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Tuesday, August 29, 2023

SOMOS UM PAÍS DE BÊBADOS

Às seis e vinte da manhã de hoje, no IC19, pouco depois da saída de Sintra, via-se no lado contrário, sentido Lisboa-Sintra, um carro de pneus para o ar. Aquela hora o trânsito ainda era escasso, não provocava congestionamento de trânsito nem de um lado nem do outro da via rápida. A polícia já estava junto da viatura capotada. No IC19, o anormal é não haver frequentes acidentes de trânsito.
Três horas depois, o carro capotado estava na mesma, o congestionamento de trânsito provocava a perda de milhares de horas de trabalho. 
Porquê? Haverá várias razões, algumas das quais só não vê quem não quer ver. 

A intensidade do tráfego, porque o comboio não é alternativa para muita gente que se faz transportar de pópó com uma média de ocupação de menos de 1,2 passageiros por automóvel circulante naquela via rodoviária. Aliás, o comboio, que deveria ligar em triângulo circulante, Lisboa - Sintra - Cascais, ou no sentido inverso, é impossível porque não há ligação ferroviária entre Sintra e Cascais. Porquê? Nunca vi esta pergunta em nenhum lado e, não havendo pergunta, não há resposta. A qualidade do transporte ferroviário em Portugal coloca o nosso país abaixo do nível dos mais atrasados na União Europeia. O transporte ferroviário suburbano não escapa à situação geral.

Tanto tráfego automóvel não impede, provavelmente até incentiva, muita rapaziada a ziguezaguear, talvez para lhes manter em níveis elevados os depósitos de adrenalina. 
O respeito pela sinalética de velocidade máxima só é, em geral, respeitada, se o volume de tráfego não permitir gincanas.
 
O que terá provocado uma capotagem, aquela hora, quando o trânsito era mínimo, num troço recto da via?  Excesso de velocidade animado por excesso de alcool emborcado durante uma noite de pândega? É uma hipótese possível mas não passa de hipótese. A qualquer um que ande na estrada, pode acontecer um acidente. Mas que a incidência de acidentes na estrada provocados por elevados níveis de alcool no sangue de condutores de veículos em Portugal é elevada parece indesmentível.
 
Mas os portugueses não se embriagam apenas com vinho. Pelo contrário, os mais jovens, os que mais gostam de ziguezaguear, emborracham-se com cerveja e, pior que isso, com bebidas de elevado teor alcoólico, whisky sobretudo. É difícil desanimar o consumo de vinho porque isso desafiaria a fúria de produtores e distribuidores portugueses. Mas o whisky, porque não se limitam as vendas em espaços concessionados para o efeito e se enchem prateleiras de whisky nos supermercados? Pelo Natal, então, é um festival!
Sobre o assunto, anotei neste caderno de apontamentos, além de mais, em fevereiro de 2011: Continuamos a beber demais, em agosto de 2013: Quanto mais bêbado melhor. Valeu alguma coisa? Não valeu nada. Faço o que posso.
 
(Declaração de interesses - Não sou, nunca fui abstémio, filho de um pequeno vitivinicultor, se tivesse tido oportunidade e meios teria gostado de prosseguir e alargar o mais possível o nosso interesse familiar pela vinha. Encanta-me, sempre me encantou e continua a encantar ver uma vinha bem tratada) 
 
--- Correlacionado 
 
Do Semanário Expresso desta semana, retiro daqui, de uma prosa espirituosa e bem esgalhada,
 
" Nos últimos cinco anos, o consumo de álcool e tabaco aumentou em Portugal. Em contraciclo. É o país do mundo que mais consome vinho per capita e tem vindo a aumentar. Bem sei que somos um país produtor de vinho, mas não pode ser bom. Os mais velhos consomem vinho e os mais novos, cerveja. Ao falar dos dados da década 2012–2022, há dois meses, João Goulão, subdiretor-geral do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências, disse que “quando falamos de embriaguez, as coisas pioram em todos os grupos etários”. E nos grupos etários mais baixos, dos 13/14 anos, “os consumos das raparigas ultrapassam os dos rapazes e são muito altos”. E ainda: “Nestes dez anos, em vez de ganharmos, perdemos para as questões de saúde relacionadas com álcool.” Mas nem tudo são más notícias. Portugal é, segundo o Eurostat, o país da UE onde se bebe mais álcool, mas não é dos países onde há mais episódios de binge drinking, de beber à bruta num dia. Era suposto isto alegrar-nos.

O álcool é um problema grave neste país. Fingimos que não. Cada português consome mais de 12 litros de álcool puro por ano. E já se sabe como são as médias. Se eu não bebo, alguém está a beber 24 litros. Mas, acima de tudo, está inculcado no inconsciente nacional. Ao longo destes anos que não bebo (às tantas tornou-se uma teimosia engraçada), não consigo contar quantas pessoas ficaram verdadeiramente chateadas, aborrecidas, indignadas, desapontadas e muito desconfiadas por eu ter recusado simpaticamente o copo de vinho, licor, aguardente — ou por eles feitos, ou para acompanhar a refeição, ou o champanhe para celebrar o momento —, apenas e só pela justificação que me parece justa: não bebo. Ali, a indignação do momento foi sempre o meu desrespeito pelo anfitrião. E não o facto de ele estar a exigir que quebrasse um princípio de vida. Sei que nem se apercebia. Mas, sim, quem era o merdoso da situação? “Custava alguma coisa fingir que bebias?” É apenas #anossaCultura.

 

Tuesday, December 01, 2020

EDUARDO LOURENÇO

Entrevistas do Público

“Somos muito pequenos e, ao mesmo tempo, se olhar para os destinos dos países europeus que são mais ou menos da nossa dimensão, é uma espécie de milagre quase absoluto como este cantinho se conseguiu preservar.”

  PÚBLICO -


Wednesday, August 21, 2019

SUBINDO O DANÚBIO


AVISO À NAVEGAÇÃO

O que se segue tem como único propósito registar algumas informações recolhidas ao longo de nove dias de navegação fluvial, com saídas a terra, antes que o tempo as apague ou, pior ainda, as deturpe. Os amigos e conhecidos, ou curiosos que, por acaso, aqui tenham vindo parar, considerem que a qualidade das fotografias é resultante da inabilidade do fotógrafo, do equipamento utilizado - um telemóvel ., e das condições de luminosidade do dia no momento.
Aliás, pretende-se que as fotos inseridas neste texto funcionem apenas como dicas das nossas recordações. Na internet há ziliões de fotografias, a internet é exemplo de um universo infinito, sempre em expansão.
Há quatro fotos que foram retiradas da internet - as das catedrais de Bucareste, Belgrado e Budapeste e ainda da Universidade de Budapeste, que, por serem tão grandes, não me cabiam no alcance do telemóvel. 

O texto segue ao correr das teclas.


O Danúbio é o segundo rio mais longo da Europa (o Volga é maior) e tem entre 2845 e 2888 km de extensão, com um fluxo médio de 6700 m/s. Tem a sua fonte na Floresta Negra, a 60 km a noroeste do Lago Constança, a partir de dois pequenos ribeiros, Brigach e Breg, que se juntam em Donaueschingen e passam a ser chamados Danúbio dali em diante. O Breg desce de uma altura de 1078 metros.
Não muito distante da nascente do Breg, nasce o Reno. Mas enquanto o primeiro se  junta ao Brigach, e formam o Danúbio, correndo para sul até ao Mar Negro, o Reno vira-se para Norte e vai, após percorrer 1233 km, desaguar em delta comum Reno-Mosa-Escalda, no Mar do Norte, numa vasta extensão que abrange territórios da Bélgica e Holanda.

Nascendo na mesma maternidade, a ideia de os ligar através de um rio intermédio - o Meno - remonta ao ano 793 quando Carlos Magno ordenou a construção de um canal ligando outros dois rios nas proximidades. Com avanços e recuos, a ideia original de ligar o Danúbio ao Reno foi concretizada em 1992, cerca de 1200 anos depois.

Voltando ao Danúbio, compreende-se que, nascendo a uma altitude relativamente baixa, pouco acima dos 1000 metros, para percorrer quase 3000 km., o enorme caudal faz o seu percurso principalmente em planície. Entre o delta, onde desagua no Mar Negro, e Budapeste há apenas um desfiladeiro, aliás pouco elevado, na área das "Portas de Ferro", a separar os Balcãs, a oeste, dos Cárpatos, a leste. 


Delta do Danúbio - Laguna lateral nos meandros do delta.

Nos canais por onde andámos no delta, os cursos de água são ladeados por vegetação densa, do mesmo tipo que acompanha o rio em toda a sua extensão, salvo quando se erguem, mas não muito, os Balcãs e os Cárpatos. Nas margens do delta, aparece de vez em quando, saído não se sabe de onde, um ou outro esforçado de olho na cana de pesca a acenar aos turistas.
Informa o guia que em toda a área do delta vivem cerca de 5000 pessoas. Não há habitações à vista, de vez em quando vislumbra-se uma ou outra cabana.



Corvos-marinhos ou cormorões. Os corvos marinhos (há cerca de 60 espécies na família) têm plumagem preta, cinza ou bronzeada, por vezes com peito ou garganta branca.  Os fotografados são da espécie de peito e garganta branca.


- Tenham atenção a tudo o que mexe, diz o guia.
- Lá ao longe anda um bando, de quê?
- São pelicanos.

Voam ao longe e muito alto. Bailam no ar e, consoante as voltas, o sol mostra-lhes a cor branca ou escurece-os. São pelicanos? Se o guia o diz, são pelicanos.
Aparte os pelicanos ao longe, não se viu muito mais que uma ou outra garça real, várias garças brancas pequenas, muitas gaivotas de tamanho mais reduzido que as que temos por cá.

Não estivemos nos melhores sítios de observação? Na internet leio e vejo imagens que não vi.
De Sulina e Crisan, prometidos no programa não demos conta.


Garça, sozinha, para turista ver ou a ver passar turista.

Para se ter uma ideia menos imprecisa da dimensão do delta do Danúbio, da sua diversidade biológica, da beleza dos seus meandros a correr para o Mar Negro, seriam necessários vários dias de observação, equipamentos e competência para os usar, e muita paciência para esperar pelos momentos oportunos. Para conhecer na Roménia alguns dos mais diversificados eco sistemas da Europa, teríamos de subir às montanhas, percorrer os vales povoados de espécies vegetais e animais, raros ou inexistentes em qualquer outro local do continente europeu. Percebemos isso ontem, 23/08, quando vimos no canal Odisseia um programa sobre a natureza na Roménia. A não perder. Repete amanhã, e, muito provavelmente, em outros dias no mesmo canal. 

Rio acima, a vegetação densa, mostra aqui e além, em línguas estreitas de areia, pelicanos e garças. E um ou outro pescador, geralmente desacompanhado. Lá mais para cima, aparecerá uma ou outra tenda de campismo, porque a língua de areia se alarga à medida que navegamos para montante do rio, aparecem praias fluviais  e, inesperadamente, talvez porque o calor apertava vimos uma manadas de vacas a beber no rio com água pela barriga.

Já em Budapeste, quando o rio passa junto ao edifício da universidade, a que adiante farei referência,
regalavam-se na água do Danúbio umas dezenas de pessoas.


O rio é largo, volumoso, apressado, não se vê nele nem traineira, nem barco à vela. Nem transporte de passageiros ou mercadorias. Só em Budapeste há movimento de barcos de turismo e barcos de recreio.


Excepto algumas barcaças carregadas de, ao que supomos, lixo, talvez sucata metálica.
As barcaças, quatro ou seis, lado a lado são empurradas por um ... empurrador.
















Antes de chegarem às margens montanhosas do rio, aliás não muito extensas, os navios galgam duas eclusas, a primeira de 15 metros, a segunda, em dois níveis, subindo 30 metros.


Primeira eclusa, a porta ao fundo baixa quando a porta de entrada se fechou. Normal.


Saída da segunda eclusa, segundo segmento. Note-se no fim do paredão a parte superior  da porta já quase imersa.



Entre os Balcãs e os Cárpatos


Para que não restem dúvidas, porque a Sérvia aproxima-se, a Roménia pôs marco no território por alturas das chamadas (designação virtual) "Portas de Ferro".


Porque a paisagem nas margens do rio, e no próprio rio, é quase sempre idêntica, optei por, muito sucintamente descrever o rio e só agora dar conta dos passos em terra. A monotonia da navegação poderia ter sido quebrada com informações do comandante ou da tripulação sobre o território,  história, a cultura, que ao longo dos séculos passaram por aquelas águas,  mas talvez não tinham sido pagos para isso. Só quando lhes referimos que tanta monotonia só era boa para quem gostasse do silêncio perturbado pelo rumor das águas, passaram a dar algumas informações em apreçadas rotações por minuto para calar o freguês.
Conclusão minha: por aqueles lados do mundo ou há muito ressentimento ou estão saturados com tanto turismo na época de férias. 
Há excepções, como em todas as regras. Voltarei ao assunto mais adiante.

Tínhamos embarcado em Tulcea, na ponta norte do delta, quase à hora de jantar, na manhã do dia seguinte passámos para  lanchas rápidas (no programa) na realidade barcos já velhotes e cansados, para umas voltas nas voltas do delta, estivemos a cerca de 60 km. do Mar Negro, voltámos para o navio. De noite, navegou-se até Oltenita, e de autocarro vamos até Bucareste. 

A estrada atravessa a planície, onde, se a terra está cultivada, a paisagem está, a perder de vista,  quase sempre coberta de searas de milho e de girassol. Já na Bulgária, onde o panorama é em tudo idêntico, perguntei:  

- É latifúndio?
- Há quem possua 154 mil hectares.
- Como é que isso pode ter acontecido se antes, na época comunista, toda a propriedade tinha sido nacionalizada?
- Por isso mesmo. A privatização foi aproveitada por uns quantos que por meios vários se apropriaram de áreas enormes. O segundo maior tem quase 100 mil hectares e depois há meia dúzia deles com idênticas áreas de grandeza. É a direita no poder, percebe?
- Pensa que em próximas eleições os comunistas poderão voltar ao poder?
- Não creio. Apesar das dificuldades que defrontamos não acredito que o comunismo volte. Mas que há muita gente saudosa dos tempos antigos, há. 

Recordei-me, a propósito desta última afirmação da guia, da obra de Svetlana Aleksievitch, Nobel da Literatura em 2015, "O Fim do Homem Soviético". Recomenda-se. 

Temas recorrentes nas informações dos guias que nos acompanham são as reminiscências do pavor causado pela ocupação otomana, entre meados do século XVI e meados do século XIX, a elevada percentagem (oficialmente 3,3%, mas provavelmente superior) de ciganos, povos oriundos do norte da Índia e que no ocidente continuam a ser considerados romenos por a si mesmos se terem nomeado povos roma (no plural, rom, no singular), relutantes à integração social. 
E a perda da Moldávia. A Moldávia é romena!, defende o guia com forte determinação nas palavras. Somos o mesmo povo, falamos a mesma língua, uma língua latina, temos a mesma cultura, nada justifica que o território da Roménia tenha sido amputado. Esperamos que um dia o erro seja corrigido.

O guia tem razão: identificar o povo romeno com o povo cigano (rom) resulta de uma confusão de nomes que prejudica a imagem do país. Os roma, povo nómada, migrou para muito lado do mundo. Mas são as especificidades dos seus valores culturais e a sua relutância à integração nas sociedades por onde passam ou vivem que geralmente os ostracizam, e a confusão com o povo romeno é indigna do elevado grau cultural da Roménia. Em 2017 era de 11 o número médio de anos completos de escolaridade para indivíduos dos dois sexos com 25 ou mais anos. Em Portugal 9,2. 

Constantin Brancusi, escultor, Eugéne Ionesco, dramaturgo, George Palade, Prémio Nobel da Medicina em 1974, são alguns de vários artistas, cientistas e intelectuais que enriqueceram a cukltura europeia.

- Bucareste é a cidade mais limpa da Europa, garante-nos o guia. Talvez o guia exagere um pouco, mas que Bucareste é, indiscutivelmente, mais limpa que Lisboa, é. A recente polémica das beatas lançadas para o chão é apenas um testemunho que o nível de civismo colectivo luso ainda anda muito por baixo. 


Bucareste, à semelhança de outras capitais do leste europeu - Sofia, Belgrado, Budapeste - exibe muitos edifícios de porte pesado e adornado que recordam os tempos de riqueza do império áustro-húngaro. Muitos deles foram deteriorados pelo tempo e pelas circunstâncias políticas, mas observam-se, por outro lado, esforços de restauração da imponência perdida. 
Na foto junto da fachada modernista do teatro nacional, celebra-se a libertação do regime comunista. Do outro lado da rua, o estilo majestoso da Universidade.
Registe-se, registo quase desnecessário, que a Roménia é o único pais no leste europeu onde a língua latina sobreviveu a todas as migrações, invasões e conflitos que formaram na região uma heterogeneidade de etnias, de confissões religiosas, de miscelâneas linguísticas. 


Em Bucareste, almoçámos (assim-assim, frango de cebolada, sobremesa boa) neste restaurante, que na frontaria reclama ter sido a primeira capital a ser iluminada com lâmpadas a petróleo, em 1857. A propósito, na Roménia há muitos anos que se extrai petróleo.
O que falta na Roménia, onde a população decresce porque a taxa de natalidade é baixa e a emigração elevada?



Na esquina oposta, situa-se um palácio em reconstrução que, em frente, mantém um busto do Conde de Drácula. O seu castelo é uma das atracções turísticas da Roménia.


Neste café, arte nova, onde fiz a foto num instante porque o tempo urgia, a comitiva não esperava, nunca há um lugar vago, garantiu o guia. No centro de Bucareste não faltam esplanadas, apesar das férias. 


Ao fundo à esquerda, o palácio  mandado construir por Ceaucescu. Não chegou a vê-lo terminado por ter sido morto antes. Hoje é a sede do parlamento romeno. Não consigo imaginar o que fazem os deputados num espaço tão vasto.  
Cá fora, vd. imagem abaixo, há espaço para manifestações de protesto contra o governo. Onde é que nós já vimos isto, mas perante um edifício incomparavelmente menor?   


"Milhares de pessoas participaram este sábado numa manifestação em Bucareste contra o Governo de esquerda, concentrando-se em frente à sede do executivo para assinalar o aniversário da repressão violenta de um evento semelhante há um ano."
"Queremos que este governo cheio de incompetentes, pessoas corruptas e ladrões se vá embora porque não podemos continuar assim", disse à AP Mihai Munteanu um manifestante residente em Bucareste. aqui
A guia disse-nos que a culpa da situação calamitosa do país era o governo de direita.
Nesta notícia, de uma manifestação que ocorreu poucos dias depois de lá termos estado, refere-se que o governo é de esquerda.
Nem só os romenos se entendem sobre para que lado está virado.

O Estado romeno é laico, não tem religião oficial, mas, à semelhança dos vizinhos, a recuperação ou a reconstrução dos templos é evidente mesmo para os menos observadores. Mais de 85% dos romenos identificam-se como cristãos ortodoxos, 7% como protestantes, 5% como católicos gregos. Os restantes 3% são muçulmanos, judeus e irreligiosos. 
Tanta devoção religiosa só pode ser explicada pelas restrições impostas durante o período comunista. 
A inauguração da nova catedral ortodoxa de Bucareste, construída mesmo ao lado do edifício ambicionado por Ceauscescu, está prevista para Novembro deste ano. Em Maio foi visitada pelo Papa Francisco, na busca do ecumenismo entre as igrejas irmãs.

-  E, se posso perguntar, qual é a sua religião?
- Sou cristão ortodoxo. Mas a minha mulher e os nossos três filhos são católicos. E eu costumo ir à igreja católica porque as missas são mais curtas. Sabe quanto tempo pode demorar uma missa numa igreja ortodoxa? Mais de quatro horas. Mas podem ser seis.
- Tanto?
- É verdade, é demais.


Bucareste é uma capital onde os muitos parques, verdejantes nesta altura do ano, oferecem a residentes e visitantes uma atmosfera refrescante. 

No Parque Herastrau, em Bucareste, estão, além do mais, reunidas as construções tradicionais que em tempos foram habitadas pelas gentes dos campos. Depois a agricultura dispensou trabalhadores porque o regime comunista emparcelou e mecanizou, as pessoas procuraram emprego na indústria e nos serviços - os serviços representam, presentemente, 52% do PIB- depois a indústria estiolou, as aldeia foram abandonadas, a emigração foi a porta de saída.
Na foto pode observar-se uma habitação rural antiga que, para poder iludir os otomanos e escapar às suas atrocidades, foi construída em subsolo, de modo a poder ser coberta com terra quando soava o alarme de proximidade do inimigo.
Repare-se ainda numa "cegonha" que, entre nós, também se chamava "picota" para tirar a água dos poços.

Enquanto visitamos Bucareste o navio avança para Ruse, já na Bulgária.
É dali que, no dia seguinte, vamos até Veliko Tarnovo e Arbanassi.
Sofia, a capital do país, fica a mais de 300 km. Visitamos Veliko Tarnovo que foi cidade capital de começos do séc XII até finais do séc XIV (1185-1393).
O trajecto de hora e meia é traçado sobre paisagem idêntica à da planície romena. Os terrenos são férteis e de irrigação natural. Talvez seja anedota mas conta-se, contou o guia, que um dia um governo japonês propôs comprar 10 cm de terra destas planícies para aumentar a fertilidade das suas.
  
Voltamos à planície, de searas de milho e girassol, em propriedades latifundiárias como na Roménia. Aliás foi nesta ida a Veliko Tarnovo que a guia contou a enormidade de hectares adquiridos por meios esconsos, que referi atrás na travessia da planície romena. 
Constata-se um padrão que, com algumas excepções, é muito evidente na evolução da titularidade dos meios de produção nos países que viveram em regime (dito) comunista: apropriação do poder e da gestão dos meios de produção pelos dignatários do regime, privatização e devolução desses mesmos meios a grupos protegidos - há quem os designe por máfias -, alguns dos quais se não a maior parte, transitaram do anterior regime.  

À planície extensiva, que se estende à produção animal - bovinos, ovinos, etc.- sucede uma orografia de altitude moderada que depressa descobre a silhueta de Veliko. 

Da grandeza passada de Veliko Tarnovo sobra a beleza natural e a urbanização antiga que se desdobra nos vales à volta do rio circundante, o Yantra.
Está um dia de assar caracóis, 35º., vamos subir até ao cimo da fortaleza, a  quem não conseguir prosseguir recomenda-se que espere cá em baixo à sombra das muralhas. Resultado: à saída faltava-nos um companheiro. Esperámos, telefonámos, afinal entrou no autocarro antes de nós, os que o esperavam. 


À entrada da primeira porta, encontra-se um desenho do conjunto quando estava inteiro e bem conservado, há muitos séculos atrás. O tempo, mas sobretudo as guerras, derrubaram a maior parte do conjunto, pouco deve ter ficado em pé. Foram reconstruídas as muralhas derrubadas e a igreja que dominava o centro da fortaleza.




A igreja reconstruída está interiormente decorada com pinturas nas paredes, seguindo a tradição ortodoxa, mas em estilo modernista. No altar pende uma peça que sugere o nascimento de Cristo recortada como antiguidade feita recentemente. Vale pela intenção. Pelo esforço da subida vale a vista do conjunto urbano aos pés da fortaleza. 


De Veliko Tarnovo vamos para Arbanassi por estrada de montanha amável, cerca de 15 km, 10 minutos. 
Arbanassi, hoje com menos de 300 habitantes, foi em tempos idos, sobretudo na segunda metade do séc XVII e finais do séc XVIII,  chegou a ter 1000 casas, terra de prósperos comerciantes que transaccionavam na Transilvânia, nos principados do Danúbio, Rússia e Polónia, artesanato em cobre  e ouro, vinhos, seda.


Agora vive do turismo, da amostra de algumas casas em que foi mantida a dignidade de outros tempos, das suas igrejas e, principalmente, da igreja da Natividade de Cristo (sec. XVII)

A casa do próspero comerciante em Arbanassi que todo o turista visita é esta. No rés-do-chão, além do mais, havia a adega, que hoje é loja de artesanato, principalmente bordados. No primeiro andar, a cozinha, os quartos, camas largas onde dormia toda a família e um quarto separado onde a mulher, quando parturiente, tinha espaço reservado, sossegado, para ela e espaço com berço para o nascituro.
E tinha retrete, um espaço com porta, de onde os moradores em cima evacuavam para baixo através de uma conveniente abertura no chão. 
Se perco o meu tempo com estes pormenores é porque, dizia a guia, não ser comum haver naquele tempo em toda a Europa espaço dentro das casas para o efeito referido. Nem em Paris. A comitiva, francesa em grande maioria, calou-se e eu concluí que a guia não estava a contar basófias.


A Igreja da Natividade de Cristo (pela descrição da guia pareceu-me tratar-se de um mosteiro, e, no mosteiro, uma das salas a igreja) terá sido construída com dimensão recatada para não suscitar a excitação da fúria otomana. Trata-se de um espaço composto por três salas, totalmente decoradas com frescos segundo a tradição ortodoxa.
Num desses frescos, que coloquei acima, a figura central é a mãe de Cristo. A Igreja chama-se da "Natividade de Cristo", mas uma das figuras que rodeiam a figura central é a figura de Cristo.

- Explique-me, se faz favor, como é que Cristo assiste ao seu próprio nascimento.
- Não. Este quadro não representa o nascimento de Cristo mas a Ressurreição da Virgem Maria.
- E o filho assiste?
- Cristo está sempre presente.

A Internet é de infinita sapiência:

" ... quando se aproximava o fim da vida terrestre de Maria, houve uma grande agitação na Igreja. Maria soube de antemão que estava para deixar este mundo. Os apóstolos também foram previamente avisados, de modo que se reuniram em Jerusalém. Quando lá chegaram, Maria já tinha morrido; abriram o seu sepulcro, que encontraram vazio. Cristo viera buscar a alma de sua Mãe Santíssima, que a arte bizantina representa sob a forma de uma criança enfaixada. A seguir, o corpo da Santa Mãe de Deus, gloriosamente ressuscitado, também foi assumido e levado a reunir-se à respectiva alma no céu." - aqui
Esclarecido.
E assim convencidos, regressámos ao navio, em Ruse. Onde nasceu Elias Canetti (1905-1994), vencedor do Prémio Nobel da Literatura em 1981. 

No dia seguinte, mais um mosteiro. O de Saint Dimitar Basarbowski, cavado nas rochas, provavelmente no séc. XV, durante a ocupação do otomana a avaliar pelos registos dos impostos dos 
turcos. Feita a visita, regressámos a Ruse.


Mosteiro de S. Dinis (Ruse)

Depois da visita a Ruse, uma "paragem técnica" na "Bulgariana" para beber o que apetecesse desde que fosse água ou cerveja, a acompanhar uns folhadinhos. E voltámos ao navio.

O navio subiu o rio durante a noite e, de manhã, estávamos em Belgrado, a capital da Sérvia, que foi capital da Jugoslávia, pela mão dura de Tito, antes de se estilhaçar o puzzle balcânico e a Sérvia ter sido reduzida a um território menor que o território português: 88361 km2, 77474 km2 para quem reconheça o Kosovo independente. E de entre os que o Danúbio atravessa até Budapeste, o mais pobre. 

Quando iniciámos a visita a Belgrado, as ruas junto ao cais de acostagem estavam, e devem continuar a estar, em obras. Disse a guia que o presidente da câmara prometeu que no princípio de Setembro estará tudo concluído, mas não passa de mais uma promessa que não vai cumprir. O costume, resumiu. Ah! Também prometeu que as obras da catedral ortodoxa estarão finalizadas no princípio de Novembro, mas ninguém acredita. 

É interessante analisar a evolução dos índices de desenvolvimento humano nestes países avaliados pelo Programa da Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano - PNUD: A Hungria é a 45ª no ranking do IDH, a Croácia 46ª., a Bulgária é 51ª , a Roménia 52ª, a Sérvia 67ª. 
A propósito, Portugal estava na 41ª posição. Refira-se, no entanto, que num dos componentes do índice - anos de escolaridade completos da população a partir dos 25 anos -, Portugal posiciona-se pior que qualquer daqueles cinco países. Sendo a educação o principal motor do desenvolvimento humano, Portugal arrisca-se, enquanto aquele handicap subsistir, a ficar para trás no pelotão.    


Catedral  Ortodoxa de Belgrado


A foto do exterior foi retirada da internet por não me caber tanto volume na objectiva do telemóvel.
  As duas abaixo foram obtidas na cripta da catedral, o único espaço acessível a visitantes.

- Gostou?
- Não. Francamente, não gostei.
- E porque é que não gostou?
- Porque a grandeza volumétrica e as iconografias douradas, são sinais opostos das direcções que, segundo as Escrituras, Cristo apontou. 




Kalemegdan (parque)

Depois da entrada no meio da confusão das obras com conclusão prometida para o princípio de Setembro, entrámos na fortaleza que domina a confluência do Danúbio com o Sava. E o que vimos é muito esclarecedor dos ânimos bélicos que subsistem no imaginário sérvio. De um lado e do outro da
muralha, há uma exposição de armas de artilharia, incluindo mísseis, que metralharam os países vizinhos. Uma exposição prometedora de novos conflitos. 
A Sérvia não aceita a independência do Kosovo, que considera o berço da sua pátria. A Rússia votou contra na resolução das Nações Unidas sobre a independência do Kosovo.
Para melhor se entender o vulcão político repleto de conflitos étnicos, religiosos, linguísticos, vale a pena ler aqui, a Desintegração da Jugoslávia. O gráfico com resolução dinâmica é muito impressivo da velocidade temporal com que tudo se processou.


Do lado oposto da entrada da fortaleza, observa-se uma panorâmica esplêndida sobre Belgrado. Ali, à direita junta-se o rio Sava ao Danúbio. 


À tarde, saímos de Belgrado a caminho de Novi Sad. 
Após "paragem técnica" para beber o que se quisesse, conquanto fosse água, cerveja ou refrigerante, ao som de um animado quarteto de cordas, visitámos Juzno-Backi. 
É um centro religioso, dominado por um enorme complexo de edifícios exclusivamente destinado a um seminário menor, seminário maior encontra-se em Belgrado.  


- Que diferenças teológicas separam os ortodoxos dos católicos.
- Ortodoxos não crêem no purgatório.
- E crêem no inferno?
- Acreditam que o inferno existe. O céu e o inferno.
- Quantos padres ortodoxos existem na Sérvia?
- Hum! Talvez dez mil? Não sei quantos são, mas são muitos.
- São casados?
- Ah, sim, são casados. Só se forem casados podem ser padres ortodoxos. 
- E se se divorciam?
- Deixam de ser padres.
- Aqui, neste seminário, formam-se padres?
- Não. Os estudos superiores de teologia são feitos em Belgrado. A formação aqui só permite que sejam monges, padres menores.
- Os monges são casados?
- Não, os monges não podem casar. Mas só eles podem atingir o patriarcado.
- Como pode ser isso, se têm estudos teológicos menores que os padres formados em Belgrado.
- São carreiras distintas. É um sistema muito complexo.

E com esta resposta, a guia apressou-se para a entrada no autocarro



Curiosamente, à entrada da elegante arquitectura neo-clássica do edifício principal do seminário menor, foram colocadas réplicas da Esfinge de Gizé, uma em cada lado da escadaria de acesso à entrada do edifício. Informou a guia que algum responsável pela obra, na altura da construção do edifício viajou até ao Egipto, ficou encantado com a Esfinge e mandou esculpir e colocar as duas réplicas. Verdade ou não, o escultor, entendeu que à Esfinge faltava o que é natural nos peitos femininos e colocou o que faltava.


A entrada de Novi Sad, uma cidade a cerca de 90 kms. de Belgrado, é dominada pela fortaleza. 
Nos Balcãs não faltam fortalezas nem mosteiros. 


Novi Sad é a segunda maior cidade da Sérvia com cerca de 300 mil habitantes, 400 mil na área metropolitana. É a mais multiétnica da região, cerca de 76% são sérvios, 6% são húngaros, 3% consideram-se jugoslavos, ainda que a Jugoslávia se tenha desintegrado, 3% eslovacos, 2% montenegrinos. Sobram 10% de outras etnias.
Situada a norte, à beira no Danúbio, foi violentamente atacada pelas tropas da OTAN durante a Guerra do Kosovo.   
Novi Sad perdeu as três pontes medievais que tinha sobre o Danúbio, assim como os sistemas de comunicação, água e eletricidade. Áreas residenciais foram bombardeadas com bombas de fragmentação várias vezes, enquanto a refinaria de petróleo local foi bombardeada diariamente, causando uma grave poluição e um amplo dano ambiental. 
c/p internet.


Apesar dos bombardeamentos a que foi sujeita, Novi Sad ainda apresenta grande elegância arquitectónica dos tempos em que foi o centro cultural mais importante da Sérvia.


A sede do poder local


A Igreja (Católica) do Nome de Maria


O interior gótico.


Mas também uma parte moderna que não escapa ao investimento chinês

Visitada a cidade, vamos ao Mosteiro de Krusedol.
A área ocupada pelo Mosteiro é enorme. Uma fotografia do conjunto, só com drone. Não temos drone. Poderia pescar algumas fotos na Internet mas nada acrescentaria ao que qualquer um pode aceder. 
O que o drone não pode mostrar é o Rasputine. 

- Rasputine? Tem algo a ver com o místico russo, influente na corte do último czar da Rússia?
- Absolutamente, nada. Entre na igreja, olhe à sua esquerda e verá um monge sentado, barbas compridas, vestes negras, com o tradicional barrete alto e negro na cabeça.
- Hum! E o que faz ele ali sentado?
- Quando não está a dormir ali, vela pela ordem e decência ( proibida a entrada a calções curtos) dentro da igreja. Também tem responsabilidades administrativas e supervisão das contas. 
  
Entrei, olhei à esquerda, Rasputine olhou para mim, desviei o olhar para as pinturas, sempre presentes e omnipresentes em todo o espaço interior das igrejas ortodoxas. Não há ícones em três dimensões mas não há espaço que não esteja preenchido por pinturas, umas ingénuas, outras barrocas, sempre em honra de milhares de santos que já passaram pela terra e agora os querem eternizados nas paredes.

Visitado o mosteiro, voltámos para o barco, que, durante a noite, navegou até Osijek, na Croácia  



Em Osijek, a 30 km da fronteira com a Hungria, não visitámos mosteiros.
Osijek é a quarta cidade da Croácia, com cerca de 120 mil habitantes.
Na Croácia, 87% dizem-se católicos, cerca de 5% ortodoxos. O estilo dos templos diz-nos quem reza lá dentro. Ao mesmo Deus, quase os mesmos ritos, a mais notória diferença para um leigo é a arquitectura dos templos.


Em Osijek, as ruas do centro histórico ligam-se entre si através de travessas em arcadas. Algumas bem mantidas, outras não tanto, sobretudo na parte mais antiga que cresceu junto da fortaleza. 
Vimos travessas idênticas a estas em Novi Sad.
Osijek também tem fortaleza. Que mais parece um conjunto de casernas, e talvez tenham sido isso mesmo, em degradação. 
Na fortaleza, o guia, um homem novo, que trabalhou em tempos em Paris como distribuidor de livros e revistas, voltou para a Croácia para a costa adriática. Mas lá a  renda da casa era muito cara e preferiu voltar às origens, neste lado, junto ao Danúbio. Pode dizer-se, neste caso com propriedade, que deu meia volta, porque a Croácia tem formato de ferradura ... quase.
Na fortaleza viu-se uma maqueta (em cobre?) da configuração da fortaleza quando ela merecia o nome. Agora resta a maqueta e os casarões a desmoronarem-se com o tempo. 


Após a visita à parte mais antiga, e a mais arruinada da cidade, visitámos a parte moderna, alguma arquitectura arte-nova, testemunho de tempos idos mais prósperos. 




Arquitectura e escultura contemporâneas apagam as memórias da passagem dos tempos em que orbitavam na constelação soviética.


Também na Croácia houve investimentos em que a crise de 2008 fez mossa grossa. 

- Vêem aquele edifício ao fundo?
...
- Destinava-se a centro comercial, de artes e espectáculos, uma meca de negócios em terra católica.
Faliu. Está vazia há mais de dez anos. Quem está a arder? 

O guia estava disponível para todas as perguntas. Tínhamos de estar de volta ao navio às 12,30, impreterivelmente, segundo o programa. Foi avisado a tempo de uma corrida em contra-relógio, de Osijek ao cais de embarque exigem pelo menos 45 minutos a um motorista experimentado. 
A paisagem, repetida na ida e volta, são searas de milho e girassóis.

Navegou-se até Mohács, já na margem direita do Danúbio, em território húngaro. 
O navio acostou para formalidades de controlo aduaneiro e eventual emigração clandestina.
Não havia clandestinos a bordo.
Não pisámos terra em Mohács. Não longe dali, defrontaram-se em 1526 e 1687 duas batalhas que determinaram o princípio e o fim do domínio do Império Otomano na Hungria. Quatro anos antes, em 1683, os otomanos tinham perdido a Batalha de Viena, e nela o fim da sua expansão na Europa.

Na manhã seguinte, depois de navegar de noite, chegámos a Budapeste


E à sua catedral.  
Cerca de 60% da população húngara é católica, 24% protestante.
Catedral Basílica de São João, o apóstolo ou, mais formalmente, Metropolitana Catedral Basílica de São João Apóstolo e Evangelista, São Miguel e da Imaculada Conceição  também chamada de Catedral de Eger (nome complicado, a fazer lembrar o do nosso Dom Duarte) é um edifício barroco do séc. XIX. Excessivo para o meu gosto. 
Em frente da Catedral Basílica encontra-se o Teatro da Ópera, mas está em renovação, não visitável, coberta como numa instalação de Christo ( Christo Vladimirov Javacheff, búlgaro). 

Registe-se que, vendo o nosso grupo às voltas com um mapa sem saber onde se encontrava, uma senhora pequenina, aparentemente octogenária, de olhos azuis claros, vivos, acercou-se de nós oferecendo ajuda.

- Estão longe do local para onde querem ir. Mas eu vou convosco.
- Mas ia  à  sua vida ...
- Tenho muito tempo. Estou reformada. O meu marido está totalmente incapacitado. Venham. Vamos entrar no próximo carro eléctrico.
- Não temos bilhetes ...
- Os senhores são da União Europeia, não são?
- Somos. Pois com a vossa idade não pagam nada nos transportes públicos, incluindo o metropolitano.

E lá fomos atrás daquele anjo da guarda para chegar onde queríamos. 
Podemos medir a simpatia dos húngaros pelo padrão desta senhora idosa? Obviamente, não. Mas é da mais elementar justiça registar o sucesso de simpatia deste encontro.

Não longe dali fica a  Grande Sinagoga de Budapeste, a segunda maior do mundo, só superada pela de Jerusalém. 


Frente


Interior

Entrada paga, cerca de 15 euros por pessoa. Uma fila longa, muita gente no interior.
Os homens devem cobrir a cabeça com um quipá, ou boné, ... um tipo descontraído entrou e sentou-se, a cabeça coberta com o capacete de motard. Às mulheres não é exigido que cubram a cabeça mas não podem entrar de perna ao léu. Há saias de plástico (transparente!) disponíveis à entrada. 
Se mais não houvesse, cobrir ou não cobrir a cabeça, ou o rosto, ou todo o corpo, só os olhos descobertos, revela bem a importância da relevância com que a espécie humana reverencia Deus. Único.


O mercado tem dimensões colossais. Mas ainda não chegou a sua vez de ser restaurado. Exteriormente decadente, dentro podem comprar-se legumes, frutas, carne, sobretudo frango, bugigangas, kitsch de toda a espécie, atoalhados, roupas, trapos.
Tem três pisos. No piso inferior o letreiro prometia haver peixe. Havia muito pouco e muito mal encarado, salvo as postas de salmão de aquicultura. com melhor aspecto.
E havia peixes vivos num aquário de aspecto manhoso onde se mexiam com dificuldade algumas carpas (ou peixe parecido). Um deles estava morto, bem junto à vitrina virada para o corredor. 
Há peixe no Danúbio?
Na internet afiança-se que sim.
Mas desde o delta, junto ao Mar Negro, até aqui em Budapeste comemos uma vez um desenxabido meio "red mullet", outra vez, salmão (bem) grelhado. 

Ao lado do mercado, voltado para o Danúbio, está o grandioso edifício da Universidade. Também a precisar de restauro.


Budapeste é monumental. Uma monumentalidade construída sobretudo no séc. XIX, quando a Hungria era parte do Império Áustro-Húngaro. Em cima o palácio real. 
Há muita renovação das majestosas construções daquela época. E também muita construção recente onde se instalam companhias multinacionais.


O ex-libris arquitectónico da cidade é o Parlamento, que se reclama o segundo maior do mundo, a  seguir a Westminster. Outros posicionam-no em terceiro, depois do actual Parlamento de Bucareste, que Ceaucescu quis inaugurar mas foi morto antes que a construção tivesse acabado. 
É muito visitado. Quisemos entrar, teríamos de aguardar uma tarde inteira. Desistimos.
O Parlamento de Budapeste, começado a construir em 1902 é, pelo menos mais recente, mais de um século que a reconstrução de Westminster após um incêndio. Se é segundo em dimensão não tem comparação com o perfil neo-gótico de Westminster. 
Budapeste tem um Parlamento enorme, mas quando foi construído já a arquitectura e as artes plásticas em geral tinham enveredado por outros caminhos. É enorme, sem dúvida, em termos volumétricos, mas é uma volumetria de gótico plástico.

Curiosamente, o Palácio da Regaleira, em Sintra, começou a ser construído depois de ter começado a construção do Parlamento húngaro. Também em gótico plástico. Quem o mandou construir tinha milhões e como "O Milhões" era conhecido.
Com milhões constrói-se o que se queira. Até ao excesso.


Saindo do mercado, passa-se à frente do monumental edifício da Universidade, atrás referido, e atravessa-se a mais icónica das várias pontes que ligam Buda a Peste. Ao fundo vê-se o Hotel Gellért.
Ao lado fica o edifício dos "Banhos Públicos".


Entrada para os "Banhos Públicos"
Não tomámos banho ali.