Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Lisboa
Dr. Fernando Medina
Face à onda de intervenções radicais e devastadoras que as árvores de Lisboa têm sofrido nas últimas semanas - empreitadas de poda, abate e substituição de árvores de alinhamento e de jardim um pouco por toda a cidade, de Alvalade à Estrela, das Avenidas Novas a Arroios, da Graça à Ajuda, com menor ou maior grau de intensidade e número de árvores objecto das mesmas, com mais ou menos gravidade e grau de irreversibilidade, sob esta ou aquela justificação, não poucas vezes caricata, e outras tantas por razões que a razão desconhece - considera esta Plataforma recém-constituída ser seu imperativo dirigir-se ao novo Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, uma vez que nos parece ser tempo de se virar de página e da cidade partir para outro paradigma.
Porque entendemos que quando estão em causa valores tão nobres e elementares como a preservação de um património que temos a obrigação de legar às gerações vindouras, o direito à informação, os afectos, o respeito por todas as formas de vida, a qualidade de vida e o bem-estar da população; ficar-se calado não serve!
É verdade que esta insensibilidade e este menosprezo pelo indispensável contributo dado pela árvore à cidade e por aqueles que as defendem não são de agora. Todos nos lembramos da destruição massiva de jacarandás nas transversais à Avenida da República e dos 153 plátanos abatidos nem há 10 anos no Campo Pequeno porque havia que implementar determinado projecto de paisagismo. Ou do “vendaval” no Vale do Silêncio, as “desmatações” de Monsanto e a “requalificação” do Príncipe Real, só para enumerarmos algumas reconhecidas más práticas. Mas é neste preciso momento que o flagelo assume proporções inauditas, com o confluir de uma série de constatações e de procedimentos menos claros (por exemplo, ajustes directos através dos quais é diagnosticado o estado do arvoredo - que compete aos serviços municipais e após parecer do Laboratório de Patologia Vegetal Veríssimo de Almeida – e se procede aos abates e às podas, e posteriormente ainda dentro do mesmo ajuste, se vendem os espécimes de substituição - cuja determinação a competência continua na esfera do Município e não das Juntas), a que importa obviar de uma vez por todas, Senhor Presidente, a saber:
As árvores não são podadas nem conservadas nem tratadas, quando doentes. Antes se mutilam, agridem, abatem e substituem como se fossem objectos de decoração descartáveis e sujeitos à ditadura da última moda, nem sequer respeitando a época mais propícia para as árvores e para a bio-diversidade que albergam. Há árvores de primeira (as estruturantes) e de segunda (as de alinhamento).
Não existem jardineiros, mas abundam os curiosos e os madeireiros de serra em punho, cujas intervenções deveriam ser adjudicadas com transparência, critério e sem conflitos de interesse, tantas vezes ao arrepio dos pareceres fitossanitários de entidade idónea e, ultimamente, ao abrigo do não exercício da prorrogativa de declarar esta temática como estruturante, delegando nas Juntas de Freguesia de forma a nosso ver errada e contraproducente, transferindo direitos a nível da gestão do arvoredo, mas esquecendo-se de transferir as boas práticas já regulamentadas, logo agora que aquelas ainda estão numa fase de auto-afirmação e de delimitação de território. Continuam a não ser aplicados e cumpridos o Regulamento aprovado pela AML (51/AM/2012), que resultou da deliberação 102/CM/2009, nem o Despacho do 60/P/2012 do Senhor Presidente de CML de então, mas quando há um parecer sério que indica a necessidade de abater determinada árvore, logo esse mesmo parecer serve para uma dúzia de outras sãs.
Perdeu-se a boa-prática de consulta preferencial ao LPVVA, preferindo-se o parecer de empresas que depois procedem elas próprias à poda e ao abate no que se configura como procedimento a carecer de sindicância. Cultiva-se a ignorância, acenando com pragas e alergias, velhice excessiva das árvores (quando árvores com 60 anos devem ser consideradas jovens), cataclismas inevitáveis e a corrosão da chapa. Alimenta-se o ódio instalado ao choupo, cipreste, plátano, freixo e, quiçá a breve trecho, à tília, à tipuana e ao jacarandá! Não se percebe de onde vêm os novos espécimenes que se plantam, mirrados e sem copa frondosa previsível que não por várias décadas, nem para onde vai a lenha que resulta de tudo isto. De uma assentada, como no caso recente da Av. Guerra Junqueiro, destrói-se a imagem até agora inalterável de um arruamento histórico com 60 anos.
Por isso esta nossa carta dirigida a V. Exa., Senhor Presidente, porque temos esperança que a sua juventude signifique irreverência, sensibilidade e vontade indómita em querer mudar o status quo que muitos presidentes antes não conseguiram mudar, pelas razões que cada qual saberá.
Os regulamentos existem e bastará cumpri-los, pois têm matéria suficiente para que os procedimentos de poda, abate e substituição de arvoredo se traduzam em boas práticas de arboricultura, motivo de orgulho para esta cidade, em contraponto com tantas outras onde continuam a aceitar práticas retrógradas, baseadas em mitos e inverdades. Não aceitamos que Lisboa possa ser referida como um dos piores exemplos de gestão do arvoredo do país, quando tem todas as condições para ser exactamente o oposto, desde que corrija o que é preciso corrigir. Estamos, como sempre estivemos, disponíveis e empenhados em colaborar com a CML e com o seu Presidente e os seus Serviços para que consigamos esse desiderato. Conte connosco!
Lisboa, 26 de Maio de 2015
A recém-formada "Plataforma em Defesa das Árvores": Associação Árvores de Portugal, Associação Lisboa Verde, Fórum Cidadania Lx, GEOTA-Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente, Grupo de Amigos do Príncipe Real, Grupo dos Amigos da Tapada das Necessidades, Grupo Ecológico de Cascais, Liga dos Amigos do Jardim Botânico, Plataforma por Monsanto, Quercus