entrevistas: “O Crocodilo que voa – entrevistas a Luiz Pacheco”, e “Roberto Bolaño: Últimas entrevistas”. O primeiro é organizado e introduzido por João Pedro Jorge, o biógrafo de Pacheco. Nas entrevistas, Luiz Pacheco joga naquela posição de artilheiro (assim o denomina o português  futeboleiro de Brasil), disparando em várias (quase sempre as mesmas) direções, devidamente ajudado por um meio campo ávido de sangue. Pacheco daria (na minha modesta imaginação) uma rede social ainda não inventada, cruzamento do faice com o buque, uma app Pacheco, que a bombar, seria um caso sério para passar o tempo. Assim começou ele a escrever. De Bolaño, não sei porquê, gosto dos olhos tristes, uns olhos que escondem uma ambição desmedida, freak, mas desmedida, ambição essa que, por exemplo, se projecta na megalomania insano jornalística de 2666 (que eu fui lendo em casa, na praia e por aí – livro comprado por 3€ numa feira em Guimarães), livro (ou livros?) editado após a sua morte, resgatado através de um corte e cose discutível, claro, defraudando (será?) a ideia do seu autor de o dividir em cinco postas correspondendo a cinco livros, cinco vezes mais dinheiro, em princípio, para os seus filhos. Muito mais nos conta Marcela Valdes na sua pojante introdução, enquanto (imaginamos nós – sem grande deleite), se masturba com o calhamaço 2666, edição americana, acho. Na sua última entrevista, concedida a Mónica Maristain (gosto deste nome: Maristain), da Playboy (a sério) edição mexicana, a páginas tantas, a entrevistadora julgando estar perante um miss universo, chuta “o mundo tem remédio?”, sem se rir, tudo isto tem, supostamente, um contexto, e Bolaño calmamente responde: “o mundo está vivo e nada vivo tem remédio. Essa é a nossa sorte”. A edição da revista data de Julho de 2003.  Bolaño morre a 15 de Julho de 2003.


Imagem de um crocodilo (na verdade trata-se de um jacaré) a voar. Está visto

novembro 27, 2015

Diga coisas Sr. Bolaño


Não gostava da unanimidade eclesiástica, clerical dos comunistas. Sempre fui de esquerda e não ia virar à direita só por não gostar dos sacerdotes comunistas, pelo que me tornei trotskista. O problema é que, uma vez no seio dos trotskistas, também não gostei da unanimidade clerical deles, pelo que acabei por ser anarquista. A unanimidade aborrece-me imenso. Sempre que me apercebo que toda a gente está de acordo em alguma coisa, sempre que vejo que toda a gente está a fazer coro para amaldiçoar alguma coisa, aflora-me qualquer coisa à pele que me faz rejeitá-la. 

(in entrevista a Eliseo Álvarez, 2005)

março 12, 2015

outubro 10, 2014

"A realidade é como um chulo drogado"


De repente, segundo exprimiu a testemunha, os cães puseram-se a tremer, como se tivessem farejado um tigre ou um urso. Mas, como aqui não há tigres nem ursos, imaginei que tinham farejado o fantasma de um tigre ou de um urso. Conheço os meus cães e sei que, quando começam a tremer e a rosnar é por alguma coisa justificada. Fiquei com curiosidade, por isso, depois de dar pontapés aos cães para se portarem como machos, dirigi-me decididamente para o regato.

Roberto Bolaño (“2666”)

setembro 07, 2014

Press start to continue


Bem me parecia que o Bolaño queria dividir o 2666 em 2 – 6 – 6 – 6 (+1), isto é, em vários cadernos (livros), não apenas para assegurar o futuro da sua prole (a primeira edição do livro apenas foi lançada um ano após a sua morte), mas também porque o dito cujo tem mil e vinte cinco páginas, na edição portuguesa da Quetzal. Por aqueles dias Juan de Dios Martinez ainda continuava a ir para a cama de quinze em quinze dias com a Drª Elvira Campos (…) leio eu, que navego pela página quatrocentos e oitenta e cinco, e não me parece, até ver, um romance inconcluso, faltando(-me) ainda quinhentas e quarenta páginas para o final, nada leva a crer que Bolaño tivesse a necessidade de arrematar o livro, mesmo não tendo em conta a impossibilidade de este gigantesco fresco alguma vez ter um fim. Quer dizer, se calhar (saído, ou não, da imaginação do Vila-Matas) também existirá um  [O] Mal de Bolaño


agosto 17, 2014

Marcado pelas transferências




Borges (Vaccaro no pacote?), Bolaño e Andric: dois argentinos, um chileno e um extremo Sérvio, contratações não comunicadas à CMVM, mas já em treinamentos no centro de estágio da biblioestantina. Negociações decorridas, algures, entre a cidade berço da nação e a tal Figueira plantada junto à foz do Mondego. Ficaremos por aqui?

agosto 15, 2013

Explosões do acaso


Para lutar contra o mal recomendava a aprendizagem da leitura, uma leitura que compreendia os números, as cores, os sinais e a disposição dos objectos minúsculos, os programas de televisão nocturnos ou matinais, os filmes esquecidos. Não acreditava, no entanto, na vingança: era contra a pena de morte e a favor de uma reforma radical das prisões. Andava sempre armado e defendia o direito dos cidadãos a andarem com armas, único meio de prevenir a fascização do Estado.

“Estrela Distante”,  Roberto Bolaño

agosto 02, 2013

Estou a ganhar coragem para começar a ler isto:


Mas esta capa até mete nojo aos cães. Aquele fundo em azulinho pacífico, as letras do título e do nome do autor em relevo, o tipo de letra, tudo contribui para esquadrinhar as entranhas. Quando acabar de vomitar e arrancar a capa lá começarei, com fastio. Entretanto, os escritores de antes


outubro 23, 2012

Tínhamos encontrado Cesárea apenas para lhe trazer a morte


Lupe disse-me que somos os últimos real visceralistas que restam no México. Eu estava estendido no chão, a fumar, e fiquei a olhar para ela e disse-lhe não me lixes.

“Os detectives salvagens”, (pp.622), Roberto Bolaño. Tradução Miranda das Neves. Teorema/leya.

[mata(dor)]

outubro 17, 2012

A sua teoria era estapafúrdia, e não resistia ao menor exame?


«Tudo tinha começado, segundo Pele Divina, com uma viagem que Lima e o seu amigo Belano fizeram ao norte, em princípios de 1976. Depois dessa viagem, ambos começaram a fugir, primeiro pela Cidade do México, juntos, depois pela Europa, já cada um por sua conta. Quando lhe perguntei o que é que os fundadores do realismo visceral tinham ido fazer a sonora, Pele Divina respondeu-me que tinham ido à procura de Cesárea Tinajero. Depois de viver uns anos na Europa, Lima regressara ao México. Talvez achasse que já tudo estava esquecido, mas os assassinos materializaram-se uma noite, depois de uma reunião na qual Lima tentava reagrupar os real visceralistas, e ele teve que fugir. Quando lhe perguntei porque é que alguém havia de querer matar Lima, Pele Divina disse que não sabia. Tu não viajaste com ele, pois não? Pele Divina assentiu. Então como é que sabes essa história toda? Quem é que ta contou? Lima? Pele Divina disse que não, que quem lha tinha contado fora Maria Font (explicou-me quem era Maria Font) e que lha tinha contado o pai. Depois disse-me que o pai de Maria Font estava num manicómio. Numa situação normal, ter-me-ia desatado a rir ali mesmo, mas quando Pele Divina me disse que quem tinha espalhado o boato era um louco, senti um calafrio. E também senti pena, e pensei que estava apaixonado.»

“Os detectives salvagens”, (pp.358-359), Roberto Bolaño. Tradução Miranda das Neves. Teorema/leya.

[poema

outubro 11, 2012

O André Breton do terceiro Mundo


«Eu não sei francamente o que é que eu fazia de mal. Quando contaram a Belano o que se passou no Príapo’s, ele disse que nós não eramos nem rufias nem chulos, mas eu a única coisa que fiz foi dar saída à minha sensualidade. Em minha defesa apenas pude balbuciar (em tom de chalaça, sem sequer o olhar nos olhos) que eu era um mostro da natureza. Mas Belano não percebeu a piada. Na opinião dele, eu fazia tudo mal. Ainda por cima, não fui eu que convidei Luis Sabastián Rosado para dançar. Foi ele, que estava perdido de bêbado e deu-lhe para ali. Gosto de Luis Rosado, é o que eu lhe devia ter disto, mas quem é que dizia alguma coisa ao André Breton do terceiro mundo?»

“Os detectives salvagens”, (pp.170), Roberto Bolaño. Tradução Miranda das Neves. Teorema/leya.

outubro 03, 2012

Militâncias políticas dos visceralistas


«Moctezuma Rodríguez é trotskista. Jacinto Requena e Artur Belano foram trotskistas.
Maria Font, Angélica Font e Laura Jáuregui (a ex-companheira de Belano) pertenceram a um movimento feminista radical chamado Mexicanas ao Grito de Guerra. Supõe-se que lá é que conheceram Simone Darrieux, amiga de Belano e propagandista de um certo tipo de sado-masoquismo.
Ernesto San Epifanio fundou o primeiro Partido Comunista Homossexual do Máxico e a primeira Comuna Proletária Homossexual Mexicana.
Ulisses Lima e Laura Damián planeavam fundar um partido anarquista: ainda existe o rascunho de um manifesto de fundação. Antes, aos quinze anos, Ulisses Lima tentara ingressar no que restava do grupo guerrilheiro de Lúcio Cabañas.
O pai de Quim Fonte, também chamado Quim Font, nascera em Barcelona e morrera na batalha do Ebro.
O pai de Rafael Barrios militara no sindicato dos ferroviários clandestino. Morrera de cirrose.
O pai e a mãe de Pele Divina nasceram em Oaxaca e, segundo diz o próprio Pele Divina, morreram de fome.»

“Os detectives salvagens”, (pp.78-79), Roberto Bolaño. Tradução de Miranda das Neves. Teorema/leya.

[sebastião]

setembro 27, 2012

Para trás, em linha recta em direcção ao desconhecido


«No geral, não percebi muitas coisas. O nome do grupo, de certa forma, é uma brincadeira, e, de certa forma, é completamente sério. Creio que há muitos anos houve um grupo vanguardista mexicano chamado os real visceralistas, mas não sei se foram escritores, pintores, jornalistas ou revolucionários. Estiveram activos, também não tenho muita certeza, na década de vinte ou trinta. Naturalmente, nunca tinha ouvido falar desse grupo, mas isso é devido à minha ignorância em assuntos literários (todos os livros do mundo estão à esperta que eu os leia). Segundo Arturo Belano, os real visceralistas perderam-se no deserto de Sonora. Depois mencionaram uma tal Cesárea Tinajero, ou Tinaja, não me lembro, acho que nessa altura eu discutia aos berros com um empregado por causa dumas garrafas de cerveja, e falaram das Poesias  do Conde de Lautréamont (…)»

Os detectives Selvagens”, (pp.15), Roberto Bolaño. Tradução Miranda das Neves. Edição Teorema/leya.





A capa da edição portuguesa é uma merda tão grande, mas tão grande que até apetece vomitar e vomitar-lhe, tal o asco do amarelinho mais a merda das letrinhas em relevo, mais as palavras do Ferreira mais a Sontag que não tem culpa nenhuma. Um focinho de bradar e de fugir para qualquer leitor de livros que seja um leitor. Mas parece que assim vende bem. Da falecida e agora embalsamada Teorema na leya, como lhe chama o Cão. Mas sem referências ou conhecimento do autor ninguém lhe pegava, como diz a Zobaida (momentaneamente sem link).